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É em um ambiente de interação real e virtual que ocorre a comunicação de todos os agentes da sociedade, conceituado por esfera pública, que se constitui no “[...] conjunto de espaços físicos e imateriais em que os agentes sociais podem

efetivar sua participação no processo de comunicação pública” (MATOS, 2007, p. 52).

Há, contudo, dificuldades de gerenciamento, acompanhamento, registros e análises dos fluxos de informação, pois a esfera pública pode ser composta pelos veículos de comunicação de governos e representantes políticos, sociais e religiosos, porém reduzi-los pode afastar os pressupostos da comunicação pública, como interesse e utilidade pública das informações.

Para Matos (2007), é necessário que todos os atores da esfera pública assumam a tarefa reservada por Zémor (2005) como sendo das instituições públicas, pois é “[...] preciso sair do círculo concêntrico em torno do governo, deixando que o Estado e também a sociedade assumam a responsabilidade da comunicação pública” (MATOS, 2007, p. 54).

Como política considerada de “inclusão informacional” e de democratização do conhecimento, a autora enfatiza que somente ocorre comunicação pública:

Se todos os agentes participam do debate das questões de interesse e utilidade comum, se essa participação é possível graças a existência de uma infra-estrutura que materializa a esfera pública, se eles se sentem aptos e motivados a participar graças à cultura de valorização de seu papel social, se os critérios de instituição e processo do debate são claros e equitativos, então será possível preencher os requisitos mínimos para o reconhecimento da comunicação pública. (MATOS, 2007, p. 56).

Já Monteiro (2007) corrobora com a discussão sobre a esfera pública ao afirmar ser o "[...] ambiente de expressão e de mediação em que ocorrem as trocas de informação, os conflitos, as negociações, as relações entre emissor e receptor na comunicação pública".

A autora destaca que a marca e a diferenciação dessa comunicação em relação às demais praticadas pelas organizações são tentativas de criar ambientes de diálogo entre emissores e receptores, onde criam-se espaços de cidadania por meio da troca de ideias em audiências e conferências públicas, demonstração do comprometimento institucional com as questões de interesse da sociedade e vias para ouvir as demandas da sociedade.

Ao contrário do que ocorre nas mais diversas vertentes de comunicação, cuja divulgação de informações tem efeito efêmero e imediatista, na comunicação pública os resultados não são percebidos a curto prazo, tendo em vista que a relação entre emissor e receptor demora um pouco mais para se estabelecer e alcançar seus objetivos, pois envolve, além da informação, a qualificação do “[...] cidadão para

exercer seu poder de voz, de voto e de veto nas questões que dizem respeito à coletividade” (MONTEIRO, 2007, p. 40).

3.2.1 Do interesse público

As novas tecnologias de informação e comunicação têm ampliado o espaço da comunicação pública, por meio de novas formas de accountability, entendida por Novelli (2006) como um processo de responsabilização de políticos e administradores no desenvolvimento da cidadania e estímulo à participação popular. O termo pode ser compreendido ainda como o envolvimento de atores da sociedade divulgando suas ações, como desempenham, quais os resultados alcançados e possíveis consequências, visando ao conhecimento e ao debate dos temas de interesse público entre sociedade e Estado (MATOS, 2007).

A interação concebida como ação pública desempenha um importante papel de mediação para a governança, forma adotada pelo Estado para implementar seus projetos, viabilizando a participação da sociedade no debate, elaboração e condução das políticas. Novelli (2006) afirma que este caminho extrapola a visão da comunicação apenas como instrumento de disseminação de ações e políticas e “[...] passa a ser concebido como parte intrínseca dos projetos e programas desenvolvidos pelo governo. Esse tipo de programa está relacionado à promoção da cidadania e da participação do que com a divulgação institucional" (NOVELLI, 2006, p. 87).

Há correntes que defendem que não haja separação entre os interesses públicos e privados por estar diante de uma sociedade globalizada, interligada em rede e com informações que chegam rapidamente aos meios de comunicação de massa e aos cidadãos.

Para Bueno (2007), a comunicação pública ou de interesse público passa longe de ações oportunistas e inconsequentes de governantes e empresas que privilegiam interesses pessoais e lucros em detrimento das demandas do cidadão. Para seu exercício efetivo é necessário incorporar a diversidade, o social, a cultura, a transparência e compromissos “[...] com a credibilidade nas relações de consumo e com a qualidade de vida dos cidadãos” (BUENO, 2007, p. 150).

De acordo com este autor, as decisões e a implementação de medidas públicas ou privadas que impactam negativamente a comunidade e setores específicos são hoje melhor acompanhadas pelo consumidor, sociedade civil

organizada, movimentos e grupos sociais e repercutem na “arena pública”. Sobre a convergência entre os interesses públicos e privados, Bueno acrescenta que:

Diante desse desafio, urge que os profissionais, as empresas, os governos e a mídia se mobilizem e estejam capacitados para que, com competência e coragem, viabilizem a legítima comunicação pública ou de interesse público. (BUENO, 2007, p. 151).

Já Elizabeth Breese, socióloga norte-americana, em seu artigo Mapping the

Variety of Public Spheres (2011), prefere se referir ao termo esferas públicas (grifo

original) em vez de a esfera pública para definir a multiplicidade de públicos, instituições, grupos e meios de comunicação, que atuam na sociedade por meio de seus discursos, ações, representações e críticas.

O conceito de esfera pública começou a ser discutido pelo filósofo, sociólogo e um dos principais herdeiros da Escola de Frankfurt, Jürgen Habermas, em sua obra The Structural Transformation of the Public Sphere. Este autor declara que, na esfera pública burguesa na Europa, indivíduos e grupos criticam o Estado e discutem questões de debate de interesse comum. Breese (2011) caracteriza a esfera pública de Habermas como uma espécie de debate crítico que se contrapõe às formas anteriores de práticas baseadas no poder hereditário e status social. Esta autora analisa o conceito de esfera pública de Habermas:

Neste texto fundamental, Habermas traça os detalhes históricos e sociológicos da ascensão e incompleta prosperidade da esfera pública burguesa na Europa. A esfera pública está num domínio separado do Estado, da economia formal, e da família. Interesses privados, como o ganho monetário, e os interesses do Estado na administração e na ordem, interpretada de forma restritiva, não são as principais preocupações da esfera pública. Na esfera pública, os indivíduos, ao invés de agentes do Estado, reúnem-se para participar como cidadãos. BREESE, 2011, p. 131)27.

Por considerar restrito o termo esfera pública, Breese (2011) considera mais confortável incorporar o conceito esferas públicas política e civil, aproximando-se de Hannah Arendt, em A condição humana, pois se caracteriza pela participação, pluralidade, convicções, ênfase na ação sobre o discurso, em espaço aberto a todos os que desejam contribuir independentemente do status social ou identidade. Ela

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Tradução nossa: In this foundational text, Habermas traces in historical and sociological detail the rise and incomplete blossoming of the bourgeois public sphere in Europe. The public sphere is a separate realm from the state, the formal economy, and the family. Private interests, such as monetary gain, and state interests in administration and order, narrowly construed, are not the primary concerns of the public sphere. In the public sphere, private individuals, rather than agents of the state, come together to participate as citizens. BREESE, 2011, p. 131).

compreende na esfera pública política movimentos sociais, meios de comunicação que monitoram e criticam o Estado e grupos que atuam politicamente. Já na esfera pública civil, incluem-se associações, organizações não-governamentais e grupos sociais. Sobre este assunto, a autora enfatiza que:

Indivíduos envolvidos nas esferas públicas políticas organizam a si mesmos e seus objetivos vis-à-vis com o Estado, enquanto os indivíduos engajados em esferas públicas cívicas emergem e se orientam em direção à esfera privada, que engloba as interações familiares e amizades e as atitudes sociais com respeito à solidariedade e condições sociais. A existência de esferas públicas políticas se opõe à inércia e à subjetividade acrítica, enquanto a existência de esferas públicas cívica, ao isolamento social. (BREESE, 2011, p. 136)28.

Independentemente de adotar o conceito "a esfera pública" ou "esferas públicas política e civil", este último defendido por Breese, compreende-se que há espaço na sociedade que incorpora a diversidade de públicos e atores, culturas, convicções e ideologias, transitando entre o campo político e civil, e que podem eventualmente migrar de um grupo a outro. O elemento que os coloca em relacionamento é a comunicação.