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Educação científica e democratização

Capítulo II A participação como visão democrática na ação

2.8. Educação científica e democratização

A educação científica e a contribuição do processo de participação sobre o livro didático como instrumento de democratização podem ser observados, tomando como embasamento a concepção de Astolfi, Peterfalvi e Vérien (1998), ao abordar como as crianças aprendem Ciências. Colocam a educação científica como instrumento de democratização, apresentam a preocupação dos reformadores do ensino ao prolongar a alfabetização através da iniciação científica do futuro cidadão, como também para permitir o desempenho satisfatório das instituições democráticas.

Para esses autores, numa democracia, as decisões devem ser tomadas numa sequência de discussões públicas, abertas a todos sem dominação, seja ela explicitada ou maquiada pelos veículos de comunicação. Um exercício que pode ensinar o funcionamento da democracia recai sobre as aulas, que possibilitam a participação. Com essa visão (op. cit, p.147), contribui ao afirmar que “professor tem liberdade para determinar as relações intradisciplinares, interdisciplinares e acadêmicas – não acadêmicas que pretende estabelecer entre os conceitos e os assuntos que explora com os seus alunos”. Dessa maneira, pode o professor dar a palavra a cada educando da turma. Assim, de modo sucessivo, os alunos apresentam suas ideias, opiniões e falas e se constrói gradativamente a unanimidade pela negociação.

Esse ideal torna-se cada vez mais difícil, em conseqüência da crescente sociedade tecnológica, tanto dos meios materiais como da hierarquia pautada nas competências (op. cit, p.286). Nesse sentido, observam:

Os detentores do poder detêm todos os elementos necessários à tomada de decisões: a informação e os procedimentos que permitem tratá-la, os conhecimentos científicos e os métodos de cálculo para os pôr em prática, o domínio dos instrumentos de comunicação e eventualmente de condicionamento. Assim, detêm esses poderes por intermédio de especialistas que têm a seu serviço.

Com essa postura e apoiado pela hierarquia do sistema educacional, o diálogo torna-se falsificado entre os especialistas e os executores de base. Os especialistas “superiores” dominam o conjunto das competências necessárias e as põem em prática. As suas falas e suas práticas apresentam uma complexidade, rigor e alto nível. Contudo, no domínio das competências que lhes asseguram o grau de especialistas, podem deixar de perceber variáveis estranhas ao seu conhecimento disciplinar. Porém, com aqueles que executam, pode acontecer, ao contrário, a percepção da existência de variáveis ou indícios negligenciáveis, pois os executores estão em contato direto com a situação concreta.

Na verdade, o que se apresenta é que os executores não são ouvidos, porque não desenvolveram aquele conhecimento pelo fato de não dominarem determinados aspectos do saber experimental ou apresentam um saber por analogias, embasadas em aproximações de situações vividas ou globais. Consequentemente, as discussões, muitas vezes, são direcionadas para as decisões de acordo com a visão dos especialistas e os executantes permanecem alheios às tomadas de decisões.

A formação científica tradicional, apontada neste trabalho, pode ser responsável, em parte, por problemas como este, quanto às tomadas de decisões que em geral são condicionadas aos especialistas. O caráter elitista do conhecimento científico repousa nas exigências do rigor científico, da formulação matemática, como também não reconhece caráter científico à vulgarização destinada ao grau de público.

Embora a metodologia do ensino e aprendizagem de Ciências não se constituam como cerne deste estudo, mas a fim de uma compreensão mais detalhada de como se dá a construção do conhecimento científico, apoiada em Astolfi, Peterfalvi e Vérien (1998), de modo sintético, o referido autor evidencia os seguintes níveis: a) o nível mais elevado, onde é alcançada a investigação; b) o nível intermediário, caracterizado pela

capacidade de aplicação do conhecimento e c) o nível mais elementar, cuja competência é reconhecida na capacidade de traduzir o mesmo enunciado e expressá-lo em linguagens diferentes, de reconhecer as analogias, caracterizado como o modo mais apresentado pelos meios de comunicação.

Outros aspectos levantados de como os jovens aprendem Ciências estão voltados para o desenvolvimento do “diálogo”, em vez do dialogal (Ibidem). Com a preocupação de que o conhecimento científico, ao envolver a questão da participação da turma que deve fazê-lo, mas de modo que ocorra o debate, ou seja, de modo “dialógico”, que diz respeito à estrutura dos conteúdos dos discursos: A promoção da participação, por si só, torna-se insuficiente se tal participação não envolver o diálogo verdadeiro, aquele que pressupõe a explicitação e a argumentação, os diferentes pontos de vista, na busca coletiva de um novo e mais satisfatório sistema de explicitação e compreensão do real, assim como o confronto entre o saber vivido e o conhecimento sistematizado. Em outras palavras, o debate entre o saber que os educandos trazem para a escola e o conteúdo dos livros didáticos de Ciências. A promoção dessa participação possibilita ao educando/cidadão frente aos especialistas, através da construção do conhecimento, participar via democrática, de modo que as competências científicas oficializadas ou habilitadas não confisquem o poder das decisões a serem tomadas, na esfera escolar, a exemplo do que acontece na adoção dos livros.

Sem dúvida, pode-se questionar, a partir das considerações apontadas anteriormente, quanto às concepções ou representações6 que os educandos podem apresentá-las a fim de participar de um debate entre o saber legitimado e o saber não legitimado. Nesse aspecto, apóia-se em (Ibidem), ao afirmarem que as concepções dos educandos são sempre multidimensionais, que é riqueza e, ao mesmo tempo, complexidade. E como tal a questão da complexidade deve ser estudada, conforme preconiza Morin (2000).