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Efetivação do currículo na Escola de Educação Infantil

CAPÍTULO I – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.8 O Modelo Cognitivo-Interacionista e a articulação dos saberes no currículo da

1.8.4 E o campo do currículo no Brasil?

1.8.4.2 Efetivação do currículo na Escola de Educação Infantil

Nas últimas décadas, a área da Educação Infantil vem consolidando uma nova concepção sobre como educar e cuidar de crianças pequenas em instituições educacionais, assegurando a educação em sua integralidade, entendendo o cuidado como algo indissociável do processo

educativo. Essa concepção busca romper com dois modos de atendimento fortemente marcados na história da Educação Infantil: o que desconsidera o potencial educativo das crianças dessa faixa etária, limitando-se a tarefas repetitivas de controle e de guarda e, também, o que se orienta por práticas descontextualizadas, centradas em conteúdos fragmentados.

A partir desta perspectiva, currículo da Educação Infantil deve ser estabelecido de modo flexível e sempre considerando as necessidades e possibilidades essenciais a todas as crianças: as brincadeiras e as interações tendo como eixo integrador as artes e suas linguagens, o que, indubitavelmente, contribui para o estímulo da interação no espaço escolar. Foi com esse objetivo que as propostas do SME e ME foram desenvolvidas, ou seja, com a finalidade de proporcionar às crianças, desde sua mais tenra idade, um material didático que tivesse um embasamento teórico adequado aos seus princípios educacionais.

Nos dias de hoje, não é difícil deparar-se com crianças que chegam à escola cheias de energia e curiosas em desvendar conhecimentos, porém, permanecem engessadas em espaços inapropriados para o desenvolvimento da aprendizagem. Espaços que, infelizmente, se apresentam inadequados para a educação e cuidados da infância. São salas e mais salas de aula repletas de carteiras coloridas, mas ausentes de reflexão sobre esse espaço.

No Brasil, muitos fizeram da escola um negócio rentável, da sala de aula um palco de ignorância e da educação, mais um motivo de chacota. Pessoas que pouco sabem sobre Educação e, muito menos, sobre como se dá o desenvolvimento dos pequenos, abrem escolas, superlotam salas com crianças ávidas por aprender e, que, em breve tempo, apresentam essa curiosidade, característica da infância, amortecida. Enchem de bichinhos e objetos que agradam aos olhos dos pais ou responsáveis, mas, nos bastidores, camuflam a “tragédia pedagógica” permeada por práticas de controle, fragmentação de conteúdos e distanciamento da realidade vivida pela criança e suas formas de aprender.

Na Figura 3 a seguir, apresenta-se um esboço do currículo dos projetos Princípio do Saber e Conhecer e Conviver do SME e ME, no qual se destacam as brincadeiras e as interações; o devido espaço ao letramento e consciência fonológica, essenciais ao processo de alfabetização da língua materna e matemática a partir da primeira infância; as artes como um caminho de integração deste currículo, bem como o processo de alfabetização de suas linguagens.

Figura 3 - Esboço do currículo dos projetos: Princípio do Saber e Conhecer e Conviver

Fonte: Elaborado pela autora

No sentido de aprimorar esse contexto desfavorável ao desenvolvimento da criança, foram desenvolvidas, no Brasil, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI), os Referenciais Curriculares da Educação Infantil (RCNEI), e, mais recentemente a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) cujos eixos principais de aprendizagem na Educação Infantil são as interações e as brincadeiras. Sabe-se que o brincar é essencial para o aprendizado na infância de forma integral. Winnicott (Cf. 1975) salienta que é no brincar, e talvez apenas no brincar, que a criança ou o adulto fruem sua liberdade para a criatividade.

Figura 4 – Interações e brincadeiras

Fonte: Creche Betel

As diferentes abordagens pedagógicas baseadas no brincar, bem como, os estudos de psicologia infantil direcionados ao lúdico permitiram a constituição da criança como um ser brincante (Cf. WAJSKOP, 1995), portanto, a brincadeira deve ser vista como uma atividade essencial e significativa para a educação infantil.

As interações e as brincadeiras acontecem como processo dinâmico, indissociável; interagir e brincar são linguagens naturais das infâncias. Assim diz Kishimoto (2010), quando salienta sobre a importância dessas ações, pois, por meio delas a criança aprende a expressar sua identidade, sentimentos e valores, conhecer a si, aos outros, condições de repetir ações prazerosas, de partilhar, de usar os sentidos do corpo e solucionar problemas. Ainda, segundo a autora, ao brincar, a criança explora o mundo dos objetos, das pessoas, da natureza e da cultura para compreendê-los e expressá-los por meio de variadas linguagens.

Mas é no plano da imaginação que o brincar se destaca pela mobilização dos significados. Enfim, sua importância se relaciona com a cultura da infância, que coloca a brincadeira como ferramenta para a criança se expressar, aprender e se desenvolver.

No contexto da Educação Infantil, as Rodas de Conversa se tornam um momento ímpar para o levantamento dos conhecimentos prévios das crianças como forma de efetivar a aprendizagem significativa. Esse momento, que faz parte da rotina de toda escola de educação infantil, possibilita às crianças expressarem livremente seus saberes advindos de suas relações

sociais seja na escola, em casa, no parque, ou qualquer outro espaço. O professor atento e sensível ouvirá o que a criança verbaliza e aproveitará essas informações para preparar suas próximas aulas, partindo daquilo que o aluno já sabe, considerando o aprendiz na sua individualidade, afetividade, cognição, e também, como ser social e cultural, pressupostos cruciais para que a aprendizagem tenha significado.

A brincadeira, desta forma, assume um papel fundamental na infância; numa concepção sociocultural, a brincadeira mostra como a criança interpreta e assimila o mundo, os objetos, a cultura, as relações e os afetos das pessoas, sendo um espaço característico da infância e de vital importância para o conhecimento de si e do outro.

Figura 5 – Brincadeiras e rodas de conversa

Fonte: Creche Betel

A criança enquanto brinca se constitui como indivíduo diferente dos demais, entra em contato com diferentes papéis sociais e evolui quanto à diferenciação do eu e do outro. Esse ambiente de brincadeiras e interações, engajado numa proposta inovadora que apresenta as linguagens da arte como integradora do currículo, promove condições de ocorrência de aprendizagem significativa, no sentido de que efetiva na prática o aguçar do processo relacional já descrito anteriormente: daquilo que a criança já sabe e está presente em sua estrutura cognitiva com o novo conhecimento apresentado pelo professor nas atividades diversas; de quem ensina com a criança que aprende; do compreender do professor com o compreender da criança; do ensino com a aprendizagem.

Figura 6 – Diferenciação do eu e do outro

Fonte: Creche Betel

Esse ambiente também potencializa o espaço escolar como ideal, não cristalizado para o uso da capacidade da criança de perceber, compreender e refletir, visto que lhe é permitido a atribuição de significados ao que lhe é ensinado. Nas palavras de Kastrup (1999, p.152-3)

O melhor aprendiz não é aquele que aborda o mundo por meio de hábitos cristalizados, mas o que consegue permanecer sempre em processo de aprendizagem. O processo de aprendizagem permanente pode, então, igualmente ser dito desaprendizagem permanente. Em sentido último aprender é experimentar incessantemente, é fugir ao controle da representação. É também, nesse mesmo sentido, impedir que a aprendizagem forme hábitos cristalizados. [...] Aprender é, antes de tudo, ser capaz de problematizar, ser sensível às variações materiais que têm lugar em nossa cognição presente.

Evidencia-se neste trabalho de investigação o desejo de que todos os livros desenvolvidos pelo SME e ME apresentem a fundamentação teórica necessária para o desenvolvimento das atividades de seus livros e, consequentemente, orientem as ações dos professores, pois como salienta Bigge (Cf. 1977), a ação, seja ela parte do processo de ensino, seja parte de qualquer outra atividade na vida, ou está ligada a uma teoria ou é cega e sem objetivo. Logo, qualquer ação com objetivo é fundamentada teoricamente - a pessoa que ensina tem uma teoria de aprendizagem.