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CAPÍTULO I – EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR

1.1. Contexto Educativo

1.1.6. Tempo

13 O programa The Incredible Years é um programa de aprendizagem socio emocional que ambiciona

promover estratégias socio emocionais efetivas nas crianças. Foi desenvolvido por Carolyn Webster- Statton em 1990 e para além da ação com pais e educadores para intervenção com crianças com comportamentos desafiantes e na prevenção desses mesmos comportamentos, conta também com uma vertente para pais de crianças dos zero aos doze anos. A aprendizagem socio emocional desenvolve, em adultos e crianças, a capacidade de reconhecimento e gestão das próprias emoções, relacionar-se de forma positiva com os outro, serem saudáveis e produtivos e serem capazes de tomar decisões responsáveis. Para tal, este programa alia na sua metodologia a abordagem comportamental, cognitiva e emocional. Ao concertar a ação das crianças, pais e educadores favorece a prevenção e a redução dos comportamentos menos positivos (Vale, 2012).

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A organização do tempo está intimamente relacionada com a organização do espaço e, conjuntamente com a organização do grupo, criam o suporte para o desenvolvimento curricular (ME, 2016). No contexto experimentado, a fluidez observada na utilização do espaço está, por sua vez, espelhada na fruição do tempo. À parte os momentos mais vincados da rotina diária (tempo da higiene, das refeições, do repouso) a gestão do tempo segue o ritmo da criança e procura dar resposta aos seus interesses e necessidades. Embora até nestes momentos seja percetível o respeito pelo tempo da criança, como por exemplo durante as refeições, momento social por excelência que é levado a cabo sem pressas permitindo o desenrolar de conversas e interações espontâneas. O que vai ao encontro da opinião de Oliveira- Formosinho (2013) acerca das escolas de Reggio Emilia, onde a organização do tempo é de feita de maneira a dar à criança oportunidades de interação diversa com os adultos, entre pares em grande e pequeno grupo, em momentos de brincadeira, da rotina diária ou de desenvolvimento de projetos (Oliveira-Formosinho J. , 2013). A partir das dez horas as crianças reúnem com a educadora na sala e definem as áreas para onde querem ir e com quem, se for caso disso (uma construção, por exemplo, pode ser feita pela criança que tem a ideia e que escolhe um par para a ajudar). Muitas vezes a educadora conta uma história ao grupo ou joga um jogo no tapete (como o grupo tinha terminado recentemente um projeto sobre o “tempo dos nossos avós” optavam muitas vezes por jogos tradicionais revisitados nesse período). Após o almoço é tempo da CAF (componente de apoio à família) e depois dessa hora vão brincar para o quintal. Como já foi referido, os tempos não são muito marcados e pode acontecer que de manhã as crianças brinquem no quintal e à tarde estejam na sala, ou que estejam no quintal o dia todo, o que aconteceu muitas vezes durante este período de integração. Esta opção facilitou a integração da equipa de estagiárias e a criação de uma relação mais profunda com as crianças, permitindo pôr em prática a observação participativa. Uma vez por semana, à quinta-feira de manhã, as crianças têm expressão musical.

1.1.6.1. Tempo para brincar

Brincar é uma das linhas mestras da proposta pedagógica deste JI. A importância que lhe é atribuída reflete-se na forma como está disponível para as crianças, o que fazem, o tempo que lhe é dedicado, a forma como o lúdico faz parte integrante do desafio com que as crianças são convidadas a pensar e a encontrar soluções criativas. Brincar é transversal quer temporal quer espacialmente a toda a atividade do JI. Na sala de atividades as crianças podem realizar diferentes tipos de jogo (construção, por exemplo) e há um espaço contíguo à sala onde especialmente preparada para o jogo simbólico. O espaço exterior é visto como uma fonte inata de experiências e aprendizagens, explorado através da brincadeira. Os elementos presentes no quintal são, na sua maioria, desafiantes e proporcionadores de desenvolvimento e aprendizagens. São provocações lúdicas, tal como as criadas no espaço interior. Bruner apontava a flexibilidade do pensamento humano como a chave para a sua capacidade intelectual e que o brincar desenvolve essa flexibilidade (Whitebread & Coltman, 2008). Vygotsky acreditava que brincar permitia às crianças encontrar soluções e compreender regras (Pound, 2014). Para Huizinga (1988), o jogo é uma função com sentido e é a base de construção da cultura humana, da nossa evolução enquanto sociedade com regras e leis a respeitar.

Por outro lado, Munari (2007, p. 35) refere que “a fantasia é a faculdade humana que permite pensar em coisas que novas que não existiam antes”. Para este autor, os produtos da fantasia, da criatividade e da invenção nascem das relações estabelecidas entre o que se conhece. Então, quanto mais relações se conseguirem criar, mais ativa será a fantasia e portanto quanto mais conhecimento, a quantos mais dados tiver acesso o indivíduo, mais relações estabelecerá, mais ativa será a sua fantasia. “O alargamento do conhecimento e a memorização dos dados devem ser feitos, naturalmente na idade infantil, através do jogo” (Munari, 2007, p. 37). Mais ainda, o autor refere o papel decisivo do educador neste aspeto do qual dependerá o desenvolvimento da criatividade e definição de espírito crítico na criança.

Segundo Pramling Samuelsson e Carlsson (2008) apesar de na maioria das vezes brincar e aprender estejam separados no espaço e no tempo, é desejável que estas

duas atividades, naturais para a criança, aconteçam em simultâneo, de forma a promover o desenvolvimento da criatividade. Aliás, Pramling Samuelsson e Carlsson (2008) afirmam que para a criança, em contexto de JI, estas atividades acontecem muitas vezes em simultâneo.

1.1.6.2. Tempo para observar

“Não percebo como fazem os professores no 1ºCEB, não têm tempo para observar…” (Júlia).

A observação é fundamental para o desenvolvimento da abordagem pedagógica deste JI. Na opinião de Malavasi e Zoccatelli (2013), a observação permite, por um lado, o conhecimento profundo da criança e do grupo e, por outro, a deteção dos seus interesses e de onde poderão emergir os projetos a desenvolver. Esta observação passa por escutar a criança e estar disponível para ela sem no entanto invadir o seu espaço, resultando num processo ativo em que se cruzam os pontos de vista do observador com os interesses dos observados, e que permite à equipa pedagógica discutir e delinear propostas de projetos a desenvolver (Malavasi & Zoccatelli, 2013). A observação, juntamente com o diálogo, torna evidente o envolvimento natural da criança na busca de sentido e o seu constante processo de construção de significado (Kinney & Wharton, 2009).

1.1.6.3. Tempo para documentar

“Olha, nós estávamos a desenhar este e o Guilherme deixou cair o lápis num buraco! E nunca mais o viu!” (Manuela)

Os projetos desenvolvidos pelas crianças e adultos deste JI são devidamente documentados. Em Reggio Emilia as paredes falam (Edwards, Gandini, & Forman, 1999), seguem o desenvolvimento dos projetos e tornam-nos visíveis para todos: pares, pais, comunidade, equipa, crianças, dando a todos a oportunidade de acompanhar e compreender o que vai acontecendo no JI (Edwards, Gandini, & Forman, 1999). Ao partilhar o processo de construção de aprendizagens, a documentação abre a discussão ao público, envolvendo-o no processo educativo e fazendo da escola um local de prática democrática (Edwards, Gandini, & Forman,

2016). Para além disso permite aprofundar por um lado, o conhecimento sobre a construção de significados pela criança e o seu potencial, e por outro, o conhecimento do educador enquanto profissional e da sua forma de interagir com a criança e com os outros (Kinney & Wharton, 2009). Numa outra dimensão, a documentação permite reconhecer o valioso contributo da cultura familiar e da comunidade (Kinney & Wharton, 2009).

Para Vasconcelos, o grande objetivo da documentação é tornar transparente o trabalho no jardim de infância para o exterior, tornando-o sujeito a interpretação, a crítica e a escrutínio” (Portugal & Laevers, 2010, p. 66). Esta documentação contém transcrições dos diálogos das crianças, registos escritos e desenhos, fotografias de momentos chave, uma coleção de produtos e de construções feitas pelas crianças (Portugal & Laevers, 2010, p. 67). Expõe as diferentes linguagens da criança (Edwards, Gandini, & Forman, 2016) e põe a descoberto os muitos significados que se vão tornando claros à medida que o processo avança (Malavasi & Zoccatelli, 2013). E ao acompanhar o desenvolvimento dos projetos, a documentação torna-se também numa ferramenta de monitorização que permite ao educador revisitar o processo, reconhecer a estrutura de pensamento da criança e assim reformular questões que a auxiliem a prosseguir as suas pesquisas (Malavasi & Zoccatelli, 2013), sendo essencial para levar a cabo uma aprendizagem negociada (Edwards, Gandini, & Forman, 2016). Da mesma forma, para Malavasi e Zoccatelli (2013) a documentação pedagógica permite uma leitura reveladora de futuros projetos para aquele grupo específico.

A documentação pedagógica revelou-se um auxiliar excecional na elaboração de todos os documentos escritos a ser produzidos no âmbito dos exercícios de prática supervisionada aqui descritos. Facilitou a descrição do processo, a sua justificação, a sua análise e fundamentalmente a sua reflexão.

No documento Espaço(s) da educação: relatório final (páginas 32-37)