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CAPÍTULO V: TERRITÓRIO E DESENVOLVIMENTO: POLÍTICAS

5.4 O AÇAÍ E AS POLÍTICAS PÚBLICAS NA MICRORREGIÃO CAMETÁ

Neste item discutiremos as políticas públicas voltadas para a produção do açaí e para comunidades ribeirinhas no estado do Pará, bem como na Microrregião Cametá, embora algumas ainda sejam de caráter incipiente e outras não sejam encontradas em um grande número na área estudada.

PRO VÁRZEA

Um dos grandes problemas enfrentados pelas comunidades ribeirinhas é a regularização fundiária. A população residente nestas comunidades vive em áreas de várzea, as quais pertencem a marinha brasileira e, por isso, não possui o título de propriedade.

Nesse sentido atores como Instituto Brasileiro de Meio Ambiente - IBAMA, Secretaria de Patrimônio da União – SPU, Instituto Nacional de

Colonização e Reforma Agrária – INCRA, ONGs, como a Federação de Órgãos

para Assistência Social e Educacional (FASE), comunidades da várzea, governos dos estados do Pará e Amazonas, Conselheiros do Conselho Nacional do Meio ambiente (CONAMA), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e Ministério do Meio Ambiente, realizaram estudos para elaboração de um programa que pudesse viabilizar o processo de regularização fundiária (SANTOS, 2005, p. 33).

O resultado desse estudo é o Pro Várzea, um programa que prevê a regularização das áreas de várzea para as comunidades que vivem em tal ecossistema. O Programa de Regularização Fundiária de Áreas de Várzeas Rurais foi instituído pela Portaria nº 284, de 14 de outubro de 2005 – DOU de 17/10/2005. O programa tem a coordenação da Secretaria de Patrimônio da União (SPU), por meio da Gerência da Secretaria do Patrimônio da União do Estado do Pará (GRPU/PA).

Os principais objetivos do Programa são: Para os comunitários ter a posse da terra garantida, Incra e SPU têm o objetivo de resolver a situação de cerca de 1,5 milhão de pessoas que vivem em áreas de dominialidade pública, Ibama e Ministério do Meio Ambiente têm o interesse de garantir a gestão participativa dos recursos naturais da várzea, trabalhando com populações legalmente assentadas na terra, as ONGs têm o interesse de trabalhar em áreas onde é possível fazer o planejamento de longo prazo e onde os direitos de uso destas facilitem a implantação do manejo dos recurso naturais. (SANTOS, 2005)

Através desse marco legal e jurídico será possível a regularização fundiária das áreas de várzea para as comunidades ribeirinhas, dando-lhes maior segurança para a permanência em seu habitat, proporcionando-lhes capacidade para poder pensar em investimento a médio e longo prazo.

Além disso, esse instrumento pode servir como um facilitador de acesso ao crédito para o ribeirinho. Atualmente poucos conseguem algum tipo de financiamento para produzir, devido das exigências das instituições quanto a titulação das terras.

É importante ressaltar que do ponto de vista da implementação dessa política pública na microrregião estudada ainda precisa avançar muito, sendo encontrado um número muito baixo de pessoas beneficiadas pela regularização fundiária que foi efetivada pelo INCRA com vistas muito mais em conseguir a construção pelo projeto da casa própria fornecido pelo governo Federal.

A maioria das pessoas tem apenas a posse da terra, adquirida quase sempre através da herança de seus familiares, quando ocorre compra do lote de outras pessoas é muito comum se encontrar um recibo feito em cartório onde ambas as partes assinam apenas para obter algum documento por escrito, mas que não tem valor legal.

5.5 PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO DA CADEIA PRODUTIVA DO AÇAÍ NO ESTADO DO PARÁ - PRÓ AÇAÍ

O estado do Pará é um dos maiores produtores de açaí do Brasil e precisa de políticas públicas específicas para esse produto. O governo do

estado do Pará, em parceria com outras instituições como EMBRAPA, lançou no início do ano de 2016 o Programa de Desenvolvimento da Cadeia Produtiva do Açaí no estado do Pará – o Pró Açaí.

O Programa foi lançado por meio da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca – SEDAP com o objetivo de expandir a oferta do fruto. Segundo a SEDAP o Pará é hoje o maior produtor nacional de açaí, com 154 mil hectares de área plantada e manejada em 12,8 mil propriedades rurais distribuídas em todo estado e produção anual de um milhão de toneladas. Em 2014 apenas as vendas externas do produto injetaram mais de R$ 225 milhões na economia estadual. A demanda continua a crescer e a produção local já não consegue atender ao aumento do consumo em condições satisfatórias, o que tem levado, inclusive, ao aumento do preço. (AGÊNCIA PARÁ, 2016).

Conforme se constata no documento publicado pela SEDAP existe uma preocupação em atender a demanda externa e para isso precisa aumentar a área plantada e a quantidade produzida do produto. Uma clara preocupação com o mercado externo e com um aumento dos recursos que serão injetados na economia do estado.

Salienta ainda que com o Pró-Açaí, a Sedap espera expandir em 50 mil hectares a área cultivada com açaí no período de 2016 a 2020, fazendo com que a produção aumente em 360 mil toneladas anuais de frutos até 2024, quando todas as novas áreas cultivadas estarão produzindo de forma plena30.

A meta é implantar 10 mil hectares de açaizeiros nas regiões de terra firme do estado, na forma de cultivo solteiro ou em Sistemas Agroflorestais (SAFs). A ideia, na terra firme, é aproveitar apenas as áreas já abertas pela ação humana – como pastagens abandonadas – e envolver mil pequenos, médios e grandes produtores rurais utilizando, entre outras tecnologias, a irrigação. (AGÊNCIA PARÁ, 2016).

A ideia é aproveitar as áreas degradas pela ação humana nas áreas de terra firme e implantar 10 mil hectares de açaizeiro em regime de SAF’s ou plantio solteiro, não necessitando de abrir novas áreas da floresta nativa.

30 Isso leva em consideração que o açaizeiro começa a produzir a partir do terceiro ano após o plantio

Ressalte-se a ainda a importância da utilização da irrigação nessas novas áreas para evitar o déficit hídrico e alteração das propriedades organolépticas do fruto que quando plantado em área de terra firme apresenta alteração no gosto, por conta do ressecamento, diminuindo a quantidade e a qualidade da polpa extraída do fruto. Além do mais, o açaizeiro quando irrigado diminui o seu ciclo de safra/entressafra podendo produzir quase o ano todo, diminuindo a escassez e os preços do produto na entressafra. Os elevados preços do açaí no mercado local, durante a entressafra dificultam o acesso ao produto pelas classes baixas.

Segundo a Sedap, nas áreas de várzea, onde se concentra atualmente a maior parte da produção paraense, a meta é ampliar o emprego de técnicas de manejo e de enriquecimento em 40 mil hectares de açaizais envolvendo 10 mil produtores familiares das regiões do Marajó e Baixo Tocantins no período

compreendido entre 2016 e 2020(AGÊNCIA PARÁ, 2016).

Dessa forma, o programa deverá ser responsável pela ampliação de 40 mil hectares de açaizais nas áreas de várzea e o que é de maior ênfase para o presente trabalho que será exclusivo para as regiões do Marajó e Baixo Tocantins, sendo esta última o objeto de estudo de nosso trabalho, o que poderá trazer impactos futuramente na forma de organização da produção e comercialização do açaí.

O diretor de Agricultura Familiar da Sedap, Luiz Pinto, destaca que: “Um dos pontos importantes do programa é a incorporação de tecnologia ao processo. Nas áreas de terra firme, por exemplo, a ideia é triplicar a produtividade com o uso de irrigação, passando das atuais quatro toneladas de frutos por hectare, em média, para uma média de 12 toneladas de frutos colhidos por hectare” (AGÊNCIA PARÁ, 2016). A principal técnica a ser empregada é irrigação dos açaizais em áreas de terra firme.

Outro ponto destacado pelo programa é a geração de emprego e renda, “a expansão da cadeia produtiva trará ganhos sociais, com a criação de mais de três mil empregos diretos e 12 mil indiretos na terra firme e de 5 mil ocupações produtivas diretas e de outras 20 mil ao longo da cadeia, nas áreas de várzea”. (AGÊNCIA PARÁ, 2016). O documento procura demonstrar os impactos na geração de emprego, apesar de não estar devidamente demonstrado como isto ocorrerá. A previsão de trabalhar com mil propriedades

e gerar três mil empregos diretos seria uma proporção de três empregos para cada propriedade na terra firme e na área de várzea a previsão de trabalhar com 10 mil produtores e a geração de cinco mil empregos, uma proporção de meio emprego direto para cada propriedade. O programa também contará com uma nova base genética que está sendo preparada pela Embrapa Amazônia Oriental, trata-se do lançamento de uma nova cultivar de açaí, chamada provisoriamente de BRS Ver-o-peso. Essa semente deverá ter como diferencial a maior produtividade, podendo alcançar até 15 toneladas por hectare/ano (EMBRAPA, 2016). Importante salientar que a Embrapa já lançou anteriormente o BRS Pará, uma cultivar com melhoramento genético próprio para área de terra firme e com ciclo mais curto para frutificação.

Além disso, o BRS Ver-o-peso tem a vantagem de ter sido desenvolvido exclusivamente para área de terra firme e sua produção garantirá a safra o ano inteiro minimizando um dos grandes problemas da cultura no estado que é a sazonalidade como ressaltou o pesquisador João Tomé “Atualmente 80% da produção ocorre de julho a dezembro. No restante do ano a oferta da fruta cai drasticamente, impactando toda a cadeia" (EMBRAPA, 2016).

De fato, a sazonalidade da produção do açaí sempre foi um problema para o consumidor, mas muitos produtores ribeirinhos têm manejado sua produção para que possa colher frutos na entressafra por conta do melhoramento do preço, pois o açaí na safra, conforme demonstramos no capítulo anterior, é vendido muito barato, os melhores preços são alcançados por atores sociais que conseguem fazer a agregação de valor ao produto que nesse caso não é o produtor e sim as grandes empresas que atuam no ramo.

Para a Sedap os números demonstrados são promissores e podem elevar o estado a um novo patamar, o que aumenta a satisfação em fazer parte desse programa, como falou o chefe adjunto de pesquisa e desenvolvimento da Embrapa Amazônia Oriental, Walkymário Lemos. Ele lembrou que a cultura do açaí é estratégica para áreas de pesquisa e transferência de tecnologia e que todos os esforços serão concentrados, para estabelecer e reforçar parcerias que auxiliem o Pará a alcançar desenvolvimento com sustentabilidade (EMBRAPA, 2016). Importante ressaltar que o açaí manejado de forma correta contempla a questão ecológica, mas é preciso contemplar as outras dimensões do desenvolvimento sustentável, devendo ser socialmente

justo e economicamente viável.

Se o investimento for apenas em ampliar as áreas produtoras e aumentar a quantidade da produção do fruto, podemos estar correndo o risco apenas de aumentar a oferta do produto para atender a demanda externa e é preciso pensar em outras formas de valorizar esse produto e não apenas vender de forma in natura como é feito pelas comunidades ribeirinhas hoje ou vender em forma de polpa de fruta como é exportado hoje pelas agroindústrias, sendo o beneficiamento maior feito fora do estado.

Não podemos andar na contramão da história uma vez que temos lições bastante contundentes de produtos que tiveram apenas a produção ampliada como foi o caso do café no vale do paraíba em São Paulo e do látex na Amazônia que passaram depois do auge entraram em decadência.

É preciso pensar em outras formas de agregar valor ao açaí como produto, e pensar esse circuito espacial da produção, sendo o Pará (e em nosso caso a microrregião Cametá) não apenas mero fornecedor de matéria prima, é preciso investir em tecnologia para transformar esse produto, como já é feito lá fora, como por exemplo a fabricação de alimentos funcionais, energético, geleia, doce, café, suco, sabão etc.

Do ponto de vista da efetivação do Pró Açaí pensamos que ainda está em caráter incipiente o processo de implementação, pois, não encontramos em nossa pesquisa de campo na microrregião Cametá nenhum produtor que tenha sido beneficiado por este programa.