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Enquadramento histórico

No documento Dissertação Final_Ana Sofia Vieira Coelho (páginas 97-101)

Parte I | Revisão da Literatura

5. Enoturismo em Portugal

5.3. A Região demarcada do Douro

5.3.2. Enquadramento histórico

Ao longo de anos e anos da nossa história, que a região do douro, esteve orientada para o fabrico do vinho do porto, constituindo assim o “principal critério definidor da região do Alto Douro” (Pereira, 1991, p. 12). No entanto, foi só a partir do século XVIII, que o vinho do porto começa a ter maior procura e notoriedade, particularmente no mercado inglês. O aumento da procura dos vinhos do vale do Douro por parte dos ingleses, deveu-se ao facto das pesadas taxas de exportação aplicadas sobre os vinhos de Bordéus pelo ministro Colbert no reinado de Luís XIV. Face a esta medida do rei francês, Carlos II (rei governante inglês), decide boicotar a importação dos vinhos de Bordéus. “Este episódio viria a marcar decisivamente o renome internacional do vinho do porto” (Carrera, 1999, p. 98). Esta medida do rei D. Carlos II fez com que os comerciantes de Plymouth, Bristol e Londres descobrissem “as virtudes dos vinhos do vale do Douro, dando ouvidos às notícias que lhes chegavam através da colónia inglesa de comerciantes que florescia no porto” (Carrera, 1999, p. 98). Mais tarde, viria a celebrar-se um tratado anglo-português, conhecido pelo nome de Tratado de Methuen. Este acordo, assinado em 1703 por Portugal e a Inglaterra, impulsionou mais o comércio deste vinho que chegava ao Porto através do rio douro, nos pequenos barcos de madeira – o Rabelo. Esta convenção definia privilégios aduaneiros para os tecidos ingleses para Portugal e em contrapartida, a Inglaterra importava os vinhos portugueses com baixas tarifas alfandegárias (Carrera, 1999). Como já foi referido, este tratado “provocou um novo surto de expansão da produção, do comércio e do prestígio do “Porto” que, percorrendo o império inglês, se tomou num dos mais respeitados vinhos do mundo” (Carrera, 1999, p. 99). Carrera (1999) afirma ainda que este acordo veio também melhorar a qualidade da produção da região do Douro. Porém, a intensa procura deste produto, que não era correspondida pela capacidade de produção, originou numa adulteração da qualidade dos vinhos, destruindo a reputação dos vinhos da região do Douro. Como resultado, a quantidade dos vinhos produzidos rapidamente ultrapassou a procura e a falta de qualidade começou a ser evidente, e em pouco mais de um século, os vinhos do Douro, caiem da mais alta cotação para um grande descrédito.

Com o objetivo de defender a qualidade e autenticidade dos vinhos da região, foi instituída por alvará régio, a CGAVAD - Companhia Geral da Agricultura das vinhas do Alto Douro, “também denominada Real Companhia dos Vinhos do Porto e conhecida em Inglaterra pelo nome de Royal oporto wine companym” (Monteiro, 1998, p. 117), a 10 de setembro de 1756, em Belém, durante o reinado de D. José I, pelo seu primeiro-ministro Sebastião José de Carvalho e Melo (a quem foi concedido o título de Marquês de Pombal no ano de 1769). De acordo com Sousa (2001), a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro teve como “primeiras funções, a demarcação do Alto Douro e a regulamentação do "vinho de embarque", "vinho do Douro" ou "Vinho do Porto" (p. 19). Ainda para Sousa (2001):

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a primeira demarcação de 1756 revela já uma grande modernidade, incluindo não só a definição dos limites de uma região vitícola, mas também a elaboração de um cadastro e de uma classificação das parcelas dos respetivos vinhos, tendo em conta a complexidade do espaço regional e, por outro lado, a criação de mecanismos institucionais de controlo e certificação do produto, apoiados num vasto edifício legislativo (p. 22).

Para Sequeira (2000, p. 19), a CGAVAD estava “alicerçada nos princípios mercantilistas do protecionismo, o principal objetivo da companhia era equilibrar os preços, restaurar a qualidade, regularizar a produção e o comércio do vinho do Porto e estabilizar a exportação.” De acordo com Sousa (2001) a criação da companhia teve como principais objetivos garantir a qualidade do produto, fixar preços, estabelecer a demarcação da região vinícola de forma a assegurar os rendimentos do Estado, regulamentando a produção e o comércio dos vinhos do Douro. Para o efeito, foi realizada uma demarcação do território, registando cada uma das parcelas de vinha, calculando a produção de cada uma das parcelas, classificando a qualidade dos vinhos e fixando preços (Sousa, 2001).

Após esta primeira demarcação, Sousa (2001) salienta que as delimitações feitas na região foram alteradas ao longo do tempo, sendo que, entre 1788 e 1791, houve um alargamento da área demarcada, durante o reinado de D. Maria I, chamadas de marianas ou subsidiárias.

Foi assim reconhecida a “primeira região vitícola do mundo, demarcada na época pombalina (Pereira, 1991, p. 7).

Em 1907, ao iniciar o seu governo, João Franco assinou um decreto que introduzia nova legislação. Segundo Simões (2006):

reintroduziu as medidas já conhecidas desde a legislação pombalina, ou seja, a restrição da barra do Douro para os vinhos do Douro e a delimitação administrativa da região com o privilégio de produzir vinho do Porto. O restabelecimento da demarcação implicou, necessariamente, um conjunto de restrições ao mercado livre, com regras de produção e de funcionamento do mercado, bem como a ação de uma entidade responsável pela sua aplicação e controlo (p. 47).

As sucessivas delimitações da Região Demarcada do Douro (1757-1761, 1788-1793, 1907-1908), representadas no quadro abaixo, refletem, as transformações ocorridas na evolução das técnicas da produção, dos transportes e da comercialização, mas preservam uma “forte continuidade face aos princípios orientadores que exerceram, tanto na mentalidade popular como das elites aliados a uma forte carga simbólica que constitui um elemento-chave da identidade regional” (Sousa, 2001, p. 22).

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Períodos das

Demarcações Demarcações

1757 – 1761 Demarcações pombalinas, as primeiras do mundo

1788 – 1793 Demarcações marianas e alargamento da área demarcada 1907 Alargamento da região do Vinho do Porto até à fronteira com a

Espanha

1908 Redução da área produtora do Vinho do Porto

1921 A área demarcada passa a ser praticamente a atual região demarcada

Tabela 8. Evolução das demarcações na região do Douro

A reforma pombalina, veio a demonstrar-se extremamente eficaz. Segundo Brito (1997): Embora a região demarcada tenha sofrido modificações ao longo dos últimos duzentos anos, ninguém põe em causa a sua existência. Pelo contrário, o sistema foi inclusivamente aplicado nalgumas das mais famosas regiões vitivinícolas, como a de Bordéus ou a de Champanhe. Segundo, não só houve uma melhoria na qualidade do vinho, como a sua comercialização cresceu de modo significativo (pp. 29-30).

De acordo com Salvador (2010), a última demarcação da região do douro foi realizada em 1921, fixando os seus limites atuais, presente no decreto-lei 254/98 de 11 Agosto. Segundo Barreto, “esse diploma foi alterado diversas vezes, no seguimento de mudanças administrativas pontuais, nomeadamente a criação de novas freguesias dentro do perímetro demarcado” (Barreto, 1993, p. 166).

Como refere Esteves (2008) “a região demarcada do douro insere-se numa vasta área das províncias de Trás-os-Montes, Beira Alta e Douro Litoral” (p. 23).

Numa região como o douro, cuja sustentabilidade económica se encontra muito dependente da cultura da vinha e que, nos últimos tempos, começou a distinguir-se, como um destino turístico, essa herança coletiva, tanto de património material e de paisagem, como de património imaterial, constituído por saberes e saberes-fazer, pode e deve assumir-se, simultaneamente, como valor de memória e como valor de recurso (Pereira, 2009, p. 78).

A 14 de Dezembro de 2001, “em reconhecimento do caráter excecional da sua paisagem vitícola de valor universal, a UNESCO, inscreveu uma parte significativa da região, na lista de património mundial como paisagem cultural evolutiva e viva” (Syngenta, 2006, p. 57).

De acordo com Pereira (2009), o Douro:

possui uma herança milenar, duramente construída em torno da vinha e do vinho. É essa espessura histórica que confere identidade á região, que marca tanto a paisagem como a vida quotidiana e o sistema de relações. Cada muro de xisto, cada casta de videira, cada operação de cultivo da vinha – a que poderia acrescentar-se cada fase da vinificação e, até, cada marca de vinho – encerram uma história, mais ou menos longa, traduzindo o saber e a arte das gerações que nos procederam (p. 78).

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No documento Dissertação Final_Ana Sofia Vieira Coelho (páginas 97-101)