• Nenhum resultado encontrado

O ensino de Inglês na educação comercial pela Reforma Francisco Campos

SEÇÃO 3 – O ENSINO DE INGLÊS NO BRASIL: LEGISLAÇÃO,

3.2 A REFORMA FRANCISCO CAMPOS: DIRETRIZES PARA O ENSINO DE INGLÊS

3.2.1 O ensino de Inglês na educação comercial pela Reforma Francisco Campos

A primeira vez que o Método Direto apareceu na legislação educacional brasileira foi no dia 30 de junho de 1931, pelo Decreto n. 20.158, que definiu o ensino comercial, regulamentou a profissão de contador e deu outras providências. Logo no início do documento ficou definido que

o ensino comercial constará de um curso propedêutico e dos seguintes cursos técnicos: de secretário, guarda-livros, administrador-vendedor, atuário e de perito-contador e, ainda, de um curso superior de administração e finanças e de um curso elementar de auxiliar do comércio (BRASIL, 1942b, p. 459).

Dentre as disciplinas do curso propedêutico, estavam Português, Francês e Inglês. Os cursos técnicos previam o estudo de Francês e Inglês comerciais, além de correspondência portuguesa, francesa e inglesa. O curso superior de administração e finanças não englobava o estudo de nenhuma língua. O Inglês era a única língua estrangeira que constava no escopo do curso de auxiliar de comércio. No entanto, para fazer esse curso, dentre os exames de admissão, constava um de Língua Francesa. Assim, embora o Francês não estivesse dentro das disciplinas, esperava-se que o aluno tivesse conhecimento suficiente dessa língua para conseguir aprovação. Para o curso de secretário, era esperado que os alunos trouxessem os conhecimentos de Português, Francês e Inglês do curso propedêutico, para, então, poderem fazer “aplicação intensiva desses idiomas à prática comercial”, de modo que os alunos fossem capazes de aliar “precisão técnica a correção de linguagem” (BRASIL, 1942b, p. 462). Havia, ainda, a instrução de associar o uso das línguas estrangeiras para os casos brasileiros. Em relação ao curso de

administrador-vendedor, foi definido o estudo do Francês e Inglês comerciais. Tal estudo, no primeiro ano, visava fornecer os elementos que possibilitassem o domínio das línguas no trato dos negócios, tanto como vendedor como viajante. Para tanto, o ensino deveria estar focado na aplicação especial ao comércio, além da aplicação aos casos brasileiros e o estudo de “expressões, termos e correspondência comerciais” (BRASIL, 1942b, p. 464). Nas disciplinas regulamentadas para o curso de auxiliar de comércio, a única língua viva encontrada, nos dois anos de curso, era o Inglês, com orientação para o uso do Método Direto, com práticas de conversação e redação. A Língua Inglesa não era indicada para estudo apenas nos cursos de guarda-livros, atuário, perito-contador e superior de administração e finanças. No currículo destes cursos não figurava a Língua Francesa também.

Encontra-se, nesse Decreto, a primeira menção ao método de eleição para o ensino das línguas vivas, a saber, o Método Direto. Anteriormente, a legislação dava instruções de como trabalhar as línguas em sala de aula, mas o método nunca chegou a ser definido.

Em 1809, por exemplo, ao criar as cadeiras de Língua Inglesa e Francesa no Brasil, D. João VI, por intermédio da Decisão n. 29, de 14 de julho de 1809, orientou que as lições devessem ser ditadas por obras compostas pelos professores nomeados ou por gramáticas conceituadas, até que esses materiais fossem elaborados, de modo que os alunos pudessem ser adestrados no “bem fallar e escrever”, valorizando as belezas da língua e os estilos encontrados nos textos, com preferência para aqueles em que a moral fosse exaltada (BRASIL, 1891, p. 29). A língua materna foi colocada como parâmetro necessário para esses estudos, com uma clara associação entre ensino e estudo de textos de autores renomados, ou seja, da literatura. Apesar de ficar implícita uma ideia de valorização da tradução. Não havia um delineamento metodológico a ser seguido, e nem uma relação de obras a serem adotadas.

Em 1838, ano seguinte à criação do Collegio de Pedro II, podem ser encontradas, na legislação, orientações sobre os aspectos mais importantes da língua, bem como indicação de obras a serem estudadas, mas não havia uma referência direta à metodologia que a ser empregada e nem aos passos que deveriam ser seguidos para que o ensino fosse assegurado. Assim, ao analisar os onze programas de ensino do Collegio de Pedro II / Gymnasio Nacional do século XIX, Santos (2017) detalhou as orientações para o ensino de Inglês e relatou que em alguns momentos, como no programa de 1850, apenas havia uma referência a obras e páginas a serem lidas, tanto em Língua Inglesa como na língua nacional, o que sugeria uma predileção por uma abordagem baseada na gramática e tradução, sem que esta regulamentação fosse expressa.

A partir do programa de 1856, algumas orientações metodológicas foram adicionadas nos Decretos que originaram os programas de ensino, mas ainda de forma embrionária, com menção a aspectos que deveriam estar presentes nas aulas ministradas, e não a uma metodologia a ser seguida. É o caso, por exemplo, do Programa de Ensino de 1858, com a definição de conteúdos a serem trabalhados por ano de estudo.

Durante os sete anos de curso, o inglês deveria ser ensinado no segundo ano, com uma compreensão simples da gramática, trabalhos de leitura e versão simplificada; no terceiro e quarto anos, com o trabalho mais elaborado de versão; e no quinto, com composição e conversação (SANTOS, 2017, p. 148).

Essas orientações foram observadas durante todo o século XIX, com a menção de inclusão de tópicos de conversação nos últimos planos de ensino e de práticas mais intuitivas no plano de 1898. Santos (2017) ressaltou que a ideia de conversação do século XIX deve ser analisada a partir das concepções sobre esse tópico. Assim, segundo a autora, as conversações eram, muito provavelmente, práticas guiadas de recitação dos diálogos familiares presentes em muitas obras destinadas ao ensino de línguas, ou trechos de textos selecionados pelo professor. Práticas mais intuitivas foram privilegiadas nos livros adotados no programa de 1898, como, por exemplo, a obra The English Reader, de Emil Hausknecht (1894), permeadas por outras ainda focadas na gramática e na tradução.

A partir dos achados de Santos (2017), pode-se afirmar que a única referência direta à metodologia a ser empregada foi somente encontrada na legislação promulgada pela Reforma Francisco de Campos. Ao analisar o Decreto 20.158, de junho de 1931, mais atentamente, percebe-se, no item II, que são fornecidas as informações relacionadas às disciplinas do curso propedêutico e não só para o Inglês, mas também para o Francês, havia a indicação do Método Direto. De acordo com as orientações encontradas nessa peça legislativa, o ensino de Inglês no primeiro ano deveria acontecer da seguinte forma: “Método direto, conduzindo o aluno a pensar no próprio idioma estudado. Exercícios elementares de conversação e redação. Gramática aplicada aos casos ocorrentes” (BRASIL, 1942b, p. 460). O segundo ano previa a continuidade do programa do ano anterior, o aumento da prática oral e escrita com vistas à aquisição do vocabulário e à correção da pronúncia. Para o terceiro ano, era prevista a

intensificação do programa anterior, com frequentes exercícios de conversação, para que o aluno possa utilizar fluentemente o idioma. Exercício de tradução e versão. O ensino visará a linguagem corrente, afim de que à compreensão dos alunos se tornem facilmente acessíveis as publicações em língua estrangeira, que interessem ao comércio (BRASIL, 1942b, p. 461).

A peça legislativa em questão dedicou-se, ainda, a dar orientações sobre o regime escolar e definiu, entre outras coisas, as datas de início e fim de cada semestre letivo, bem como das férias. Para o curso propedêutico e de auxiliar de comércio, a idade mínima exigida era de doze anos. A completude do curso propedêutico ou da quinta série do curso secundário era pré- requisito para o ingresso nos cursos de secretário, guarda-livros, administrador-vendedor, atuário e perito-contador. Para ingressar no curso superior de administração e finanças, era necessária a formação em perito contador ou atuário. De maneira semelhante ao que foi detalhado na organização do ensino secundário, o Decreto n. 20.158 traz as orientações referentes à obrigatoriedade da frequência e formas de avaliação.

Os alunos dos cursos propedêutico, de auxiliar de comércio e administrador-vendedor que desejassem a transferência, deveriam achar instituições que ministrassem as mesmas línguas estrangeiras (BRASIL, 1942b). Diferente do curso secundário, para os cursos comerciais, o professor era responsável por elaborar os programas das disciplinas das suas cadeiras e submetê-los à aprovação do superintendente, anualmente. Cabia, também, ao docente, escolher os compêndios. O documento dava “completa autonomia doutrinária nas matérias” (BRASIL, 1942b, p. 417), ao mesmo tempo que dava o direito da fiscalização de chamar atenção para casos de má condução do método designado ou para qualquer coisa que estivesse em desacordo com as orientações postas pela Superintendência do Ensino Comercial. As escolas tinham o direito de substituir as línguas estrangeiras, desde que respeitassem o quantitativo de duas e seguissem o método de ensino determinado pelo ministro.