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“[...] Agora temos leis que falam de educação indígena. As leis estão do nosso lado e nós vamos lutar para que elas sejam cumpridas”. (Professora Maria de Lourdes, Guarani/MS)

A Constituição de 1988 representa uma mudança de paradigma, pois em seu artigo 231 fica claro ser o Brasil uma República Democrática, já que o mesmo é considerado na referida Constituição como sendo formado de modo plural, constituído por diferentes povos com culturas diversas e, sendo reconhecida à antecedência dos grupos étnico-indígenas ao processo de formação do Estado brasileiro e, portanto, com direito originário sobre as terras que tradicionalmente ocupam.

78 Cf. Tese de Doutorado de Luís Donisete Grupiani: Olhar longe, porque o futuro é longe-

cultura, escola e professores indígenas no Brasil. Universidade de São Paulo, São Paulo: 2008, 240p. Disponível em: <.http://www.usp.br/nhii/biblioteca/LuisDoniseteGrupioni2009.pdf >. Acesso em: 3 Jan. de 2018, às 13:21:21. Luís Donizete Benzi Grupiani

O que se teve antes de 1988, no que se refere à educação aos indígenas desde a colonização com as ordens católicas, como os jesuítas e franciscanos, por exemplo, passando pelo período “pombalino”, foi uma educação que não levou em consideração os saberes dos povos originários. Muito pelo contrário, foi uma política que buscou transformá-los em colonizados, cristãos e mão de obra a serviço do Estado que lhes tomou a terra.

Retomando a questão, o fato é que a educação escolar indígena passa a ser de responsabilidade do Ministério da Educação, as propostas e ações de políticas públicas saem da esfera do Ministério da Justiça, através da Fundação Nacional de Apoio ao Índio – FUNAI - ficando ao encargo do Ministério da educação pensar e construir as diretrizes e, as Secretarias de Educação das Unidades da Federação, bem como as Secretarias de Educação Municipais, ficaram responsáveis pela execução, neste caso, as duas últimas devem trabalhar em regime de cooperação79.

Ao se pensar comparativamente nas formas de internato da escolarização católica, constatando-se que em muitos casos eram proibidas nas escolas das aldeias serem faladas as línguas maternas, onde quem se comunicasse através delas, era severamente castigado se percebe que a situação escolar pouco mudou quando o órgão responsável era o Sistema de Proteção aos Índios, no caso do povo aqui estudado, o povo Karitiana, há relatos80 sobre maus tratados sofridos pelos Karitiana

quando houve o processo de sedentarização no início dos anos setenta, quando da implantação do primeiro Posto Indígena. Em decorrência, constata-se que esta escolarização não pode ser conceituada como indígena.

Em reconhecendo o que, de fato, representava o Instituto Linguistico de Verão em suas aldeias, as lideranças em parceria com organizações não governamentais, entre outras o Conselho Indigenista Missionário buscou, por um lado construir formas próprias de alfabetizar, realizando uma parceria com o povo Karitiana e mediando o diálogo dos mesmos com a Secretaria de Estado da Educação quando, na oportunidade, uma missionário atuou no Núcleo de Educação Escolar Indígena – atual Coordenação de Educação Escolar Indígena – consegiu que jovens indígenas estudassem na aldeia, por meio de módulos, o ensino fundamental e realizassem as provas na cidade, no Instituto de Educação de Jovens e Adultos Padre Moreti e, por outro, de modo

79 Dados obtidos no portal do MEC. Disponìvel em:<

http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/vol4c.pdf>. Acesso em: 5 ago 2018.

organizado pressionaram os constituintes a fazerem com que os povos indígenas pudessem ter autonomia enquanto sujeitos históricos, sociais, culturais e, no caso aqui específico, educacional. Enfatizamos o fato de que a maioria dos jovens, hoje são professores indígenas que desenvolvem suas atividades como docentes nas escolas indígenas Karitiana.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Básica Nacional de nº. 9394/96 (BRASIL, 1996) e demais instrumentos legais surgidos depois de seu advento, de um modo geral e, no caso específico da educação escolar indígena, os Movimentos Indígenas e o Movimentos de Apoio às causas dos mesmos conquistaram avanços perceptíveis.

No Título I I da Constituição Federal de 1988 que trata “Da Organização do Estado”, em seu Capítulo I que especifica o que são patrimônios da União, o artigo 20 estabelece que “São bens da União”: “XI – as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”; já o artigo 22 reza que “Compete privativamente à União legislar sobre: XIV – populações indígenas. ” Já o artigo 49, contido na seção II do capítulo I, presente no Título IV, que trata da organização dos Poderes, possui a seguinte redação: “É da competência exclusiva do Congresso Nacional: XVI – autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais. O Capítulo III – Do Poder Judiciário em sua seção IV – Dos Tribunais Regionais Federais e dos Juízes Federais cujo artigo 109 dispõe “Aos juízes federais compete processar e julgar: XI – a disputa sobre direitos indígenas. (BRASIL, 1998)

Além das legislações acima descritas, após o Ministério da Educação – MEC - ficar com a incumbência da escolarização dos grupos étnico-indígenas diferentes documentos foram constituídos, como a Resolução da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação – CEB/CNE nº 3 de 10/11/99 – que estabelece diretrizes nacionais para o funcionamento das escolas indígenas, Parecer nº 14/99. Além desses, o Plano Nacional de Educação: Lei 10172/2001 possui um capítulo específico sobre a educação escolar indígena, capítulo nove. Todos estes documentos reafirmam o compromisso do Estado brasileiro em relação à escolarização dos povos indígenas. (BRASIL, 2001)

O MEC também elaborou documentos-chave para que os princípios estabelecidos na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Base pudessem ser colocados em prática, assim, elaborou-se o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas em 1998 - RECENEI, os Referenciais para a Formação de

Professores Indígenas que já se encontra em sua segunda edição, editando a primeira no ano de 2002, e a segunda no ano de 2005, também foi elaborado um material com as Leis e a educação escolar indígena do programa Parâmetros em Ação de Educação Escolar Indígena com organização de Luís Donisete Benzi Grupioni.

Dois outros fatos não podem ficar ausentes desta análise, um é o Parecer de 29 de novembro de 1999 da Assessoria internacional do MEC sobre o Summer Institute of Linguistics (SIL), onde o Ministério da Educação estabelece sua posição em relação à atuação educacional deste instituto nas áreas indígenas, deixando claro que o Estado brasileiro é laico e a educação escolar de um modo geral não deve se confundir com religião e, no caso específico dos povos indígenas, devem ser respeitados todas as manifestações tradicionais, com firmeza, este parecer evoca o que estabelece o Estatuto do Índio em seu capítulo 11, artigo 58 no qual preconiza ser “crime contra os índios e a cultura indígena escarnecer de cerimônia, rito, uso, costume ou tradição cultural indígenas, vilipendiá-los ou perturbar, de qualquer modo, a sua prática.” (BRASIL, 1973)

Um segundo fato de que não pode ser esquecido é a Portaria nº 1062 de 16 de agosto de 2008, que convoca os órgãos gestores da educação nos estados, municípios, instituições indigenistas, movimentos e instituições indígenas, as universidades, instituições científicas ligadas à temática indígena e todas as outras instituições comprometidas com as garantias plenas de direitos indígenas à Primeira Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena, onde a mesma leva em consideração o Decreto 5.051, de 19 de abril de 2004 que promulgou a Convenção nº169 da Organização das Nações Unidas – OIT-, sobre “os Povos Indígenas e Tribais, o qual determina a consulta aos povos interessados, mediante procedimentos apropriados e de boa-fé, para que haja acordos e consentimentos acerca de medidas propostas que os afetem e para que determinem suas prioridades.” (BRASIL, 2004) Desta conferência se construiu as diretrizes para uma educação escolar indígena.

4.2 Territórios Etnoeducacionais e o Desafio da implantação de uma política de