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CAPÍTULO II – ABORDAGEM SOBRE TERRITÓRIO, DESENVOLVIMENTO

2.10 ESPAÇO-TEMPO DO AÇAÍ NA AMAZÔNIA

Podemos classificar, com base nos levantamentos bibliográficos realizados, o processo histórico da problemática do açaí na Amazônia em três períodos.

O primeiro chamaremos de consumo regional quando o açaí é consumido apenas pela população local/regional, isso remonta há muitos séculos, desde a sua utilização pelos indígenas, sendo recorrentes as fontes mitológicas que fazem referência ao açaí, mas não é possível precisar o momento exato do início do consumo, tanto do fruto quanto do palmito, além da utilização de outras partes do açaizeiro, como a vassoura do cacho para varrer a casa, o caule do açaizeiro para construção de pontes rústicas e mesmo de assoalho de casas, o caroço do açaí já era utilizado como adubação orgânica de plantas e hortas medicinais, o caroço também era misturado a outros componentes como ração para animais, a palha como cobertura de casas de animais, as raízes como remédio caseiro, dentre outros.

Calzavara (1976) afirma que o açaí já era utilizado há século pelos indígenas e Jardim (2004) ressalta que sua importância não se limita apenas ao fornecimento do vinho de açaí, mas como fonte de produtos para os mais variados fins, assim como matéria-prima na indústria de palmito.

O segundo período tem início na década de 1970 com a implantação das agroindústrias de palmito na Amazônia, em especial no estado do Pará, essa é a fase predatória do açaí-palmito na Amazônia, conforme registrou Sebastião Sobrinho (2005):

Mais recentemente, com o esgotamento das fontes de Eutherpe

edulis na Mata Atlântica e a transferência das indústrias de palmito

para regiões de várzea no Pará nas décadas de 1970 e 1980, a região do Baixo-Tocantins sofre grande pressão pela extração do palmito do açaí (Eutherpe olerácea)(SEBASTIÃO SOBRINHO, 2005, p. 24)

Nessa fase, o palmito do açaí ganha importância comercial e a derrubada do açaizeiro para a retirada do palmito para fornecer matéria-prima a agroindústria ocorre em larga escala, levantando grande preocupação dos movimentos sociais que lutavam em defesa do bem-estar das comunidades ribeirinhas, pois a retirada do palmito começa a comprometer a soberania alimentar das comunidades, gera impactos ambientais negativos com a retirada do açaizeiro e a casca do palmito jogada principalmente nos rios e igarapés liberando substancias tóxicas.

Durante este período foram gerados muitos problemas e poucos benefícios para as comunidades ribeirinhas. Os preços pagos pelos compradores de palmito eram baixos e atividade predatória comprometia a produção de açaí, apesar da elevada capacidade de recuperação dos açaizais, tendo em vista que uma árvore demora de 3 a 5 anos nas áreas de várzea para atingir a fase adulta.

A terceira fase se inicia na década de 1990, quando o açaí começa a ser consumido fora da região amazônica. Trata-se da fase de expansão do açaí no mercado externo, quando o seu consumo começa a ser feito de forma diferente da realizada pela população amazônica, ao invés do tradicional uso com farinha adiciona-se outros produtos como guaraná, amendoim, banana, laranja, leite etc.

Nesta fase, que ainda perdura, o açaí continua sendo um alimento básico das comunidades ribeirinhas e urbanas na Amazônia, mas passa a ser consumido fora da região amazônica, inclusive em outros países. O consumo do produto, fora da região amazônica, costuma ser feito nas formas de suco, energético e como ingrediente na composição de várias receitas.

A partir da década 1990, com o aumento da pressão internacional para a preservação da Amazônia, os produtos florestais não- madeireiros ganharam importância como alternativa para evitar desmatamentos e queimadas.

É nesse contexto da busca de novos produtos a explorar na Amazônia que o açaí-fruto surge como uma grande proposta, além de satisfazer o mercado externo com suas propriedades organolépticas, o açaí fruto se encaixa na proposta sustentável de "valorizar a floresta em pé" (BECKER, 2005). Por meio do cultivo e manejo adequado do açaí é possível manter a floresta e continuar se beneficiando dela, pois a manutenção das árvores em pé contribui na conservação do Ambiente, sendo uma alternativa importante no combate ao desmatamento, diferentemente do que ocorria na fase anterior quando as árvores eram abatidas para a retirada do palmito.

Não somente o açaí como fruto se torna importante, mas outros produtos também ganham destaque como bem demonstrado por Homma et al. (2006, p. 26):

Essa exposição da Amazônia, na mídia mundial, chamou a atenção para diversos frutos regionais, como o guaraná, cupuaçu, açaí, pupunha e o bacuri, entre os principais, que tiveram forte crescimento no mercado nacional e atraíram o interesse do mercado internacional.

A demanda internacional afetou profundamente o modo de vida das comunidades ribeirinhas produtoras de açaí na Amazônia, havendo significativa expansão das áreas manejadas. Mesmo aqueles que ainda praticavam apenas o extrativismo passaram a cultivar o açaí, seja plantando seja fazendo o manejo adequado.

Isso também propiciou o aparecimento de uma nova variedade antes pouco cultivada, o açaí de terra firme, antes para a retirada do palmito, mas agora para o cultivo do açaí fruto, mas este não é cultivado pelas comunidades ribeirinhas e sim por agricultores comerciais vinculados ao agronegócio.

Dada à importância que os conceitos de desenvolvimento e território assumem não só na Geografia, mas também em outras áreas do conhecimento, amplia-se a necessidade de analisar tais conceitos em maior

profundidade. Na presente pesquisa temos procurado estabelecer relações entre os dois conceitos e o objeto de estudo que está centrado na análise da produção de açaí na Amazônia, tomando como recorte espacial a Microrregião Cametá.

A intenção é reunir a bibliografia que possibilite estabelecer o fio condutor entre os conceitos trabalhados e a realidade empírica. Foram enfatizadas as diferentes perspectivas em relação aos conceitos de território e desenvolvimento, havendo forte identidade com o conceito de desenvolvimento territorial de Pecquer (2005), sendo este um dos elos essenciais na metodologia de interpretação do presente trabalho.

Mas a intenção é trazer esse debate de cunho mais conceitual de forma a contribuir para a pesquisa, relacionando cada vez mais ao objeto de estudo. Metodologicamente podemos afirmar que o fio condutor da pesquisa tem o desafio de estabelecer a interligação entre os conceitos de território, desenvolvimento, desenvolvimento territorial, com a produção do açaí por comunidades ribeirinhas na Microrregião de Cametá.

CAPÍTULO III – CIRCUITO ESPACIAL DA PRODUÇÃO DO AÇAÍ NA