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Emergência de conflitos relacionados às UCs

2.3 Conflitos relativos à criação de Unidades de Conservação

2.3.2 Emergência de conflitos relacionados às UCs

A criação de UCs e demais Áreas Protegidas no Brasil e no cenário mundial foi marcada pela emergência de conflitos de interesses relacionados ao uso e à destinação dos recursos naturais. Para Ferreira (2006), tais conflitos sempre estarão presentes, em qualquer escala ou tipo de ocupação humana, constituindo parte do processo de construção e reconstrução social.

Dentre as principais causas de conflitos em torno das Unidades de Conservação encontra-se o problema da falta de regularização fundiária. De acordo com Martins (2011), a grande maioria das áreas protegidas que têm sido criadas desde a época da ditadura militar não apresenta um quadro regularizado da situação fundiária. Conforme informações do próprio presidente do ICMBio, Roberto Vizentin, a desapropriação de áreas privadas no interior das UCs, ainda hoje está longe de ser concluída. Vizentin (2013) afirmou que “dos 75 milhões de hectares que compõem as 312 Unidades de Conservação Federais (313 em 2014) nós vamos ter algo como 10 milhões de hectares de áreas privadas e que ainda precisam ser desapropriadas e pagas”, uma conta que, segundo afirmou Vizentin, ficava em torno de 12 bilhões de reais. Como resultado existe inúmeros casos de irregularidade espacial, situação que também diz respeito às populações residentes desses territórios, àquelas que não foram indenizadas e/ou realocadas para fora das unidades de conservação de proteção integral.

Contudo, esses conflitos relacionados à desapropriação de terras privadas representam apenas uma parte do complexo quadro de tensões originadas

com a criação de UCs. Conforme Martins (2011):

Disputas relativas ao uso dos recursos naturais ali presentes, tais como o potencial energético de rios e mananciais para empreendimentos de geração de energia, as reservas de matérias-primas para indústrias de extração mineral (areia, carvão, minério de ferro, calcário, fosfato, etc), recursos pesqueiros, extração madeireira e de espécies nativas para produção de cosméticos ou indústria alimentícia (recursos genéticos vegetais e animais), além da apropriação paisagística pela indústria de turismo e do mercado imobiliário, conformam a miríade de exemplos que nos permite dimensionar o problema em escala nacional. (p.42).

Com relação à política ambiental de criação de Unidades de Conservação, direcionada à região da Terra do Meio, ela inquestionavelmente representou a possibilidade de tratar e amenizar alguns conflitos preexistentes. No entanto, também é inquestionável que ela foi a mola propulsora da emergência de novos conflitos, representando, portanto, um dos eixos causadores de conflitos. Ao recorrer à literatura sobre o tema Unidades de Conservação, constata-se que são numerosos os casos envolvendo conflitos que dizem respeito às problemáticas envolvidas na criação de áreas de preservação ambiental. Uma série de trabalhos aponta para a pertinência e para a existência dessas relações conflituosas, concernentes tanto à criação quanto aos encaminhamentos relacionados à gestão dessas áreas no Brasil. Algumas das questões envolvidas neste debate podem ser acessadas nos estudos de casos realizados por Ferreira et al., 2007; Silva, 2009; Campos, 2006; Creado, 2008; Creado et al., 2008; Ferreira et al., 2002; Ferreira, 2005; Calvimontes, 2013; Calvimontes e Ferreira, 2012; Simões, 2010; Mendes, 2009; Caldenhof, 2013, dentre outros. Em geral, essa literatura recorre à categoria conflito ambiental em unidades de conservação, associando-o ao tema da gestão territorial.

Ainda que a criação de Unidades de Conservação não seja considerada um empreendimento de natureza econômica ou infraestrutural, que movimente multidões em busca de oportunidades de trabalho ou que dinamize a economia de uma região, trata-se inquestionavelmente de um grande empreendimento que tende a gerar transformações fundamentais nas relações sociais preexistentes num dado território. Em decorrência, as políticas ambientais dessa natureza também têm provocado uma série de debates e conflitos entre diferentes perspectivas sobre a atuação do Estado e os arranjos institucionais, sobretudo naquelas áreas em que há

ocupação humana de longa data dentro dos limites territoriais transformados em unidades protegidas.

De acordo com Maurício Mercadante, consultor legislativo da Câmara dos Deputados e ex-diretor de Áreas Protegidas do Ministério do Meio Ambiente entre 2003 a 2008, a criação de uma unidade de conservação, assim como qualquer obra ou medida que implique a destinação de uma parte do território em favor de uma determinada atividade em detrimento de outras possíveis, gera conflitos e produz

resistências (MERCADANTE, 2012). Entretanto, as reações por parte dos

descontentes ou da sociedade em geral se dão em grau e natureza diferenciadas, dependendo da obra ou projeto que se está em questão. Por exemplo, afirma Mercadante (2012), a construção de uma hidrelétrica gera conflitos, assim como a de uma rodovia, mas, em geral, percebem-se com maior facilidade as vantagens da construção de uma hidrelétrica ou de uma rodovia do que da criação de uma unidade de conservação. Mercadante (2012):

No primeiro caso, os benefícios são mais facilmente mensuráveis e imediatamente percebidos e apropriados. Há mais recursos para minimizar os danos e compensar os eventuais prejuízos das comunidades locais. No segundo caso, os benefícios são mais difusos e de mensuração mais difícil. Há menos recursos para compor interesses prejudicados. A sociedade, em geral, só dá um relativo valor aos ambientes naturais quando sobrevém a catástrofe, como, por exemplo, quando falta água ou nas enchentes.

Ainda com relação ao depoimento de Mercadante (2012):

No caso de obras como as acima mencionadas, elas são defendidas pelos governos, pelos empresários, pelos trabalhadores em busca de emprego e renda, pela população local; e criticadas (no bom sentido da palavra) pelo setor ambiental. No caso das unidades de conservação, elas são condenadas pela população e pelos empresários locais, pelos governos municipais, quando se trata de uma unidade estadual, pelos governos municipais e estaduais, quando se trata de uma unidade federal, e são defendidas apenas pelos ambientalistas e, na melhor hipótese, por uma parcela da “opinião pública”, melhor informada e mais sensível aos problemas ambientais. Há uma grande assimetria na correlação de forças contra e a favor da criação de uma unidade de conservação, embora a situação venha melhorando nas últimas décadas.

Mesmo quando se trata das populações residentes em unidades de conservação, a questão não é tranquila, sobretudo quando se tratam de residentes em áreas de proteção integral. Elas são colocadas diante de novas regras tecno- jurídicas ou político-administrativas que as deixam em situação de irregularidade em relação à ocupação do território. Em função da carência de recursos econômicos,

passam a viver em condições ainda mais precárias por conta das proibições de suas atividades rotineiras de uso dos recursos. Muitas vezes, inclusive, ficam sem permissão de realizar qualquer atividade extrativa, mesmo que seja de madeira para a reforma das residências (CATTANEO, 2004, apud MARTINS, 2011). Há também a possibilidade de elas serem realocadas para fora das áreas transformadas em Unidades de Proteção Integral e/ou de serem indenizadas; entretanto, são opções que não são bem aceitas por essas populações, uma vez que implica em transformar seu modo de vida, mexendo inclusive com uma questão de maior complexidade que é a relativa à sua identidade. Portanto, se por um lado não se sentem contempladas por essas opções, por outro nem sempre o governo disponibiliza recursos para realizar tais indenizações.

Nessa mesma linha Calvimontes (2013), afirma que o dilema relacionado às unidades de conservação continua sendo, tanto no Brasil quanto no resto do mundo, a antiga questão sobre se essas áreas devem ser grandes extensões de ecossistemas livres da presença humana ou se elas devem incorporar o homem de forma que este possa aproveitar os benefícios do uso sustentável dos recursos naturais. De acordo com o autor, apesar de ser muito difícil achar um espaço onde não existam pessoas residindo, áreas protegidas que visam só o uso indireto dos recursos foram e ainda têm sido criadas no Brasil. Desde então, “milhares de trabalhadores do campo passaram a ser considerados clandestinos, ilegais, irregulares”, tendo sido ou removidos de suas terras ou passando a viver sob ameaça de sê-lo. Em suas palavras, “Pescadores, agricultores e extrativistas das diversas regiões do país tiveram sua condição de trabalhador rural deslegitimada e foram ameaçados seus modos de vida”, e estabeleceu-se uma relação baseada em negações e proibições vindas de todos os níveis do poder político.

Desde então, uma luta pelo direito à terra e ao trabalho começou e, mais recentemente, ideias sobre conservação aliada ao desenvolvimento sustentável e à melhoria da qualidade de vida da população local foram postas em prática em diversas regiões do país. A partir desta perspectiva, os moradores das áreas que se tornaram unidades de conservação precisaram adequar suas atividades econômicas às regras estabelecidas pelos órgãos de gestão. Estabeleceu-se, assim, uma relação baseada em como realizar o aproveitamento dos recursos naturais e da

terra, como manejá-los; dando início a um diálogo mesmo que muitas vezes truncado.

Conforme assinalam Ferreira et al. (2002), ao examinarem aspectos de contextos contemporâneos da política ambiental brasileira, os programas de conservação ambiental foram sendo concebidos e implantados em discordância com as posições e necessidades dos moradores de áreas sob proteção legal, ou impactadas por grandes empreendimentos. Nas suas palavras:

Nesse contexto, e à medida que as UCs brasileiras foram sendo implantadas, a ação cotidiana das instituições públicas colocou seus agentes em uma situação social de confronto com os moradores dessas áreas sob proteção legal. Propostas de conservação formuladas em gabinetes fechados, debatidas e referendadas muitas vezes em fóruns internacionais, no momento de serem implementadas, foram altamente politizadas, mobilizando diversos atores em torno de diversas arenas; outros tiveram que rever posições e conceitos e, principalmente os moradores, em sua maioria sem uma prévia experiência importante de participação política, foram repentina e inusitadamente lançados a uma situação de ator (FERREIRA et al., 2002, p.3).

De acordo com Mendes (2009), existem normas positivadas pelo Estado que por vezes são impostas e manipuladas, negociadas e “subvertidas no âmbito local”. A autora trabalha com os casos do Parque Nacional do Jaú e da Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá, ambos situados no Amazonas; e, segundo afirma, há uma sobreposição entre meio ambiente e diversidade cultural, considerados dois bens tutelados constitucionalmente. Mendes (2009), discorre sobre a importância e os limites do conhecimento científico, do direito e do próprio Estado como entes legítimos para definir e gerir as políticas públicas brasileiras destinadas à proteção ambiental e à proteção da diversidade cultural. Para ela, é fundamental a participação dos grupos sociais locais na definição das regras e acordos socioambientais das áreas protegidas para que haja efetivação da democracia. Mendes (2009) e Creado (2006), ao examinarem a questão da proteção de grupos étnicos e culturais que compõem a sociedade brasileira, problematizam os limites da intervenção estatal no regramento da vida social e cultural das populações residentes em UCs e na garantia de proteção da diversidade biológica do país. Mendes (2009) afirma que

a importância dos sujeitos individuais e coletivos vai muito além da mera obediência a regras impostas pelo Estado. Estes sujeitos devem entender- se como parte fundamental para a consolidação da democracia. Ou seja,

devem assumir a responsabilidade de construir, junto com o Estado, a democracia. (MENDES, 2009, p.57).

Em concordância com o acima exposto, Martins (2012) considera que a mera participação política das populações residentes em UCs, tal como a participação em conselhos gestores, não implica, necessariamente, compartilhamento de poder e diminuição do índice de conflitualidade.

Para Mendes (2009), quando os moradores de UCs são subjugados a uma lógica que lhes é externa e que, portanto, não dominam, são submetidos a uma forma de violência. Na sua visão, a implantação de uma UC, por vezes, “é ela mesma uma intervenção violenta em processos e regulamentações que já tinham dinâmicas próprias” (p.59). Por outro lado, defende que em algumas situações, “mesmo que implicando a imposição de um regulamento estrangeiro e à força”, as implantações de UCs contribuíram para a diminuição de “incertezas, inseguranças e falta de garantias que os moradores tinham com relação à possibilidade de manutenção de seu modo de vida” (MENDES, 2009, p.59/60).

Acredita-se, e Mendes (2009) defende este ponto de vista, que o mais frequente é encontrar casos de UCs em que as duas situações operaram simultaneamente. Por um lado, algumas regras que passaram a vigorar após a implantação das UCs significaram uma restrição à liberdade dos moradores (como as que ditam como e o que pode ser feito em relação ao uso dos recursos, provenientes exclusivamente do conhecimento científico, em detrimento do conhecimento tradicional que acumularam ao longo do tempo). Por outro lado, em vários casos é patente que os moradores foram beneficiados com maior segurança em relação ao direito de permanência em seu território e em relação à restrição ou proibição de que pessoas de fora das UCs usem ou ameacem o acesso dos moradores aos recursos naturais. Isso é certo quando as UCs são de uso sustentável, tais como as Reservas Extrativistas (RESEX) e as Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS), que são incentivadas pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.

Entretanto, conforme exposto anteriormente em relação às UCs de proteção integral, a lei que estabelece o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) determina que não é permitida a presença humana em seu

interior. Assim, é comum que o histórico da relação entre os moradores e gestores dessas UCs caracterize-se pelos conflitos, sobretudo os relacionados aos direitos de permanência e de uso dos recursos naturais. Este é o caso do Parque Estadual da Serra do Mar, localizado no litoral norte do Estado de São Paulo, examinado dentre outros trabalhos, pelos de Calvimontes e Ferreira (2012), Calvimontes (2013), Simões (2010), Simões et al. (2011).

De acordo com Calvimontes e Ferreira (2012), alguns anos após sua criação em 1977, os moradores do Parque Estadual da Serra do Mar, trabalhadores do campo e pescadores, se viram deslegitimados de seus direitos ao trabalho e à continuação de suas atividades produtivas e culturais. Os conflitos iniciais foram ganhando novos contornos ao longo dos anos, na medida em que avança a organização social dos moradores com o surgimento de lideranças locais e de associações comunitárias. Essas organizações surgem e se desenvolvem com a finalidade de resistência e luta por direitos que os moradores consideravam violados. Desta forma, ao longo dos últimos anos, novos espaços de discussão e negociação se estabeleceram, e deles passaram a participar além de moradores e gestores, outros atores, como ONGs e cientistas.

Para Calvimontes e Ferreira (2012), essa ampliação dos participantes na gestão do Parque, por vezes, tornou mais factível a administração da área; mas, em outros momentos, tornou as negociações mais complexas por conta da incorporação de mais variáveis nas discussões. Para eles, a ação política dos atores nas negociações nem sempre é bem definida, por vezes ela envolve interesses até mesmo contraditórios. Aludem aos próprios moradores que assumiram postos de lideranças e diferentes posições ao longo do tempo. As disposições desses moradores enquanto atores no campo de negociação, passaram a variar conforme os interesses representados naquele momento (se os de morador, pescador ou os de liderança responsável pelo cumprimento das regras no uso dos recursos, por exemplo). Também em função disso, os autores defendem que o conflito permanece em constante mudança e ressignificação, se constituindo no principal propulsor de transformação social do Parque Estadual da Serra do Mar.

gestão desse Parque sempre significaram acomodações temporárias aos conflitos do momento. A autora exemplifica sua afirmação a partir das demandas dos moradores, que segundo ela, entre 2001 e 2009 (período investigado) evoluíram de um patamar mais imediatista das necessidades básicas para outros patamares que caminharam no sentido da exigência da autonomia. A autora sintetizou as demandas dos residentes ao longo do tempo nos seguintes agrupamentos:

a) acesso à infra-estrutura básica, direito à habitação e trabalho (uso dos recursos naturais); b) direito de permanência no território; c) acesso à propriedade efetiva da terra (título dos quilombos); d) e autonomia de gestão do uso dos recursos naturais e de seus territórios, sem a tutela do Estado. (SIMÕES, 2010, p. 328)

Portanto, as acomodações seriam provisórias, com pactos de durabilidade temporária, o que implica em aceitar que os conflitos, em especial os relativos ao uso de territórios e dos recursos naturais, não são elimináveis, mas geradores de novas necessidades e possibilidades de negociação.

3 Amazônia e região de estudo

Neste capítulo são abordados os elementos formadores da problemática a ser discutida: os conflitos sociais na Terra do Meio. Esses conflitos originam-se na história da ocupação da Região Amazônica, englobando as visões e ações que predominaram sobre seu desenvolvimento econômico e social desde o começo do século XX até o momento contemporâneo. Procura-se demosntrar que os conflitos ora existentes são produtos históricos de uma intrincada rede de ações do Estado que, em nome da sua concepção de desenvolvimento econômico para a região, produziu, direta ou indiretamente, severo desflorestamento, desrespeitando as culturas indígenas e ribeirinhas locais.

O avanço do desmatamento na Amazônia está diretamente relacionado às consequências das políticas de Estado para o desenvolvimento da região. Dentre essas consequências podemos elencar a especulação das terras ao longo das estradas, o crescimento desordenado das cidades, o aumento da pecuária bovina, a exploração madereira, a agricultura familiar e agricultura mecanizada. Essas consequências vão desembocar nas atuais questões consideradas críticas ligadas à conservação, ao uso dos recursos e às funções ambientais e climáticas da Amazônia.

O processo de desmatamento inicia-se, via de regra, com a abertura oficial ou clandestina de estradas que permitem a expansão humana e a ocupação irregular de terras, a exploração predatória de madeiras nobres. A floresta explorada transforma-se em agricultura familiar e pastagens para a criação extensiva de gado, especialmente em grandes propriedades, sendo este fator responsável por cerca de 80% do desmatamento das florestas na Amazônia legal, que apresentou aumento significativo desde a segunda metade dos anos de 1990, persistindo pelos anos 2000 (FERREIRA et al., 2005). Constata-se uma relação direta entre a economia, o avanço da fronteira na Amazônia legal e a taxa de desmatamento crescente, que seguiu até o início dos anos 2000. Desde então, essa relação começou a modificar- se, pois a taxa de desmatamento continuou crescente, ao passo que o crescimento econômico não.

Os dados que levaram a essa situação sugerem que pelo menos nos primeiros anos da década de 2000, a dinâmica que estava influenciando o desmatamento nessa região estava ligada ao mercado de exportação, muitas vezes irregular, e é impulsionada pela alta rentabilidade de atividades econômicas, tais como a extração madeireira, a pecuária e a agroindústria.15

A grande demanda por recursos naturais, sobretudo nos países mais desenvolvidos, tem trazido à tona controvérsias acerca dos rumos do desenvolvimento da Amazônia brasileira. Segundo Harvey (2005), à medida em que cresce a tendência global de mercantilização dos recursos naturais, aumenta igualmente a valorização da Amazônia no cenário nacional e mundial, uma vez que ela se destaca por acomodar em seu território reservas substanciais de vários e valiosos recursos naturais16. Tais características despertam a cobiça em larga escala e de diversas frentes do grande capital.17 Além do interesse associado à extração extensiva e intensiva dos seus recursos, em particular os energéticos, minerais e madeireiros, há grandes interesses voltados para a expansão da agropecuária e da cultura de grãos. Bertha Becker (201318, p.4), em 2003, afirmou que:

Estamos diante de um processo de mercantilização e eventos da natureza estão sendo transformados em mercadorias... porque não foram produzidos para a venda no mercado, mas estão sendo transformados e estão gerando mercados, por exemplo o problema da troca do mercado de Carbono, ou seja, há uma tendência à mercantilização e à criação de mercados reais para essas mercadorias que alertam para a necessidade de pensar em como regular esses mercados.

Becker (2013) argumenta que o atual processo de mercantilização da natureza conduz a um conflito de difícil conciliação entre as demandas nacionais, de um lado, e as demandas regionais, por outro. De forma simplificada, podemos dizer

15

Ver mais a respeito em: Fearnside ( 2003) e Alencar et al.( 2004).

16

Alguns desses recursos são o minério de ferro (de alto teor), níquel, ouro e outros vários minérios, recursos hídricos (considerada a maior reserva de água doce do mundo), outros recursos energéticos (tais como biomassa e gás natural), além dos produtos florestais tropicais madeireiros e não