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A ERA FERROVIÁRIA: A CONSOLIDAÇÃO E A EXPANSÃO DA CENTRALIDADE DE CRICIÚMA

CRICIÚMA (1990 2015) 151 5.1 CRICIÚMA, O PÓS-MODERNISMO E O NEOLIBERALISMO

4. O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO DO CENTRO DE CRICIÚMA (1880 1990)

4.2 A ERA FERROVIÁRIA: A CONSOLIDAÇÃO E A EXPANSÃO DA CENTRALIDADE DE CRICIÚMA

Figura 24 - Representação de Criciúma no ciclo carbonífero

Fonte: elaborado pelo autor

A abertura da estrada de ferro em Criciúma no ano de 1919 para o tráfego de cargas de carvão mineral e em 1923 para o transporte de passageiros foram fatos determinantes para a consolidação da indústria de mineração e para a inauguração, sob o aspecto do espaço urbano, do Ciclo Carbonífero. Como signo do progresso, ideologia ocidental que se consolidou com o boom econômico e industrial entre os séculos XIX e XX (LE GOFF, 2003), o trem, com todo seu maquinário carregado de simbolismos industriais, foi recebido na pequena cidade de imigrantes europeus como estímulo para o desenvolvimento dos frágeis meios de comunicação e das atividades econômicas.

O novo ramal ferroviário cortava no sentido Leste/Oeste parte do território do então Distrito de São José de Cresciuma e estabeleceu um limite ao sul do núcleo colonial que caracterizava sua centralidade. Junto a ele, foi construída uma estação de passageiros (Figura 25) que, em poucos anos, por influência do destaque econômico e da oferta de trabalho proporcionados pelo desenvolvimento da mineração, configurou-se como uma das mais movimentadas da região e ponto nodal com forte influência sobre a urbanização do espaço central.

Concomitante ao período de implantação da estrutura ferroviária, vale registrar a instalação de novas empresas mineradoras dentro dos limites políticos do distrito. Um exemplo é a Sociedade Carbonífera Próspera, fundada em 1923 às margens do novo ramal ferroviário, mas dista a cerca de dois quilômetros a leste do centro da vila. Com a C.B.C.A., localizada no núcleo Santo Antônio, aproximadamente dois quilômetros a oeste, a centralidade estava posicionada a meio caminho de duas das maiores companhias mineradoras da região. Somado à localização da estação, esse posicionamento geográfico influenciou indiretamente o aumento populacional do centro urbano. Nascimento (2004, p. 69) considera que a atividade extrativista "ajudou a consolidar aquela área como central, na medida em que atraiu pessoas das localidades vizinhas, que vieram

trabalhar nas minas, estimulando o comércio e outras atividades econômicas no centro da cidade".

Figura 25 - Estação ferroviária de Criciúma. Na foto, a recepção de autoridades para a instalação do município, em 1º de janeiro de 1926.

Fonte: Acervo Foto Zappelini.

Pode-se considerar a cidade como uma formação histórica conflituosa entre elementos fixos - os espaços físicos, os lugares - e fluxos - as pessoas, o movimento, as comunicações, as relações sociais (SANTOS, 2014). Numa referência à compreensão da formação do espaço central de Criciúma, interpreta-se que as companhias extrativistas que se instalavam na região formavam, pela natureza das jazidas de carvão, elementos fixos, que atraíam fluxos populacionais cada vez maiores em busca de emprego. Estes, por sua vez, foram estimulando, junto ao núcleo colonial, a multiplicação de novos elementos fixos. Tratava-se de estabelecimentos comerciais, bares e hotéis, que, conforme relato de Nascimento (2004), passavam a se concentrar no entorno da estação.

O fluxo de pessoas na estação atraiu, principalmente, os estabelecimentos comerciais, que buscavam se localizar nas suas proximidades. Começaram a surgir no entorno da estação estabelecimentos como armazéns, bares, lojas populares, pensões e hoteis. O Hotel Brasil, por muito tempo o principal hotel da cidade, localizava-se na frente da estação de passageiros.

Na rua Paulo Marcus, a rua da estação, havia o mercado Garibaldi, padaria, restaurante, a garagem da empresa de ônibus de Basílio Aguiar, que fazia o transporte de passageiros para a região de Metropolitana, casas residenciais e inúmeros bares (NASCIMENTO, Dorval do., 2004, p. 69). Ao mesmo tempo em que o espaço se dinamizava, o crescimento das atividades ligadas à mineração também aumentou o poder político do distrito, que em 1926 conquistou sua emancipação administrativa e passou a organizar legalmente seu território. Na condição de município, a publicação do primeiro Código de Posturas estabeleceu os limites do perímetro urbano e algumas normas de dimensionamento urbanístico/arquitetônico que caracterizam parte do atual traçado e da paisagem da área central. Publicado originalmente no jornal O Mineiro e posteriormente transcrito por Pedro Milanez (1991, p. 99), o trecho abaixo destaca as regulamentações espaciais mais relevantes:

Dos arruamentos, alinhamentos e edificações Artigo 58 - Os edifícios que se construírem na Vila ou sede das povoações serão regulados pelos planos de nivelamento, regras de arquitetura e higiene adotados pelo Governo Municipal. Artigo 59 - Da publicação deste código, as ruas que se abrirem na Vila ou sede das povoações terão 12 metros de largura, no mínimo.

Artigo 60 - As casas que se construírem ou reedificarem terão 4,40 metros de altura a contar da linha térrea a linha do telhado; se o edifício for sobrado, terá, no mínimo, 8 metros de altura. As portas terão 3 metros de altura e 1,10 metros de largura.

Paralela à organização administrativa, faz parte do estágio inicial do Ciclo Carbonífero a urbanização da atual Praça Nereu Ramos, que desde a colonização fora configurada como um largo de apropriação pública (Figura 26). O ajardinamento da praça foi implantado sob a gestão do prefeito Cincinato Naspolini, ainda nos anos 1930, o que atribuiu ao espaço novos significados sociais. Com a igreja e os principais equipamentos administrativos localizados em seu perímetro (a prefeitura e a Câmara de Vereadores, por exemplo), a praça foi adquirindo valores simbólicos e novas apropriações.

Com a instalação das primeiras companhias mineradoras nas proximidades dos afloramentos carboníferos, as ruas que ligavam o centro às minas de carvão, originárias das antigas estradas coloniais, foram gradativamente sendo ocupadas por residências e estabelecimentos de comércio em seus trechos mais próximos à Praça Nereu Ramos. Era o caso da Rua Henrique Lage, ligação viária para as localidades de Santo Antônio e Nova Veneza. Através de registros fotográficos é possível identificar o espraiamento de usos característicos da centralidade desde as primeiras décadas do século XX (Figura 27). Já no lado oposto do centro urbano, a construção e inauguração do Hospital São José (Figura 28) em 1936 tratou de definir um limite à expansão no sentido Nordeste, pela Estrada Cresciuma-Urussanga, visto sua localização a cerca de 600 metros da praça central, no início do aclive delimitador da Microbacia do Rio Criciúma. Para quem se deslocava da praça central, a fachada simétrica da edificação, cuja frente estava voltada para o centro, conformava um ponto focal da rua e um marco limítrofe do perímetro urbano.

Figura 26 - Vista da área central a partir de uma das torres da Matriz São José na década de 1930. Destaque em primeiro plano para a Praça Nereu Ramos.

Nota: 1 - Sociedade Recreativa Mampituba / 2 - Rua Conselheiro João Zanette, a "rua da estação"; 3 - Estação Ferroviária / 4 - Cemitério (outro lado dos trilhos)

Figura 27 - Fotografia da Rua Henrique Lage batida de uma das torres da igreja Matriz São José. À esquerda, o rio Criciúma.

Nota: A foto é datada da década de 1940.

Fonte: Acervo de Nilson de Souza apud NASPOLINI FILHO, 2008.

Figura 28 - O Hospital São José (em destaque) como ponto focal da Rua Cel. Pedro Benedet, originada da Estrada Colonial Cresciuma - Urussanga.

Nota: A foto é datada da década de 1940.

No aspecto econômico, a década de 1930 foi caracterizada pela crescente atuação intervencionista do Estado sobre a produção mineral. "O intervencionismo estatal na ordem econômica acentua-se para criar no país uma estrutura que permitisse ao Estado impulsionar o desenvolvimento econômico nacional, notadamente nos setores da indústria pesada, da exploração mineral, dos transportes e da produção de bens e consumo" (BELOLLI et al., 2010, p. 125). Sob a égide nacionalista de Getúlio Vargas, sucessivos decretos promoveram o uso do carvão brasileiro, a exemplo do Decreto n° 20.089, de 9 de junho de 1931, que, dentre outras normativas, autorizava a Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro e a Estrada de Ferro Central do Brasil a contratar todos os estoques disponíveis do minério. Belolli et al (2010) acrescenta que o carvão importado passou a sofrer sucessivas taxações e que as companhias nacionais estavam obrigadas a comprar 10% (o Decreto-Lei nº 1.828, de 21 de julho de 1937 aumentou esta cota para 20%) de carvão nacional, em proporção ao similar importado.

Ainda sob o contexto político nacionalista, a publicação do Código de Minas no ano de 1934 tratou de regulamentar a extração de carvão e estimular o surgimento de dezenas de pequenas empresas mineradoras. O decreto-lei estipulava o prazo de um ano para o fim do regime de acessão, o qual considerava a jazida mineral pertencente ao proprietário do respectivo lote de terra. Ao fim do período estipulado, os proprietários fundiários que não declarassem as jazidas conhecidas perderiam o direito de extração, passando-as a pertencer aos Estados ou à União. "O Código de Minas foi um dos mais importantes instrumentos legislativos desse período, e tão logo entrou em vigor, impulsionou o setor para uma desenfreada corrida à produção" (BELOLLI et al., 2010, p. 145). A necessidade de manifestar as jazidas e de cumprir a capacidade de extração impulsionou a multiplicação de pequenas companhias mineradoras na região de Criciúma, que ao final da década somavam-se em cerca de quarenta empresas (Idem, 2010).

Toda essa efervescência econômica foi consequentemente destacando Criciúma na hierarquia urbana estadual e, por vezes, elevando a cidade a ponto estratégico de fornecimento de combustível para o desenvolvimento industrial no Sudeste do país. Acompanhando a propaganda e a crescente oferta de trabalho nas minas, a população, que em 1925 era estimada em 8.500 habitantes, saltou para cerca de 27.753 (dado do IBGE) no ano de 1940. De fato, um crescimento vigoroso, mas ainda apenas o prelúdio do intenso processo de urbanização, assistido nos anos seguintes.

4.3 O ART DÉCO, A EXPANSÃO URBANA E A AFIRMAÇÃO DA

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