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2 REFERENCIAL TEÓRICO-CONCEITUAL

2.1 DESCORTINANDO A EFICIÊNCIA NO COOPERATIVISMO DA AGRICULTURA FAMILIAR NO CONTEXTO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA

2.1.2 Eficiência numa perspectiva evolucionária

A corrente teórica dos evolucionistas se contrapõe à microeconomia tradicional, pois embora se assuma que as empresas são motivadas pelo lucro, e procuram meios

de aumentá-lo, suas ações não são de maximização de lucro a partir de um conjunto de alternativas bem definidas e exógenas (NELSON; WINTER, 1982).

Carvalho (2001) aponta que esta corrente privilegia o progresso técnico como causa do aumento de produtividade, tendo como preocupação central a “lógica dos processos de inovação e seus impactos sobre a atividade econômica” (KUPFER, 1992 apud CARVALHO, 2001).

As empresas, na teoria evolucionista, segundo Nelson e Winter (1982) têm apenas capacidades e regras de decisão que ao longo do tempo se modificam em função tanto de ações deliberadas para resolver problemas quanto de eventos aleatórios.

Carvalho (2001) aponta que a teoria da eficiência-X de Leibenstein (1996) possui aproximação com o pensamento evolucionista e se destaca pela sua relevância no estudo da produtividade. Leibenstein (1996), tendo por base evidências empíricas, sugeriu que as empresas, em geral, não minimizam os custos de produção, constituindo este fato a principal ineficiência da economia (ocupando a ineficiência alocativa um papel secundário). Em lugar de utilizar a denominação tradicional de “ineficiência técnica” ou “ineficiência produtiva”, Leibenstein (1996) introduziu o termo “ineficiência X” para se referir à perda de output ou o excesso de custo que se produz como consequência das carências de motivação existentes entre os indivíduos que configuram a organização.

Em que pese alguns problemas teóricos12, o conceito de ineficiência produtiva tem ganhado aceitação na literatura empírica, uma vez que se têm constatado diferenças importantes entre os custos reais das empresas e os mínimos possíveis. No entanto, estas medidas empíricas invariavelmente se referem a medidas de eficiência relativas, comparando o desempenho de cada empresa com o desempenho das empresas consideradas similares. Esta ideia é mais evidente quando técnicas não paramétricas são utilizadas, onde vetores input-output das empresas são comparados diretamente entre si, resolvendo programas matemáticos (sob a suposição de que as empresas são comparáveis, ou seja, utilizam uma tecnologia comum). O mesmo é verdade em aplicações que estimam uma função de produção sob a suposição de que a função (tecnologia) é comum a todas as empresas, fazendo comparação de maneira indireta.

No entanto, Fidalgo (1999) chama atenção que se algumas empresas (eficientes) se saem melhor em comparação com outras (ineficientes) é simplesmente porque elas são diferentes. Existem diferenças entre as empresas que não tem reflexo contábil dadas as

dificuldades envolvidas na sua avaliação e até mesmo em sua mera identificação. A diferença entre a empresa que tem custos mais baixos e as demais, por exemplo, reflete a existência de fatores não observáveis, que não são medidos em termos monetários nos modelos (ou seja, o resíduo), o que comumente é chamado de ineficiência produtiva. Nesse sentido, Fidalgo (1999) considera que as tentativas de Leibenstein para defender uma teoria de ineficiência X, em oposição à tradição da teoria econômica, são estéreis, uma vez que o termo ineficiência X refere-se apenas a uma maneira de falar sobre as diferenças de motivação que existem e que têm uma explicação perfeita se o suficiente é investigado. Diante disso, a questão da ineficiência produtiva pode, então, ser abordada investigando porque as empresas são distintas, considerando seu conjunto de recursos e capacidades (FIDALGO, 1999).

O conceito de ineficiência tradicionalmente tem sido formulado levando em conta apenas as variáveis observáveis (entradas físicas e saídas físicas) e assumindo uma tecnologia subjacente comum, que se refere a uma abstração que representa as possibilidades existentes de transformar entradas físicas e observáveis em saídas físicas e observáveis. Mas, na realidade, esta tecnologia (possibilidades de transformação) sempre difere entre as empresas, porque estas possuem conjuntos de recursos e capacidades únicos, muitas vezes intangíveis e, portanto, difíceis de observar, quantificar e valorar. Nesse sentido, Stigler (1976) aponta que se as empresas obtém quantidades diferentes de ouptus a partir dos mesmos recursos (físicos), é porque utilizam tecnologias de processamento diferentes, ou seja, porque possuem e, portanto, empregam diferentes conjuntos de recursos intangíveis (conhecimento, sistema de incentivos, rotinas organizacionais, etc.).

Este é o raciocínio em que se sustenta a teoria de recursos e capacidades, segundo a qual não é razoável aplicar a cláusula ceteris paribus sobre a tecnologia, porque as empresas são heterogêneas, sendo que são as diferenças no conjunto de recursos e capacidades que possuem que lhes permitem alcançar níveis diferentes de output a partir dos mesmos inputs, gerando ganhos extraordinários que a concorrência não é capaz de eliminar completamente (BARNEY, 1991; DIERICKX; COOL, 1989; LIPMAN; RUMELT, 1982; PETERAF, 1993; WERNERFELT, 1984).

Uma classificação útil dos recursos controlados pela empresa é a proposta por Dierickx e Cool (1989) que, influenciados pela obra de Barney (1986), propõem dois tipos de recurso. Os recursos de fluxo são aqueles que podem ser obtidos imediatamente no momento que se necessita. Normalmente, são fatores que podem ser identificados e medidos em termos monetários, por exemplo, máquinas, força humana e participação de mercado. Recursos de estoque são aqueles que são gerados internamente a partir de fatores de fluxo ao longo de um

determinado período de tempo. Este processo de geração dos fatores de estoque é chamado processo de aquisição. Referem-se a fatores específicos à empresa, cuja valoração em termos monetários é difícil ou impossível, tanto para os concorrentes quanto para a própria empresa. Dierickx e Cool (1989) apontam que não existe um mercado de troca de tais fatores.

Por outro lado, as capacidades organizacionais da empresa referem-se a sua capacidade de realizar atividades através da coordenação dos seus recursos. Parilo (1999) aponta que não obstante a terminologia científica tem distinguido os termos capacidades competências, competências essenciais (PRAHALAD; HAMEL, 1990) e competências distintivas (HOFER; SCHENDEL, 1978; SELZNICK, 1957), todos estes termos se referem aquilo que uma empresa pode fazer particularmente bem com um conjunto de recursos trabalhando juntos.

Nesse sentido, Parilo (1999) propõe que é possível interpretar os índices de eficiência como indicadores da heterogeneidade existente nos recursos de estoque e nas capacidades organizacionais que carecem de avaliação explícita na análise. Por outro lado, as diferenças de recursos e capacidades das empresas também podem ser interpretadas como diferenças tecnológicas. Stigler (1976) observou que a aparente observação das ineficiências produtivas se devia, na verdade, a que as empresas estavam usando diferentes tecnologias. Na mesma linha, Collis e Montgomery (1997) afirmam que as capacidades podem ser uma fonte de vantagem competitiva, uma vez que permitem a empresa tomar as mesmas entradas (inputs) que os rivais e transformá-las em produtos e serviços, com uma maior eficiência no processo ou com saída de qualidade superior.

Considerando essa perspectiva, os índices de eficiência seriam, de fato, a medição de distâncias entre as diferentes funções de produção, em vez de medir as distâncias entre a empresa e uma função de produção comum hipotética que, na verdade, não existe. Ou seja, as fronteiras onde operam diferentes empresas são diferentes e isso se deve ao fato de que seus recursos são diferentes. Nesse sentido, Parilo (1999) aponta que uma interpretação possível do conceito de eficiência seria como o valor relativo dos recursos e capacidades ou como a vantagem competitiva das empresas.