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EFEITOS DO RUÍDO NA SAÚDE: O ESTRESSE

As situações estressantes e as respostas de um indivíduo ao estresse9 podem estar associadas a muitos aspectos negativos. Com muito mais freqüência, associa-se o estresse a situações indesejáveis e somos bombardeados com informações que assinalam que ele é uma das maiores causas de nossos problemas. O excesso de estresse pode resultar em conseqüências danosas ao nosso organismo (FRANÇA et al , 1999).

A todo instante estamos fazendo movimentos de adaptação, ou seja, tentativa de nos ajustarmos às mais diferentes exigências, seja do ambiente externo, seja do mundo interno. Pode-se citar, como exemplo, um operário que trabalha em um ambiente ruidoso, pessoas que moram perto de ruas muito movimentadas ou perto de bares, igrejas barulhentas e de aeroportos. Neste sentido o estresse é aquele denominador comum de todas as reações de adaptação do organismo (FRANÇA et al, 1999).

Hans Selye (1936 apud FRANÇA et al., 1999) pôde perceber em seus estudos que, quando se submete um organismo a estímulos que ameacem sua homeostase, ele tende a reagir com um conjunto de respostas específicas, que constituem uma síndrome, desencadeada independentemente da natureza do estímulo. A isso ele denominou estresse.

Devem-se ressaltar dois aspectos essenciais sobre o estresse: de um lado, temos as situações que podem desencadear o estresse e que se

9 Estresse pode ser entendido como o conjunto de reações, que ocorrem em um organismo quando este está submetido a um esforço de adaptação - Hans Selye (1936 apud FRANÇA et al., 1999).

denominam estímulo estressor ou simplesmente estressor e, de outro lado, a resposta do indivíduo diante do estímulo, que é a resposta ou o processo de estresse. Se essa resposta é negativa, ou seja, desencadeia um processo adaptativo inadequado, podendo gerar inclusive doença, é chamado de distress; no entanto, se a pessoa reage bem à demanda, nomeamos de eustress. Em essência, o que temos é um estímulo sobre o organismo, o estressor, que desencadeia uma resposta, que é o estresse.

A tabela 1 mostra as principais reações do organismo humano ao distress e ao eustress.

Tabela 1. Reações ao distress e eustress FASE DE EUSTRESS

(fase positiva ou ascendente)

FASE DE DISTRESS (fase negativa ou descendente) vitalidade entusiasmo otimismo perspectivas positivas resistência à doença vigor físico lucidez mental

relações humanas ótimas alta produtividade e criatividade

fadiga irritabilidade falta de concentração depressão pessimismo doenças acidentes dificuldade de comunicação baixa produtividade e criatividade Fonte: STRESS - 2007

Dessa feita, estes estímulos (agentes) estressores são capazes de disparar em nosso organismo uma série imensa de reações via sistema nervoso, sistema endócrino (relacionado às glândulas) e sistema imunológico,

por meio do sistema límbico10; essas importantes estruturas do sistema nervoso central estão intimamente relacionadas com o funcionamento dos órgãos e regulação das emoções.

Dentro desta perspectiva, o estresse deve ser observado não só como uma reação do organismo, mas também como uma relação particular entre uma pessoa, seu ambiente e as circunstâncias as quais está submetida, que é avaliada pela pessoa como uma ameaça ou algo que exige dela mais que suas próprias habilidades ou recursos e que põe em perigo seu bem-estar ou sobrevivência (FRANÇA et al., 1999). Em síntese, agentes estressores são perigosos ao equilíbrio sistêmico do ser humano.

Por sua vez, o ruído pode ser considerado um agente estressor, pois provoca várias formas de reações reflexas, particularmente se o barulho é inesperado ou de fonte desconhecida, manifestando reações primárias de defesa do organismo, em especial para o homem em vigília ou dormindo, em que a audição estende seu papel no processamento da comunicação, aquisição de conhecimento e percepção da identidade própria (WHO, 2001). Se a exposição é temporária, o organismo geralmente retorna ao normal ou ao estado de pré-exposição em poucos minutos. Se o estímulo ruidoso é mantido ou alternado regularmente ocorrem mudanças persistentes.

Contribuindo com o entendimento fisiológico da ação do ruído no organismo humano, Babisch (2002) acrescenta que este provoca mudanças em hormônios associados ao estresse e é relativamente fácil obter medidas de seus níveis de forma não invasivas e o resultado é bastante significativo para estudos epidemiológicos. Eles fazem parte de um complicado mecanismo de

10 O Sistema Límbico é constituído de um grupo de estruturas que são muito importantes para as reações emocionais, a memória e o aprendizado.

respostas positivas e negativas que afetam as atividades do coração, a pressão sanguínea, a presença de lipídios no sangue, os níveis de glicose no sangue, a coagulação e a viscosidade do sangue. Todos estes são fatores de riscos biológicos estabelecidos para hipertensão, arteriosclerose ou infarto do miocárdio (BABISCH, 2002).

Desta forma, Babisch (2003) mostra o papel importante destes hormônios relacionados ao estresse e relaciona as mudanças que o aumento dos mesmos promove no risco ao sistema cardiovascular. As pesquisas a respeito dos efeitos do ruído, na relação estresse e distúrbios cardiovasculares, permitem obter informações do risco da exposição ao ruído para a saúde e que indiquem quais seriam os níveis aceitáveis. Por isso, Babisch (2003) afirma que esta direção dos estudos sobre a exposição do ruído está claramente de encontro com o capítulo 6 da Agenda 2111. Neste capítulo há cinco áreas relacionadas à saúde e destas três podem ser diretamente aplicadas a comunidades expostas ao ruído. São elas: proteção dos grupos vulneráveis; o desafio da saúde urbana e a redução dos riscos para a saúde decorrentes da poluição e dos perigos ambientais. A ênfase aqui é o do risco para a saúde física e psicossocial.

Insistindo na ênfase do risco do ruído para a saúde, Babisch (2002) adota um modelo do processo da evolução do risco que é ilustrado na figura 1. O processo de evolução do risco inclui: identificação do perigo (o quanto este perigo é relevante para a saúde?), avaliação da exposição (quantos foram afetados?) e avaliação do efeito. Estas informações são resumidas no que é chamado de risco de caracterização (periculosidade do risco).

11 O capítulo 6 da agenda 21 versa sobre a proteção e promoção das condições da saúde humana.

Figura 1. Processo da evolução do risco. (Adaptado de: The noise/stress concept, risk assessment and research needs – Wolfgang Babisch 2002).

O ponto final do processo de evolução do risco é a gestão do risco que deveria assegurar que efeitos adversos à saúde não poderiam acometer a sociedade12. A propósito, a Organização Mundial da Saúde (WHO 1994) define “efeito adverso” como sendo uma alteração, mudança, na morfologia, fisiologia, crescimento, desenvolvimento ou período de vida de um organismo que resulta em prejuízo da capacidade funcional para compensar o estresse ou o efeito prejudicial de outras influências ambientais. Neste sentido, o corpo humano tende a sofrer mudanças quando é impactado por uma crescente exposição ao ruído e tem-se, assim, um efeito adverso originado na poluição sonora. Estas alterações adversas podem provocar distúrbios como doenças no coração que são uma das causas principais de morte prematura em sociedades modernas

12 BABISCH, 2002.

IDENTIFICAÇÃO DO PERIGO

AVALIAÇÃO DA EXPOSIÇÃO AVALIAÇÃO DO EFEITO

RISCO DE CARACTERIZAÇÃO

(DOLL, 1992). Por esta razão desordens cardiovasculares, incluindo hipertensão e infarto do miocárdio, são prioridades nas pesquisas epidemiológicas sobre o impacto do ruído.

Figura 2. Efeitos graves do ruído. (Adaptado de: The noise/stress concept, risk assessment and research needs – Wolfgang Babisch 2002).

Some-se a essas informações, a figura 2, apresentada por Babisch (2002) em seu trabalho, adaptada de Wichmann13. Originalmente a figura refere-se à exposição química e resume os possíveis tipos de respostas do organismo a um agente ambiental. Porém, de forma geral, a figura pode ser aplicada a qualquer tipo de exposição ou fator ambiental. O termo “exposição externa” ao fundo do triângulo da figura não é pertinente para ruído, pois o ruído não pode ser medido no organismo, somente seus efeitos. Entretanto, este termo pode ser substituído por “incômodo”. Ainda no triângulo temos “mudanças fisiológicas de significação desconhecida” seguido por “distúrbios patológicos” “morbidez” e “mortalidade”. Babisch (2002) acredita que os três

13 WICHMANN, 1992 apud BABISCH, 2002. !

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efeitos mostrados mais ao topo do triângulo (figura 2) são passíveis de receberem o atributo “efeito adverso” de acordo com os critérios da Organização Mundial da Saúde.

Estes efeitos adversos e suas principais reações no organismo são mostrados por no esquema ilustrado pela figura 3. Para um melhor entendimento da figura 3 torna-se necessário aqui diferenciar indicadores de estresse (por exemplo, hormônios relacionados ao estresse), fatores de risco (hipertensão, pressão sanguínea) e manifestação de doenças (como infarto do miocárdio).

Figura 3. Esquema das reações produzidas pelo ruído. (Adaptado de: The noise/stress concept, risk assessment and research needs – Wolfgang Babisch 2002).

Os indicadores de estresse não são, diretamente, muito relevantes clinicamente, mas servem para avaliar os mecanismos do efeito. São como

parâmetros reagindo em curto prazo, ou seja, aparece primeiro dentro da cadeia de reação-efeito. Já os fatores de risco são diretamente relevantes para a saúde porque agem, na maioria dos casos, como variáveis contínuas. No entanto, para uma estimação quantitativa do risco, dados de fontes externas têm que ser levados em conta. A manifestação de doenças é o passo seguinte onde o resultado do efeito para a saúde é imediato. Nesta etapa temos uma quantificação direta do risco com base em dados armazenados. Porém, desde que os dados disponíveis consistam somente de incidências discretas e raras, serão necessários levantamentos com grande número de amostras para termos alguma evidência estatística do resultado (BABISCH, 2002).

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