Kerlinger (2009, p. 170) considera que, “nos levantamentos, pequenas e grandes
populações são estudadas através de amostras para descobrir a incidência relativa, a
distribuição e inter-relações de variáveis psicológicas e sociológicas”.
Para Gil (2008), a análise e a interpretação são dois processos distintos e
relacionados; enquanto a análise visa a organizar e resumir os dados na busca das respostas
ao problema proposto, a interpretação busca um sentido mais amplo das respostas. Esses
processos constituem-se no estabelecimento de categorias, da codificação, tabulação,
análise estatística, avaliação das generalizações, inferência de relações e interpretação dos
dados.
Neste trabalho foi feita a verificação da existência dos 10 tipos motivacionais dos
valores humanos da teoria de Schwartz (1992), a prevalência entre eles, quais sejam,
universalismo, benevolência, conformidade, tradição, segurança, poder, realização,
hedonismo, estimulação e autodeterminação, conforme a Figura 3.
Foi verificada também a estrutura bidimensional dos tipos motivacionais agrupados
nos quatro fatores de segunda ordem: autotranscedência, conservação, autopromoção e
abertura à mudança, conforme a Figura 4:
Figura 3. Tipos motivacionais e metas pessoais.
Fonte: Schwartz, S. H. (1992). Universals in the content and structure of values: Theoretical advances and
empirical tests in 20 countries. In: M. Zanna (ed.). Advances in experimental social psychology. 25, 1-65.
Os tipos motivacionais de valores humanos e os fatores de valores organizacionais
são variáveis dependentes de diversos fatores pessoais tais como idade, sexo, grau de
escolaridade, área de ocupação, cargo e renda, que podem afetar a hierarquia de
preferências. A análise dos dados tem em vista o panorama geral do comportamento e das
percepções dos colaboradores que compuseram o conjunto de sujeitos. São utilizadas
estatísticas descritivas de locação como média, mediana, percentis e quartis e de
variabilidade, assim como a variância e o coeficiente de variação.
Marconi e Lakatos (2003, p. 220) descrevem que “o ponto básico do tema,
individualizado e especializado na formulação do problema, sendo uma dificuldade
sentida, compreendida e definida, necessita de uma resposta, ‘provável, suposta e
provisória’, isto é, uma hipótese”.
O objetivo dos testes de hipótese é verificar se os dados trazem evidências que
contrariam ou não uma hipótese estatística formulada, considerando-se hipótese uma
suposição formulada a respeito dos parâmetros de distribuição de probabilidade de uma ou
mais populações. Essa hipótese será rejeitada somente se o resultado da amostra for
claramente improvável de ocorrer quando a hipótese for verdadeira.
Figura 4. Estrutura bidimensional dos tipos motivacionais de valores.
Fonte: Schwartz, S. H. (1994). Are there universal aspects in the structure and contents of human
values? Journal of Social Issues, 50(4), 19-45.
Considere-se H0 a hipótese nula e H1 a hipótese alternativa a ser testada
(complementar de H0). O teste pode levar à aceitação ou rejeição de H0 que corresponde,
respectivamente, à negação ou afirmação de H1. A decisão a respeito da rejeição ou não de
H0 se orienta pelo nível de significância do teste, ou seja, a probabilidade máxima de
rejeitar H0 erroneamente.
A análise de variância (ANOVA) tem por objetivo a comparação de mais de dois
grupos amostrais; é um teste estatístico amplamente difundido, que verifica se existe
diferença significativa entre as médias, o que permite inferir sobre a influência que os
fatores analisados exercem em alguma variável dependente. Entende-se por fatores as
variáveis categóricas cujo efeito se deseja medir. Por variável dependente entendem-se
aquelas que podem sofrer influência dos fatores.
A análise de variância multivariada (MANOVA) é utilizada para comparar vetores de
médias que dependem da partição do total da variância pelo efeito dos fatores analisados e
devido ao erro (Johnson & Wichern, 1999). Um ponto relevante da análise multivariada é o
aproveitamento da informação conjunta das variáveis envolvidas para a análise das suas
influências cruzadas sob a variável resposta (Regazzi, 2000).
Neste trabalho, pretendeu-se utilizar a Análise de Correspondência, uma técnica da
Estatística Multivariada voltada para a verificação da associação entre variáveis
categóricas (Jobson, 1996). A Análise de Correspondência tem por grande vantagem
permitir revelar relações que não teriam sido percebidas se a análise fosse feita aos pares
de variáveis; ela é altamente flexível no tratamento dos dados, por não ser necessária a
adoção de algum método teórico de distribuição de probabilidade, bastando que se tenha
uma matriz retangular contendo dados não negativos.
4 Análise dos Resultados
Este capítulo é dedicado à análise dos resultados produzidos pela aplicação dos dois
questionários escolhidos para o levantamento requerido pelo objetivo desta dissertação, no
capítulo 2. O conjunto de resultados propiciou informações sobre os valores da população
estudada, conforme foi explicado nos capítulos anteriores, e confirma a dificuldade de
mensuração dos valores, principalmente quando se busca a compreensão das diferenças
entre distintos grupos. Os valores são realidades dinâmicas, em contínua adaptação e
reajuste, por isso, sua tradução em números é uma fonte de problemas. A lição mais
evidente desses resultados é a confirmação das limitações dos questionários como
instrumentos para a mensuração dessa estrutura subjetiva denominada valor. Os
questionários reduzem a complexidade desses elementos, ao transformar os valores em
linguagem numérica, mesmo assim, frequentemente é o meio mais acessível para a coleta
de dados dos sujeitos estudados.
A regularidade das escolhas que os indivíduos apresentam na rotina da vida
quotidiana e em situações nas quais eles devem definir algum caminho para suas ações
manifesta as preferências que eles têm na busca da satisfação de suas necessidades e na
realização de seus objetivos e sonhos. Nessa busca, o indivíduo se apoia em suas
experiências e aprendizados anteriores e escolhe o caminho ou a opção que ele julga a
melhor. Assim, tal como bem-analisado por Scheibe (1970), o indivíduo é movido pela
pergunta que faz a si mesmo – “o que é melhor nessa situação?”.
Os questionários foram elaborados para captar essas preferências, ou seja, aquilo que
os indivíduos consideram melhor para fazer. Então, valores são hierarquia de preferências
inferidas pelo observador no indivíduo que guiam sua ação para um particular rumo. Os
indivíduos agem guiados pelo caminho que eles julgam ser a melhor escolha. As
regularidades que sustentam essas escolhas revelam aquilo que os indivíduos entendem
como melhor conduta, numa situação específica. A repetição e a rotina permitem a
inferência das escolhas que os indivíduos fazem. Os dois questionários objetivaram captar
a regularidade das preferências dos sujeitos para compreensão de suas ações. Portanto, a
investigação aqui proposta e realizada consistiu em diferentes situações da rotina de
trabalho, no exame da opção que os indivíduos entendem como sua melhor conduta e a
opção que eles percebem na empresa onde trabalham como a melhor conduta por parte dos
empregados. Para tanto, foram escolhidos os questionários QVP e IPVO.
Essas preferências estão hierarquizadas e articuladas entre si e apresentam certa
estabilidade, mesmo quando observadas em diferentes situações, mas ao mesmo tempo são
suscetíveis a adaptações para funcionar como mecanismos de ajustes do indivíduo às
condições do meio ambiente. Quando estimulado pela sede, um indivíduo pode revelar sua
preferência pelos refrigerantes. O que é melhor para ele é saciar sua sede com refrigerante,
porém se ele está sem dinheiro suficiente para comprar refrigerante ou se julgar muito caro
o preço do refrigerante, ele pode apresentar uma conduta diferente de sua escala regular de
preferências. Ele pode saciar sua sede com água ou com chá. Essa “inconsistência” entre a
conduta e os valores do indivíduo é igualmente uma contingência da rotina. Essa alteração
da rotina ou da resposta à pergunta “o que é melhor nessa situação?”, distanciando a
hierarquia de preferências e sua conduta, não altera sua estrutura de preferências, mas
ajusta-a a circunstâncias do meio ambiente. É por esse motivo que Fryvberg (2001)
distingue a investigação dos valores em diferentes contextos. Buscar essa hierarquia de
preferências foi a razão da elaboração dos questionários. Ambos medem valores.
Os valores funcionam como fator importante de adaptação dos indivíduos e
apresentam graus de mais rigidez aos ajustes solicitados pelo ambiente. A literatura
diferencia esses graus nomeando-os em valores centrais e valores periféricos, revelando
distintos graus de flexibilidade nessa hierarquia de preferências. Essa flexibilidade própria
dos sistemas subjetivos decorre das limitações encontradas no meio ambiente. Nem tudo o
que um indivíduo considera melhor é possível. Há circunstâncias que têm força para mudar
a ordem dos valores e há outras que não têm essa força. Embora essa questão seja crucial e
interessante, não integra os objetivos desta dissertação. Tais circunstâncias surgem na
relação eu-outro a partir de outros elementos da estrutura subjetiva, como as identidades,
as atitudes e os desempenhos de papéis esperados na conduta. Igualmente, podem
despontar de contingências do ambiente, como a disponibilidade e o acesso a recursos, que
obrigam o indivíduo a alterar seu comportamento. Bem (1973) analisa exaustivamente essa
diferenciação no comportamento dos valores mais centrais e dos mais periféricos. Essa
diferenciação é importante na compreensão e diferenciação de culturas (Hofstede, 2001).
Fryvberg (2001), em seu estudo da pesquisa em política, faz uma extensa análise da
interface entre os valores e o âmbito, evidenciando o processo adaptativo do ser humano e
o impacto desse processo na pesquisa. Um mesmo indivíduo pode demonstrar diferenças
em sua hierarquia de preferências, em situações como o desempenho de papéis, a
necessidade de jogar com a saliência da identidade social ou da identidade pessoal e em
situações de conflitos graves que ameaçam sua integridade. Os valores não são elementos
cristalizados nem líquidos, mas têm certa estabilidade e, ao mesmo tempo, espaço para
mudanças. Essas propriedades complicam a tarefa de sua mensuração porque questionários
como os dois aqui utilizados se servem de linguagem da qual se pode inferir que os valores
são mais estáveis do que, de fato, são. Por esse motivo, a leitura de resultados numéricos
requer algumas reflexões. Essas observações são importantes para a compreensão dos
resultados desta pesquisa.
No documento
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS FUNDAÇÃO DOM CABRAL. Programa de Pós-graduação em Administração
(páginas 55-62)