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3.2 Tipos de poder constituinte

3.2.2 Poder constituinte derivado

3.2.2.1 Espécies de poder constituinte derivado

O poder constituinte derivado71 subdivide-se em reformador, que tem a função de alterar a Constituição, garantindo que o seu texto esteja em conformidade com os novos ambientes formatados pela dinâmica social, e em decorrente, que resume-se na capacidade conferida aos estados membros, enquanto entidades integrantes da federação, de elaborarem suas próprias constituições.

71 Para alguns doutrinadores o termo apropriado para se referir a esse poder deveria ser “competência derivada”, pois para eles a terminologia “poder constituinte” deriva diretamente da soberania popular sem haver qualquer limitação. (NATHALIA MASSON, Manual, p. 117.) Nesse sentido, outro apoiador dessa teoria é o atual Presidente da República Federativa do Brasil MICHEL TEMER que diz: “parece-nos mais convincente a expressão «Poder Constituinte» para o caso de emanação normativa direta da soberania popular. O mais é fixação de competências: a reformadora (capaz de modificar a constituição); a ordinária (capaz de editar a normatividade infraconstitucional)”. (MICHEL TEMER, Elementos de direito constitucional, 17.ª ed., São Paulo: Malheiros, 2001 p. 35.) CARLOS AYRES BRITTO preceitua não existir “um poder constituinte derivado, pela consideração elementar de que, se é um poder derivado, é porque não é constituinte. Se o poder é exercitado por órgãos do Estado, ainda que para o fim de reformar a Constituição, é porque sua ontologia é igualmente estatal. E sendo estatal, o máximo que lhe cabe é retocar o Estado, nesse ou naquele aspecto, mas não criar um Estado «zero quilômetro». E sem esse poder de plasmar ex novo e ab novo o Estado (que é correlato poder de desmontar, desconstituir por inteiro o Estado pré-existente) então de poder constituinte já não se trata.” (CARLOS AYRES BRITTO, Teoria da constituição, 1.ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 96.)

3.2.2.1.1 Poder constituinte decorrente

O poder constituinte decorrente corresponde à capacidade conferida pelo poder originário aos Estados-membros de, enquanto entidades integrantes da federação, elaborarem suas próprias constituições, de modo que estes possam cumprir sua capacidade de auto- organização, fruto da autonomia política a eles conferida pelo sistema constitucional federado.

Quando o poder decorrente cria a Constituição Estadual, a doutrina o chama de poder decorrente instituidor, mas quando realiza apenas alterações em seu texto, ajustando-o à realidade, recebe o nome de poder decorrente reformador.

O poder derivado decorrente, sendo criado pelo poder constituinte originário, é um poder limitado, condicionado e secundário. Mas, por ser institucionalizado pela Constituição, é um poder de direito, isto é, possuidor de natureza jurídica.

Com sua atuação limitada às normas constitucionais que institui; o poder decorrente tem a obrigação de garantir a perfeita consonância entre o texto constitucional do ente federado e o texto presente na Constituição da união federativa, pois ele complementa esta, perfazendo a obra do poder constituinte originário ao estabelecer a Constituição dos Estados componentes da federação.72 Assim, observando o princípio norteador da federação, conhecido por princípio da simetria, o poder constituinte decorrente tem sua competência limitada pelas normas constitucionais.

3.2.2.1.2 Poder constituinte reformador

Como apresentado anteriormente, o poder constituinte derivado reformador tem como competência promover a alteração do texto constitucional, conformando-o às exigências sociais contemporâneas, decorrentes da evolução histórica, sem deixar de respeitar os princípios e limites presentes nesse texto.73

72 PEDRO LENZA, Direito, 15.ª ed., pp. 178-179.

73 LUÍS ROBERTO BARROSO nos acrescenta que “na Europa, a doutrina tradicional, originária da teoria constitucional francesa, só admitia modificações na Constituição por via do procedimento próprio de reforma do seu texto. Coube à teoria constitucional alemã, em elaborações sucessivas, e à própria jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal, [sic] o desenvolvimento e comprovação da tese da ocorrência de alterações na Constituição

Caso essa função de adaptação do texto constitucional às mudanças sociais não seja devidamente cumprida, tal texto tornar-se-á um conjunto de recomendações sem sentido. Nessa linha, J.J. GOMES CANOTILHO, mencionando o trinómio identidade, evolução e adaptação, acrescenta que essa importante tarefa do poder constituinte derivado reformador equivale a um “compromisso pleno de sentido entre a estabilidade e dinamicidade das normas constitucionais”,74 que impede a dissonância destas com a realidade social contextual.

Observa-se que é neste cenário de tensões entre a estabilidade e a adaptabilidade, entre a permanência e a mudança, que se situa a problemática envolvendo a reforma constitucional, que se dá por se evitar a insegurança de uma profunda volatilidade constitucional ou o anacronismo de uma intensa rigidez constitucional. É por isso que muitos países buscam, na rigidez, o equilíbrio entre esses valores.

Como já exposto, a rigidez constitucional pressupõe uma alteração constitucional mais solene, complexa e sofisticada,75 de modo a conceder certa flexibilidade para a manutenção da ordem vigente, sem renunciar à conveniente segurança jurídica. Dessa forma, visando afastar a ingerência de direitos e garantias, arduamente conquistados, o constituinte originário preocupou-se em impor maiores obstáculos a sucessivas alterações, para não desfigurar o cerne constitucional.

Destarte, por intermédio da Lei Maior, o poder constituinte reformador institucionaliza os interesses populares, cujos valores se extraem na pauta da política estatal. Com isso, busca-se um efetivo corolário democrático reconhecedor e protetor de direitos fundamentais, que ultrapassa a própria Constituição.

material de um Estado, sem qualquer mudança no texto formal. Essa admissão, é bem de ver, precisou superar a separação metodológica rígida entre o mundo do Direito (o ser) e a realidade fática (o dever-ser) imposta pelo positivismo jurídico. O impacto da passagem do tempo e das transformações históricas, políticas e sociais levou ao reconhecimento dessa específica categoria teórica que é a mutação constitucional.” (LUÍS ROBERTO BARROSO, Curso, 6.ª ed., p. 148.)

74 J.J.GOMES CANOTILHO, Direito, 6.ª ed., p. 95.

75 OSCAR VILHENA VIEIRA diz que “quanto mais detalhista e substantivo for o texto constitucional, maior a possibilidade de ele se inviabilizar em face das ideologias, tendências e imperativos econômicos daqueles que o estabeleceram. Quanto mais sintético e processual, limitando-se a traçar os procedimentos para tomada de decisão, maior sua possibilidade de sobrevivência através dos tempos.” (OSCAR VILHENA VIEIRA, A constituição e sua reserva de justiça, um ensaio sobre os limites materiais ao poder de reforma, São Paulo: Malheiros, 1999, p. 139.)

3.2.2.1.3 Poder constituinte revisor

Autores como NATHALIA MASSON76 e PEDRO LENZA77 consideram esse tipo de

poder, assim como os poderes reformador e decorrente, como poder constituinte derivado, dizendo ser ele condicionado, limitado e vinculado ao poder constituinte originário. Outros autores, por sua vez, como J.J.GOMES CANOTILHO78, reconhece seu tratamento dominante

como um poder constituinte derivado, mas diz o ser constituinte em sentido impróprio.

Entendemos que, alheios à esta celeuma classificatória, o poder revisor, revisional ou de revisão, com certeza não é um poder constituinte originário, motivo pelo qual o tratamos como poder constituinte derivado, já que proveniente do texto constitucional.

De qualquer forma, o poder de revisão corresponde àquelas faculdades de poder constituinte conferidas, a título de exemplo, pelos artigos 3.º e 284.º e seguintes do ADCT da CRFB79 e da CRP80, respectivamente.