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ELIAS, Norbert O processo civilizador: uma história dos costumes Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990.

Alianças e negociações

7 ELIAS, Norbert O processo civilizador: uma história dos costumes Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990.

Este espírito cruzou o Atlântico, chegando às grandes cidades brasileiras que lentamente foram difundindo as novidades européias para o interior do Brasil, onde cada comunidade fez sua própria leitura das novidades propostas pelos franceses.8 Os grandes centros urbanos do país passaram por transformações do espaço urbano através da busca pelo embelezamento, conforto, higiene e segurança. Estas aspirações expressavam tanto um ideal de civilização, quanto os interesses burgueses, implícitos na renovação urbana.9

Lages, a exemplo de Desterro/Florianópolis e de outras cidades de Santa de Catarina, vivenciou este processo com menos intensidade,10 contudo, ele aconteceu como Elio Serpa aponta:

uma pequena parcela da população lageana tinha contato com outros valores da sociedade burguesa através dos comerciantes que traziam novidades de Porto Alegre, São Paulo, Laguna e Desterro/Florianópolis, além da presença de pessoas de outros países e até de outras províncias ou

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Em Lages, a implantação de tais concepções, por vezes, contou com o trabalho ou até com a iniciativa de artesãos e técnicos alemães ou filhos destes, que através de

8 TEIXEIRA, Francisco Maria Pires. História concisa do Brasil. Pires Teixeira. São Paulo: Global, 1993, p. 209-211.

9 PESA VENTO, Sandra. Um novo olhar sobre a cidade: a nova história cultural e as representações do urbano. In.: Porto Alegre na virada do século 19: cultura e sociedade. Porto Alegre, Canoas, São Leopoldo. Ed. Universidade, UFRGS, ULBRA, UNISINOS, 1994, p. 140.

10 SERPA, Elio. A reformulação das condutas e das sociabilidades em Lages durante a Primeira República. In.: Revista da Memória. Fundação Cultural de Lages. Lages: ano 1, n° 1, 1996, p. 15.

pequenos detalhes ou grandes projetos contribuíram com a implantação material do projeto civilizador.

O espaço urbano passou por um processo de re-ordenamento iniciando pela re- nomeação de algumas ruas e praças. Posteriormente, em 1888, as ruas de Lages, receberam

46 placas de identificação, confeccionadas pelo pintor José Wolff em tabuletas com a medida de 55 cm por 30 cm, em fiindo preto e com letra gótica de 12 cm, em tinta branca. José Wolff havia sido contratado pela Câmara de Vereadores da cidade, através do vereador José Augusto de Arruda, para a execução do serviço, que custou 218$880. A mesma sessão da Câmara de Vereadores, que decidiu que as ruas seriam identificadas, também deliberou que as casas passariam a ser numeradas.12

O tempo da vida urbana também passou a ser disciplinado através do magnífico relógio construído pelo relojoeiro Einecke e instalado no alto da antiga matriz.13 Anos mais

tarde, em 1920, os sinos, afixados no alto da torre da Catedral Diocesana de Lages, passaram a dar novos ritmos aos movimentos urbanos e práticas cotidianas que, paulatinamente, foram embaladas pelos sons das horas canônicas.14

Os relógios de bolso lentamente foram ganhando lugar entre uma população que começava a viver no compasso do ritmo das badaladas do sino que vinha do alto da igreja. Para atender esta demanda, durante as primeiras décadas do século XX, as relojoarias de

12 COSTA, Licurgo Ramos. O continente das Lagens — sua história e influência no sertão de terra firma. Florianópolis: Fundação Catarinense de Cultura, 1982. p. 1627.

13 Guia Serrano. Lages, 09 de outubro de 1941.

14 Horas canônicas: 1. Na liturgia católica, cada uma das partes em que se divide a recitação do ofício divino ou breviário: matinas, laudes, vésperas, prima, terça, sexta, nona e completas. 2. Coleção de orações para as diferentes horas canônicas. 3. Horas certas, regulares. In.: Dicionário Aurélio CR Room.

Paulo Baier15 e Ervin Specht ofereciam grande variedade de relógios de bolso, relógios de pulseiras e fitas para relógios.16

Segundo Licurgo Costa os imigrantes, sobretudo os que chegaram em Lages no fim do século XIX e inicio do XX, eram vistos como agentes da modernidade que poderiam trazer novas tecnologias à cidade. O articulista afirma que eles:

Era visto com consideração e respeito por que falava outra língua, tinha vindo da Europa, de um país que tinha luz elétrica, trens e outras coisas da modernidade que não existiam em Lages.17

A introdução da eletricidade como força motriz nas fábricas e na iluminação elétricas das cidades iniciou na Europa em 1870. Em Santa Catarina, a primeira usina hidroelétrica foi instalada na cidade de Blumenau, em 1909, vindo a cooperar com o aquecimento da industrialização da região. Com a eletricidade e, conseqüentemente, com as várias form as de iluminação, o mundo fica muito diferente: o dia confunde-se com a noite, rompe-se o limite ‘natural ’ da noite n

Os projetos de eletrificação de Lages, seguidos pelos primeiros experimentos na década de 1910, ficaram por conta de José Suiter. Maria Luiza Aquino, sua filha, recorda e comenta sobre os projetos modemizadores de seu pai para a cidade que havia escolhido para viver:

15 O Clarim. Lages, 05 de Julho de 1911.

16 Correio de Lages. Lages, 18 de outubro de 1924.

17 Licurgo Costa. Entrevista realizada em Florianópolis, 11 de maio de 1999.

18 AUED, Bemadete Wrublevski. História de profissões em Santa Catarina: ondas largas civilizadoras. Florianópolis. Ed. do Autor, 1999, p. 75.

O ideal do meu pai era construir a luz elétrica em Lages. Então ele fo i o primeiro a instalar um sistema de luz elétrica de Lages. Ele fe z instalação de luz elétrica em fazendas, no cinema e no Clube I o de julho. Só que o rio Carah era pequeno e tinha pouca potencia. Ele fe z também

encanamentos de água.

Ele fazia de tudo para sobreviver.19

Poucos anos mais tarde, Frederico Guilherme Busch, empresário de Blumenau, ganhando uma concorrência pública, recebeu o direito de fornecer o abastecimento de luz elétrica para a cidade. Para comemorar mais esta marca da modernidade que chegava a Lages, promoveu-se uma solenidade inaugural no Salão de Honra da Superintendência Municipal em Io de novembro de 1917. Inicialmente foram poucos os pontos que receberam o abastecimento de luz, gerado através do salto do Rio Caveiras.20

O conhecimento que alemães trouxeram da Europa também foi usado na construção de casas, sobrados, prédios públicos, móveis, utensílios domésticos. Com a chegada do

século XX, as casas da cidade de Lages sofreram transformações em resposta às prescrições dos códigos de posturas. O aspecto exterior dos prédios públicos e construções mudava e dentre esta mudança estavam algumas construções pensadas e desenvolvidas por alemães.

As famílias mais ricas importaram o desing de moradia de outros lugares de tal modo que Lages não tem mais residências com um estilo característico, que revelem uma tradição local.21 Neste mesmo período, casas com a frente do telhado abatido, no estilo de chalet germânico, passaram a fazer parte da paisagem lageana, segundo Victor Peluso

19 Maria Luiza Suiter Aquino. Entrevista citada.