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Escola de Surdos: espaço de inclusão e desenvolvimento

CAPÍTULO VI PESQUISAS E PRÁTICAS DE GEOGRAFIA PARA SURDOS:

7.2 Escola de Surdos: espaço de inclusão e desenvolvimento

Com relação à Escola de Surdos, inicialmente os professores entrevistados foram questionados sobre como conheceram e começaram a trabalhar nesse espaço escolar. O professor P1 optou por trabalhar em uma Escola de Surdos por já ter o domínio da Libras, gostar da língua de sinais e da cultura Surda. Era professor de História da rede estadual de ensino e foi cedido para a escola, para ministrar aulas de Geografia e História.

A professora P2 optou por trabalhar na escola pela identificação pessoal. A proposta de trabalho também foi considerada, por ser inovadora e considerada adequada para os surdos. A professora P3 começou a trabalhar na escola onde atuava porque levava o seu irmão surdo para estudar e decidiu realizar o estágio nela, no terceiro ano do Magistério. Com a aposentadoria de uma professora, surgiu uma vaga para docente e a mesma foi chamada.

A professora P4 escolheu por trabalhar no ensino bilíngue devido a uma proposta feita pela Prefeitura Municipal. Complementou que: “com o passar dos anos, eu apaixonei pelos alunos Surdos. Amo trabalhar com eles” (P4).

36 Os classificadores referidos pela professora são sinais que não existem na Libras e que são icônicos, ou seja,

A professora P5 afirmou que no segundo ano do curso de Geografia foi convidada para um programa de estágio da Prefeitura Municipal, o qual envolvia a Inclusão. “Pude conviver com pessoas com deficiência e me apaixonei pela área” (P5). Aprendeu Libras com os surdos, durante o Programa, sendo que a escola também oferecia cursos de capacitação para os funcionários. Para aperfeiçoar a Libras, realizou no lugar onde atua os cursos Básico, Intermediário e Avançado, além da pós-graduação. Durante a participação em um dos cursos, a diretora disse que precisava de professor de Geografia. “Fui contratada imediatamente”, afirmou a professora.

Durante as entrevistas, constatou-se que todos os professores possuem uma ligação afetiva com a Escola de Surdos. A Libras e os surdos foram os principais motivadores para iniciarem a atuação na escola, sendo que os professores acreditavam na proposta de ensino e procuravam se especializar na área.

Os professores entrevistados também foram questionados sobre o desenvolvimento dos estudantes surdos nessa escola.

O professor P1 informou que eles se desenvolvem mais na Escola de Surdos, comparada com a escola comum. Justificou que nesse espaço “eles estão imersos em sua cultura, tendo a Língua Portuguesa ensinada como L2”.

A professora P2 acreditava que os surdos se desenvolvem mais na Escola de Surdos, porque há uma metodologia voltada para o ensino de cada disciplina de forma específica, além da importância de que todo professor ministre suas aulas em Libras.

A professora P3, primeiramente, afirmou que o trabalho com esses estudantes no ensino comum é muito difícil, pois a questão não é só a Libras. “A língua de sinais ajuda na comunicação, mas há uma metodologia, o tempo de aprendizado é diferente”. Também informou que as professoras da escola comum, onde trabalhava no turno da tarde, reclamavam sobre as dificuldades de incluir surdos junto com ouvintes. Com relação à presença do intérprete de Libras, disse que “é diferente você com o seu aluno e você terceirizar a comunicação”.

A professora também acreditava que a maioria dos estudantes surdos se desenvolve melhor na Escola de Surdos, principalmente, quando possui a surdez associada a uma deficiência. Justificou dizendo que a Escola de Surdos oferece uma metodologia mais específica para o atendimento dos estudantes.

O que eu vejo na escola regular é que a primeira preocupação, quando se tem um aluno surdo, é a Libras. Pensam: eu tenho que aprender Libras. Mas nem

sempre esse aluno sabe Libras. E as outras tantas coisas que ele precisa? Aqui na escola eles têm um atendimento mais especializado. (P3).

A professora P4 informou que os estudantes surdos estão se desenvolvendo satisfatoriamente na Escola de Surdos, principalmente, porque os conteúdos podem ser explicados em Libras e associados à visualidade. Com relação ao ensino de Geografia, percebia que eles compreendiam os conteúdos e conseguiam relacioná-los com a realidade.

De acordo com a mesma, as avaliações em Libras mostravam que os conhecimentos geográficos, construídos na sala de aula, foram compreendidos pelos estudantes. Afirmou que “nesta escola o aluno adquire mais conhecimentos, por meio de aulas diretas em sua primeira língua” (P4).

Não diferente dos demais professores entrevistados, a professora P5 acreditava que os surdos se desenvolvem mais na Escola Bilíngue, porque o ensino é voltado para eles. Já na escola comum disse que eles são deixados de lado, tanto pela diferença da Língua como pela indiferença dos professores.

Durante sua fala, a professora citou uma situação vivenciada:

Quando estávamos aplicando os questionários para os estudantes hoje, um aluno me disse que o professor simplesmente ia dando a nota, quando estudava na escola comum. Ele disse que era oco, não sabia nada, e ganhava as notas. (P5).

A professora observou que os próprios estudantes reconhecem que o desenvolvimento é mais satisfatório na Escola de Surdos, quando comparado com a escola comum.

Todos os professores de Geografia entrevistados acreditavam que a inclusão dos estudantes surdos nas escolas próprias para eles possibilitam um desenvolvimento maior de suas capacidades. Além da Libras ser utilizada como primeira língua, as atividades são realizadas de acordo com as suas potencialidades visuais, de uma forma bilíngue, ou seja, juntamente com o português escrito.

A professora P4 deixou sua opinião sobre a Educação Bilíngue de surdos:

Os alunos surdos necessitam de mais atenção de nossos governantes para estudarem em escolas bilíngues. Desde os primeiros anos escolares o aluno surdo precisa aprender sua língua, a Libras, e ter conhecimento do mundo e de sua cultura. Por isso, no ambiente bilíngue ele vai adquirir mais conhecimento. (P4).

Acredito que a proposta Bilíngue seja satisfatória, no entanto, não tenho dados concretos para afirmar, visto que é um trabalho recente. É necessário citar ainda que o surdo precisa dispor de uma temporalidade específica. (P3).

De fato, são escassos os estudos que fazem a avaliação e comparação do que é aprendido pelos estudantes surdos na proposta de inclusão em escolas comuns e na proposta da Escola Bilíngue para surdos. Tem-se conhecimento apenas da pesquisa de Andrade (2013), que analisou na escola duas possibilidades de educação de alunos surdos no ensino comum: a) educandos surdos inseridos com todos os alunos em diferentes séries/turmas; b) uma turma formada apenas por estudantes surdos, conforme apresentado no capítulo VI.

Quando questionados sobre a divulgação dos trabalhos realizados nas escolas pesquisadas, todos os professores afirmaram que os mesmos são pouco divulgados. Dois professores disseram que há divulgação pelas redes sociais, como Facebook e Blog, entretanto, ao se buscar essas informações, as mesmas não foram encontradas.

Percebe-se a necessidade de se compartilharem as atividades desenvolvidas e os seus resultados, relacionados à aprendizagem dos estudantes surdos, pois os professores de Geografia estão trabalhando de forma isolada. Eles não conheciam os demais professores de Geografia de Escolas de Surdos, não discutindo com os colegas de área suas experiências e sucessos educacionais.

Sobre a temporalidade específica, citada pela professora P3, de fato o aprendizado dos estudantes Surdos não pode ser comparado ao aprendizado dos estudantes ouvintes. Eles possuem formas diferentes de interação com o mundo. As informações são obtidas pelos estudantes ouvintes desde a infância e a todo o momento, por meio da Língua majoritária da comunidade ouvinte. Em contraponto, os surdos possuem certa limitação para terem acesso às informações, pois são poucos os ambientes e os meios de comunicação que os oferecem a comunicação em Libras.

Sabendo-se que o conhecimento de Geografia perpassa pelos eventos locais e mundiais, aos quais os surdos têm acesso restrito, cabe ao professor de Geografia informar e discutir sobre os acontecimentos cotidianos importantes, muitas vezes televisionados e disponibilizados na Internet, pois são fundamentais para o entendimento de mundo e a prática da cidadania. Na Escola de Surdos, os professores encontram maiores possibilidades de realizarem essas ações, uma vez que a maioria dos estudantes surdos carece de informações complementares às aulas.

O apoio da equipe pedagógica também é fundamental para a realização dos trabalhos com os estudantes surdos. É em conjunto que se discutem as demandas para as melhorias do

ensino, com a possibilidade de elaboração e realização de projetos interdisciplinares. Desse modo, o desenvolvimento de Projetos e ações interdisciplinares também foram pesquisados, assim como o apoio oferecido pela equipe pedagógica das Escolas de Surdos, composta por direção, supervisão, coordenação e demais professores.

Na escola do professor P1, os alunos eram liberados um dia por mês para a realização de reunião pedagógica, onde eram discutidas e aperfeiçoadas as práticas realizadas pelos professores.

Os professores da escola tinham a possibilidade de realizar trabalhos interdisciplinares, com teatro, seminários e palestras. Ocorria com frequência a realização de Projetos, como o “Museu na sala de aula”, e a exibição de materiais iconográficos com legenda, para utilização na sala de aula.

A professora P2 afirmou que a equipe pedagógica – supervisão, coordenação e direção – oferecia acompanhamento e incentivo aos professores, por exemplo, para participarem de cursos de formação. Realizavam-se trabalhos interdisciplinares, planejados nas coordenações coletivas, observando as adequações à metodologia visual e bilíngue.

Os projetos eram elaborados dentro das reuniões coletivas, onde havia discussões. No ano da pesquisa foi realizado um Projeto sobre a história do município, envolvendo todos os segmentos da Escola. Também ocorreu a participação dos estudantes no V Circuito de Ciências, cujo tema proposto foi “Libras: a alcance da Ciência e da Tecnologia, uma luz para a liberdade”. Nesse projeto, houve uma intensa participação dos estudantes, com realização de teatro, decoração de estande, dentre outros.

Durante a visita à escola da professora P2 a pesquisadora também observou a realização de teatros, comemorações ao Dia dos Surdos e diversos cartazes de Geografia, elaborados pelos estudantes e anexados nos corredores da escola.

A professora P3 informou que as reuniões pedagógicas ocorriam mensalmente, com discussões e orientações da direção. Os professores procuravam trabalhar de forma interdisciplinar, tendo como exemplo o trabalho que estava sendo desenvolvido sobre a África. A professora de Geografia utilizou mapas, vídeos e textos curtos durante as aulas, e a professora de Artes desenvolveu, com os estudantes, pinturas e quadros.

A professora P4 disse que a equipe pedagógica da escola era participativa e disposta a trocar materiais e experiências da sala de aula. As reuniões aconteciam quinzenalmente.

Os trabalhos interdisciplinares ocorriam com temas atuais, explicando-se em diferentes perspectivas os acontecimentos do mundo. Também eram celebradas as datas comemorativas, com atividades diferenciadas. Sobre projetos, a professora desenvolveu um

que contemplou o “Dia do Surdo”. O resultado, de acordo com a mesma, foi ótimo, justificando que foram trabalhadas a identidade e a cultura surda.

A equipe pedagógica da escola da professora P5 realizava reuniões mensais, onde os professores e a direção conversavam sobre os estudantes. A professora entrevistada também afirmou que eram realizados trabalhos interdisciplinares pelos professores. No ano de 2016, trabalharam com os estudantes sobre as drogas e as doenças sexualmente transmissíveis. No ano de 2017, estava sendo realizado um projeto de contação de histórias, com temas diversos.

Nota-se que todas as Escolas de Surdos pesquisadas desenvolvem encontros e projetos em que são contempladas as necessidades educacionais dos estudantes surdos. São realizadas discussões e parcerias entre os professores, os quais buscam trabalhar conceitos e temas de forma interdisciplinar.