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Em foco o universo conceitual das dissertações analisadas

A ATIVIDADE LÚDICA NA PRODUÇÃO DA ÁREA EDUCACIONAL: TECENDO ANÁLISES

3.1 Em foco o universo conceitual das dissertações analisadas

Para caracterizar nosso objeto de pesquisa, um primeiro aspecto é identificar quais são os referenciais teóricos que fundamentam as pesquisas realizadas. Nesse sentido, cabe destacar a predominância de teóricos da Psicologia, especialmente Jean Piaget, Lev S. Vygotsky, Henry Wallon e Daniil B. Elkonin.

Muitas vezes os autores utilizam referenciais teóricos opostos de forma complementar, ou seja, Jean Piaget e Lev S. Vygotsky aparecem lado a lado em muitas dissertações para explicar a atividade lúdica, embora se fundamentem em matrizes epistemológicas diferentes. Esta diferença não é considerada pelos autores, o que leva a uma compreensão superficial e utilização deturpada dos princípios da Psicologia Histórico-Cultural, já que a tendência é “esquecer” que essa perspectiva se fundamenta no materialismo histórico e dialético. Duarte (2001) e Facci (2004) reconhecem que essa é uma tendência presente na produção educacional nas últimas décadas, um certo ecletismo na utilização dos referenciais teóricos e uma aproximação entre perspectivas diferentes sob o manto do construtivismo ou sócio- interacionismo. Considerando que a produção analisada foi elaborada a partir da metade da década de 1990, a constatação desses educadores também se manifesta nas dissertações analisadas.

Como já apresentamos no capítulo 1, a teoria de Vygotsky enfoca primordialmente a relevância do aspecto social na constituição da consciência. Essa condição influenciará também o conceito sobre o desenvolvimento e aprendizagem, que, de acordo com seu enfoque, no jogo estão as suas principais possibilidades. Já a teoria piagetiana utiliza como base epistemológica a teoria evolucionista, apriorista, explicando o jogo com a mesma lógica que utiliza para descrever a inteligência. Portanto, de maneira espontânea e natural, a criança ao ser desafiada no brincar com os objetos, forma esquemas mentais desenvolvendo assim a inteligência.

Ramos (1997), na dissertação nº 10, utiliza os referenciais de Piaget e Vygotsky de forma complementar, destacando que não se deve considerar apenas uma das teorias, pois ambas caminham de forma paralela. Embora reconheça que há diferenças teóricas entre ambos, afirma que na prática não são tão diversas. Neste sentido, considera:

8 Para análise dos conceitos de atividade lúdica utilizados pelos autores, foi elaborado um quadro- síntese para

cada uma das dissertações. Estes quadros compõem o Anexo 1 do presente trabalho. As dissertações serão identificadas com a mesma numeração utilizada para apresentar a síntese geral de cada uma no capítulo 2. Isto permite ao leitor relacionar os dados apresentados nos capítulos 2 e 3.

Embora existam algumas diferenças de enfoque entre Piaget (1975) e Vygotsky (1994), ao se fazer crítica a uma ou a outra teoria, deve-se pensar até que ponto as perspectivas são, na prática, tão diversas. Por se tratar de uma questão ampla e controvertida, não podemos nos fechar a nenhuma das duas teorias, pois elas caminham de forma paralela. (RAMOS, 1997, p. 25).

Esta mesma questão se verifica na dissertação nº 9 (OTERO, 1996), que considera que há aspectos comuns entre Vygotsky, Piaget e Wallon, sobretudo na importância dada ao jogo simbólico. A autora destaca primordialmente o desenvolvimento cognitivo, apesar de considerar também os outros aspectos envolvidos no desenvolvimento da criança.

Na dissertação nº4, Barreto (1999) faz um estudo comparativo e integrativo, como denominou, entre Piaget e Vygotsky, ressaltando as diferenças e integrando os pontos de vistas dos dois teóricos. Os pressupostos teóricos que integraram a proposta pedagógica da escola analisada tinham por base o construtivismo e o sócio-interacionismo. Assim, de forma integrativa, a autora defende a possibilidade do desenvolvimento do ensino-aprendizagem e da avaliação de forma lúdica, unindo os dois pressupostos.

A dissertação nº3 (CARLETO, 2000) apresenta teóricos que valorizam a atividade lúdica nos processos de ensino-aprendizagem, sobretudo, Piaget e Vygotsky. Apesar de apontar diferenças significativas entre ambos, aponta também aproximações. Refere-se, sobremaneira ao jogo de regras, destacando sua importância para o desenvolvimento social. Assim, destaca:

Tanto Piaget quanto Vygotsky sustentam que a inteligência é elaborada a partir de relações recíprocas do homem com o meio. Os dois se opõem tanto à teoria empirista, para a qual a evolução da inteligência é produto apenas da ação do meio sobre o indivíduo, quanto à concepção racionalista, que parte do princípio de que já nascemos com a inteligência pré-formada, ou seja, o desenvolvimento da inteligência é determinado pelo indivíduo e não pelo meio. (CARLETO, 2000, p. 32).

Nesse viés, observamos a dissertação nº 16 (MORENO, 2001), que enfoca e educação infantil. O conceito de criança acompanha o conceito que tem sobre o jogo: o jogo é um direito da criança no seu desenvolvimento na educação infantil. As reflexões giram em torno de perspectivas históricas e filosóficas do lúdico, incluindo Piaget juntamente com outros teóricos como Huizinga, Chateau e Brougère.

Nas dissertações nº 1 (MAGNANI, 1998), nº 13 (BUENO, 1997) e nº 5 (MUSEKA, 1995) essa mesma situação se repete. Na primeira, a autora defende uma base cognitiva do jogo, utilizando Piaget: o brincar é entendido como forma espontânea e natural da criança, ao

mesmo tempo em que o brincar é resultado das relações interindividuais; a criança aprende no convívio social. A segunda apresenta primordialmente Piaget em sua análise, conceituando jogo como atividade espontânea e natural da criança, assim como uma forma de desenvolvimento intelectual que tem a função de satisfação das necessidades naturais e essenciais da criança. Para a autora, é uma marca de expressão natural do ser; em contrapartida, é visto também como fator gerador de cultura, e fazendo parte dela. Na terceira, o lúdico é considerado dentro de uma perspectiva inatista, como, por exemplo, como traço de personalidade, como “uma fonte de estímulo para o desenvolvimento cognitivo” e, ao mesmo tempo, preza sua função cultural, enfocando paralelamente autores como Vygotsky e Huizinga.

Com relação ao ensino fundamental, a dissertação nº 7 (RABIOGLIO, 1995) tem como objetivo encontrar o lugar do jogo na escola. Faz referências a Piaget e autores que enfatizam o aspecto cultural, como Wallon e Huizinga, entendendo que suas análises se complementam.

A dissertação nº 8 (MIRANDA, 2000) apresenta concepções de jogo de acordo com Piaget e com Brougère e a dissertação nº 11 (MARQUES, 1997) elege como referências principais Piaget e Claparède. Constata-se uma mistura conceitual sem diferenciação entre os autores.

Com relação às teorias sobre o jogo, discutidas no capítulo 1, percebe-se o predomínio das teorias cognitivas, o que talvez se explique pela grande influência das idéias piagetianas nas dissertações analisadas. Destoando deste universo, a dissertação nº 13 (BUENO, 1997) inclui também a tendência da análise pelas teorias psicoafetivas, representadas em seu trabalho pela teoria psicanalítica do jogo.

Em um número menor, verificamos quatro dissertações cujos referenciais teóricos são utilizados pelos autores de forma única. Uma delas é a dissertação nº 15 (RIZZO, 1996), em que a autora utiliza unicamente os pressupostos Wallonianos como referencial teórico para sua análise, aprofundando seu estudo. A dissertação nº 6 (PEIXE, 1999) apresenta apenas considerações de autores dentro da abordagem histórico-cultural. A dissertação nº 2 (PINHO, 2001) utiliza primordialmente os autores pertencentes à abordagem Histórico-Cultural no corpo teórico do trabalho e na sua análise, abordando a relevância do aspecto social da brincadeira. Também destacamos a dissertação nº 12 (DEBORTOLI, 1995), cujo trabalho apresenta coerência conceitual, quanto ao aspecto cultural da atividade lúdica, entre os teóricos abordados pelo autor.

Após uma análise geral do referencial teórico presente nas dissertações, procuramos identificar categorias que permitissem a organização do material pesquisado. As categorias não foram definidas a priori, mas emergiram dos discursos apresentados nas dissertações, em seus referenciais teóricos. Em seguida, confrontamos com o referencial teórico apresentado no Capítulo 1. São categorias mais amplas que englobam subcategorias. Tal organização nos ajudou a sistematizar a grande quantidade de informações recolhidas das 16 dissertações analisadas. De acordo com Franco (2003), esse processo ocorre em uma contínua busca na teoria e, ao mesmo tempo, no material de análise, o que implica um domínio conceitual do pesquisador frente às diferentes abordagens teóricas que se apresentam na pesquisa.

Procedendo desta forma, chegamos a cinco categorias, a saber: 1-Brincar e Cultura; 2- Concepção de Educação/Aprendizagem; 3-Concepção de Criança e do Brincar; 4-Brincar e Processo Escolar; 5- Atividade Lúdica Como Recurso Instrucional.

Em todas as categorias, procurou-se discutir as informações considerando o trabalho realizado na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental, buscando perceber se há diferenças significativas na compreensão da atividade lúdica entre esses dois níveis do processo de escolarização.