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A ESFERA PÚBLICA, A DELIBERAÇÃO DEMOCRÁTICA E O PAPEL DA COMUNIDADE DE PESQUISA

CAPÍTULO I ABORDAGEM METODOLÓGICA 27 1.1 OBJETIVOS

REPOSITÓRIO 2010 2011 2012 2013 2014 2015 T0TAL

3.3 A ESFERA PÚBLICA, A DELIBERAÇÃO DEMOCRÁTICA E O PAPEL DA COMUNIDADE DE PESQUISA

Embora seja muito difícil fazer justiça ao trabalho de Habermas neste curto espaço, é importante manifestar aqui o pensamento dele acerca da democracia e da “esfera pública”20

procurando relacionar ao campo de pesquisa educacional.

Dentro de uma concepção discursiva, comunicativa e deliberativa inaugurada por Habermas, a democracia discursiva/deliberativa21 propõe os diferentes processos de participação pública na tomada de decisões. A democracia discursiva/deliberativa do autor defende que o exercício da cidadania amplia-se para além da mera participação no processo eleitoral, exigindo um envolvimento mais direto dos indivíduos no domínio da “esfera pública”, em um processo contínuo de discussão e crítica reflexiva das normas e valores sociais.

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Na sua obra Mudança da Esfera Pública, publicada em 1961, o autor reflete sobre a validade do modelo da esfera pública burguesa para o projeto e a prática democrática nas sociedades ocidentais de nossa época. A esfera pública nasce simultaneamente ao surgimento do Estado, com a mudança estrutural da sociedade e a reivindicação de um espaço no qual o sistema possa ser analisado criticamente.

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O conceito de "esfera pública" é chave para a democracia deliberativa, pois Habermas a vê como um local destinado à deliberação comunicativa, um espaço onde os indivíduos interagem uns com os outros, debatem as decisões tomadas por autoridades políticas, gerando uma rede de procedimentos comunicativos. As questões sociais e coletivas devem ser objeto de apreciação de todos, considerando que em uma sociedade democrática, a esfera pública é dominada pelo discurso e pela argumentação.

O espaço no qual é possível a ação comunicativa, Habermas denomina de esfera pública. Conforme o filósofo, podemos entender esfera pública como:

[...] a esfera das pessoas privadas reunidas em um público; elas reivindicam esta esfera pública regulamentada pela autoridade, mas diretamente contra a própria autoridade, a fim de discutir com ela as leis gerais da troca na esfera fundamentalmente privada, mas publicamente relevante, as leis do intercâmbio de mercadorias e do trabalho social (HABERMAS, 1989, p. 42).

Em outras palavras, Habermas entende por esfera pública, o espaço no qual os indivíduos interagem para trocar ideias sem estar sob a tutela da vida doméstica, da igreja ou do governo. Exemplo disso é o espaço público no mundo da vida, como as praças, as ruas, onde as pessoas falam francamente sobre o que pensam e formam conceitos sobre fatos e valores políticos. Nessa esfera não existe coerção, mas sim, a ação comunicativa voltada para o entendimento, por isso as ideias e conceitos são elaborados livremente, discutidos e argumentados de forma ilocucionária.

Ao estabelecer as condições para um procedimento democrático em políticas deliberativas, Habermas observa que o mesmo é essencialmente do agir comunicativo, elevado a uma ética do discurso, e é marcado pela deliberação de que é de uma forma argumentativa; inclusiva e pública; livre de coerção externa e interna; visa o acordo racionalmente motivado; mantém a possibilidade de um diálogo continuado: uma decisão é sempre provisória no sentido de que deve estar aberta para ser questionada em algum momento no futuro; cobre qualquer assunto que possa ser regulado em um interesse igual de todos; e inclui a interpretação das necessidades e dos quereres.

Adotar a estrutura habermasiana implica um novo território, ou seja, em algo que ainda não foi descoberto, em que as formas de alcançar o entendimento e acordo na teoria da ação comunicativa requer uma vontade para examinar a validade e reivindicações.

Nesse sentido, a fim de apresentar uma pluralidade de posições ontológicas e epistemológicas, vozes representativas precisam ser ouvidas. É difícil apresentar posições que não são experienciadas no mundo subjetivo como “verdade”, então muitas informações é necessária dos pesquisadores em diferentes paradigmas de pesquisa. Além disso, a abertura, o desafio e o debate entre professores e alunos deve ser uma característica essencial da experiência de aprendizagem, para manter fiel uma representação da educação como um campo pluralista e contestada do conhecimento.

Dessa forma, alguns princípios valem a pena ser refletidos e discutidos. Como por exemplo, não temos que adotar uma posição ontológica "exclusiva" para ser coerente: a postura pluralista é igualmente válida e talvez mais fiel à nossa real posição; as tensões em projetos de pesquisa precisam ser reconhecidas, mas elas não precisam ser removidas; precisamos compreender diferentes metodologias para ser capaz de julgar reivindicações ao conhecimento em nossos domínios de interesse; devemos buscar explicações diferentes em campos de investigação onde se parece que certos discursos e metodologias dominam; onde houver contestação ou conflito, devemos tentar analisar a extensão para que explicações contrárias possam ser acomodadas; na tentativa de compreender o estado do conhecimento dentro do nosso domínio de interesse, devemos tentar avaliar em que medida essa contestação pode ser vista como ação comunicativa ou ação estratégica.

Em discurso educacional concordamos com algumas proposições básicas sobre a racionalidade dos atores e tentativas de chegar a um entendimento coletivo. Professar o inverso, negando tendências em ação comunicativa que indicam racionalidades fundamentais é como Habermas aponta, uma contradição performativa. Entender diferentes questões educacionais requer diferentes metodologias, dependendo do mundo(s) investigado e os tipos de perguntas.

Pesquisadores educacionais, apesar de todas as suas diferenças e as complexidades de seu trabalho, em fazer reivindicações ao conhecimento e compreensão, estão fazendo apelos ilocutórios, que implicam na tentativa de chegar a um entendimento comum de práticas educativas que se encaixam as condições da

ação comunicativa, com seu ideal de um consenso baseado em nada mais que a força do argumento. Os valores implícitos por essas proposições são democráticos, consensuais e participativos. Descobertas sobre fenômenos educacionais são sempre provisórios e parciais e a busca da verdade é vista como um acumulado processo passível de revisão da ação comunicativa. O desenrolar deste processo requer uma prática repleta de considerações éticas relacionadas com a prevenção da ação estratégica, permitindo espaço para o desacordo fundamentado e de abertura à crítica. Isso fornece uma base sólida para o conteúdo e a orientação do ensino de pesquisa educacional.

Por fim, nosso objetivo com este texto foi exemplificar como o pensamento Habermasiano pode ser operacionalizado no intento de apoiar uma metodologia coerente de pesquisa do agir emancipatório. A teoria crítica de Habermas é essencialmente uma teoria da argumentação. No entanto, usar Habermas como fundamento filosófico para a pesquisa é explorar apenas uma faceta de seu trabalho, que é de extrema relevância para a pesquisa educacional. Habermas, com a sua ênfase nos processos intersubjetivos do agir comunicativo, oferece uma pragmática para facilitar este diálogo, conforme discutiremos a seguir.