• Nenhum resultado encontrado

Epidemiologia e Prevalência

Na literatura, a idade média dos sujeitos com tricotilomania varia entre os 11 e 14 anos (Christenson et al, 1991, in Diefenbach et al., 2000; Chaudhury et al., 2003; Lochner et al., 2002), sendo mais frequente em raparigas, tanto crianças como adultas (Özcan, Özcan e Ensari, 2003; Tay et al., 2004). Relati- vamente à prevalência desta perturbação, não existem, ao presente, estimativas exactas. Contudo, um estudo realizado por Christenson, Pyle e Mitchell (1991) com 2579 estudantes de um colégio, cerca de 1,5% dos rapazes e 3,4% das ra- parigas apresentavam semiologia de arrancar de cabelo patológico. Todavia, 0.6%, tanto rapazes como raparigas, haviam sido diagnosticados com tricotilo- mania. No entanto, outros autores mencionam que, nas crianças, esta patolo- gia, é frequente, indiferenciadamente em ambos os géneros (Tay et al., 2004). Estes dados vão de encontro ao referido na DSM-IV (American Psychological Association, 2002) cujas crianças com tricotilomania, de ambos os sexos, são igualmente representados; sendo que nos adultos esta perturbação parecer ser muito mais comum em mulheres. Estudos recentes de amostras universitárias su- gerem que 1 a 2% dos estudantes apresentam uma história actual ou passada de tricotilomania (American Psychological Association, 2002).

Etiologia

A etiologia desta perturbação não é clara (Begotka et al., 2004). Apesar disso, têm vindo a ser propostos alguns modelos explicativos, nomeadamente, etológicos (e.g. Bordnick, Thyer e Ritchie, 1994, in Begotka, Woods e Wetter- neck, 2004), neurobiológicos (Stein e Hollander, 1992), e ainda comporta- mentais (Mansueto, Townsley-Stemberger, Thomas e Golomb, 1997; Penzel, 2003, in Begotka et al., 2004).

Em vários modelos, a ênfase tem recaído fundamentalmente nas variáveis emocionais ou eventos stressantes que precedem à exacerbação do puxar o cabelo como por exemplo, a ansiedade, a tensão e tristeza (Diefenbach, Mou- ton-Odom e Stanley, 2002)

Nas crianças, esta perturbação «está usualmente associada a outros tra- ços neuróticos como o roer as unhas (…) chuchar no dedo, ansiedade ou stress em momentos de avaliação, dificuldades de aprendizagem e negligên- cia parental» (Christensen e Crow, 1996; Khan e Langley, 2004). Uma rela- ção deficiente com a mãe (Oguchi e Miura, 1977) e a influência de aconteci- mentos traumáticos na infância (Lochner et al., 2004) são identificados em crianças com esta perturbação.

Teorias psicanalíticas

As teorias psicoanalíticas explicam esta perturbação mencionando o puxar o cabelo como expressão de conflitos insconscientes (Greenberg e Sarner, 1965, Tattersall, 1992, in Diefenbach et al., 2004), em que o cabelo é utilizado como objecto transacional (Krishnan, Davidson e Guajardo, 1985). A existência de relações objectais pobres e a consequente perca das mesmas (Krishnan et al., 1985), levaria a esta perturbação. Outros autores mencionam traumas na infân- cia, como por exemplo abuso sexual (Singh e Maguire, 1989).

Teorias biológicas

Do ponto de vista biológico, têm vindo a ser mencionadas alterações ao ní- vel de neurotransmissores, especificamente da serotonina (Jenike, 1989, Stein, Simeon, Cohen e Hollander, 1995) e disfunção ao nível do lobo frontal (O’Sulli- van et al., 1997, Rettew et al., 1991), essencial para o processo de inibição de controlo dos impulsos e que se pensa ser crucial para o funcionamento cognitivo (Wilson e Kipp, 1998, in Bohnea, Keuthen, Tuschen-Caffierb e Wilhelm, 2004). Num estudo realizado por Christenson, Mackenzie e Reeve (1992, in Diefen- bach et al., 2000) com 161 pacientes, verificou-se que 8%, tinham ou tiveram um parente de primeiro grau que sofresse de tricotilomania. Este facto, de per se, não permite esclarecer se haverá uma susceptibilidade genética envolvida na tricotilomania, ou se esta ocorre por um mecanismo de aprendizagem social. Neste sentido, alguns autores vêm salientar que uma história parental de tiques, hábitos ou sintomas obsessivo-compulsivos (King et al., 1995) são frequentes em pais de crianças e mesmo adultos com tricotilomania.

A Teoria Neuro-etiológica de Swedo (1989, in Diefenbach et al., 2000) postula que a tricotilomania (mas também a POC) é causada por uma disfun- ção nos mecanismos neurobiológicos responsáveis pelos comportamentos de monitorização. Apesar da associação proposta entre a tricotilomania e a POC, Stanley et al. (1992) com base na revisão de vários estudos menciona que existem mais diferenças do que similitudes entre ambas: severidade dos sintomas observados e prazer percebido com o comportamento de arrancar o cabelo (Stanley et al., 1992), estímulos desencadeantes (Mackenzie, Ristvedt, Christenson, Lebow e Mitchell, 1995), focus atencional (Christenson, Macken- zie e Mitchell, 1991) e ainda demográficas (Himle, Bordnick e Thyer, 1995, Mackenzie et al, 1991).

Investigações neuropsicológicas e neurológicas citadas por Diefenbach et al. (2000) sugerem uma performance pobre em testes de habilidade espacial

(Rettew et al., 1991), memória não verbal e funcionamento executivo (Keuthen et al., 1996). Técnicas de mapeamento funcional sugerem também actividade metabólica no cerebelo e área parietal direita superior (Wedo et al., 1991), no córtex frontal e núcleo caudado (Baxter et al., 1992) e ainda diminuição do volume do putámen esquerdo (O’Sullivan et al., 1997).

Teorias comportamentais

No âmbito das teorias comportamentais, a tensão-redução, covariação da resposta e modelamento têm sido identificadas como factores explicativos da origem e manutenção desta perturbação. De acordo com Azrin e Nunn (1973, in Diefenbach et al., 2000), o arrancar cabelo é aprendido por um processo similar aos outros hábitos, bem como uma estratégia de coping face ao stress e que é reforçado por meio da tensão-redução (reforço negativo). As sensações físicas associadas ao puxar/arrancar podem assim estar condicio- nadas (Friman, Finney & Christophersen, 1984, in Diefenbach et al., 2000) dado que. «Através dos processos de condicionamento clássico e operante, o comportamento passar a estar associado a um exponencial espectro de pistas externas e proprioceptivas (internas). Em potencial, o comportamento pode tornar-se usual, ocorrendo frequentemente de forma inconsciente, que leva ao decréscimo da controlabilidade subjectiva» (Azrin e Nunn, 1978, in Diefen- bach et al., 2000, p. 295). Por outro lado, tem-se verificado que sugar o dedo e arrancar os cabelos covariam nas crianças (Altman, Grahs e Friman, 1982), e que um tratamento do sugar o dedo, eliminará também o arrancar do cabe- lo (Friman e Hove, 1987, Knell e Moore, 1988, Watson e Allen, 1993, in Die- fenbach et al., 2000).

Mansueto et al., (1997) com base nas leis do condicionamento clássico e operante conceptualizaram um modelo explicativo e compreensivo desta per- turbação. O mecanismo de condicionamento clássico estaria representado na tricotilomania nos estímulos que desencadeiam ou são o trigger para o com- portamento de arrancar o cabelo, enquanto que o condicionamento operante explicaria como este impulso, factores cognitivos, conjuntamente com outros factores conseguiriam estimular a complexa sequência de comportamentos que estão associados ao puxar, e como, as consequências determinam a re- corrência do comportamento. Destaque-se aqui que os episódios de puxar o cabelo apresentam uma natureza cíclica.

Outros autores sugerem que a tricotilomania também pode ser o resultado de um desvio na socialização na infância e expressão de dificuldades na adaptação a novos ambientes (Manasievska et al., 2001), que se podem de-

ver a experiências negativas no contexto familiar. De acordo com Manasievs- ka et al., (2001, p. 204)

"Estas crianças são sobrecarregadas com ansiedade exacerbada, insegu- rança, dependência (física e mental), medos de punições e ameaças de serem separadas dos seus pais. O papel da mãe para estas crianças deve também ser reforçado. Frequentemente tende a manter a criança numa relação simbiótica e não é capaz de considerar o seu filho como um indivíduo separado dela mes- ma. Nestas famílias a mãe é a figura mais dominante em relação ao pai. Numa tal atmosfera, o medo torna-se crónico, associado a sentimentos de periculosi- dade constante: a cada momento a separação e a perda de protecção podem ocorrer. Consequentemente, a separação da criança da sua família quando é enviada para o jardim de infância é um momento em que os mecanismos de de- fesa da criança, entre os quais a tricotilomania, são activados".