• Nenhum resultado encontrado

Os efeitos materiais: da aquisição derivada e da transferência do bem num estado eventual de oneração

ADJUDICAÇÃO TERMO INICIAL.

3 EFEITOS DA ADJUDICAÇÃO

3.4 O tratamento da questão no Direito brasileiro

3.4.2 Os efeitos materiais: da aquisição derivada e da transferência do bem num estado eventual de oneração

De forma prevalente, a aquisição do bem penhorado por força da adjudicação é considerada efetuada a título derivado no Direito brasileiro (o que também se verifica no Direito português) e isto se deve ao fato dos bens adjudicados poderem, na eventualidade, continuar onerados por determinados tipos de direitos reais, o que explicaria o aludido modo de aquisição, embora, de modo paradoxal, contemple a regra de purgação dos direitos de garantia que recaiam sobre o bem em comento

387

.

Quando o Estado realiza a transferência coativa do bem do devedor, silente a lei, não possui a prerrogativa de excluir os ônus porventura incidentes sobre ele, haja vista a máxima de que não se pode transferir além daquilo que se tem (nemo

plus iuris in alios transferre potest quam ipse haberet), salvo exceções que serão

tratadas mais adiante.

Salienta Araken de Assis388 que “(...) ao Estado descabe expungir dos bens do executado alguns ônus (v.g., servidão de passagem que grava o imóvel penhorado), que beneficiam a terceiros (...)”.

Relativamente, portanto, ao traspasso dos direitos reais de gozo, o entendimento majoritário, no Direito brasileiro, é o de que a adjudicação transfere o bem com todos os ônus que o oneravam, subsistindo, portanto, as servidões, o uso, a habitação, a enfiteuse e a renda sobre imóvel. A exceção será quanto aos direitos reais de garantia389.

387

GIANNICO, Maurício. Expropriação executiva, p. 158.

388

ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução, p. 830.

389

O próprio Superior Tribunal de Justiça390 já decidiu, através de sua Terceira Turma, que “(...) A nua-propriedade pode ser objeto de penhora e alienação em hasta pública, ficando ressalvado o direito real de usufruto, inclusive após a arrematação ou a adjudicação, até que haja sua extinção”.

No Direito português, de forma diversa, haverá hipótese em que o direito real de gozo não acompanhará a transmissão do bem penhorado, caducando por ser posterior à garantia mais antiga (embora anterior à penhora), consoante anteriormente destacado.

No tocante, todavia, aos direitos de garantia, adjudicado o bem penhorado, aqueles passam a recair sobre o produto da citada transferência coativa, havendo uma sub-rogação em relação ao produto da alienação.

Doutrinariamente, fala-se em “purgação” dos direitos reais, mas que não o é a rigor, pois, quando verificado o efeito sub-rogatório, já mencionado quando examinado o Direito português sobre a questão, o que ocorre é a transferência do objeto da garantia.

Estabelece o art. 1499, VI, do CCB que a hipoteca extingue-se “pela arrematação ou adjudicação”; preceitua, igualmente, o art. 1436, V, do CCB que o penhor também se extingue em virtude da adjudicação do bem.

Caberá, então, aos credores com garantia real sobre o bem expropriado exigir, de acordo com a sua respectiva preferência, o recebimento de seu crédito no bojo da própria execução, instaurando-se, conforme o caso, o concurso de credores, previsto nos artigos 711 e 712, do CPCB/73 (artigos 908 e 909 do NCPC).

Se, todavia, o credor com garantia real não houver sido intimado previamente da realização da adjudicação391, a garantia real subsistirá e poderá o referido credor reivindicar o bem em pagamento de seu crédito contra aquele que o adquiriu judicialmente.

Ao credor não cientificado será facultado, então, não interferir na adjudicação para exercer seu direito de sequela, se e quando necessário (CCB, art.

390

Superior Tribunal de Justiça, 3ª Turma, Recurso especial nº 925687 / DF, rel. Min. Nancy Andrighi. Decisão unânime. Brasília, 09/08/2007. DJ 17/09/2007, p. 275. Disponível a partir de: <

http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=usufruto+e+adjudicacao&b=ACOR&p=true&l= 10&i=3>. Acesso em: 03 mar. 2016.

391

1501392), o que é reforçado pelos artigos 619 e 694, §1º, VI do CPCB/73 e 804, do NCPB, nos termos dos quais a alienação de bem gravado por penhor, hipoteca ou anticrese será ineficaz em relação ao credor pignoratício, hipotecário ou anticrético não intimado.

Desta orientação não discrepa o Superior Tribunal de Justiça393, através de sua Terceira Turma, que assim decidiu:

(...)

Ineficácia da alienação judicial de imóvel hipotecado sem intimação do credor hipotecário.

Direito de SEQÜELA. Persistência do gravame hipotecário que persegue a

coisa dada em garantia com quem quer que esteja, enquanto não cumprida a obrigação assegurada pela sujeição do imóvel ao vínculo real (...).

Comparando-se os regimes português e brasileiro, neste tópico, pode-se afirmar que se assemelham na medida em que, em ambos, ocorrendo a adjudicação, o bem penhorado será transmitido sem o ônus do direito da garantia.

Deve-se acrescentar, ainda, que, tanto em um quanto no outro regime em comento, a adjudicação tem o efeito de transferir o domínio do bem penhorado ao adjudicatário.

No sistema normativo brasileiro, a efetiva transferência da propriedade do bem adjudicado ocorre somente com o registro da respectiva carta de adjudicação, no caso de bens imóveis. Para a imissão na posse do bem, expede-se, a favor do adjudicatário, o correspondente mandado, conforme dispõe o NCPB (art. 877, §1º, I). Tratando-se de bens móveis, a transferência do domínio ocorrerá através de sua tradição (CCB, art. 1267, caput), expedindo-se, para tanto, a ordem de entrega ao adjudicatário (NCPC, art. 877, §1º, II).

392 “Não extinguirá a hipoteca, devidamente registrada, a arrematação ou adjudicação, sem que

tenham sido notificados judicialmente os respectivos credores hipotecários, que não forem de qualquer modo parte na execução”.

393

Superior Tribunal de Justiça, 3ª Turma, Recurso especial nº 303325 /SP, rel. Min. Nancy Andrighi. Decisão unânime. Brasília, 26/10/2004. DJ 06/12/2004, p. 283. Disponível a partir de: <

http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=adjudica%E7%E3o+e+direito+real&b=ACOR& p=true&t=JURIDICO&l=10&i=20>. Acesso em: 03 mar. 2016.

3.4.3 Da adjudicação da coisa locada

Pode ocorrer que o bem objeto da adjudicação (não importa se móvel ou imóvel) esteja locado na oportunidade da penhora.

Todavia, caso a locação ocorra após a penhora, pode ser considerada fraudulenta (CPCB/73, art. 593, caput e art. 792, caput, do NCPC), salvo se for autorizada pelo juiz. Nesta hipótese de fraude, o correspondente contrato de locação nenhum efeito produz perante o processo e o adquirente, realizando-se o desapossamento do locatário sem maiores formalidades, mediante a expedição de mandado judicial de “evacuando”394

.

No que tange às locações realizadas de forma prévia à penhora do bem e consideradas eficazes, como regra a adjudicação do bem locado libera o adjudicatário de respeitar o pacto locatício firmado com o proprietário anterior, havendo, contudo, exceções a esta regra.

Em se tratando de coisas móveis, de acordo com a regra contida no art. 576,

caput, do CCB, alienada a coisa durante a locação, o adquirente não fica “obrigado a

respeitar o contrato, se nele não for consignado a cláusula de sua vigência no

caso de alienação, e não constar do registro” (Grifo nosso).

Na locação de imóvel urbano, independentemente de sua destinação, regida pela Lei nº 8245, de 18.01.1991395, a alienação (aqui incluída a adjudicação) do imóvel torna denunciável o vínculo, dentro do prazo de noventa dias, contados do registro da venda ou do compromisso, presumindo - se, após esse prazo, a concordância na manutenção da locação.

Com efeito, preceitua o art. 8º da Lei em comento:

Art. 8º Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá

denunciar o contrato, com o prazo de noventa dias para a desocupação,

salvo se a locação for por tempo determinado e o contrato contiver cláusula de vigência em caso de alienação e estiver averbado junto à matrícula do imóvel.

394

ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução, p. 835-836.

395

Brasil. Lei nº 8.245 (Lei do inquilinato), de 18.01.1991. Disponível a partir de:< https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8245.htm>. Acesso em: 29 mar. 2016.