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SEÇÃO 2 – OS CAMINHOS PARA A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO

2.2 O MÉTODO DIRETO E SUAS BASES

A busca por uma educação natural, realizada por meio de diálogos, com uso de objetos do dia a dia e não na base da memorização não é uma inovação do Método Direto. Locke (1996), em Some thoughts concerning education, publicado em 1693, defendeu o ensino mediante frequentes conversas e não pela memorização de regras gramaticais. Rousseau, em Emilio ou

Da Educação, publicado em 1762, fez críticas ao processo educacional baseado na repetição,

ao relatar a experiência de ensino de um jovem, defendeu que a educação não deveria acontecer a partir de lições verbais e sim de conversas frequentes com seu tutor e o uso de elementos da natureza.

Pestalozzi (2006), um dos precursores da pedagogia moderna, em Cartas sobre a

educação infantil, de 1818, defendia que a educação deveria estar pautada na experimentação,

9 “The Direct Method had, it seems, been discovered twice in the ten years in virtually the same place” (Texto

original, tradução minha).

10 “Antes de emplear el libro se harán las nueve primeras lecciones oralmente, a fin de que el discípulo imite la

pronunciación del professor” (Texto original, tradução minha).

intuição e ludicidade, com foco nos conhecimentos dos alunos, de modo que as práticas de memorização, consideradas, pelo autor, como enfadonhas, não mais guiassem os procedimentos adotados pelo professor. Assim, os exemplos e a imaginação passaram a ser privilegiados, juntamente com a exposição aos objetos, e não apenas às palavras. Esses pressupostos faziam com que o aluno se tornasse cada vez mais autônomo, porém a autonomia era uma característica que não combinava com os métodos baseados na gramática e tradução, recorrentes desde o século XVI. Pestalozzi (2006) se preocupou com o ensino desde a mais tenra idade, pois acreditava que se as mentes das crianças fossem domesticadas desde o início com as práticas de memorização descontextualizadas, dificilmente conquistariam a autonomia, uma vez que as necessidades dos pequenos é que deveriam nortear o ensino. Todas essas concepções defendidas pelo autor deram sustentação à sistematização dos princípios defendidos pelo Método Direto.

Embora o ensino conduzido na própria língua que se deseja aprender não seja uma prática nova, tampouco a busca por um método natural de ensino seja recente, nem date do século XIX, a nomenclatura Método Direto foi utilizada primeiro por Claude Marcel, em sua obra Language as a Means of Mental Culture and International Communication, em 1853 (HOWATT; WIDDOWSON, 2009). Marcel defendia uma metodologia de ensino de línguas baseada no uso de objeto nas aulas e na inversão da ordem de ensino, de modo que os objetos pudessem ser utilizados primeiro. Esse pensamento foi recorrente nas obras de vários autores, como Pestalozzi (2006), Spencer (1888) e Calkins (1886), este último considerado um dos maiores defensores do estudo das coisas antes das palavras, privilegiando a cientificidade e a experimentação. Os alunos deveriam entrar em contato com os objetos concretos, incialmente, reconhecê-los e nomeá-los, para, só então, poderem estudar as abstrações da língua, e deveriam fazer uso, sempre que possível, de diálogos criados pelos professores, com o objetivo de guiar o aluno no caminho da descoberta e do conhecimento.

O livro Primeiras Lições de Coisas, escrito por Calkins, inicialmente em 1861, foi traduzido para o português por Ruy Barbosa, em 1886. É importante destacar que esta obra não era dedicada ao ensino de línguas, fossem elas a materna ou estrangeiras. Este conhecimento foi abordado em partes específicas do manual. Em uma visão mais ampla, o autor se propunha a ensinar todos os conhecimentos escolares, a partir das coisas, pela parte concreta e experimental do ensino. Foi assim que Calkins (1886) trabalhou os números, a aritmética, a geometria, as cores e o corpo humano, por exemplo. O estudo do Método Direto permite-nos

perceber em sua essência, muitos dos traços do livro Primeiras Lições de Coisas, com destaque para as práticas indutivas.

O que o Método Direto traz, então, não é exatamente novo, mas ele tem seu valor ao levar o desenvolvimento da oralidade, propor o uso de objetos e figuras, preocupar-se com um trabalho que respeite a ordem natural para a sala de aula de língua estrangeira e, como bem apontou Schmidt (1935), ao fazer uso da ciência a seu favor. Schmidt (1935) acrescentou que o Método Direto passou por fases até chegar a ser sinônimo de método científico. Para a autora, o estudo do Método Direto não pode ser simplista, uma vez que passou por várias etapas, com bases bastante peculiares. Houve, assim, o momento do Método Natural, que tentou transportar as ideias da aquisição de língua materna ao aprendizado de uma língua estrangeira e, como exemplo, temos os trabalhos de Sauveur e Berlitz; a fase em que o Método Direto foi visto como intuitivo, com base na visão e na percepção das coisas ao redor; o despontar do Método Fonético, em que a pronúncia era o centro de tudo, e com ideias compartilhadas por foneticistas como Viëtor e Sweet; o método visto como psicológico, com foco na associação de ideias e a visualização mental; e, finalmente, o científico, que consiste no Método Direto acrescido das conquistas cientificas para o ensino de línguas e nos resultados obtidos oriundos das salas de aula. Era nessa última concepção que a autora acreditava estar inserido o Método Direto nas reformas defendidas na década de 1930, no Brasil. Em resumo,

O método é natural, na medida em que adota os processos empregados no aprendizado da língua materna, pouco importando que se atenha, ou não, ao sistema de Berlitz e seus seguidores. É psicológico, não apenas por lançar mão das séries de Gouin, em algumas circuns-tâncias específicas, mas sobretudo porque nenhuma concepção educativa, em nenhum instante do seu desenvolvimento, poderá jamais deixar de subordinar-se às normas que regem a marcha com- plexa e ininterrupta do ajustamento humano. É fonético, segundo o realce que atribui ao aspecto oral da linguagem, buscando as melho- res técnicas que assegurem urna reprodução tanto quanto possível exata da pronúncia estrangeira. É intuitivo, conforme se funda em percepções e representações claras, precisas e totais da realidade mediata ou imediata, sem que com isso se devam obrigatoriamente usar as lições de coisas ou os quadros-murais. É direto, sempre que o ensino do idioma se faz no próprio idioma. É científico, quando se inspira no espírito de ordem e clareza que caracteriza todas as ciências, e o seu conteúdo, por conseguinte, emerge de “uma verificação precisa e con- trolada” da matéria considerada, dos meios empregados para transmiti-la e dos próprios indivíduos que deverão aprendê- la (CHAGAS, 1957, p. 81-82).

Para Larsen-Freeman e Anderson (2011), na obra Techniques and principles in

da língua estrangeira desde o primeiro dia de aula, com o objetivo de fazer com que os alunos aprendam a pensar na língua estrangeira. Não deve haver explicitação das regras gramaticais, que precisam ser inferidas pelos alunos, e a aprendizagem de novas palavras necessita se dar de forma contextualizada, com o auxílio de objetos, desenhos e mímicas. Além disso, a pronúncia correta é primordial.

A partir da década de 1880, o mundo viu a disseminação das Escolas Berlitz e a popularização do Método Direto. Em 1914, havia aproximadamente 200 escolas dessas no mundo (HOWATT e WIDDOWSON, 2009)12. No Brasil, o Método Direto aportou,

oficialmente, no ano de 1931.