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3.5 Inteligência Social e Empatia

3.5.4 Empatia

O termo empatia costuma ser empregado com o signi- icado de capacidade de se colocar no lugar do outro, ou seja, habilidade para imaginar o que o outro está pensando e sen- tindo. Nos momentos de empatia, o indivíduo imagina o que pensaria, o que sentiria e como reagiria se estivesse na situação em que o outro se encontra. No caso dos seres humanos, o “se colocar na situação do outro” pode ser algo tão complexo quanto imaginar como seria ter a idade, o sexo, a educação, a proissão, as amizades etc. do outro indivíduo.

Teoricamente, é possível imaginar uma espécie de empatia objetivamente informada, em que o sujeito não precisa se imaginar no lugar do outro para criar hipóteses sobre quais são seus pensamentos e sentimentos. Ele parti- ria de premissas sobre como os indivíduos do tipo observa- do pensam e o que sentem em determinadas circunstâncias para imaginar o que um indivíduo específico está pensan- do e sentido. Um psicopata incapaz de sentir remorsos, por exemplo, poderia usar seu conhecimento teórico de que pes- soas sentem remorsos quando se tornam conscientes de ter cometido uma injustiça para manipular o comportamento de algum indivíduo. Ao que tudo indica, entretanto, os in- divíduos reais devem sua capacidade de empatia, princi-

palmente, à sua capacidade de imaginar a si próprios como objetos. Ou seja, a autoconsciência é um pré-requisito para a empatia. A propósito, são justamente os animais que pas- sam no teste do espelho os que demonstram capacidade de empatia, como no exemplo seguinte:

[…] chimpanzés são famosos por serem bons negocia- dores. Estudos experimentais indicam que a habilidade é adquirida sem nenhum treinamento especíico. Todo zelador de zoológico que já esqueceu sua vas soura numa jaula de babuínos sabe que não há outra forma de consegui-la de volta sem entrar na jaula. Com chim- panzés é mais simples. Mostre-lhe uma maçã e aponte para a vassoura; eles entendem a proposta e passam o objeto pelas barras (WAAL, 1989, p. 82).

É preciso ser capaz de “ler a mente” do outro para que uma troca seja realizada, e, como pode ser visto no exemplo acima, esse pré-requisito para existência de uma sociedade capitalista (e de qualquer sociedade complexa) já está embrionariamente presente nos antropoides. De acordo com os pesquisadores que trabalham diretamente com esses animais, eles são tão perspica- zes quanto os humanos para perceber mudanças sutis no estado de humor das pessoas com quem convivem:

Ninguém que trabalhe com antropoides adultos pode deixar de se sentir estranhamente transparente. Os an- tropoides respondem a todo tipo de humor antes de percebermos que estamos nervosos, deprimidos ou irritados naquele dia. E eles leem nossas mentes quan- do tentamos esconder algo desagradável, como a visita iminente do veterinário (WAAL, 1989, p. 220).

Os antropoides não são capazes de falar — talvez por limitações neurológicas (FITCH, 2005, p.  200) — e, em seu ambiente natural, não usam uma linguagem simbóli- ca complexa. Mas eles possuem um amplo repertório de gestos e expressões faciais que os ajuda a comunicar seus desejos e estado de espírito:

Todos os (mais de cem) padrões de comportamento regularmente observados em chimpanzés na nossa co- lônia também foram observados no seu hábitat natural. A face de brincadeira, o sorriso e o gesto de pedinte não são imitações do comportamento humano, mas formas naturais de comunicação não verbal que humanos e chimpanzés têm em comum (WAAL, 1982, p. 36).

Frans Waal argumenta — e exempliica ao longo de todo o seu livro — que os chimpanzés, com suas complexas estra- tégias de formação de alianças para subir na hierarquia da co- munidade, demonstram uma inventividade social comparável à dos humanos (WAAL, 1982, p. 51). É claro que o autor se refere apenas às táticas de formação de alianças que se limi- tam a tentativas de conquistar aliados e vencer inimigos entre os poucos indivíduos que compõem o próprio grupo, embora muitas vezes tratando-se de estratégias empregadas por vários anos até darem os resultados esperados. Ainda está reservada apenas aos humanos a capacidade de pensamentos mais abs- tratos, que levam à formação de alianças entre tribos e à pre- ocupação com as gerações futuras. Tais habilidades exigem o uso de um pensamento conceitual de nível mais elevado do que qualquer primata não humano seja capaz de possuir.

Bonobos e chimpanzés apresentam desempenhos di- ferentes quando suas habilidades cognitivas são comparadas, como ica claro pelas citações seguintes:

[…] em tarefas como montagem de quebra-cabeças, uso de ferramentas, labirintos e assim por diante, Panzee [uma chimpanzé] tem sempre estado à fren- te de Panbanisha [uma bonobo]. Em qualquer coisa fora do domínio da comunicação social, envolvendo manipulação de objetos ou orientação espacial, os chim pan zés estão seguramente à frente. Quando se trata de habilidades comunicativas e perceptivas, tais como combinar imagens de televisão com a narra- tiva, a bono bo é sempre mais avançada (SAVAGE- -RUMBAUGH apud WAAL, 1997, p. 40).

Se forem comparadas a habilidade de usar ferramentas ou o uso de parceiros para objetivos estratégicos, os bo- nobos não são particularmente espertos. Mas quando se olha para relações sociais íntimas, sua cognição é altamente desenvolvida devido à sua longa dependên- cia quando crianças. Nos domínios de relações, afeição e evitação de conlitos, eles são muito inteligentes. Por exemplo, chimpanzés são incapazes de desenvolver re- lações pacíicas com outros grupos. Sua organização so- cial é focada em como tirar vantagem e como lutar com outros grupos (KURODA apud WAAL, 1997, p. 61).

Em relação a agressividade e comportamento político, os chimpanzés estão mais próximos de nós do que os bono- bos. Quanto ao comportamento afetivo, ocorre o inverso, os bonobos são mais semelhantes a nós do que os chimpanzés. E quanto ao relacionamento entre os sexos, os bonobos são mais igualitários do que os humanos, tendo mesmo revertido a hierarquia entre machos e fêmeas. Num grupo de bonobos, são as fêmeas que lideram. Bonobos fêmeas possuem ligações mais fortes entre si do que os machos, e também mais fortes do que os relacionamentos entre machos e fêmeas. Os ma-

chos, mesmo os adultos, são dominados pelas fêmeas, e o ma- cho alfa depende do apoio das fêmeas, principalmente de sua mãe, para manter a posição (WAAL, 1997).

Para desenvolver sua capacidade de empatia, humanos e antropoides fazem uso da mesma técnica: quando crianças, brincam muito de faz de conta. Tanto crianças humanas quan- to os ilhos pequenos de chimpanzés e, principalmente, bono- bos gostam muito de ingir que desempenham determinado papel, o que pode ser considerado um exercício em teoria da mente, ou seja, um exercício que ajuda no desenvolvimento da capacidade de empatia. Como argumentam Whiten e Byrne (1988, p. 59), é de se esperar que espécies socialmente inteli- gentes sejam adeptas das brincadeiras sociais. Um exemplo da criatividade e interesse dos chimpanzés por essas brincadei- ras ocorreu no zoológico de Arnhem quando um dos machos adultos icou ferido após uma briga:

Todos os ferimentos foram supericiais, mas Luit não andou sobre sua mão pelos próximos dias. (Ao invés disso, ele icou apoiando seu peso sobre o pulso. Sur- preendentemente, todos os jovens antropoides o imi- taram e repentinamente começaram a cambalear sobre os pulsos.) (WAAL, 1982, p. 135).