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Gestão participativa: sua lógica e relações

Capítulo III As diretrizes, os gestores e a escola pública no ensino

3.4. Gestão participativa: sua lógica e relações

Como aproximação para compreensão sobre gestão participativa ao tratar a administração e supervisão escolar como questões importantes, apresenta-se:

O conceito de gestão participativa envolve, além dos professores e outros funcionários, pais, alunos e qualquer outro representante da comunidade que esteja interessado na melhoria da escola (...) pressupõe, em si, a ideia de participação, isto é, do trabalho associado de pessoas analisando situações, decidindo sobre o seu encaminhamento (Machado et al, 2000, p.107) (grifo nosso).

Para Lück et al (2008), cabe aos responsáveis pela gestão escolar a promoção e sustentação de um ambiente propício à participação plena, de modo que todos os funcionários, alunos, pais ou responsáveis entendam que é por essa participação que os mesmos desenvolvem consciência social crítica e sentido de cidadania. Porém, por trás da gestão participativa existe, conforme Weber (1971), a lógica burocrática, que constrói a organização do trabalho, de modo que a regulação fique limitada aos papéis e funções a serem desenvolvidos. As práticas profissionais independem das características singulares dos assalariados e das relações pessoais que eles mantêm em seu trabalho. No organograma das instituições, registram-se as relações de autoridade e cadeias hierárquicas explícitas. Consequentemente, os membros da organização têm noção de que são dependentes e quais podem comandar, quem orienta e quem executa. Assim, o sistema esclarece os canais legítimos, a via hierárquica e os vínculos funcionais.

Desse modo, a lógica burocrática pode ser percebida na escola, ambiente em que seus atores são influenciados e capazes de identificar seu papel, estatuto, nível de autonomia, divisão de trabalho, as relações de poder, mecanismos de controle e a gestão dos processos de mudanças.

Para complementar essa lógica, focaliza-se que, nos sistemas escolares e nas ordens de ensino, há uma certa divisão de trabalho, em que os professores são distribuídos para o desempenho de suas atividades entre as series ou disciplinas, conforme o nível de escolaridade. Os diretores administram, coordenam, planejam, avaliam e, de acordo

com Thuler (2001), esses gestores no cotidiano escolar tentam proteger os professores contra as ingerências externas, a fim de que possam concentrar-se em seu trabalho de sala de aula. Lembra-se também que a direção de uma escola pública brasileira não assume a responsabilidade da contratação dos novos professores, que é confiada ao poder organizador regional ou nacional. A inspeção dos professores depende de um corpo especializado e a sua formação contínua, de outros especialistas, ao passo que a pesquisa, a avaliação e o desenvolvimento profissional são assegurados por instituições, muitas vezes exteriores aos estabelecimentos de ensino, ou até do sistema escolar.

Quanto às relações que podem refletir na participação dos atores escolares na gestão da escola, repousam nos seguintes fatores: descentralização, a questão da autonomia da escola e a própria articulação desses atores escolares. Para compreender essas relações, busca-se, inicialmente, o apoio no conceito de Costa (1997), ao considerar a descentralização com a ideia de redistribuição entre instâncias governamentais, entre poderes estatais e entre o estado e a sociedade. Isso, no que trata competências, recursos e encargos originários dos organismos centrais. Tal aspecto toma uma conotação de redistribuir o poder e redivisão do trabalho entre diferentes instâncias autônomas do sistema.

Barroso (1996) complementa ao considerar a policentração que pode ser definida como vários centros de poder coexistindo no sistema educacional. Para a transferência das políticas educacionais já descentralizadas para a escola, é denominada de redescentralização. Para Ghanem (2004), no Brasil, a forma mais difundida de descentralização é a municipalização, em que se transfere a competência das esferas maiores, entendida como União e Estados, para a menor esfera estatal, considerada como o Município.

Trata-se de uma estratégia que cria possibilidades para a participação e o controle das políticas públicas. Todavia, a participação e o controle dependem de circunstâncias políticas locais, especialmente da qualidade das relações entre o Estado (no caso, o Município), as entidades e os cidadãos (Lordêlo, 2004). Quando essas relações são dominadoras, tutelares, de clientelismo político e de fisiologismo, o autor esclarece:

(...) como prevalece em muitos municípios brasileiros, especialmente onde o Estado é o principal agente econômico e social, provedor de serviços de toda natureza, as instâncias decisórias se reduzem a espaços de legitimação e homologação (ibidem).

Outra resistência para a descentralização entre as esferas estatais repousa nas características comuns ao orçamento público. As despesas públicas são autorizadas, e não podem ser ultrapassadas. Essas despesas são também classificadas quanto às categorias econômicas. Consequentemente, os gestores estatais ou conselhos institucionais não têm autonomia financeira, como também não dispõem de liberdade para aplicar e remanejar recursos conforme as suas necessidades.

Desse modo, uma escola estatal torna-se uma organização governamental com o mesmo estatuto do conjunto da administração pública. Assim, torna o grau de autonomia administrativa e financeira da escola limitada. Fica impossibilitada de contratar ou demitir conforme seus próprios critérios. Nela são empregados os mesmos critérios que são usados para todo serviço público. Portanto, a escola estatal tem maior potencial de autonomia pedagógica do que administrativa, financeira e política.

Cassassus cit. in Lordêlo (2004) lembra três tipos de descentralização e desconcentração na América Latina: regionalização, municipalização e nuclearização. Cabe à nuclearização uma maior concepção de escola e função de responsabilidade da comunidade, pois essa estratégia cria elos entre as escolas de um determinado distrito e delega a função de coordenação para uma das unidades. Contudo, destaca-se que no Brasil, a modalidade da nuclearização é minimamente adotada.

Na América Latina, o que estaria ocorrendo seria uma desconcentração. Isso é um processo cujo objetivo é garantir a eficácia do poder central. Para os referidos autores, o poder central desconcentra funções e ações e mantém inalterável o núcleo de poder centralizado. Agindo assim, esta articulação atenderia mais aos interesses do poder central e, em menor intensidade, aos interesses do local.

A descentralização é um desejo tanto do Estado como da sociedade civil, mas as motivações são diferentes, na medida em que o Estado tem motivações instrumentais, a sociedade tem motivações políticas. À descentralização, cabe transferir o poder do Estado para a sociedade civil organizada e considera:

Nesse sentido, pouco importa se a eficácia contida pela via ascendente (supostamente descentralização) ou descendente (desconcentração). Quem deve ser fortalecida é a sociedade organizada, não o Estado. É desse modo que se constrói o capital social e se fortalece a democracia (Lordêlo, 2004, p.175).

Para Ghanem (2004), ao considerar a gestão escolar como desconcentrada, admite que mesmo assim essa não possui diferentes graus de eficácia e de poder transferido, seja esse administrativo, técnico ou político. Além disso, destaca a ausência de entusiasmo dos atores escolares com relação às sugestões de gestão desconcentradas. As experiências apontam, em comum, o fato da comunidade escolar assumir mais as discussões no que trata a gestão financeira escolar do que a pedagógica. O poder de difundir o projeto pedagógico ficou à disposição da comunidade e não foi utilizado. Entende-se, dessa maneira, que o poder não faltou aos atores escolares, mas, mesmo assim, não foi o mesmo exercido.

Cabe questionar por que algumas escolas fazem a diferença, e se a culpa é sempre do governo. Seria interessante buscar também explicações para a falta de participação com o trabalho dentro da escola. Por que razão não admitir que a disposição para participar implicaria dispor de mais tempo para um trabalho gratuito. Como vencer a cultura da falta de participação no interior da escola, este é um dos mais atuais desafios na gestão escolar. Nessa perspectiva, propõe-se como uma das ferramentas o diálogo voltado para o

(...) exame dos desafios da existência individual e social, seria o melhor caminho para o desenvolvimento da capacidade de reflexão e de apreensão crítica, isto é, para a formação da consciência apta a conhecer e, por isso, a apropriar-se de seus condicionamentos naturais e culturais, individuais e coletivos (Ghanem, 2004, p.95).

3.5. O papel do gestor escolar, sua relação com os atores escolares e a participação