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4.1. CAUSAS DOS CUSTOS DE TRANSAÇÃO

4.1.3. Especificidade dos ativos

Especificidade descreve um ativo ou investimento realizado de forma específica para um relacionamento ou transação individual, ou um recurso que foi comprometido para uma transação em particular que não poderá ser remanejado para outra transação (WILLIAMSON, 1996).

A Tabela 7 apresenta as informações relativas aos temas vinculados à especificidade dos ativos, bem como uma sumarização das respostas associadas a cada item, para cada caso individual.

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Tabela 7 – Especificidade dos Ativos

Caso Sua empresa possui ativos

dedicados a clientes específicos? parcerias com E dedicados a concorrentes

específicos?

A posse de ativos gera dependência em relação a

alguma empresa?

E1 “Não” “Não” “Não”

E2 “Não; possuo resfriador, mas isso não está dedicado nenhum parceiro específico”

“Não” “Não”

E3 “Não” “Não” “Não”

E4 “Não” “Não” “Não”

E5 “Estou investindo em resfriador para

fornecer para um laticínio vizinho” “Não” “Não”

E6 “Não” “Não” “Não”

E7 “Não, apesar de termos uma planta de

concentração de soro” “Não” “Não”

E8 “Instalamos em parceria (comodato) um concentrador de soro, eu pago eles em soro. Vou captar soro na região para atingir a capacidade máxima”

“Não” “Não, pois as condições

contratuais amarradas me dão liberdade de não ficar preso a eles”

E9 “Não” “Não” “Não”

E10 “Não” “Não” “Não”

E11 “Não” “Não” “Não”

E12 “Não” “Não” “Não”

E13 “Tenho resfriador dedicado à Kerry, mas se o cliente parar de comprar, continuarei usando, pois ele atende uma exigência de legislação”

“Não” “Não, apesar que gostaria

que houvesse mais

alternativas de clientes para vender meu soro”

Fonte: Dados da Pesquisa

Não há ativos específicos dedicados unicamente a um relacionamento específico, tais como plantas ou equipe, seja com concorrentes, fornecedores ou clientes (POPPO; ZENGER, 2002). Tampouco isso ocorre em ativos intangíveis, como a transferência de conhecimento ou treinamento específico (WATHNE; HEIDE, 2000).

A empresa E5 está investindo em um resfriador de soro a partir do contato comercial estabelecido com a empresa E8, que por sua vez está investindo em um concentrador de soro em parceria com um cliente. No entanto, nenhum desses casos configura um ativo específico, já que ambos relatam que o investimento permite que os outputs sejam comercializados com outras empresas que não aquelas originalmente envolvidas. Até o momento de realização da pesquisa, a empresa E5 doava seu soro para produtores rurais, e irá vendê-lo para a empresa E8 a partir de janeiro de 2015. A empresa E8, por sua vez, até então vendia todo o volume de soro de forma fluida para o cliente Kerry, e a partir de dezembro de 2015 irá concentrar seu volume de

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soro (100.000 litros/dia) e comprará na região até 100.000 litros/dia para completar a capacidade máxima de processamento do concentrador, e revender o resultado para a Kerry. O investimento ficará para a empresa E8, mesmo que o contrato de fornecimento seja rompido por uma das partes. A empresa E13 investiu em resfriador, e vende seu resultado exclusivamente para a Kerry, mas com grandes possibilidades de passar a comercializar diretamente para a empresa E8, que se tornaria, assim, um hub regional de concentração e distribuição de soro do queijo.

A empresa E7 possui um concentrador em sua planta, e relata ter feito tentativas de comprar soro de outros laticínios menores. No entanto, esta possibilidade não foi adiante, pois dependeria de investimentos em resfriamento e melhoria da qualidade a serem feitos pelos laticínios menores, o que não prosperou. Sendo assim, eles concentram apenas o volume próprio de soro, e revendem sem exclusividade para duas empresas.

A ausência de ativos específicos dedicados aos relacionamentos no negócio do soro do queijo decorre, principalmente, da percepção predominante que o soro possui um baixo valor comercial. Tal percepção inibe o envolvimento conjunto dos atores no desenvolvimento de estruturas de beneficiamento e transporte do soro. Esta realidade se manifesta em grande parte das situações estudadas.

Como consequência, a pouca maturidade dos relacionamentos na cadeia de valor é predominante, o que contribui para fomentar o estado de isolamento relacional ao qual as empresas se encontram no negócio do soro do queijo.

4.1.4. Incerteza

Incertezas podem provocar mudanças exógenas, fora do controle dos agentes, e afetam sua capacidade de responder adequadamente a tais mudanças (WILLIAMSON, 1996).

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A Tabela 8 apresenta as informações relativas aos temas vinculados à incerteza, bem como uma sumarização das respostas associadas a cada item, para cada caso individual.

Tabela 8 – Incerteza

Caso Há eventos que afetam empresa, mas que estão

fora do seu controle ou não podem ser previstos?

Como sua empresa se adapta, responde ou

planeja?

Sua empresa evita negociações por causa de

incertezas? E1 Há sazonalidade na oferta

de leite por conta da genética das búfalas. Há escassez de leite de setembro até março

“Tentamos fazer manejo para intercalar a parição, e convencer fornecedores a fazer o mesmo;”

“Pagamos por qualidade para incentivar o fornecedor a fazer manejo”

“Sim, deixamos de fornecer ricota de vaca porque não conseguíamos comprar soro com qualidade estável, e isso poderia comprometer nossa marca”

E2 “O cliente liga e avisa que não poderá receber o meu soro hoje, e isso me traz prejuízos”

“Mantenho outros clientes ativos e ligo para eles quando ocorre este problema”

“Já deixamos de investir em concentração com outros laticínios, pois havia incerteza; Já deixei de vender soro por incerteza.”

E3 “Não tem nenhum evento

que eu não possa prever” “Eu apenas decido estratégias na empresa” “Apenas incertezas comerciais” E4 “Não que eu tenha passado

até o momento” “Produzo, vendo meus produtos e doo o soro” “Não” E5 “Preço, basicamente; não

somos nós que controlamos”

“Apenas se nos unirmos (grupo de laticínios) para ter maior poder de barganha na negociação de preços”

“Não”

E6 “Hoje o mercado de ricota está vendedor, e isso pode fazer com que muitos invistam e aumente demais a oferta”

“Eu apenas monitoro e vejo como planejar meus negócios”

“Deixo de vender caso haja dúvidas quanto ao pagamento”

E7 “Não vejo nenhum evento que afete diretamente o meu negócio de soro, talvez falta de matéria- prima”

“Mantenho parcerias com os fornecedores de leite, eu os ajudo a melhorar a

qualidade, doo material de limpeza, e por aí vai”

“Deixei de comprar soro por não confiar na qualidade”

E8 “O custo da matéria-prima de entrada, o leite. Me afeta diretamente o volume, e o volume afeta o custo, pois estou investindo em planta de concentração para 200 mil litros/dia de soro”

“Amarrei o contrato de soro no preço por quilo, mas é uma variável muito complicada, o mercado de leite é muito perigoso. Preço hoje é o principal problema”

“Não, pois a minha incerteza é preço, e sou refém do preço do dia.”

E9 “Para mim nenhum, pois a fábrica não para, e eu tenho soro todos os dias”

“Prefiro ficar com o soro e

ver o gado ganhar peso” “Não negocio porque soro não dá rentabilidade, não há como investir em refrigeração, armazenagem, frete, imposto.” E10 “Tenho receio de não

conseguir escoar o soro, estrada, por exemplo”

“Não tem o que fazer, não posso investir para resfriar e armazenar”

“Não” E11 “O fornecimento de leite é

uma guerra” “Estou pagando por qualidade, como forma de conquistar o produtor”

116 E12 “Ouvi rumores sobre

pesquisas dizendo que soro não é bom para alimentar animais; se for verdade, terei problemas para escoar o soro”

“Planejo entrar com

produção de bebidas lácteas à base de soro”

“Não”

E13 “Sim, paradas na linha de produção do cliente; Tem também as estradas na época das chuvas, dificultando a distribuição de soro”

“Minha propriedade funciona como pulmão para a questão do soro”

“Evito sim, mas faltam opções para negociar soro, então fico um pouco vulnerável”

Fonte: Dados da Pesquisa

Duas empresas (casos E10 e E13) alertam sobre o risco de problemas nas estradas impedirem o escoamento da sua produção de soro, seja para doação, seja para venda. A primeira afirma que não tem como responder a esta situação, pois não pode investir em resfriamento e armazenamento, enquanto a segunda usa sua propriedade e seu rebanho particular como pulmão para eventuais estoques excedentes. Uma terceira empresa (caso E1) aponta que a genética das búfalas provoca escassez de leite durante parte do ano, e que a solução para tal situação é o manejo dos rebanhos. Especificamente, a empresa alimenta os animais com forragem, tentando assim “quebrar” um mecanismo natural desses animais de “dar cria” apenas no período seco, quando os filhotes mamam, desmamando-os na entrada do período de chuvas, quando a pastagem estará recuperada.

Sete empresas apontam eventos não-previstos ou fora de controle, resultantes da ação de outros agentes econômicos como geradores de incertezas (WILLIAMSON, 1996). As empresas E2 e E13 apontam os problemas operacionais na linha de produção do principal cliente, provocando o cancelamento de embarques. Enquanto a primeira adota a estratégia de manter outros clientes ativos, a segunda utiliza a propriedade como pulmão, de modo a tentar escoar o soro excedente nesses casos. As empresas E5 e E8 apontam o preço como evento fora de controle, gerando incertezas de investimento ou de planejamento estratégico. A primeira sugere a união de concorrentes como forma de minorar os riscos dessa incerteza; a segunda firmou contrato, mas aponta que tal medida é pouco eficaz no combate à incerteza do preço. As empresas E6 e E11 temem o acirramento da competição comercial (SUTCLIFFE; ZAHEER, 1998), e tentam responder

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com adaptações nas respectivas estratégias (KRINSHNAN; MARTIN; NOORDERHAVEN, 2006). A empresa E12 aponta a existência de rumores sobre a inadequação do soro para consumo animal, e teme que tal hipótese, se confirmada, possa provocar a necessidade de investimento na produção de bebidas lácteas como forma de escoar o soro gerado no laticínio.

Quatro empresas apontam que não há eventos imprevistos ou fora do seu controle (casos E3, E4, E7 e E9).

Nenhum participante evita negociar por conta de incertezas (SUTCLIFFE; ZAHEER, 1998). Apesar de quatro empresas terem respondido positivamente, afirmando que evitam negociações por conta de incertezas, os exemplos que elas apontaram são todos de comportamento ardiloso por parte de outros agentes econômicos, caracterizando risco de comportamento oportunista. Este é o caso da empresa E1, que optou por não fornecer ricota de leite de vaca por não poder assegurar fornecimento regular de soro de qualidade; da empresa E2, que desistiu de realizar investimento conjunto com outros laticínios por conta de incertezas quanto ao comportamento oportunista; da empresa E6, que teme o risco de calote comercial; e da empresa E7, que aponta problemas de qualidade na compra do soro de outros laticínios para concentração.

Conclui-se pelas informações apresentadas que há pouca influência das fontes de incertezas citadas na decisão de negociar com outros atores do negócio do soro do queijo. A opção por não negociar o soro (doação ou uso interno) ou vendê-lo está relacionada a outros aspectos que não as incertezas. Algumas das causas apontadas estão relacionadas a aspectos associados a um possível comportamento oportunista, como no caso dos clientes que cancelam embarques de soro, ou a assimetrias de informação, como no caso do comportamento não previsto dos preços do soro do queijo. Sendo assim, incertezas não são uma fonte evidente e importante dos custos de transação para essas empresas estudadas.

118 4.1.5. Frequência das Transações

Transações frequentes com o mesmo grupo de clientes e fornecedores reduzem os custos de transação, especialmente se houver algum tipo de ativo dedicado (WILLIAMSON, 1996).

As informações relativas à frequência das transações foram levantadas a partir da análise das decisões de escoamento do soro do queijo para cada empresa analisada. Algumas doam o soro, outras o utilizam para produzir ricota e as demais comercializam o produto para outros laticínios ou beneficiadores do soro.

Nenhuma das empresas entrevistadas relatou participar de negociação de curto prazo no negócio do soro. As empresas E4, E5, E9, E10 e E12 doam o volume de soro para produtores rurais e relatam haver estabilidade na seleção das empresas que retiram o soro em suas instalações.

A empresa E3 usa parte do soro para produzir ricota, comercializada em uma grande rede de supermercados, e outra parte vende para um cliente no Estado de São Paulo. Segundo relato do proprietário, “a minha ricota está faltando.... e eu estou vendendo o soro porque não quero perder esse cliente antigo, mas estou perdendo dinheiro por não produzir mais ricota”.

As empresas E1, E6 e E11 também produzem ricota, e vendem para grandes redes de supermercado, muitas vezes com contratos de marca própria.

As demais empresas, como comentado anteriormente, vendem seu soro para clientes cativos, dentre eles a Kerry e a Porto Alegre.

Transações repetidas, mesmo nos casos de doação, oferecem a oportunidade para as partes desenvolverem confiança e então reduzir os custos de transação do oportunismo (NORTH, 1990). No caso das empresas estudadas, a alta frequência de transações com os mesmos atores parece estar relacionada à escassez de alternativas de destinação. Há poucos compradores disponíveis para a comercialização do soro. No caso daquelas que doam o soro, por questões associadas ao custo logístico, é conveniente restringir a área geográfica de destinação, e isso acaba direcionando os

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acordos para o mesmo grupo de produtores rurais na destinação do soro doado. No caso das empresas que transformam o soro em ricota, elas relataram possuir clientes fidelizados e com contratos firmados em alguns casos.