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3.2 MODALIDADES DE CONTRATOS BANCÁRIOS

3.2.3 Empréstimo bancário

Este contrato é, talvez, o mais importante negócio bancário existente, tendo em vista ser a forma mais comum para se colocar a disposição da população os recursos financeiros.

O contrato de empréstimo bancário assemelha-se àquele contrato de mútuo previsto no Código Civil, porém com significativas alterações. O art. 58619 caracteriza o mútuo civil como um empréstimo de coisas fungíveis. Com efeito, o dinheiro disponibilizado pela instituição financeira é um objeto fungível, eis que substituível.

Tratando-se de mútuo, no qual possui como objeto o dinheiro, denomina-se, tal negócio, mútuo feneratício ou frugívero.

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“Art. 586. O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade.” (BRASIL, 2002)

Contudo, o mútuo bancário e o civil não se confundem, mormente pela incidência dos juros, os quais são diferentemente aplicados a cada negócio, conforme art. 59120 do Código Civil, dispositivo este não aplicável às instituições financeiras. Nesse sentido, explica Coelho (2007, p. 132):

A diferença entre o mutuo civil e o bancário não é, assim, pertinente à natureza do contrato ou aos direitos e deveres que as partes titularizam. Diz respeito exclusivamente ao regime dos juros: limitados à taxa SELIC no mútuo civil e não limitados no bancário. Quanto aos demais aspectos, as duas espécies de mútuo submetem-se às mesmas regras.

Em que pese a concisa e interessante argumentação acima, convém lembrar que há sim limitação dos juros nas operações bancárias, tema este abordado em capitulo oportuno.

Feitas tais considerações, cingir-se-á o presente trabalho ao contrato de empréstimo bancário (mútuo bancário), o qual pode ser conceituado da seguinte forma:

[...] empréstimo de cosa fungível (dinheiro) feito pelo credor (instituição financeira) ao devedor (cliente), o qual se obriga a restituí-la, no prazo previamente avençado, no mesmo gênero, quantidade e qualidade, com o acréscimo dos encargos financeiros (correção monetária e juros ou comissões) estabelecidos no contrato escrito, celebrado por instrumento particular ou público. (LIMA; NISHIYAMA, 2007, p. 193).

Nota-se que a presente operação revela característica de contrato real, uma vez que a perfectibilização do negócio está condicionada à entregada do objeto do empréstimo (dinheiro).

Sem tal entrega não há que se falar na existência de contrato de mútuo. Assim, o mero acordo de vontades entre as partes sobre o empréstimo não é suficiente para a formação de um contrato de mútuo. Tal acordo é apenas promessa de mútuo, que recebe o nome de abertura de crédito na atividade bancária e tem o tratamento de contrato preliminar [...] (SALOMÃO NETO, 2005, p. 180).

Para a entrega desta quantia (concretização do contrato de empréstimo bancário), é prescindível qualquer garantia, uma vez que a instituição financeira pode confiar na solvabilidade do mutuário. Entretanto, é corriqueiro que os empréstimos sejam precedidos de uma garantia fidejussória, mediante emissão de títulos de créditos (geralmente nota promissória). Salienta-se que tal título deverá ser emitido pelo próprio mutuário, caso contrário se estará diante de um contrato de desconto (estudado a seguir).

Ademais, este negócio caracteriza-se, também, pela unilateralidade e onerosidade. Aquele traduz-se pela unicidade de obrigatoriedade, eis que apenas uma das partes possui obrigação (mutuário), enquanto o mutuante apenas conserva-se na posição de ser restituído do bem, com os acréscimos remuneratórios cabíveis. No segundo "decorre das

20 “Art. 591. Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual.” (BRASIL, 2002)

vantagens e sacrifícios que são distribuídos a ambas as partes. O mutuante priva-se do uso e gozo da coisa em troca de rendimento. O mutuário usa-a e dela usufrui o gozo, tendo, porém, que pagar por isso" (LUZ, 1996, p. 95).

Outra questão importante acerca do contrato de empréstimo bancário refere-se ao prazo para restituição do bem emprestado. Geralmente há a pactuação, pelas partes, sobre o término do contrato, até para servir como parâmetro de incidência dos encargos financeiros. Contudo, curial destacar a possibilidade de não haver estipulação de prazo nos contratos bancários desta espécie, restando à legislação civil, no seu art. 592, II21, a função de preencher a laguna deixada.

Neste sentido, colhe-se da doutrina de Abrão (2008, p. 102):

Dessarte, [...], forçoso aplicar-se o comando do citado art. 592, II, do Código Civil, estabelecendo o prazo mínimo de 30 dias se o mútuo for em dinheiro, não se concebendo prazo inferior. Portanto, decorrido esse lapso de tempo, o credor 'pode exigir o pagamento imediatamente' (CC, art. 394), mas, para constitui o devedor em mora, deverá interpelá-lo (CC, art. 397, parágrafo único).

Mutuado o dinheiro pela instituição financeira, é permitida ao mutuário a liquidação antecipada da dívida contratual em determinados casos. Isso porque, a regra é a impossibilidade do mutuário exigir que a instituição financeira, ora mutuante, receba os valores antes do prazo pactuado, eis que a remuneração auferida por esta depende do tempo em que aquele retenha o dinheiro emprestado, incidindo os encargos financeiros contratados. Com a restituição antecipada, reduz-se os encargos na proporção do prazo não utilizado pelo mutuário22.

Todavia, tal idéia deve ser relativizada com a aplicação da legislação consumeirista, especificamente em seu art. 52, §2º23. Sobre o assunto:

Os bancos e instituições financeiras em geral, bem como fornecedores com financiamento próprio (lojas com departamento de crediário), terão de proporcionar ao consumidor a liquidação antecipada do financiamento, se ele assim pretender, fazendo a competente redução proporcional dos juros e outros acréscimos.

Cláusula contratual que preveja renúncia do consumidor à restituição ou diminuição proporcional dos juros e encargos previstos neste dispositivo é abusiva, sendo considerada nula não obrigando o consumidor (art. 51, nº I, II, IV e XV, CDC). (NERY JUNIOR, 2001 apud LIMA; NISHIYAMA, 2007, p. 196).

Nesse sentido, não diverge o Areópago Catarinense:

21 "Art. 592. Não se tendo convencionado expressamente, o prazo do mútuo será: [...] II - de trinta dias, pelo menos, se for de dinheiro" (BRASIL, 2002)

22 Coelho (2007, p. 133) afirma que a "expectativa dos bancos ao contratar o mútuo centra-se no emprego remunerado do dinheiro objeto do empréstimo. O pagamento antecipado, com a redução de juros e encargos, embora reinvista o banco na disponibilidade dos recursos, frusta, ainda que parcialmente, essa legítima expectativa do mutuante."

23 "Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre: [...] § 2º É assegurado ao consumidor a liquidação antecipada do débito, total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e demais acréscimos." (BRASIL, 1990)

CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. Revisional parcialmente procedente. Insurgência do banco. Impossibilidade jurídica de revisar contratos findos. Preliminar rejeitada. Capitalização implícita de juros vedada por afrontar o princípio da transparência. Comissão de permanência. Ajuste indemonstrado. Liquidação antecipada da dívida com redução dos juros. Possibilidade. Repetição do indébito para vedar o enriquecimento ilícito. Sucumbência recíproca. Recurso desprovido. (SANTA CATARINA, 2011)

O dispositivo supracitado retira da prática bancária um instrumento de opressão contratual, mormente pelo fato do consumidor, possuindo o dinheiro para restituição, poder reduzir os altos encargos cobrados pelas instituições financeiras, objeto do terceiro capítulo do presente trabalho.

Por fim, salienta-se que a Lei da Reforma Bancária veda algumas contratações no artigo 3424. Esta vedação elenca algumas partes que não podem figurar como mutuário nesta operação bancária, cujo objetivo é coibir práticas fraudulentas.

Considerando-se todo o exposto, observa-se que este corriqueiro contrato, em razão de sua finalidade econômica, é de muita importância na realidade social, uma vez que a concessão de crédito fomenta a circulação de riqueza na sociedade.