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O ENSINO DA ASTRONOMIA DE GALILEU NUMA PERSPECTIVA FEYERABENDIANA

Não foi intenção de Feyerabend fazer um exame completo sobre as consequências de sua filosofia científica para o ensino de ciências. Entretanto, cabe a nós, professores instruídos de sua análise, buscar tais elementos e encontrar as pistas que ele deixou para que os educadores científicos possam percorrer esse caminho.

Lopes (2016) afirma que a visão social da ciência, enfatizada por Feyerabend, precisa ser difundida aos educadores e estudantes, pois

a crença de que a ciência possui um método único e de que as teorias (...) são algo desconectado do contexto do qual emergem, serve à estruturação da ciência enquanto forma hegemônica, contribuindo, inclusive, para subjugar as demais formas de conhecimento. Embora algo nesse sentido venha sendo feito já há um tempo por estudiosos em educação e educação científica, muito pouco tem chegado aos manuais, aos livros textos e à sala de aula propriamente dita (ibidem, p. 24).

A visão de Feyerabend – de que no processo educacional de uma sociedade livre a ciência não deve ter preferência em relação à astrologia, a magia, as lendas ou o vodu – parece- nos dizer, em um primeiro momento, que a ciência, a astrologia, a magia, as lendas e o vodu são (ou deveriam ser) igualmente importantes em nossa sociedade e que deveriam ter espaços iguais nos processos educacionais. Entretanto, quando analisamos com cuidado o rico material por ele deixado, sem termos a pretensão de nos armarmos para defender uma ciência racionalista, vemos que sua intenção é mostrar que a ciência moderna exerce o mesmo papel opressor que a religião exerceu outrora (suas teorias podendo, inclusive, serem tratadas igualmente como dogmas). De forma que, qualquer ensinamento que fuja da racionalidade científica e de seus métodos (ou seja, sua doutrina) é considerado um absurdo pagão.

Em uma sociedade livre [deveria existir] espaço para muitas crenças, doutrinas e instituições estranhas. Mas a premissa da superioridade inerente a Ciência foi além da própria Ciência e passou a ser um artigo de fé para quase todo mundo. Além disso, a Ciência já não é uma instituição particular; ela agora é parte do tecido básico da sociedade. É claro, a Igreja e o Estado agora

estão cuidadosamente separados38. O Estado e a Ciência, no entanto,

trabalham rigorosamente juntos (FEYERABEND, 2011a, p. 92).

Feyerabend (ibidem, p. 92) cita ainda que enquanto os pais podem escolher qual a educação religiosa que os seus filhos devam ter na escola; ou escolher que os filhos não tenham educação religiosa; ou ainda optar por colocá-los numa escola religiosa que siga estritamente uma religião; eles não têm a liberdade de exigir que seus filhos aprendam astrologia ao invés de astronomia ou pelo menos que a astronomia seja apresentada como um fato histórico.

A preocupação de Feyerabend por uma educação científica livre está associada à livre escolha feita pela educação científica. Essa escolha só poderá ser concretizada se a ciência não for, desde os primeiros anos do processo educacional, caracterizada como absolutamente verdadeira, livre de erros e detentora da única forma de acessar a Realidade (com “R” maiúsculo).

Separar estado e ciência significa regular a exagerada ênfase dada ao conhecimento científico e abandonar o mito da racionalidade científica como medida de todas as coisas e, portanto, possibilitar que o ser humano se desenvolva plenamente, sem a imposição de uma única forma de se apreciar o real. Assim, o indivíduo, em sua plenitude, poderá adotar uma única ideologia para interpretar o real manifesto (seja ela a metafísica, a religião, a ciência, etc.) ou poderá adotar várias ideologias como possíveis formas de apreciar as manifestações do real, mesmo que incomensuráveis entre si ou contraditórias segundo a lógica e a razão habituais (SILVA, 2016, p. 89).

Assim, os professores de ciências devem apresentá-la como uma construção histórica de fatos e princípios (FEYERABEND, 2011a, p. 93), como uma tradição entre muitas possíveis tradições, e não deve colocá-la a cima de outras formas de conhecimento, mas sim, dialogar com elas, reconhecendo a importância e os limites de cada uma (FEYERABEND, 2011a, p. 14), sobretudo porque a ciência as deve muito39.

38 A afirmação de Feyerabend de que a Igreja e o Estado agora estão cuidadosamente separados, dita no contexto

europeu da década de 1970, é uma realidade que começa a ser mudada no cenário sócio-político brasileiro. Há um número cada vez maior de políticos que se elegem em nome de Deus e intensificam as influências cristãs, sobretudo pentecostais evangélicas, no cenário político do Brasil, apesar da Constituição de 1988 enfatizar a laicidade do Estado.

39 A construção das teorias científicas deve-se muito a outras formas de conhecimento, como já discutido no

Entretanto, os nossos educadores,

ano após ano, são jogados sobre a geração mais jovem para enchê-la de “conhecimento” sem consideração pelo passado e pelo contexto dos alunos. Culturas inteiras foram mortas, seus sistemas imunológicos destruídos, seu conhecimento passou a ser uma raridade – e tudo isso em nome do progresso (e do dinheiro, é claro) (FEYERABEND, 2010, p. 369).

Um bom exemplo disso são as comunidades indígenas que desenvolveram (e ainda desenvolvem) sua própria forma40 de entender a natureza, de buscar alimentos e remédios, de estudar o movimento dos céus, o significado da vida e de construir sua espiritualidade ancestral sem a necessidade da fórmula mágica da científica.

Alguns tipos de medicina tribal, por exemplo, podem ter melhores meios de diagnosticar e tratar doenças (mentais e físicas) que a medicina científica atual, e algumas cosmologias primitivas podem nos ajudar a ver, em perspectiva, as ideias predominantes. Portanto, dar igualdade às tradições não é apenas correto, mas também extremamente útil (FEYERABEND, 2011a, p. 14, grifos do autor).

Não que estejamos defendendo que o conhecimento dos povos tradicionais é superior (ou inferior) à ciência, mas que este conhecimento é muito mais importante para eles do que a ciência moderna ocidental, e que esta última deve ser apresentada como uma possível visão, e não como a única (e verdadeira). Dessa forma, os professores de ciências devem apresentá-la “em pé de igualdade” com outras formas de conhecimento, buscando dialogar com elas e citar a importância que elas tiveram (e ainda têm) em outros contextos históricos, étnicos, culturais, etc., deixando claro os motivos pelos quais a Ciência (com “C” maiúsculo) desenvolveu (e

como desenvolveu41) o papel que hoje tem em nossa sociedade.

40 “Pesquisas mais recentes na Antropologia (...) demonstram que nossos ancestrais e contemporâneos ‘primitivos’

tinham cosmologias, teorias médicas e doutrinas biológicas altamente desenvolvidas, que muitas vezes são mais adequadas e têm resultados melhores que os de seus rivais ocidentais” (FEYERABEND, 2011a, p. 128-129).

41 “Há o antigo argumento de que as tradições não-científicas já tiveram sua chance, que elas não sobreviveram à

confrontação com a ciência e com o racionalismo e que tentativas de revivê-las são, por tanto, irracionais e desnecessárias. Aqui a pergunta óbvia é: elas foram eliminadas por justificativas racionais, deixando que competissem com a ciência de uma maneira imparcial e controlada, ou seu desaparecimento foi resultado de pressões militares (políticas, econômicas, etc.)? E a resposta é quase sempre: a última. Nunca pediram aos índios americanos que apresentassem suas ideias, eles foram primeiro cristianizados, depois forçados a sair de suas terras,

No que diz respeito às apropriações da epistemologia feyerabendiana pela área de Ensino de Ciências no Brasil, Silva (2016, p. 66) afirma que apenas “alguns poucos pesquisadores brasileiros (...) propuseram relações entre o anarquismo epistemológico e o ensino de ciências, a saber: Regner (1996)42, Laburú & Carvalho (2001), Terra (2002), Laburú

et al. (2003) e Siqueira-Batista et al. (2005)”, e que, apesar de numericamente escassas,

sublinham o potencial de suas reflexões para o ensino de ciências.

De forma que, reconhecendo a complexidade das situações reais de ensino- aprendizagem, o que esses autores têm em comum é recomendar uma estratégia pluralista para o ensino de ciências, inspirada no pensamento feyerabendiano. Assim,

nessa perspectiva, um mestre pluralista não se limitaria em escolher dogmaticamente uma única proposta pedagógica, ao contrário, estaria disposto a experimentar diversas metodologias, pois sua meta e seu comprometimento é com a aprendizagem dos alunos e não com uma fidelidade pedagógica (SILVA, 2016, p. 68).

Laburú et al. (2003) afirmam que os sentimentos, motivações e preferências ao modo de aprender variam de estudante para estudante. Além disso, fatores como: habilidades mentais, ritmos de aprendizagem, níveis de motivação e interesse, experiências vividas, etc., certamente influenciam a aprendizagem e, consequentemente, a estratégia metodológica. “Portanto”, destaca o autor, “é questionável uma ação educacional baseada num único estilo didático, que só daria conta das necessidades de um tipo particular de aluno ou alunos e não de outros” (LABURÚ et al., 2003, p. 251). De modo que, o professor, a partir das situações reais que o contexto exige, “poderá valer-se de qualquer outra metodologia ou de uma inter-relação de muitas, poderá adaptá-las, distorcê-las desde que se satisfaça as complexas exigências da situação real de trabalho” (SILVA, 2016, p. 70).

Logo, tendo vista a educação sob a lógica de Feyerabend,

e finalmente arrebanhados em reservas no meio de uma cultura científico-tecnológica em crescimento. Os remédios dos índios (que eram usados normalmente pelos praticantes da medicina do século XIX) não foram testados para compará-los com os novos produtos farmacêuticos que invadiram o mercado, foram simplesmente proibidos, como se pertencessem a uma era antediluviana em termos de cura. E assim por diante” (FEYERABEND, 2010, p. 360).

42 “O primeiro artigo publicado em revistas brasileiras especializadas da área de educação em/ensino de ciências,

que carregam em seu bojo a representação feyerabendiana, data de 1996 e foi escrito pela filósofa Anna Regner. O artigo em questão discute os elementos fundamentais da crítica empreendida por Feyerabend ao racionalismo, tendo como referência para a reflexão o livro Contra o Método” (SILVA, 2016, p. 66).

apenas um pluralismo de concepções poderia oferecer a possibilidade de formar cidadãos bem desenvolvidos, capazes de escolher, dentre uma gama de representações a que acreditar a maneira de ver o mundo e de nele atuar. (...) Assim, a imposição ideológica da ciência seria substituída pelo encorajamento dos alunos a aprenderem “o jogo” da ciência sem, porém, perderem de vista a possibilidade de jogar outros jogos. Após essa etapa, a da educação básica, o jovem poderá escolher a profissão de seu gosto e, assim, assumir os compromissos dessa comunidade particular, submetendo-se voluntaria e conscientemente às respectivas imposições institucionais e ideológicas da mesma (SILVA, 2016, p. 91-92).

Segundo Terra (2002, p. 208),

todas as filosofias da ciência têm implicações pedagógicas com reflexos importantes nos procedimentos de ensino de ciências. O professor de ciências adepto ao anarquismo epistemológico43, proposto por Paul Karl Feyerabend,

também adotará estratégias próprias. Guiar-se-á, primeiramente, pelo preceito de que as decisões dos alunos devem ser autônomas; abdicará, pois, de impor a visão científica aos alunos. Apresentará a ciência como sendo formada por uma comunidade na qual se discutem ideias antagônicas e a adesão a uma delas se faz por convencimento, após livre exame das argumentações apresentadas.

Dessa forma, o professor anarquista epistemológico deve oferecer as circunstâncias necessárias para que os seus alunos consigam chegar a uma decisão livre, sem excluir, inclusive, as visões não científicas e até mesmo as anticientíficas (TERRA, 2002).

Mas, o que temer de um professor anarquista-epistemológico? “Certamente”, responde Terra (2002),

que ele não adote alguns enfoques habituais, como, por exemplo, o de apresentar Galileu Galilei como o mocinho da ciência contra os bandidos da Inquisição. Se o professor resolver falar aos seus alunos sobre o insigne matemático, físico e filósofo toscano, nos termos propostos por Feyerabend, não o apresentará como herói puro da racionalidade, mas como hábil polemista, mestre na arte de tergiversar, que usou, com rara e exemplar competência, técnicas de persuasão e propaganda, recursos que muitos

43 “As ideias anarquistas sobre educação têm em comum o fato de postularem a total desvinculação entre o ensino

e as formas de poder, sobretudo a separação entre escola e estado, e escola e religião. A educação orientada pelos princípios anarquistas visa, também, conduzir o estudante à plena autonomia, incentivando-o a torna-se o principal responsável por sua própria formação” (TERRA, 2002, p. 210).

defensores da ciência consideram inadmissíveis na prática científica. (...) Tal imagem de Galileu é difícil de se apresentar, pois requer, pelo menos, muito tempo, e pode antipatizar muito com o grande cientista e filósofo – narrativa (...) mais fácil de ser contada e entendida (ibidem, p. 216).

Entretanto, como cita Martins (2019, p. 266), ainda nos dias atuais, os conteúdos científicos são ensinados de forma objetiva: leis, regras, informações, dados comprovados, datas dos acontecimentos e nomes dos grandes cientistas, o que ele chama de “uma visão de ciência neutra, objetiva, metódica, enfim, uma visão de senso comum da ciência e de seu desenvolvimento (...) uma ideologia conhecida como cientificismo” (ibidem, p. 267, grifo do autor), o que diverge, claramente, de uma epistemologia anarquista.

E isso nos leva ao ensino sobre ciências e seu valor epistemológico, uma vez que a

abordagem racionalista da História da Ciência, com seu método universal, não irá promover um cidadão consciente e atuante (...). É exatamente neste sentido que uma abordagem do ensino sobre ciência, à luz da epistemologia feyerabendiana, pode trazer contribuições significativas para a sala de aula. Ao reconhecer a limitação de toda e qualquer regra, método, ao valorizar as circunstâncias e principalmente todas as formas de conhecimento44, pode-se

criar um ambiente mais propício para a formação de pessoas críticas, ativas, flexíveis, [inovadoras, tolerantes] e sujeitas a mudanças (DAMASIO & PEDUZZI, 2015, p. 123-124).

Assim, dentre muitas possibilidades de recortes, das diversas áreas da ciência ao longo do tempo e dos numerosos referenciais teóricos, nosso interesse reside nas discussões que giram em torno da figura de Galileu Galilei e das concepções astronômicas presentes no século XVII, a partir da perspectiva do filósofo da ciência Paul Feyerabend. Entretanto, este é só um exemplo de muitos outros recortes que podem e devem ser feitos por professores das matérias científicas que pesquisam na área da História, Filosofia e Sociologia da Ciência e que têm a intenção de propor subsídio teórico para que essa estratégia didática seja utilizada nas salas de aula do Ensino Médio.

44 “Em nome da ‘racionalidade’ científica, o educando é obrigado a despojar-se do senso comum, da intuição, de

suas crenças mais profundas, de sua visão de mundo, das múltiplas possibilidades de apreciar o real em troca de uma visão unilateral do mundo, a científica” (SILVA, 2016, p. 89).

Diante disso, vamos utilizar três temas envolvendo o que chamamos de astronomia de

Galileu e que, geralmente, fazem parte dos conteúdos que são tradicionalmente45 ensinados na disciplina de física no Ensino Médio e que, ao mesmo tempo, tem relevância histórica nos trabalhos de Galileu e nas análises epistemológicas de Paul Feyerabend. Apesar de aparecerem com diferentes níveis de aprofundamento nos materiais didáticos, esses três temas juntos promovem as discussões a respeito da física terrestre e celeste de Galileu46, sendo parte essencial do período, do final do século XVI e início do século XVII, que representa um recorte de um período mais amplo de mudança de pensamento cosmológico, que ficou conhecido como

Revolução Copernicana.

Inicialmente vamos apresentá-los em suas versões47 de caráter ahistórico, onde Galileu é tradicionalmente mostrado de forma caricata, e, em seguida, vamos utilizar a Filosofia da Ciência, a partir de uma perspectiva feyerabendiana, e a obra de Galileu Galilei – Diálogo sobre

os dois máximos sistemas do mundo ptolomaico e copernicano48, para mostrar uma visão menos

distorcida do desenvolvimento científico que pode e deve ser suscitada na sala de aula, na comunidade escolar e, por consequência, na sociedade como um todo.

Ademais, uma pesquisa publicada recentemente por Schivani et al. (2020), a respeito da escolha dos livros didáticos nas escolas do Brasil (e em especial os de física), chama a atenção que a coleção mais adotada (Bonjorno, Casemiro, Clinton e Prado – Editora FTD) em vinte e um estados brasileiros para o triênio 2018-2020, com mais de 1,5 milhões de exemplares, possui um enfoque tradicional com ênfase no formalismo matemático e é, inclusive, pobre em

45 O ensino de astronomia aos poucos vem sendo inserido nos conteúdos de física do ensino básico. Entretanto,

ainda predomina nas salas de aula uma ciência apresentada de forma linear e objetiva, com ênfase na reprodução sistemática de resoluções algébricas, no protagonismo de nomes tradicionalmente difundidos na comunidade científica, na ausência dos conflitos históricos e nos métodos científicos universais (FONSECA, 2015, p. 1).

46 Vale destacar que essa diferenciação entre as físicas “terrestre” e “celeste” de Galileu (se referindo as tentativas

de descrever e explicar os fenômenos físicos) é feita a posteriori. Na época, não seria possível fazer tal separação.

47 Como exemplo, iremos utilizar fontes do cotidiano dos professores e alunos da rede pública estadual: o livro

“Conexões com a Física” (MARTINI et al., 2016) disponível para escolha no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) entre 2018 a 2020, e as páginas da internet “Brasil Escola” (SANTOS, 2018; FERNANDES, 2018) e “Mundo Educação” (HELERBROCK, 2018; CERQUEIRA, 2018), que disponibilizam informação educacional e que foram comumente visitadas nos sites de busca entre 2018 e 2019. Vale ressaltar que essas fontes foram escolhidas como exemplos e que elas não correspondem à totalidade dos materiais didáticos disponível no PNLD e na internet. O livro citado foi o material fornecido para mim e para os outros professores das matérias científicas da escola em que leciono durante o período em que essa dissertação foi escrita, e as páginas de internet correspondem às fontes mais buscadas pelos nossos alunos quando foram solicitados trabalhos de pesquisas, durante este mesmo período.

48 Em sua obra mais famosa, publicada na Itália em 1632, Galileu utiliza três personagens – Salviati, Simplício e

Sagredo – que debatem a respeito dos sistemas de mundo, em defesa do Heliocentrismo. Nesta pesquisa, utilizamos a tradução para o português de 2011.

discussões de HFC. Os autores citam que, no próprio Guia do Livro Didático de 2018, a coleção de Bonjorno e colaboradores apresenta que,

dentre todo o rol de atividades propostas, a principal ênfase está atribuída aos exercícios quantitativos (...) [e que] questões socioambientais e de sustentabilidade não ocupam lugar de destaque na coleção, já que são escassas as propostas voltadas a discussões sociocientíficas. Essa característica limita a exploração das relações entre Ciência, Tecnologia, Sociedade e Meio Ambiente, principalmente quanto ao desenvolvimento do posicionamento crítico dos estudantes e suas ações socioambientais (BRASIL, 2017, p. 76, 79 apud SCHIVANI et al., 2020, p. 8).

Assim, sendo o livro didático um dos principais recursos utilizados na Educação Básica, fica-nos evidente o déficit provocado pela ausência das discussões da HFC na sala de aula.

Corpos em queda livre

O tema da queda livre é usualmente discutido no primeiro ano do Ensino Médio como parte do conteúdo de mecânica. Apesar de se referir à física terrestre, ele está intimamente ligado às discussões astronômicas, uma vez que, para o Heliocentrismo, era necessário construir uma física terrestre compatível com uma Terra em movimento. Assim, é geralmente apresentado nos livros didáticos, que a análise do movimento de corpos abandonados é uma evidência da força gravitacional da Terra:

Todos os corpos próximos à superfície da Terra são atraídos por ela e, se nada os impedir, cairão em sua direção. Dizemos que é a atração gravitacional da Terra que “puxa” toda a matéria em direção ao centro do planeta (MARTINI et al., 2016, p. 53).

Muitas vezes, também, o professor é instruído a fazer o seguinte experimento: abandonar, ao mesmo tempo, uma borracha e uma folha de papel de uma mesma altura, e questionar os alunos sobre quem chegou primeiro ao chão. Posteriormente, amassar bem a folha de papel e repetir o experimento, questionando novamente os alunos sobre a diferença no tempo entre as quedas dos dois objetos.

A partir disso, é apresentado o filósofo grego Aristóteles e o seu estudo pioneiro a respeito da queda dos corpos:

Por volta de 300 anos antes de Cristo, existiu um filósofo grego chamado Aristóteles que acreditava que se abandonássemos dois corpos de massas diferentes, de uma mesma altura, o corpo mais pesado tocaria o solo primeiro, ou seja, o tempo de queda desses corpos seriam diferentes. Essa crença perdurou por muitos anos sem que ninguém procurasse verificar se realmente o que o filósofo dizia era mesmo verdade (SANTOS, 2018).

Figura 2 – Foto da Torre Inclinada de Pisa, na Itália, presente no catálogo da Detroit

Publishing Company de 1905.

Fonte: Biblioteca Digital Mundial. Disponível em: <wdl.org/pt/item/4240/>. Acesso em: 29 out. 19.

século XVII, o físico Galileu Galilei, ao introduzir o método experimental, chegou à conclusão de que quando dois corpos de massas diferentes, desprezando a resistência do ar, são abandonados da mesma altura, ambos alcançam o solo no mesmo instante. Conta a história que Galileu foi até o topo da Torre de Pisa, na Itália, e de lá realizou experimentos para comprovar sua