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As especificidades da docência sob as influências do contexto da prática: Afinal, a quem compete avaliar?

Trabalhos Agrupados por Nível de Ensino / Lócus de Pesquisa na Área da Avaliação

4 O MOVIMENTO DISCURSIVO DOS ESPAÇOS DE PRODUÇÃO ACADÊMICA: A CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS REALIZADA PELAS PESQUISAS

5 O PROFISSIONALISMO DOCENTE EXPRESSO NA AUTONOMIA DAS ESTUDANTES-PROFESSORAS PARA A ELABORAÇÃO DOS INSTRUMENTOS DE

5.2 As especificidades da docência sob as influências do contexto da prática: Afinal, a quem compete avaliar?

Para pensar o desenvolvimento da profissionalidade e do profissionalismo dos professores que estão em processo formativo e ao mesmo tempo atuam na docência, precisamos também refletir sobre quais as especificidades profissionais que estão implícitas às práticas avaliativas, isto porque, julgamos pertinente compreender o que as estudantes-professoras, que

estão em um duplo processo de profissionalização entendem ser as especificidades de sua função.

Ao questionarmos sobre o que era responsabilidade do trabalho do professor, recebemos respostas com sentidos diferentes, que estão inclusive, relacionados à concepção que as professoras possuem sobre a educação e o ensino, como pode se observar respectivamente nas respostas de Luiza e Alice:

A questão do planejamento, que querendo ou não é do professor.... A gente tem o planejamento, cada professor tem o seu para cada semana, mas, a gente tem autoridade: “não, acho que esse assunto agora não...”, aí eu posso retomar outro assunto, ou se não, usar o mesmo conteúdo: “o assunto é esse, mas eu acho que a questão que está no livro, os meninos não vão conseguir compreender, não vão atingir”. Então eu posso ir a parte, procurar outro assunto e complementar. Eu tenho que cobrir aquele conteúdo naquele horário, mas, eu posso em uma atividade a parte, colocar para eles. Já no caso da indisciplina, é com a professora, mas já tem casos que não é mais com a professora, tem que ter a psicopedagoga da escola, a supervisão, porque tem casos que já são mais graves, e só a professora não consegue dar conta.... Acho que isso... (LUIZA, ENTREVISTA - DIÁRIO DE CAMPO, 2016, p. 4). Porque eu acho que o professor, é responsabilidade do professor ensinar o aluno a ler, escrever, o que é uma palavra, fazer com que a criança descubra quais são os segredos da escrita, da linguagem, da matemática... porque que quando pega esse número juntando com outro vai dar outro número... para ele descobrir essas coisas. Mas eu não sei se eu estou falando uma besteira, mas eu não vejo isso como a principal coisa. O que eu vejo como principal coisa, é eles se perceberem como ser humano, está entendendo?! [...] a importância de... assim, eu tento tornar eles um pouco mais críticos, sabe?! Para quando ele crescer, ele não ser um adulto tão alienado [...]. Mais ou menos isso, acho que a responsabilidade do professor é essa, não só ensinar a ler e a escrever, mas de educar para o mundo mesmo, tipo, é mais voltado pra Paulo Freire mesmo, educar para o mundo, não só para sair daqui e depois deixar aqui dentro da sala o que aprendeu, e depois só quando voltar amanhã é que vai relembrar... não. De levar e partilhar isso com um amigo, com o pai, dele realmente levar isso para a vida dele (ALICE, ENTREVISTA - DIÁRIO DE CAMPO, 2016, p. 12).

Em seu discurso, Luiza deixa transparecer que compreende que o planejamento é uma atribuição do professor. O termo “querendo ou não”, pode, neste caso, nos informar que a estudante-professora, mesmo acatando o discurso da coordenação de que o planejamento repassado semanalmente é mais prático, entende que está (parcialmente) abrindo mão de uma especificidade de sua função. Assim, este termo nos remete a um não dito que produz significado nesta fala: “mesmo que devido às regras da escola nós [os professores] não tenhamos um controle total sobre o planejamento, ainda considero que este seja uma atribuição do professor”.

No entanto, sendo consciente dessa especificidade de sua função, Luiza aponta em seu discurso para o movimento de recontextualização que as professoras na escola realizam sobre o planejamento, afirmando que embora recebam o planejamento semanalmente, são “livres” para modifica-lo, o que reafirma o fato de que Luiza compreende que é responsabilidade do professor elaborar um planejamento destinado exclusivamente às necessidades da sua sala de aula, não um planejamento pensado sem se levar em conta as especificidades de cada turma.

Talvez devido a esta abertura para recontextualização Luiza não se posicione contrária ao modelo da escola (por uma série de contextos pessoais), ou muito menos intencione modificar o modelo adotado, isto porque reconhece a necessidade e a responsabilidade do professor em modificar este planejamento que vem pronto e adapta-lo às condições de sua turma, o que a faz apontar através de seu discurso para o reconhecimento do planejamento de ensino como uma responsabilidade exclusiva do trabalho do professor, a despeito dos modelos de controle que as escolas adotem. Assim, embora a professora não tente modificar as “estruturas” do planejamento, modifica discretamente aspectos internos do mesmo.

Para além do reconhecimento do planejamento, a estudante-professora Luiza também apontou em seu discurso o controle da disciplina como sendo especificidade da função dos docentes. Porém, vale salientar, que a mesma apresentou limites a esta atuação do professor, reconhecendo que nem sempre a indisciplina pode ser solucionada sem que haja a cooperação de outros profissionais, que lidem com questões mais avançadas que ocasionam a indisciplina.

Esta observação de Luiza nos remeteu a uma delimitação das especificidades da função docente, importante aspecto do processo de profissionalização, pois, ao delimitar o que é função do professor e o que é função de outros profissionais, a estudante-professora, talvez sem se aperceber, apresenta em seu discurso um saber que está relacionado à jurisdição do professor (ABBOTT, 1988), a partir da qual, são demarcadas linhas de atuação profissional que delimitam o que é atribuição do professor e o que é atribuição de outros grupos profissionais.

Assim, a docência não adentra ao trabalho de outros grupos e, ao mesmo tempo, pode estar se “protegendo da intrusão” de outros grupos profissionais que buscam se inserir no trabalho que desenvolve. Deste modo, ao demonstrar reconhecer que existem limites para sua atuação, que correspondem a uma jurisdição, a estudante-professora Luiza demonstra se desvencilhar da concepção de professor “herói” que foi construída e solidificada historicamente, na qual os professores, detentores do saber, estavam aptos a solucionar quaisquer problemas ou ainda desenvolver múltiplas funções, perdendo de vista as especificidades de sua função e, consequentemente, tornando-se polivalentes, como também dando margem para o controle alheio de seu trabalho (NÓVOA, 1991).

Em se tratando do discurso da estudante-professora Alice, analisamos que a mesma compreende a função dos professores a partir de dois vieses, que, em seu discurso, parecem ocupar posições separadas. Inicialmente recorre à compreensão de que é função do professor não só ensinar, mas, desenvolver no aluno a curiosidade pelo aprender, o desejo de construir saberes e não meramente assimilar um conteúdo específico de português ou matemática. Fica claro no discurso de Alice a sua concepção de ensino-aprendizagem, como também a função que ela possui, como professora, em administrar esta construção das aprendizagens básicas da língua, dos números, mas também a curiosidade do aluno pelo aprender.

Deste modo, sinalizamos que Alice atribui às especificidades de sua função o desenvolvimento cognitivo do aluno, entendendo que neste desenvolvimento, o aluno também é sujeito, visto que parte da compreensão de que sua função é, para além do ensino dos conteúdos obrigatórios, fazer com que o aluno se interesse e queira adquirir mais conhecimentos, sendo assim, autor neste processo, o que nos remete ao entendimento de que a prática docente não se dá dissociada da prática discente, visto que não há docência sem discência (FREIRE, 1996), ou seja, o professor e o aluno dependem-se entre si.

Ao tratar desse viés discursivo, agregando à responsabilidade do ensino a necessidade de instigar a curiosidade dos alunos, a estudante-professora Alice adentra a um outro viés em seu discurso, que como dissemos a pouco, parece estar dissociado do primeiro. Este segundo viés diz respeito à formação humana, que na visão de Alice, não parece estar implícita à formação escolar através dos conteúdos trabalhados (mesmo que criticamente), mas que se exprime através de valores que ela possa transmitir aos alunos, sendo esses valores morais e sociais, que sirvam, em sua visão, para incentivar a criticidade dos mesmos, para que não se tornem pessoas “alienadas”.

Afirmamos que o discurso de Alice aponta para uma possível separação entre a formação humana/cidadã e a formação escolar (no sentido da apreensão dos conteúdos e conhecimentos básicos) devido ao fato de a mesma hierarquizar estas concepções, tornando uma mais importante que a outra. No entanto, questionamos se não seria possível promover a aprendizagem e o desejo de aprender dos alunos, estando, concomitantemente, a transmitir valores e ensinar conteúdos básicos sem que houvesse necessariamente, uma separação entre essas fontes de saber.

Assim, em suma, Alice aponta que as especificidades de sua função se definem inicialmente pelo ensino, porém, a partir de uma visão mais humanista e libertária, imprime o sentido de um ensino significativo para o aluno, que o instigue a curiosidade e que o forme para a vida em todas as áreas, promovendo não só o desenvolvimento cognitivo, mas principalmente

o emocional e social, imprimindo em seu discurso marcas da concepção de educação e ensino que possui e que apontam para uma perspectiva de desenvolvimento integral do aluno e de uma educação para a vida.

Tanto no discurso de Alice quanto no discurso de Luiza, pode-se perceber que são trazidos à discussão pontos centrais que constituem as especificidades da docência, embora, imaginemos que estas não sejam as únicas especificidades do trabalho do professor que as estudantes-professoras reconheçam como tal, visto que as deixamos através de uma conversa aberta, enquanto falavam aspectos de suas biografias, exporem o que entendiam ser atribuição dos professores. No entanto, embora percebamos que ambas tenham apontado fortes atribuições, que qualificam os professores em suas funções (como a elaboração do planejamento de acordo com o contexto dos alunos; medidas disciplinares; e o ensino numa perspectiva libertária), sinalizamos que dentre os muitos silenciamentos nos discursos das estudantes-professoras sobre as especificidades de sua função, está a elaboração e desenvolvimento das avaliações.

Através das respostas de Luiza e Alice, refletimos sobre como numa profissão, a falta de delimitação da especificidade da função de seus membros pode expô-los à intrusão alheia, que muitas vezes, aparece numa forma de ajuda, mas acaba por substituir o professor em ocasiões e ações em que ele é a autoridade profissional, por possuir os saberes específicos para tal e por estar a acompanhar os alunos. Neste sentido, questionamos: Como os professores poderão tomar decisões sobre as práticas avaliativas, se não as reconhecerem de fato como uma especificidade de sua função? E mais ainda, como os professores podem consolidarem-se como grupo profissional se não estiverem conscientes das atribuições exclusivas à sua profissão?

Expomos tais questionamentos na intenção de refletir o quanto temos que avançar para a conquista de um status profissional, visto que segundo Gonçalves (2007), as bases de uma profissão estão assentes na “especificidade técnica ou científica permitindo algum grau de autonomia profissional e responsabilidades de enquadramento ou coordenação de atividades no domínio em causa” (p. 190). Frente a isto é que trazemos ao debate o reconhecimento das especificidades da docência e de seu domínio técnico, visto que estes elementos garantem aos profissionais a autonomia sobre a gerência de suas práticas, o que consiste em um dos aspectos do profissionalismo e protege o trabalho do professorado da regulação alheia, dando-lhe exclusividade frente aos demais grupos profissionais e minorando as tentativas de controle advindas do próprio contexto prático em que atuam profissionalmente.

Na escola 2, em conversa informal com Alice, observamos as muitas tentativas de controle empreendidas por outros sujeitos que convivem com a estudante-professora no

contexto da prática. Estas tentativas são realizadas por parte da coordenação, e buscam uma maior inserção na elaboração do instrumento avaliativo e do desenvolvimento das avaliações, mesmo aquelas que dizem respeito às avaliações que a professora realiza sistematicamente no cotidiano da sala de aula, através da observação do desenvolvimento dos alunos. Sobre este aspecto, Alice diz:

Por exemplo, aqui [me mostrou a avaliação de uma aluna] Ana... a menina aqui botou silábico-alfabético, eu não concordo muito não..., mas, tudo bem. Esse aqui eu tinha colocado que era pré-silábico. - E quem mudou? - A coordenadora. Porque ela olhou e disse que era, aí foi e colocou. Mas, na minha cabeça, eu sei que está no pré-silábico. A gente pode perceber aqui na estrutura das palavras que ela fez (ALICE, DIÁRIO DE CAMPO, 2016, p. 91).

Como a turma de Alice é o primeiro ano do ensino fundamental, período em que se exige do professor que facilite o desenvolvimento da escrita e da leitura, observamos que a mesma possui um acompanhamento frequente por parte da coordenação, que realiza reuniões mensais para saber do andamento do trabalho das professoras e para conferir o que elas têm realizado, principalmente as avaliações que são registradas no caderno de avaliação a cada bimestre. Ao conferir este caderno de avaliações, a coordenadora impugnou a avaliação que a estudante-professora havia realizado sobre determinada aluna. Como nota-se no relato, esta mudança foi realizada sem a aprovação da estudante-professora, que está acompanhando a aluna diariamente e que, apesar disto, não teve a avaliação que realizou tida como válida, visto que a coordenadora alterou a próprio punho o parecer da professora.

Situações como esta evidenciam a inutilização com que os saberes dos docentes vêm sendo tratados, podendo ser em alguns casos, desprezados e substituídos pela opinião de outros sujeitos do contexto da prática, que embora estejam envolvidos com os alunos, não possuem com estes uma relação que se equipare às relações que professores estabelecem em sala de aula.

Com isso, evidenciamos que todo o discurso que circunda os cursos de formação superior e formação continuada, que eleva a prática docente de uma visão utilitarista para uma visão reflexiva e dotada de saberes, parece ser em alguns casos ignorado pela escola em suas relações entre os sujeitos que compõem o contexto da prática, visto que não se levou em consideração, neste caso, quais os saberes e processos de reflexão que a estudante-professora Alice empreendeu até chegar no resultado que foi modificado.

Salientamos que episódios como este podem ser decorrentes do fato de que os “discursos que tomam o professor como prático reflexivo parecem avançados, mas podem estar obscurecendo o contexto real em que se desenvolve a ação docente” (CHAKUR, 2002), sendo este contexto delimitado pelas tentativas de controle que além de serem provenientes das esferas

políticas e organizacionais, o são nas esferas locais, que buscam diminuir as margens de autonomia dos professores através de realidades que histórica e ideologicamente procuram tirar da docência seu caráter intelectual e consequentemente, o domínio profissional de suas práticas.

Assim, trazemos à tona a importância dos professores se instituírem em seus saberes, em suas práticas, desenvolvendo o aspecto intelectual da função que ocupam. Nesta perspectiva, assim como os autores que têm pesquisado sobre os saberes e a ascensão profissional dos professores, compreendemos que os professores precisam ousar ir além:

É necessário se colocar numa posição que permita a análise crítica contínua da prática pedagógica, dos saberes que vão sendo construídos, aprofundando essa crítica reflexiva assentada num seguro campo teórico da educação e do ensino (OLIVEIRA; BERTOLO; MESCOUTO, EPENN, 2011, p. 6).

Este seguro campo teórico da educação e do ensino é, a nosso ver, um significativo avanço para o reconhecimento da docência e do processo de profissionalização, isto porque, ao ter saberes especializados que outros grupos e sujeitos (mesmo os do entorno escolar) não dominam, os professores alcançam respeito e autonomia sobre seu trabalho. Pois, como bem afirma Perrenoud (2002), um professor “pode conservar a total confiança de seus alunos, dos pais, dos colegas, e dos seus superiores se todos considerarem que ele “sabe o que faz” e que conta com os recursos de sua autonomia” (p. 54). Conquistada essa confiança, os professores certamente terão que se preocupar menos com as tentativas de controle que cotidianamente buscam espaço em suas práticas e, consequentemente, mais com a qualidade de suas práticas.

Semelhantemente, na escola em que Luiza trabalha, também tivemos contato com situações que evidenciam as tentativas de controle advindas do contexto da prática, o que fez com que a mesma também perdesse momentaneamente o domínio sobre os processos avaliativos, sendo a avaliação realizada pela coordenadora a que se sobressaiu. Um exemplo desta perca de domínio, e mais que isso, de naturalização da ausência de domínio do professor sobre os processos avaliativos pode ser compreendida através do diálogo abaixo que tivemos com Luiza:

Vocês fizeram avaliação diagnóstica? - Foi no início do ano... na primeira semana... - Como você fez a avaliação? - Foi a questão da leitura dos alunos e da escrita. Só que eu faço na sala e minha coordenadora faz a parte, aí ela disse que a gente compara os resultados. Ela falou que na minha sala tem um número grande de alunos sem saberem ler, é uma questão muito crítica (DIÁRIO DE CAMPO, 2016, p. 50).

O que mais chamou-nos a atenção, é que ao falar da situação dos alunos a estudante- professora Luiza não toma por referência a avaliação que ela realizou, mas o veredito da coordenadora. Assim, ao tomar por referência a avaliação da coordenadora, a fala da estudante-

professora aponta para um não dito, através do qual oculta sua concepção de que a avaliação da coordenadora possui maior credibilidade que a avaliação do professor, realizada por ela. É como se o coordenador estivesse em um patamar mais elevado das práticas por ocupar uma posição discursiva que o coloca (no imaginário social) em um nível mais elevado que a posição dos professores.

Em outra situação, a própria coordenadora, ao visitar a turma, expõe em seu discurso através do diálogo com os alunos, essa posição de superioridade que a sua avaliação assume em relação à avaliação da professora:

Vejam só, enquanto a professora Luiza está no ensaio, eu estou corrigindo as avaliações de vocês... foram 28 alunos que tiraram nota baixa. Apenas dois alunos tiraram 6,5 e a outra foi 6,0. As notas estão muito baixas! E aí gente?! O que é que está acontecendo? Se a gente não presta atenção no que o professor está falando e não tirar as dúvidas vai continuar desse jeito. Tem gente que pega a avaliação e não lê com atenção, fica agoniado para responder e responde de qualquer jeito. Eu sei que aqui tem gente com sérias dificuldades com a leitura, mas de 31, 28 alunos tirarem nota baixa...” [...] A partir de

agora, vocês vão ter que melhorar, porque quem vai corrigir sou eu! E eu

li todas as produções de texto. Não tem aquela produção de texto? Vocês lembram? Ela valia dois pontos. Eu li todas, acabei agora! (DIÁRIO DE CAMPO, 2016, p. 53).

No discurso da coordenadora, notamos uma afirmação da posição supostamente hierárquica que ela assume sobre as professoras, e que é também percebida por estas profissionais e pelos alunos. Deste modo, percebemos que a posição discursiva que a coordenadora ocupa, a “habilita” no meio escolar a realizar práticas que são inerentes à docência, substituindo, sempre que convir, a professora nestas práticas. No entanto, nesta substituição a coordenadora apresenta-se aos alunos através do discurso de que sua interferência na prática da professora atribuirá a esta prática um caráter de maior seriedade e, consequentemente, exigirá dos alunos maior responsabilidade, já que agora, eles não terão que prestar contas através da prova para a professora (considerada inferior dentro de uma visão cartesiana e hierárquica em que a escola é dividida), mas à coordenadora (alguém que ocupa uma posição superior a do professor, e que, inclusive, tem autoridade para intervir em seu trabalho).

Para além disto, chamou-nos a atenção o fato da ausência da professora na correção das provas e da presença da coordenadora para este fim. Em uma conversa informal, questionamos à Luiza o porquê da coordenadora estar corrigindo as provas, e a mesma respondeu:

Esse ano, cada turma, cada série ficou responsável por uma música. No caso, os quartos anos ficou com uma. Aí eu fiquei responsável de ensaiar. Aí eu disse: “sim, como é que eu vou ensaiar, corrigir prova e lançar nota? Porque

vocês querem no final o diário pronto”. Aí ela fez “não, você ensaia, a gente corrige as provas, a gente não se importa, você só vai lançar a nota”. Aí por isso que aconteceu, porque foi elas... eu fiz: “ou eu levo as provas para casa e corrijo e depois lanço as notas? ”. Elas disseram: não, a gente corrige e você lança. Foi ideia delas (DIÁRIO DE CAMPO, 2016, p. 63).

Nessa transferência ou até mesmo acúmulo de funções, vemos que a estudante- professora foi compelida a substituir sua prática por outras atividades que podem ser

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