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Capítulo 1. Revisão Bibliográfica e Objetivos

1.4 Efeito da transglutaminase na fabricação de iogurte e bebida láctea

covalentes entre aminas primárias, tais como lisina e grupo carboxiamida do resíduo de glutamina de proteínas (Figura 1.5). Desta forma, esta enzima pode atuar formando ligações intermoleculares entre proteínas e estabilizar a estrutura do iogurte e da bebida láctea (GERRARD et al., 2012).

O uso da TGase para melhorar a consistência dos alimentos iniciou em 1980. Possui sua utilização liberada pela União Européia (EU regulation 1332/2008) e considerada como GRAS (generally recognised as safe) pelos Estados Unidos da América. No Brasil, é comum o uso desta enzima em produtos cárneos, auxiliando na reestruturação de produtos, aumento da capacidade de reter água e melhora do fatiamento. O principal fornecedor da enzima é a Ajinomoto® e detentora de diversas patentes sobre a produção e utilização

(MOTOKI et al., 1989).

Contudo, diversas pesquisas comprovam benefícios da utilização de TGase em derivados lácteos (JAROS et al., 2006) como queijos (BÖNISCH; HEIDEBACH; KULOZIK, 2008; DE SÁ; BORDIGNON-LUIZ, 2010), iogurte (BÖNISCH et al., 2007a; ERCILI-CURA et al., 2013; GUYOT; KULOZIK, 2011; SANLI et al., 2011; TSEVDOU; ELEFTHERIOU; TAOUKIS, 2013) e bebida láctea (GAUCHE et al., 2009). Os derivados lácteos são estruturados basicamente por interações entre caseínas, e a TGase possui excelente atuação sobre estas

proteínas. Esta elevada atuação na caseína é atribuída pela sua estrutura mais aberta, flexível e com resíduos de lisina e glutamina facilmente acessíveis (JAROS; ROHM, 2011). Porém a susceptibilidade de atuação da TGase pode ser alterada dependendo da temperatura, pH e concentração de cálcio, sendo que o aumento da temperatura ou cálcio melhora a atuação da TGase e a redução do pH prejudica a atuação (HINZ; HUPPERTZ; KELLY, 2012).

Figura 1.5: Atuação da transglutaminase na formação de ligação covalente entre glutamina e lisina (Adaptado de BERG; TYMOCZKO; STRYER, 2012).

A TGase é estudada no aumento da consistência e redução da sinérese em iogurte e bebida láctea e pode ser utilizada de duas formas. A primeira forma é incubar a enzima (40 °C a 43 °C por 120 a 180 min) antes do processo térmico para fabricação do iogurte (85°C a 95°C por 3 a 10 min), no qual a enzima será posteriormente inativada e não terá atividade durante a fermentação das bactérias do ácido láctico (BÖNISCH et al., 2007a; LAUBER; HENLE; KLOSTERMEYER, 2000; LORENZEN et al., 2002; OZER et al., 2007). Contudo, neste procedimento cuidados devem ser tomados para evitar o desenvolvimento de micro-organismos indesejáveis durante o período de

incubação da enzima TGase. Outra forma de utilizar a TGase é adicioná-la juntamente com a cultura de bactérias do ácido láctico, neste caso a atividade da TGase será reduzida gradativamente durante a acidificação, sendo que a enzima não altera a cinética de fermentação das culturas de iogurte (BÖNISCH et al., 2007a, 2007b; ERCILI-CURA et al., 2013; LORENZEN et al., 2002). Considerando que na fermentação de iogurte o pH 5 é alcançado acima de 180 min de fermentação há tempo hábil para a atuação da TGase, e em pH inferior a 5 há perda considerável da atividade enzimática (BÖNISCH et al., 2007b).

A atividade residual da TGase foi avaliada por Bönisch et al., (2007b) após manutenção da enzima por 120 min a 40°C em pH 5 obteve atividade residual inferior a 8%, sendo que em pH < 4 a enzima sofreu perda irreversível de atividade. Considerando as características de fermentação do iogurte com temperatura entre 40 a 43° C e taxa de redução do pH entre 5 e 4,6 em aproximadamente 120 minutos, estima-se que há perda considerável de atividade da TGase durante o final da etapa de fermentação. Além disso, a temperatura ótima de atividade da TGase é 40°C e o iogurte é armazenado a 5° C, ratificando a redução ainda maior da atividade da enzima. Contudo é consensual que a adição da TGase em conjunto com a cultura starter melhora a capacidade de retenção de água e a consistência do gel (BÖNISCH et al., 2007b; SANLI et al., 2011). Porém, a adição de TGase, tanto antes da fermentação quanto em conjunto com a cultura de iogurte, contribui para o surgimento de característica grumosa do produto, provavelmente conferida pelas ligações covalentes entre proteína-proteína (LORENZEN et al., 2002).

Em estudo realizado por Sanli et al., (2011) na avaliação de iogurte firme com 3,0% de gordura, houve aumento da viscosidade em 72% quando a TGase foi utilizada em conjunto com a cultura de iogurte. Quando a enzima foi adicionada antes da fermentação (incubação por 1 hora a 50°C) houve aumento da viscosidade de 76%, não havendo, praticamente, diferença entre as duas formas de utilização da TGase. Já o teor de gordura influencia atividade da enzima, conforme demonstrado por Lorenzen et al., (2002), no qual o uso da TGase em iogurte com 1,5% de gordura aumentou a força do gel em 68% e reduziu a sinérese em 33%, em iogurte com 3,0% de gordura o aumento da consistência foi de 28% e a redução da sinérese de 15%. Com relação à

quantidade de proteína, não há acréscimo significativo na consistência do iogurte com adição de proteína de 3,0% até 3,75%, não justificando a fortificação do leite (TSEVDOU; ELEFTHERIOU; TAOUKIS, 2013).

Estudos utilizando API mostraram que amostras pressurizadas favorecem a atuação da TGase, aumentando a consistência e reduzindo a sinérese de iogurte firme, quando comparada a amostra processada termicamente adicionada de TGase (ANEMA et al., 2005; TSEVDOU; ELEFTHERIOU; TAOUKIS, 2013). Comparando as amostras de iogurte processadas termicamente com TGase e amostras processadas por API com TGase, Anema et al. (2005) verificaram aumento de 90% na consistência quando foi utilizado API (400 MPa/ 120min a 40°C) e Tsevdou et al. (2013), verificaram aumento de 62% na consistência do iogurte quando foi utilizado API (600MPa/10min a 55 °C). Este resultado é explicado pelas alterações causadas na caseína, como fragmentação parcial e solubilização de FCC (seção 1.3.1.1 desta tese). Contudo, não são relatados na literatura a utilização de TGase em leite processado por HAP na fabricação de iogurte.

De forma geral, diversos estudos comprovam o efeito sinergético do processo térmico (desnaturação de β-lactoglobulina) e adição de TGase (ligação covalente entre proteína-proteína) para aumentar a consistência de iogurte e reduzir a sinérese (ANEMA et al., 2005; BÖNISCH et al., 2007a, 2007b; ERCILI- CURA et al., 2013; LAUBER; HENLE; KLOSTERMEYER, 2000; LORENZEN et al., 2002; SANLI et al., 2011). Esses resultados são obtidos pelo arranjo estrutural estável promovido pela enzima que contribui para uma microestrutura mais homogênea e com poros reduzidos, minimizando a reorganização estrutural durante a estocagem (ERCILI-CURA et al., 2013).

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