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CAPÍTULO 1: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.4 Estratégias de aprendizagem (EA) de línguas

Estudos acerca de estratégias de aprendizagem de língua materna (LM) datam de mais de duas décadas, e seus resultados nos trazem evidências consideráveis dos efeitos positivos que a intervenção das estratégias tem sobre a aprendizagem de LM (O’MALLEY E CHAMOT, 1993). Essas pesquisas, as quais investigam a questão da instrução das EA para o desenvolvimento das habilidades em LM, tiveram grande influência sobre os estudos voltados para a aprendizagem de LE, uma vez que muitas das atividades e estratégias características da LM assemelham-se às de uma LE.

Estratégias de aprendizagem de LE ou segunda língua (L2) são, segundo Oxford (1990), ações específicas, passos ou procedimentos dos quais os alunos se utilizam – freqüentemente de forma consciente – para aprimorar seu progresso na compreensão, internalização e utilização da língua em questão. Dessa forma, constituem ferramentas importantes uma vez que permitem, ao aprendiz, envolver-se mais ativamente no seu próprio processo de aprendizagem. Em outras palavras, as EA funcionam como fatores facilitadores desse processo e conduzem os alunos a sua autonomia, além de uma aprendizagem mais significativa. Semelhante à descrição de Oxford (op. cit), Brown (1987) define as estratégias como procedimentos específicos utilizados para a manipulação e o controle de determinadas informações quando se aborda um problema ou uma tarefa. O autor (op. cit, p. 79) acrescenta, ainda, que “cada um de nós tem um grande número de maneiras possíveis para se resolver um

determinado problema e nós escolhemos uma – ou diversas delas – para um dado problema”22.

Pesquisas (O’MALLEY et al., 1985 e CHAMOT et al., 1988 apud O’MALLEY E CHAMOT, 1990) demonstram que as estratégias fornecem uma base para remediar muitas dificuldades enfrentadas no aprendizado de línguas. O’Malley e Chamot (1990) definem as EA como pensamentos ou procedimentos que os indivíduos usam para ajudá-los a compreender, aprender e reter a nova informação. Tais autores, assim como Oxford (1990) e Wenden (1986), acreditam que as EA podem ser ensinadas, e que esse ensino possibilita ao aluno se conhecer como aprendiz, bem como tornar-se gradativamente independente e responsável pelo seu próprio aprendizado. Além disso, pesquisadores têm sugerido que ensinar os leitores (aprendizes de LE) a como utilizar estratégias específicas de leitura constitui um fator primordial na sala de aula (OXFORD, 1990; COHEN, 1998 e ANDERSON, 1999). Assim, neste trabalho, o termo estratégias de aprendizagem é empregado para descrever as estratégias que podem ser ensinadas explicitamente como parte da instrução em um contexto de aprendizagem de segunda língua (O’MALLEY E CHAMOT, 1994).

Uma das principais justificativas para o ensino explícito das EA encontrada na literatura está atrelada à idéia de que tais estratégias contribuem para o “desenvolvimento da habilidade dos alunos de se tornarem aprendizes autônomos ou auto-regulados” (WENDEN, 1991; ZIMMERMAN, 1990 apud O’MALLEY E CHAMOT, 1990, p. 372). Oxford (1990, p.1) também argumenta a favor do ensino das EA ressaltando os seguintes aspectos:

- em primeiro lugar, “estratégias são ferramentas para um envolvimento ativo e auto- direcionado, o qual é essencial para o desenvolvimento de competência comunicativa23”;

22 No original: “Each of us has a whole host of possible ways to solve a particular problem and we choose one –

or several of those in sequence – for a given problem”.

23 No original: “Strategies are tools for active, self-directed involvement, which is essential for developing

- em segundo lugar, “EA apropriadas resultam em maior proficiência e maior auto- confiança24” por parte do aprendiz.

O esquema de classificação geral das EA desenvolvido por O’Malley e Chamot (1990)25 representa um dos principais alicerces que dão sustentação ao presente estudo. De

acordo com tal classificação, as estratégias dividem-se em três grupos:

METACOGNITIVAS COGNITIVAS SOCIAIS / AFETIVAS

reflexão sobre o processo de aprendizagem; planejamento para organização do discurso; monitoração de compreensão ou produção; atenção seletiva, através da qual é possível identificar e/ou solucionar problemas identificação de problemas, decorrente da monitoração de compreensão auto-avaliação durante e após o término da atividade. organização (agrupamento e classificação de palavras, terminologia ou conceitos de acordo com seus atributos sintáticos e semânticos);

inferência contextual (uso do

contexto lingüístico para “adivinhar” ou predizer significados desconhecidos);

síntese (resumo mental, oral ou

escrito das principais idéias do texto lido);

transferência (utilização de informações lingüísticas já conhecidas);

elaboração (integração de novas

idéias à informações conhecidas);

imagem (uso de imagens visuais

para compreensão e lembrança de nova informação verbal).

interação (com parceiros e

/ou professor);

controle afetivo (capacidade

de lidar com sentimentos, como a ansiedade, a frustração ou o desânimo, os quais freqüentemente atrapalham a fluidez da leitura, em casos de dificuldade);

cooperação (trabalhos em

grupo, por exemplo);

pedidos e questionamentos

(para obtenção de esclarecimentos);

fala individual (auto- encorajamento, para reduzir a ansiedade sobre determinadas atividades)

Quadro 1: Estratégias de aprendizagem

A partir dessa descrição das EA, podemos visualizar os aspectos que caracterizam cada grupo, a saber:

estratégias metacognitivas: procedimentos de execução usados para planejar, monitorar e avaliar a tarefa de aprendizagem a ser realizada;

24 No original: “Appropriate language learning strategies result in improved proficiency and greater self-

confidence”.

25 Oxford (1990) também desenvolveu um estudo completo e abrangente acerca das EA no qual apresenta seu

estratégias cognitivas: concernem à interação com o material a ser aprendido através da manipulação física ou mental do mesmo;

estratégias sociais e afetivas: envolvem a interação com outras pessoas e/ou o uso do controle afetivo para auxiliar na aprendizagem.

Diante do exposto nesta seção, podemos verificar que a instrução explícita das EA constitui um elemento de grande utilidade no ensino de uma LE, uma vez que o uso consciente dessas estratégias contribui para a formação de aprendizes mais eficientes e autônomos. Assim, a seção subseqüente faz uma apresentação das EA voltadas para uma habilidade específica, a de leitura, procurando discutir aspectos relevantes que corroboram a proposta de conscientizar o aluno acerca do uso das mesmas visando ao aprimoramento do desempenho desse aluno como leitor em LE.

1.4.1 As EA de leitura

Encontramos, na literatura sobre EA, diversos estudos cujo foco está voltado para a investigação das estratégias empregadas na leitura (BROWN, 1987; HOSENFELD, 1977, 1984; MOTTA, 1997; VAN DIJK E KINTSCH, 1983; WENDEN E RUBIN, 1987).

Van Dijk e Kintsch (op. cit) definem estratégias de leitura como qualquer controle deliberado e engenhoso de atividades que dão origem à compreensão de um texto. Concepção muito semelhante a essa é encontrada nos postulados de Brown (op. cit), que afirma que as estratégias de leitura implicam controle planejado e deliberado de atividades que levam à compreensão. O autor, aprofundando seus estudos acerca das EA de leitura, aponta sete atividades metacognitivas desse tipo, a saber:

• explicitação dos objetivos de leitura;

• alocamento de atenção em trechos que são importantes;

• monitoração do comportamento para ver se a compreensão está efetivamente

ocorrendo;

• engajamento em revisão e auto-indagação para verificar se o objetivo está sendo (ou

foi) atingido;

• tomada de ações corretivas quando são detectadas falhas na compreensão; • recobramento de atenção quando a mente se distrai e faz digressões.

Ao se referir ao controle planejado e deliberado de atividades, o autor deixa claro que a questão do uso das estratégias voltadas para a leitura está estreitamente relacionada com a consciência explícita dessas ferramentas, posição também defendida por outros teóricos (ANDERSON, 1999; COHEN, 1998; O’MALLEY E CHAMOT, 1994; OXFORD, 1990). Por conseguinte, em situação de ensino de leitura, é necessário auxiliar o aluno a adquirir o domínio dessas estratégias metacognitivas, quando ele ainda não o tem. É válido ressaltar que essas atividades enumeradas por Brown (op. cit) direcionaram a prática desta pesquisadora ao longo da implementação das atividades que compõem a proposta de intervenção deste estudo. De acordo com Motta (1997), as EA desenvolvidas para atividades de leitura envolvem tudo aquilo que poderá ser utilizado pelo aluno para facilitar o entendimento e também a organização do conhecimento propiciado pela leitura. Paris, Lipson e Wixon (1983, apud MOTTA, 1997) afirmam que o aprendiz poderá superar suas dificuldades na leitura por meio do conhecimento dessas estratégias e do uso da metacognição, isto é, por meio de sua conscientização sobre o processo de aprendizagem. É válido ressaltar, no entanto, que a escolha das estratégias a serem ensinadas e trabalhadas em cada atividade de leitura varia de acordo com a dificuldade do texto ou tarefa, com os objetivos propostos na atividade e com os objetivos do próprio leitor.

Outro aspecto a ser considerado é o fato de que, durante uma leitura em LE, as estratégias cognitivas e as metacognitivas são freqüentemente usadas juntas, uma complementando e dando suporte à outra. Aliás, os estudos sobre estratégias em LE indicam que o uso combinado de estratégias tem, geralmente, maior impacto do que o seu uso isolado (GRABE, 1997; O’MALLEY E CHAMOT, 1990; OXFORD, 1990), fato que procurei ressaltar, para os alunos, durante as aulas da fase de intervenção.