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Escola, Família e Gestão: uma busca para afinar as relações

CAPÍTULO IV GESTÃO DEMOCRÁTICA: UMA ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

4.4. Escola, Família e Gestão: uma busca para afinar as relações

Por determinação legal e por uma necessidade da escola estar mais próxima à família existe representação desse segmento social no Conselho Escolar. Para tanto, entrevistou-se dois conselheiros que compõem o órgão colegiado da escola fazendo uma adaptação no roteiro da entrevista por considerar a realidade educacional dos mesmos. Nessa direção,procurou-se levar em conta a percepção que os representantes

da família têm sobre a gestão, buscando entender também, como se deu o processo de participação no Conselho Escolar e qual a dinâmica utilizada pelo referido órgão: como as reuniões acontecem, quais os tipos de decisões são tomadas, se as mesmas são colocadas em prática e qual a percepção dos familiares no que diz respeito ao trabalho coletivo.

Na visão dos entrevistados existe harmonia entre direção e vice-direção. Acreditam que o modelo de gestão atual é participativo, pois sempre há reuniões do Conselho Escolar para tomadas de decisões coletivas conforme as falas dos conselheiros transcritas:

A diretora e o vice formam um par perfeito. Sempre quando tem

algum problema eles reúnem o Conselho para decidir em grupo.

(Representante familiar)

A visão que tenho da gestão é que ela é participativa, porque as

decisões não são tomadas sozinhas e sim com a equipe administrativa

(direção, vice-direção e supervisão), e membros do conselho escolar.

(Representante familiar)

Para os representantes dos pais existe uma sintonia entre diretor e vice-diretor, pois os dois formam um “par perfeito” e as decisões não são tomadas sozinhas. Essa visão é contraditória na medida em que a forma de escolha dos pais é por via indireta. De acordo com as entrevistas realizadas o espaço para participação dos familiares no processo de gestão da escola foi aberto por meio de convite.

Fui convidada em reunião de pais em que o espaço para a

participação foi dado a todos os presentes, como não houve

manifestação o vice-diretor fez o convite e eu aceitei. (Representante

familiar)

[...] conferir autonomia à escola deve consistir em conferir poder e condições concretas para que ela alcance objetivos educacionais articulados com os interesses das camadas trabalhadoras. E isso não acontece jamais por concessão espontânea dos grupos no poder. Essa autonomia, esse poder, só se dará como conquista das camadas trabalhadoras. Por isso é preciso, com elas, a reorganização da autoridade no interior da escola (p.11).

Na verdade a forma de acesso e participação dos pais não acontece como uma conquista, ou seja, a escolha de representantes por meio de assembleias. O fato de alguns pais não manifestarem o interesse em participar pode estar relacionado às expectativas negativas que professores, diretor e funcionários têm em relação aos mesmos, ou seja: não são esclarecidos ou representa a terceirização por parte da família do ato de educar. Há de se cuidar para que o convite numa reunião não seja um jogo de cartas marcadas. O pai ou mãe que se manifesta mais ou está mais presente na escola e, além disso, corresponde às expectativas do diretor; professores e funcionários são aqueles que se tornarão os representantes de seu segmento no Conselho Escolar, embora em determinadas ocasiões, seja o diretor quem toma as decisões conforme discussão anterior.

Segundo os participantes da pesquisa o Conselho Escolar decide sobre todo o processo de funcionamento da escola: aplicação de verbas, vida escolar dos alunos, melhoria no espaço físico, entre outros. Ainda, pensam sobre as ações que estão sendo desenvolvidas no contexto escolar e sobre o que ainda é preciso ser feito.

Praticamente tomamos todas as decisões: aplicação de verbas,

transferência de alunos, possibilidades de melhorias para o espaço

físico. Hoje decidimos sobre um parecer judicial que determina a

no pátio e segurança da escola com instalação de grades.

(Representante familiar)

Há consenso na percepção dos procedimentos utilizados nas reuniões do Conselho Escolar. Na opinião dos entrevistados, inicialmente a pauta é apresentada pela direção e há espaço para o debate. Se necessário, realiza-se novas reuniões conforme demanda da situação e após reflexões, defini-se, através do voto, qual a melhor decisão.

Nos reunimos sempre quando é necessário tomar uma decisão ou

então, mensalmente. Em algumas situações temos que nos reunir até

duas vezes ao mês. No início, a pauta é apresentada e todos dão

opiniões sobre o assunto e as opiniões sempre são respeitadas. Só

então, decidimos coletivamente. (Representante familiar)

A diretora mostra a pauta e quais os problemas a serem discutidos.

Às vezes realizamos duas ou três reuniões para discutir e resolver um

único problema. Sempre todos têm oportunidade de dar sua opinião e

cada um vota naquilo que acredita ser o melhor e a decisão é tomada

pelo voto da maioria. (Representante familiar)

É importante ressaltar que a prática de tomar decisões a respeito de alguns assuntos que envolvem o bom funcionamento da escola não quer dizer que as reuniões dos conselhos se constituem espaços democráticos de participação. Se pensarmos do ponto de vista que a escola é uma unidade de um sistema hierárquico e centralizado na SEMED podemos dizer que existe apenas alguns espaços disponíveis e permitidos para a participação de professores, diretores e comunidade.

Lima (1996) destaca que as escolas têm uma relação de dependência com o sistema de ensino, contudo existe uma margem de autonomia que sempre será relativa. A esse respeito o autor escreve:

A subjugação total da escola à imposição normativa, levada a cabo pelo Estado e pelos sistemas globais de controle, transforma-a num campo de reprodução, condenando os atores e despojando-os das suas margens de autonomia e liberdade e das suas capacidades estratégicas. (...) [Por outro lado] a escola não será uma instância hetero-organizada para a reprodução, mas será também uma instância auto-organizada para a produção de regras e a tomada de decisões, expressão possível de atualização de estratégias e de uso de margens de autonomia dos atores (p.31).

É com base nessa margem de autonomia que um dos entrevistados destaca que o trabalho coletivo da escola tem viabilizado o crescimento da unidade escolar. Por meio do Plano de Desenvolvimento Escolar (PDE), que foi construído coletivamente, muito conquistas foram alcançadas como, por exemplo, escola em tempo integral e melhorias físicas no espaço educativo.

Acho que é o Plano de Desenvolvimento Escolar tem ajudado muito a

escola a crescer porque as decisões são tomadas em grupo. Com a

escola em tempo integral conseguimos tirar meninos da rua, alguns

não tinham nem o que comer, fico feliz em participar dessa conquista.

Com os registros do PDE podemos acompanhar o tanto que a escola

vem caminhando, o que o Conselho decide sempre consegue colocar

em prática. (Representante familiar)

Na percepção dos membros conselheiros que representam a família o Conselho Escolar é atuante e suas decisões são colocadas em prática, conforme revela o depoimento abaixo:

Sim, o trabalho coletivo ajuda muito, pois já temos percebido um

retorno positivo em relação à disciplina porque transferimos alunos

temos que voltar atrás. As decisões do conselho sempre são colocadas

em prática como investimentos e melhorias. (Representante familiar)

Segundo Bordenave (1994) mesmo sendo a participação uma necessidade básica, “[...] o homem não nasce sabendo participar. A participação é uma habilidade que se aprende e se aperfeiçoa. Isto é, as diversas forças e operações que constituem a dinâmica da participação devem ser compreendidas e dominadas pelas pessoas” (p.46). Sendo assim, essa discussão, procurou compreender o processo participativo da família no contexto escolar, bem como a percepção da mesma em relação ao envolvimento da equipe com os assuntos que perpassam pelo cotidiano da escola.

A partir dos relatos torna-se evidente que os membros do Conselho que representam os familiares consideram a participação dos pais nos assuntos escolares, muito importante. Os mesmos gostam de se envolver nos processos decisórios, pois ficam atualizados em relação aos projetos da escola e consequentemente fazem parte do crescimento do educandário:

A participação é muito importante porque como mãe fico mais

atualizada em relação aos projetos da escola e sobre o que está sendo

feito. Como mãe e membro do conselho fico mais por dentro ainda, e

me sinto satisfeita em fazer parte do crescimento da escola, e de

ajudar nas decisões. (Representante familiar)

Na visão das representantes de pais a parceria família/escola é fundamental para o desenvolvimento do processo ensino/aprendizado. Acreditam que quando há envolvimento dos pais, os alunos percebem que alguém se preocupa com eles. Porém, ressaltam que a participação da família ainda é muito pequena, revelando que quando ocorrem reuniões, a participação acaba sendo mínima:

Acho a participação dos pais muito importante, nossos alunos são

muito carentes, em tudo, de alimento, de carinho e moradia. Acredito

mais felizes. Eles sabem que alguém se interessa por eles. Acho que se

a família participasse mais, o aluno melhoraria. (Representante

familiar)

Sim, considero importante à participação porque não adianta apenas

colocar o filho na escola e não vir saber o que está acontecendo.

Alguns pais não participam nem de reuniões. Quando há um chamado

em cerca de 800 alunos, não conseguimos a presença nem de 100

familiares. Penso que a parceria família/escola é importante para o

desenvolvimento do aluno. (Representante familiar)

As entrevistas revelam que há sempre um pequeno grupo de pais que participa das reuniões e emite sugestões, porém a grande maioria não é envolvida. Os estratos acima mostram que na visão de uma representante da família a porcentagem de pais que vão à escola é mínima. Identificamos no discurso da entrevistada certa contradição. Conforme dados anteriores, os membros alegaram que cerca de 50% (cinquenta por cento) dos pais são presentes. Se considerarmos a visão da mãe de que aproximadamente o número de alunos da escola é 800 e que apenas cerca de 100 famílias atendem ao chamado da escola, estaríamos falando de algo em torno de 12,5% (doze e meio por cento) de pais presentes e não da metade. Segundo os membros conselheiros representantes dos pais, algumas famílias são tão ausentes que até em momentos culturais da escola em que o próprio filho vai apresentar, elas não prestigiam. Muitos só se fazem presente na escola apenas quando há recebimento de algum benefício do governo, seja em âmbito federal como o Programa Bolsa Escola ou de âmbito municipal como entrega de material escolar, por exemplo.

Há um grupo que está sempre presente nas reuniões, que participa e

discute os assuntos sugeridos pela escola, mas é sempre o mesmo

grupo, nem todos participam.(Representante familiar)

Quando tem apenas reunião eles não vêm, até em auditórios em que o

próprio filho vai apresentar eles não aparecem! (Representante

familiar)

Podemos dizer que embora os membros do conselho considerem a participação relevante, essa participação configura-se como um grande desafio da escola. Tradicionalmente, o processo ensino/aprendizagem ficava restrito no âmbito da escola. Todavia, o artigo 12 da LDBEN9394 ao tratar da incumbência dos estabelecimentos de ensino preconiza a articulação da escola com as famílias e a comunidade por meio de processos de articulação com a sociedade, ou seja, a participação é estimulada pelo governo e representa um direito democrático.

Tomando como base os depoimentos dos atores pesquisados em relação à participação do corpo docente nos assuntos escolares, a equipe de professores da escola é muito boa, envolvida com os assuntos escolares, interessada pelos alunos e que busca melhorias constantes para a organização escolar. Na visão de uma conselheira, aproximadamente 10% (dez por cento) dos professores não demonstram o mesmo envolvimento, contudo está satisfeita com o corpo docente. É oportuno comentar que mais uma vez surge contradição nos dados. Na visão da maioria dos membros conselheiros que fazem parte da comunidade escolar 30% (trinta por cento) dos professores não se envolvem de maneira efetiva. Talvez, essa divergência possa ocorrer em virtude da família não estar em todas as situações escolares. Contudo, o presente estudo não tem base para elencar tal desvio uma vez que priorizou o entendimento do processo de maneira global e não tão demarcada pela estatística.

Quanto à participação dos discentes nos assuntos escolares, nota-se que na visão dos entrevistados os alunos são participativos, mas que não há clareza dos processos de participação por parte dos membros conselheiros que representam a família. Esse dado pode ser confirmado no trecho a seguir:

Os alunos são participativos quanto à abertura para sugestões em

deles, pois, não participei de nenhuma reunião com eles.

(Representante familiar)

Embora a participação dos membros conselheiros representantes da família tenha se consolidado por meio do convite e não da assembleia, na visão dos mesmos, a participação deles no processo de gestão escolar é uma opção e não uma imposição hierárquica. Nota-se ainda, que existe abertura para exposição de opiniões e tomada de decisões em todas as reuniões:

A participação dos membros do conselho é uma opção e todas as

reuniões são abertas para que todos deem opiniões e tomem decisões.

(Representante familiar)

Os conselheiros participam porque acreditam que podem ajudar a

escola a melhorar, é uma opção não uma imposição. (Representante

familiar)

A busca por objetivos comuns por parte da comunidade escolar suscita autonomia para diagnosticar a realidade, fazer levantamento das concepções do coletivo ao instituir qual a identidade a escola anseia construir, bem como para definir as prioridades com as quais a equipe da escola irá se comprometer para a superação dos desafios presentes em seu cotidiano. Em que pese os relatos supracitados, pode-se então inferir que, a escola pesquisada tem apresentado esforços no sentido de ampliação do exercício democrático como princípio, contudo, sua autonomia ainda é limitada, pois esbarra no modelo educacional do município que ainda apresenta características burocráticas e centralizadoras.

CAPÍTULO V - CONSELHO ESCOLAR: UMA VISÃO