• Nenhum resultado encontrado

Escolas Normais da Província de Minas em

Autor: André Luís Oliveira

O mapa anterior permite-nos concluir que havia uma concentração de instituições normalistas no sul do território mineiro. Das nove existentes a época, cinco localizavam-se mais ao sul, sendo elas as Escolas Normais de Sabará, Ouro Preto, São João Del Rey, Juiz de Fora e Campanha. A Escola Normal de Uberaba era a que se localizava mais a oeste do território mineiro e ao lado da de Paracatu e de Montes Claros era a mais distante da capital da Província. Isso nos permite afirmar, dadas as condições de transporte e comunicação do período, que a interlocução entre elas e o governo era mais difícil, se comparadas às demais.

O advento da República trouxe uma nova configuração literária para o Estado40, que

deixaram de chamar circunscrições literárias para chamar circunscrições escolares. Em 19 de dezembro de 1893, foi sancionada a Lei nº 77, dividindo Minas Gerias em 10 circunscrições escolares, tendo por sede cidades em que haviam Escolas Normais, o que significa que, além das nove citadas, havia sido criada, durante o Novo Regime, mais uma Escola Normal, tratando- se da Escola Normal de Barbacena41. “A mesma Lei criava os cargos de inspetores escolares de

circunscrição” (MOURÃO, 1962, p. 22).

Se, durante muito tempo, Minas contou apenas uma instituição para a formação e licenciamento de professores, ou seja, com a Escola Normal da capital, esse número foi

40 Com a República as províncias passaram a ser denominadas estados. 41 Criada pela Câmara Municipal da cidade (MOURÃO, 1962, p. 22).

67

aumentado, a partir de 1871, com a criação da Escola Normal de Campanha, no sul da Província. O ano de 1881 foi marcado pela criação de três novas Escolas Normais em: Sabará, Juiz de Fora e Uberaba.

Quanto a Escola Normal da capital, vimos no quadro 01 que ela foi criada em 1835 e instalada em 05 de março de 1840. Sua criação deu-se a partir do artigo 7º da Lei nº 13, de 28 de março de 1835, que determinava o estabelecimento de uma instituição do gênero na capital. O modelo para a Escola Normal de Ouro Preto foi a França, “[...] cujo ensino sem dúvida serviu de molde a toda a instrução primária, secundária e normal do Império nascente” (MOURÃO, 1959, p. 32). O primeiro diretor da instituição, o professor Francisco de Assis Peregrino, fora encarregado, pelo governo da Província, de opinar sobre métodos de ensino e modificações a serem adotadas para melhor organizar a instrução em Minas. Segundo Paulo Krüger Corrêa Mourão (1959, p. 18), esse professor estivera na França para observar as novas tendências do ensino, com seus manuais e métodos e, de volta ao Brasil, foi encarregado de aplicá-los em Minas. Tal situação

[...] mostrava claramente a tendência francesa do ensino que aí fosse ministrado, pois tratava-se de um professor de formação francesa que, no ano anterior, havia apresentado ao governo extensa memória sôbre o ensino simultâneo que êle próprio havia observado na França. A escola, certamente, seria orientada no sentido de formar mestres especialistas no método de ensino simultâneo, pois notava-se, na época, uma reação contra o ensino individual, método considerado obsoleto e inadequado a classes numerosas (MOURÃO, 1959, p. 33).

No trecho aludido, Paulo Krüger Corrêa Mourão faz referência à formação francesa recebida pelo professor Francisco de Assis Peregrino, mencionando os métodos de ensino simultâneo e individual. Tendo sido adotado naquele momento em Minas, de acordo com esse autor, o ensino simultâneo. Dedicaremos uma parte do capítulo 03 para analisar a metodologia de ensino. Certamente o período de cinco anos, entre a criação da Escola Normal de Ouro Preto e sua instalação, em 1840, deve-se à estadia de seu primeiro diretor na França, tendo apresentado ao governo mineiro, em setembro de 1839, após seu retorno, um relatório “discorrendo sobre sua experiência e suas observações nas escolas de Paris”, que intitulou de Memórias (PEDRUZZI, 2016, p. 43).

Fato é que com gratuidade de matrícula, a Escola Normal de Ouro Preto, realizou a formação de professores primários por três anos, sendo fechada, em 07 de setembro de 1842, dois anos depois de sua instalação, e, “[...] reaberta cerca de cinco anos mais tarde, isto é, em princípios de 1847”. Numa situação de clara intermitência.

68 Mesmo com essa situação,

Efetivamente, numerosos documentos mostram que freqüentemente eram mandados professores primários do 2º grau à capital para fazerem um curso intensivo, na Escola Normal, a fim de se prepararem para o ensino misto, modalidade que participava o ensino simultâneo e mútuo42 (MOURÃO, 1959, p. 34-35).

Além de receber os professores da Província para fazerem um curso intensivo, segundo Jumara Seraphim Pedruzzi (2016, p. 142), no que se referia ao currículo, ao regimento e ao corpo docente, a Escola Normal de Ouro Preto serviu de modelo aos projetos de criação dos demais centros normais da Província, tratando-se de uma instituição modelar para o restante da Província. A Lei nº 2.783, que criou a Escola Normal de Uberaba dizia que o curso desta Escola Normal compreenderia “as matérias que formam o curso da escola normal da capital” (SAMPAIO, 1971, p. 381).

Tal situação demonstra a centralidade desempenhada pela Escola Normal de Ouro Preto, não apenas no que diz respeito à preparação e autorização de professores para o exercício do magistério, em Minas, mas também enquanto referência a ser seguida. Esse fato deve-se, em grande parte, a ela ter sido a única do gênero em Minas, até 1871, quando foi criada a Escola Normal de Campanha, no sul de Minas. Posteriormente, surgiram a de Diamantina, em 1878; as de Montes Claros e Paracatu, em 1879; as de Uberaba, Sabará e Juiz de Fora, em 1881 e a de São João D’El Rey, em 1883. Totalizando nove instituições normalistas, número que foi ampliado na última década do século XIX, conforme demonstra o mapa 02.

42 Paulo Krüger Corrêa Mourão (1959, p. 35), diz que no segundo período de existência da Escola Normal de Ouro

Preto, a preparação de professores parece ter sido direcionada para o ensino misto, diferente da primeira fase quando prevaleceu o ensino simultâneo. Quando aos métodos de ensino, dedicaremos uma parte do capítulo 03 para essa questão. Indicamos o capítulo VI da obra do citado autor, O ensino em Minas nos tempos do império.

69 Mapa 02 – Escolas Normais em Minas Gerais em 1894

Autor: André Luís Oliveira

Nesse mapa percebemos a presença de 15 Escolas Normais em Minas, a maioria delas situadas na parte sul do território; mas também indica a criação de mais uma no norte do território mineiro, a Escola Normal de Januária. Assim, num prazo de 54 anos, o salto de 01 instituição, em 1840, para 15, em 1894, evidencia que, naquele momento o modelo encontrava boa aceitação entre a classe governante.

A partir da obra O Ensino em Minas Gerais no Tempo da República, de Paulo Krüger Corrêa Mourão (1962, p. 22 e 31) traçamos um panorama da expansão das Escolas Normais em Minas, que teve a seguinte sequência: o ponto de partida foi a Escola Normal de Ouro Preto (1835), Campanha (1871), Diamantina (1878), Montes Claros (1880), Paracatu (1880); Uberaba (1881), Sabará (1881), Juiz de Fora (1881), São João Del Rey (1884), Barbacena (1893), Três Pontas (1894), Cataguazes (1894), Januária (1894), Pouso Alegre (1894) e Itajubá (1894). Temos a hipótese de que haviam outras, mas reiteramos que faz-se necessário um trabalho que sistematize tal movimento, não apenas em Minas, mas em todo território brasileiro. A expansão desse modelo de formação de professores, demonstra que o governo, ainda que questionasse as deficiências do sistema, acreditava na proposta. Segundo Walquíria Miranda Rosa (2004, p. 21), as Escolas Normais tinham por objetivo formar um modelo de professor, ou seja, um profissional que substituiria o antigo mestre-escola.

70

Das 15 instituições elencadas, destacaremos uma para a reflexão final desse capítulo primeiro. Capítulo em que o foco da lupa foi amplo. Situação justificada na necessidade de se observar o iceberg como uma totalidade. Refletiremos introduzindo nossa abordagem ao capítulo 02, sobre a Normal de Campanha, a segunda instalada em Minas. Será uma abordagem sucinta e pautada em duas razões: em primeiro lugar por que entendemos ser a Escola Normal de Campanha a primeira a ser criada no fim do século XIX e tratou-se a válvula propulsora das 14 demais surgidas após ela. Em segundo lugar identificamos nela uma semelhança com a Escola Normal de Uberaba, que acreditamos valer para as demais. Trata-se de sua atração regional.

Segundo Maria Cristina Lage (2006, p. 05), a “Escola Normal de Campanha, a segunda instalada em Minas Gerais, foi criada pela Lei Provincial nº 1769 de 1871”, que entrou em funcionamento em setembro de 1873,

[...] recebeu alunos de diversas cidades da região sul mineira. Este fato pode ser comprovado através dos diversos anúncios de jornais que ofereciam vagas de hospedagem dos normalistas em casas de famílias da cidade. Através dos relatórios de presidentes de Província de Minas Gerais também percebe-se que a matrícula neste estabelecimento superou muitas vezes em números o total de matriculados na Escola Normal de Ouro Preto.

Assim como a Escola Normal de Campanha recebeu alunos de diversas cidades da região sul mineira, a Escola Normal de Uberaba acolheu interessados de diversas cidades do Triângulo Mineiro. O que nos permite concluir que estas instituições exerciam uma centralidade regional. No que se refere à Escola Normal de Uberaba a ilustração a seguir (Figura 01), retirada de uma de suas atas de exame, demonstra, se não a procedência, o destino de dois candidatos ao magistério. Um iria para o município de Monte Alegre e o outro para o município da Bagagem.

71 Figura 01 – Ata de exame de candidatos ao magistério

Fonte: APM, códice, IP 157 (grifo nosso)43.

A cópia da ata ilustrativa evidencia que a escola foi, além de um polo formador de normalistas, habilitadora de professores para a região do Triângulo. O texto faz alusão a um exame ocorrido no dia 30 de novembro de 1882 em que os candidatos “[...] Elisário Ribeiro de Vasconcelos e Antônio Augusto de Affonseca, inscriptos o 1º para a Cadeira de instrucção primária, do 1º gráo, da Freguesia de Santa Maria, do Município de Monte Alegre, o 2º para igual Cadeira da Freguesia do Sant’Anna do Rio das Velhas, do Município da Bagagem” (APM, códice IP 157, grifo nosso).

Além das localidades e candidatos citados, encontramos atas de exames que citam, Araxá, Frutal, Monte Alegre, Patrocínio, Prata, Sacramento, Uberabinha e outros munícipios (APM, códice IP 157). Tais documentos demonstram que havia um deslocamento para Uberaba de pessoas de diversos locais do Triângulo Mineiro e até mesmo do sul de Minas, com o intuito de obter a certificação para atuarem no magistério ou para frequentarem a Escola Normal,

43 A página integral desta ata encontra-se sobre o título de Anexo 01 no final deste trabalho e, assim como esse, os

72

tornando-se normalistas. Nessa perspectiva, afirmamos que Uberaba passou a exercer uma centralidade, enquanto polo habilitador e formador de professores para a região. Afinal, formar professores normalistas e habilitar candidatos ao magistério era uma das tarefas das Escolas Normais. Pois, para tornar-se professor, em Minas, o indivíduo deveria “frequentar a Escola Normal” (ROSA, 2004, p. 13).

A Escola Normal de Uberaba era a única da região e a que se localizava mais a oeste da Província, houve uma intensa procura por seus serviços. Situação que ficou clara no primeiro livro de atas de exame (APM, códice IP 157). Fato é que, ainda que tenha havido uma razoável expansão do modelo, as instituições normalistas mais próximas estavam, uma em Paracatu, cidade localizada 391 km de Uberaba e outra em Campanha, localizada à 495 km. Assim, no período estudado, para o indivíduo habilitar-se ao magistério ou tornar-se professor normalista, na região do Triângulo Mineiro, Uberaba era o caminho mais viável.

A necessidade de prestar exame na Escola Normal, para atuar como professor em Minas, fora reforçada pelo Regulamento nº 28, de 1854, que dizia que ninguém poderia ensinar

[...] sem ter prestado exame público em que provasse sua capacidade para o magistério. Contudo, o Presidente da Província poderia dispensar de prova de capacidade aos candidatos ao magistério reconhecidamente competentes para essa tarefa. No Regulamento nº 49, os candidatos ao magistério primário deveriam ser examinados perante os inspetores paroquiais (MOURÃO, 1959, p. 111).

A ideia de que, “o Presidente da Província poderia dispensar de prova de capacidade aos candidatos ao magistério reconhecidamente competentes” sem a necessidade de exame justificava-se, em meados do século XIX, no fato de haver, em Minas, apenas uma Escola Normal; mas não se justificava no final dele, pois, conforme já dissemos, na última década desse século o Estado contava com mais de 15 Escolas Normais.

A proposta desse capítulo foi a de traçar uma visão panorâmica do movimento das Escolas Normais, de suas origens até o processo de expansão do modelo na Província de Minas Gerais, no fim do século XIX. No capítulo seguinte diminuiremos nossa lupa para enxergarmos melhor aquela que é nossa ponta do iceberg do movimento de escolarização. Movimento intensificado com a criação e instalação da Escola Normal de Uberaba e que, por meio dela, rumava para os sertões do Brasil. O aprofundamento no estudo dessa instituição de formação de professores, que atuava no letramento, pois junto a ela existiu uma escola anexa; no licenciamento para mestres que já trabalhavam no magistério e na realização de exames de

73

capacidade para a ocupação de outros cargos públicos, sobretudo ofícios ligados à justiça; nos permitirá entender o real papel dessas instituições e da instituição em questão.

Finalizamos este capítulo corroborando com a afirmação de que a Escola Normal de Uberaba surgiu num tempo marcado “[...] por avanços e retrocessos, embates ideológicos, utopias e contradições” (RICCIOPPO FILHO, 2007, p. 35). A criação e instalação da instituição foi um avanço e seu fechamento, em 1905, um retrocesso. Tratou-se de tempo em que pulularam ideias e enfrentamentos ideológicos entre republicanos, monarquistas e até socialistas; entre os defensores da religião e os defensores do Estado laico44. Um tempo de profissionalização da

docência e de novidades, como a da coeducação e da ascensão feminina ao magistério. É na perspectiva da reflexão sobre esses elementos que vamos adentar na Escola Normal de Uberaba. Ao abordar a instituição iniciaremos pelo seu primeiro ato, ou seja, sua criação e sua instalação. Antes contudo faremos alguns apontamentos do porquê o município de Uberaba fora escolhido para sede da primeira a Escola Normal instalada no Triângulo Mineiro.

74

CAPÍTULO 02: A ESCOLA NORMAL E O INÍCIO DA