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Espaço para a mudança: o caso português

No documento Espaço(s) da educação: relatório final (páginas 112-117)

CAPÍTULO IV EXPERIÊNCIA-CHAVE TRANSVERSAL A EDUCAÇÃO PRÉ-

4.1. Espaço Fronteira

4.1.1. Espaço para a mudança: o caso português

Para Portugal (CNE, 2009) a relação ou o trabalho com crianças dos zero aos doze anos de idade, por conseguinte em fases de desenvolvimento funcional ou globalizante, deverá acontecer sob a perspetiva holística do desenvolvimento, apesar do enquadramento em áreas de conteúdo ou curriculares. Mas num relatório elaborado pelo CNE, a transição entre os diferentes níveis do ensino básico, nomeadamente entre a educação pré-escolar e ensino do 1ºCEB, é considerada como demasiado brusca na realidade nacional (CNE, 2009).

Um dos motivos para que tal aconteça pode estar relacionado com a estrutura atual do ensino básico. Num estudo de comparação internacional concluiu-se que noutros países o ensino primário se desenvolve por cinco ou seis anos de escolaridade, enquanto em Portugal se optou por uma estrutura única de ensino básico dividida em três ciclos (CNE, 2009). A organização curricular prevista na Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) para os primeiros ciclos de ensino básico propõe uma evolução das atividades globalizantes para áreas disciplinares a desenvolver na sua maioria em regime de professor por área (CNE, 2009). No entanto o problema não estará tão ligado à estrutura do ensino básico mas parece associado ao desfasamento

entre os discursos e as práticas bem como com os planos de sequencialização nos primeiros seis anos de escolaridade que ficarão muito aquém do necessário (CNE, 2009).

São apontados como fatores que afetam a aprendizagem de muitos alunos a falta de continuidade curricular entre os ciclos, a acumulação de problemas de aprendizagem desde o 1º ciclo e a falta de medidas efetivas, como o apoio pedagógico diferenciado, para além da repetência, a excessiva fragmentação dos tempos curriculares com horários inadequados aos ritmos de aprendizagem de muitas crianças, o excessivo número de turmas atribuídas a grande parte dos professores do 2º ciclo, tornando muito difícil a responsabilização destes pelo acompanhamento dos alunos (CNE, 2009). Com o intuito de alterar esta situação o CNE (2009) propõe uma reconfiguração curricular deste primeiro nível de ensino, tonando os seus princípios orientadores, planos curriculares e conteúdos programáticos mais coerentes. O presidente à época do CNE afirmava o benefício para a educação a progressiva integração do 2º CEB na cultura curricular do 1º CEB, formando-se assim uma educação “primeira” de seis anos (CNE, 2009, p. 20). Por outro lado, investigadores e pedagogos insistem também numa aproximação do 1ºCEB à EPE, reclamando a continuidade educativa e práticas mais concertadas.

Estas indicações vêm dar consistência à opção tomada pela equipa de estagiárias relativamente ao trabalho desenvolvido durante a prática supervisionada em 1ªCEB e que visou a continuidade de alguns dos fundamentos teóricos observados na prática em EPE. Desta forma, a equipa propôs-se a aproximar os dois contextos, desenvolvendo, no 1ºCEB e à semelhança do que havia feito em EPE, a metodologia de trabalho por projeto com base nos interesses das crianças e, assim, ouvi-las, dar- lhes autonomia e vendo-as como co construtoras do seu conhecimento.

Na opinião de Monge e Formosinho (2016) quando as crianças chegam ao 1ºCEB têm uma prespectiva realista das representações e expectativas – fazem aquilo que esperavam fazer, assumem um novo papel – o de aluno - e percepcionam a descontinuidade das orientações pedagógicas que substituem pela referência aos conteúdos lecionados. Um dos aspectos focados pelos autores (Monge &

Formosinho, 2016) é a experienciação de uma pedagogia transmissiva e a não participação das crianças na construção do seu processo de aprendizagem. Os papéis estão muito definidos, o professor ensina e o aluno aprende num ensino uniforme para todos, uma situação que parece não acompanhar a evolução dos pressupostos pedagógicos que apontam a autonomia e a diferenciação como elementos da gestão pedagógica (Monge & Formosinho, 2016).

Chamando a atenção para o perigo da escolarização da educação pré-escolar, Vasconcelos introduz na discussão a questão da agência e a necessidade da criança ser co construtora deste processo, sujeito da sua transição enquanto processo contínuo mas não uniforme (Vasconcelos, 2009).

Britt e Sumsion citadas por Vasconcelos (2009) afirmam o terreno de fronteira entre EPE e ensino do 1º CEB enquanto espaço de trabalho conjunto, de negociação e de sobreposição, num espaço de inclusão e de pensamento conjunto dos dois ciclos educativos. Formosinho (2016) aponta como aspeto importante de uma continuidade educativa entre os dois ciclos, a continuidade educativa assente numa sequencialidade progressiva. Esta sequencialidade tem raízes na pedagogia da Escola Nova e da Educação Progressiva e inspira-se na psicologia do desenvolvimento, afirmando que a nova aprendizagem se baseia no conhecimento anterior (Formosinho, 2016). A documentação pedagógica poderá representar aqui um papel fundamental ao tornar evidente as aprendizagens da criança bem como a forma como organiza o seu pensamento.

Para este espaço de diálogo contribuirão inquestionavelmente as alterações efectuadas ao enquadramento jurídico da formação de professores previsto no Decreto-Lei nº 43/2007 de 22 de fevereiro e que define como base comum uma licenciatura em Educação Básica. Mais ainda construir a organização curricular de mestrados que prevêm a formação de educadores de infância/professores do 1º CEB e professores do 1º/2º CEB. Desta forma, e tendo por base a experiência vivenciada no âmbito do Mestrado em Educação Pré-escolar e ensino do 1ªCEB, alarga-se o horizonte sobre o ciclo precedente bem como do procedente e, facilita-se a “impragnação” de eventuais práticas mais transmissivas no 1ºCEB por aquelas mais

participativas da EPE. Este aspeto ajudará também a contrariar, na opinião de Formosinho (2016), a crescente aproximação das práticas pedagógicas levadas a cabo nos JI estatais às práticas em 1ºCEB, resultante da organização institucional em agrupamentos e que conduz à assimilação da EPE por parte do 1ºCEB. Mais ainda, na opinião deste autor (Formosinho, 2016), a facilidade que a organização em agrupamentos permite ao nível organizacional e institucional aquando o processo de transição não ultrapassa o prejuízo resultante da assimilação da EPE pelo 1ºCEB que conduz a uma cultura transmissiva com perda de diversidade, inovação e qualidade de práticas.

CAPÍTULO V – EXPERIÊNCIAS-CHAVE EM 1.º CICLO DO ENSINO

No documento Espaço(s) da educação: relatório final (páginas 112-117)