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Enquadramento Jurídico ao Nível Comunitário

TRÁFICO DE SERES HUMANOS Enquadramento Jurídico

3.2 Enquadramento Jurídico ao Nível Comunitário

A U.E. tem feito, sobretudo na última década, da luta contra o TSH um dos principais compromissos da sua política no domínio do chamado terceiro pilar (Justiça, Liberdade e Segurança). Este compromisso tem estado sempre presente nas relações da U.E. com países terceiros nomeadamente com a Europa de Leste, países africanos e asiáticos. Além da política de relações externas a U.E. tem-se vindo a sensibilizar para o facto de que o combate ao

TSH vai além do fomento das políticas no âmbito do III Pilar, o investimento tem

de ser feito também em áreas tão distintas como o emprego e assuntos sociais ou o seu próprio alargamento. A U.E. tem sempre presente que o TSH viola o princípio fundamental da dignidade humana, que se encontra na própria da sua política e dos Estados Membros para a protecção dos Direitos Humanos. O Programa Haia (adoptado pelo Conselho Europeu em Novembro de 2004) veio reafirmar a importância ao espaço de justiça, liberdade e segurança, consagrado desde o Conselho Europeu de Tampere em 1999 (que havia considerado necessário combater o TSH e a exploração económica de imigrantes através da aprovação de legislação que previsse severas sanções contra esses crimes, bem

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como unir esforços para detectar e desmantelar as redes envolvidas e garantir direitos das vítimas). Este espaço assumiu uma posição cimeira entre as prioridades da União, não só porque se trata de um dos seus objectivos fundamentais mas sobretudo porque se encontra no centro dos interesses dos cidadãos. A luta contra a imigração ilegal paralelamente à luta contra a criminalidade organizada deverão converter o TSH numa actividade de baixo risco – elevado lucro para um crime organizado em actividade de alto risco - reduzido lucro. O Programa Haia convida por fim o Conselho e a Comissão a desenvolverem um plano sobre boas práticas, normas e mecanismos de luta contra o TSH (Secção 1.7.1). Na prática têm contribuído para tal objectivo uma série de iniciativas, sob as mais variadas formas: um exemplo que aponta neste sentido é o programa para 18 Meses das Presidências da U.E. Alemã, Portuguesa e Eslovena (Trio de Presidências), no que respeita à luta contra a criminalidade organizada, que alerta para a necessidade de se pôr uma tónica no TSH.

Na U.E., nos últimos anos, tem surgido um crescendo de uma espécie de estado de alerta relativamente a este assunto, exigindo um esforço cada vez maior de cooperação entre os Estados Membros. O Tratado da U.E. tem vindo a ser modificado no sentido de haver uma maior incidência no domínio penal, no sentido da visibilidade crescente das questões relativas à regulação judiciária e penal. Há uma nova perspectiva para analisar a Justiça, foi criada uma dupla ligação desta por um lado às noções de liberdade e segurança, no plano temático, por outro à polícia, no plano institucional (vide art.2º do Tratado que define os objectivos da União bem como o Título VI do mesmo). A ideia

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subjacente, e que se verificou no texto do chumbado Tratado Constitucional, “é

sincronizar, de maneira progressiva, o espaço jurídico-judiciário com o espaço de mercado e fazer com que o dispositivo judiciário, especialmente penal, corte o passo a certas formas e criminalidade, também ela sem fronteiras”.24 As iniciativas da U.E. têm-se multiplicado na certeza de que o TSH é um problema mundial, que ocorre no interior das fronteiras nacionais e as transpõe, quer se trate do pais de origem, de trânsito ou de destino, sendo uma das formas mais lucrativas de criminalidade organizada internacional (Rodrigues, 2000) 25 .

Cabe agora enunciar as iniciativas europeias mais relevantes em matéria de TSH:

• Convenção Europeia sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina de 1997 e o art.22º do Protocolo Adicional a essa Convenção relativo a transplante de órgãos e tecidos de origem humana de 2002;

• Carta dos Direitos Fundamentais da U.E. de 2000, em especial os seus artigos 1º, 3º, 4º, 5º e 6º;

• Decisão Quadro do Conselho da U.E. de 15 de Março de 2001 relativa ao estatuto de vítima em Processo Penal;

Declaração de Bruxelas sobre a Prevenção e o Combate ao TSH adoptada em 20/09/2002 na Conferência da Europeia sobre a Prevenção do TSH e Luta contra este Fenómeno – Desafio Global para o Século XXI;

• Decisão Quadro 2002/584/JAI do Conselho de 13/06/02, estabelece o MDE, cujo o objectivo é deter ou entregar por um Estado-membro uma pessoa

24

RODRIGUES, Anabela Miranda (2000) ”O papel dos sistemas legais e a sua harmonização

para a erradicação das redes de tráfico de pessoas” Revista do MP, ano 21, nº84, p..20.

25 Segundo o Relatório Explicativo (2005) da Convenção do Conselho da Europa contra o TSH, esta actividade representa a terceira maior fonte de receitas do crime organizado.

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procurada por outro para efeito de procedimento penal ou cumprimento de pena ou medida de segurança (aprovado por Portugal através da Lei 65/2003 de 23/08);

Decisão Quadro 2002/629/JAI do Conselho relativa ao TSH, adoptada em 19/02/2002. Perante este instrumento jurídico cada Estado Membro deve adoptar medidas necessárias para garantir que os actos que preencham o conceito de TSH (de acordo com a Convenção ONU contra o Crime Organizado Transnacional, Protocolo adicional relativo à Prevenção, repressão e punição do tráfico de pessoas, Art.3ºa)) sejam puníveis;

• Criação, através de Decisão da Comissão, de um grupo consultivo denominado “Grupo de peritos sobre TSH” em 25/03/2003;

• Recomendação do Conselho da Europa 16/11/2003 sobre tráfico de órgãos na Europa;

• Decisão Quadro 2004/68/JAI do Conselho de 22 de Dezembro de 2003, relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e pornografia infantil; • Directiva 2004/81/CE do Conselho de 29/04/2004 relativo ao título de

residência concedido aos nacionais de países terceiros que sejam vítimas de TSH ou objecto de uma acção de auxílio à imigração ilegal, e que cooperem com as autoridades competentes;

• Decisão Quadro 2005/212/JAI do Conselho relativa à perda de proventos, instrumentos e bens relacionados com o crime;

Relatórios da Europol sobre TSH em particular o Relatório sobre Criminalidade Organizada (2005) bem como o “Boletim dos Serviços de Informação sobre o TSH” apresentados periodicamente à Comissão;

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• Decisão 803/2004/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 21/04/2004 que adopta o Programa de acção comunitário DAPHNE II (2004-2008, orçamento de 50 milhões de Euros) que permite a obtenção de fundos adicionais para prevenir e combater a violência exercida contra crianças, adolescentes e mulheres (vítimas) bem como ajudar as organizações activas neste domínio e a reforçar a sua cooperação; O DAPHNE III foi já posto em prática, através da Decisão 779/2007/CE de 03/07/07, para o período 2007-2013;

• A iniciativa comunitária EQUAL (o seu financiamento provém exclusivamente do Fundo Social Europeu), que embora tenha um âmbito mais vasto – visa promover novas práticas de luta contra as discriminações e desigualdades de qualquer natureza - tem vindo a financiar, nas suas várias versões, projectos relacionados com o TSH (exemplo no nosso pais, entre outros, o Projecto CAIM);

• Recomendação do Parlamento Europeu ao Conselho referente ao TSH – uma abordagem integrada e propostas para um plano de acção (16/11/2006);

• Plano de Acção da U.E. sobre as melhores práticas, normas e procedimentos para prevenir e combater o TSH (Informação do Conselho 2005/C311/01) na sequência do Programa Haia (elaborado conjuntamente pela Comissão e pelo Conselho) publicado em 09/12/2005 no Jornal Oficial das Comunidades;

Convenção do Conselho da Europa relativa à luta contra o TSH (Varsóvia, 16/05/2005).

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Já em 2003, e sobre a autoridade do Comité de Ministros de 30/04/2003, no seu 838º encontro, foi criado um Comité Ad Hoc contra o TSH (CAHTSH) pelo Conselho da Europa, cuja principal tarefa seria instruir e preparar uma Convenção Europeia contra o TSH que deveria colocar um especial enfoque na tutela dos direitos das vítimas, definir um sistema de monitorização que assegure que a subordinação do Estado ratificador e, simultaneamente, assentar os seus princípios basilares nas indicações do Conselho da Europa no campo dos Direitos do Homem, lei criminal e cooperação judicial bem como nas indicações da ONU (definição de TSH presente na Convenção ONU contra o Crime Organizado Transnacional, Protocolo adicional relativo à Prevenção, repressão e punição do tráfico de pessoas, Art.3ºa)).

A Convenção de Varsóvia insere-se no quadro das preocupações com as graves violações dos Direitos Humanos decorrentes do TSH, na linha das iniciativas anteriormente enumeradas. Divide-se em seis partes fundamentais: 1. Prevenção;

2. Promoção e protecção dos direitos das vítimas; 3. Repressão Penal;

4. Investigação, procedimento criminal e direito processual; 5. Cooperação internacional;

6. Mecanismos de acompanhamento.

Esta Convenção assume-se como um instrumento jurídico internacional abordando, como não tinha sido antes, o TSH de uma forma globalizante, integrada. Cria simultaneamente um mecanismo específico de

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acompanhamento da realização dos seus objectivos (avaliação permanente) junto dos Estados partes que a ratificarem.

Adianta, no seu art. 4º, a seguinte definição de TSH:

Convenção do Conselho da Europa relativa à

luta contra o Tráfico de Seres Humanos