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CAPÍTULO 3: ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

3.1 O processo de leitura em LE na visão dos alunos: considerações sobre esse diagnóstico

3.1.3 As estratégias mais usadas pelos alunos

Uma das perguntas do questionário de diagnóstico trazia uma série de EA de leitura as quais chamei de “recursos” visando facilitar o entendimento por parte dos alunos, uma vez que tal questionário foi aplicado logo no início da pesquisa e alunos não tinham, ainda, entrado em contato com essa nova terminologia – estratégias de aprendizagem. Solicitei a eles que refletissem sobre sua prática ao ler um texto em LE e escolhessem, dentre as categorias pré-

estabelecidas, os dois recursos mais utilizados para solucionar problemas de compreensão. É válido ressaltar que, em se tratando de um questionário semi-estruturado, os alunos tinham a opção de descrever sua própria estratégia, caso aquelas ali sugeridas não correspondessem à sua prática.

Dentre os alunos que gostam de ler, a categoria de maior recorrência foi a do uso do dicionário, escolhido por 28% dos alunos. Refletindo sobre as concepções de leitura e as dificuldades apontadas por eles (subitens 3.1.1 e 3.1.2), acredito que esse dado não causou surpresa, uma vez que a maioria dos alunos já havia declarado a importância atribuída ao vocabulário e a necessidade de conhecer todo o léxico de um texto. O segundo recurso mais apontado foi o uso de ilustrações (20%) para a construção de significado (estratégia cognitiva de inferência). Esse dado causou certa surpresa pois diverge do tipo de leitura decodificadora de palavras isoladas a qual fora detectada na grande maioria dos alunos.

Gráfico 5: Recursos mais utilizados pelos alunos durante uma leitura em LE (grupo que

gosta de ler)

Quanto aos IF, A1 e A2, informantes do grupo que gosta de ler, apontaram estratégias diferentes em seus questionários. A1 optou pelo uso do dicionário e pelo destaque de

RECURSOS UTILIZADOS DURANTE A LEITURA EM LE 5%

7% 11% 9% 20% 2% 2% 28% 7% 9% ignoro as palavras desconhecidas

tento "adivinhar" o assunto pelo títluo e/ou subtítulo continuo a leitura mesmo quando não entendo

leio no intuito de entender a idéia do texto e não das palavras utilizo meu conhecimento de mundo

faço uso de ilustrações para construir significado procuro indentificar os cognatos

destaco palavras, frases e/ou trechos importantes utilizo o dicionário

palavras, frase e/ou trechos importantes para descrever os recursos que mais utiliza na leitura em inglês. Apesar de mostrar que faz uso de uma EA metacognitiva- a da atenção seletiva -, A1 confirma sua preocupação em decodificar o léxico pelo uso do dicionário, dado que pôde ser confirmado em sua entrevista, como ilustra o seguinte trecho:

Excerto 11

1. A1: a gente sempre tem que dá uma recorrida no dicionário uma 2. vez ou outra (++) porque o inglês é assim (+) tem muitas

3. paLAvras que a gente não conhece aí: (+) eu costumo trabalhar

4. muito com (+) em decoRÁ as palavras (+) fica mais fácil pra mim

5. ((referindo-se à maneira que ela faz uma leitura em LE))

6. P: e você acha que essa técnica te ajuda”

7. A1: me ajuda porque é assim (+) eu vejo uma palavra estranha 8. (++) aí eu já coloco na minha lista de palavras que eu não sei (+)

9. vocabulário /

10.P: ah: você faz um vocabulário’

11.A1: faço (+) faço um vocabulário e tento decorar e se aparece de 12. novo (+) eu já sei o que significa (++) já é um modo deu saber do

13. que se trata o texto

(entrevista – fase de diagnóstico)

Podemos inferir, da fala de A1, que ela tem uma visão estruturalista de leitura a qual acaba por direcionar o comportamento do leitor frente a uma atividade de leitura em LE, além de influenciar o tipo de estratégia utilizada para solucionar problemas de compreensão. No caso de A1, ao se deparar com palavras desconhecidas, sua atitude é anotá-la em uma lista, com o correspondente em português, para posteriormente decorá-la. Partindo da idéia de que a memória dessa aluna fosse muito eficiente nesse tipo de exercício, ainda assim haveria uma conseqüência negativa desse tipo de procedimento: o risco de, em outro contexto, essas palavras já “decoradas” denotarem outro sentido, desconhecido pelo leitor, fato que acarretaria problemas na compreensão das idéias do texto. Em situações como essa, torna-se essencial conscientizar esse aluno sobre o uso de estratégias cognitivas de dedução e de inferência, as

quais auxiliam na construção do significado partindo, por exemplo, da identificação de cognatos e do uso do contexto.

A informante A2, durante a entrevista, também reafirmou sua preocupação em “aprender” o novo léxico que se apresenta em um texto, como ilustra o seguinte excerto:

Excerto 12

1. P: e qual é a maior dificuldade que aparece quando você tá lendo 2. em inglês”

3. A2: ah (+) às vezes algumas palavras assim (+) VERBOS que eu 4. não conheço (++) mais logo eu procuro::: aprender essa palavra

5. pra pra próxima leitura já tá (++) já tá sabendo mais

6. P: e de que maneira você procura aprender (+) quando você vê um 7. vocabulário desconhecido em um texto (+) de que maneira você

8. tenta descobrir’

9. A2: ah (+) procuro em livros (++) é::: dicionários (entrevista – fase de diagnóstico)

Vemos que A2, além de utilizar o dicionário como meio de solucionar problemas de vocabulário, compartilha da visão de leitura de A1. Ao afirmar que, quando se depara com vocabulário desconhecido, ela logo tenta descobrir seu significado para “próxima leitura já estar sabendo mais”, A2 também demonstra desconhecimento da natureza dinâmica da língua, cujos componentes podem assumir os mais diversos significados em função do contexto no qual estão inseridos.

Ainda sobre a informante A2, há que se destacar um aspecto positivo de sua prática de leitura, o qual pôde ser detectado na entrevista semi-estruturada. Vejamos os excertos abaixo:

Excerto 13

1. A2: ((questionada sobre o que é ser um bom leitor)) ah (+) quando 2. ele tá entendendo TUDO e::: resolve NÃO parar (+) mesmo que às

3. vezes ele não tá entendendo (+) (incompreensível) que ele entende

4. pra quem sabe mais lá no final (+) entendê o contexto

Diante de tal depoimento, decido perguntar se ela se considera uma boa leitora, e obtenho a seguinte resposta:

Excerto 14

1. A2: eu acho que sim (+) sou uma boa leitora

2. P: então você costuma fazer isso ((entender pelo contexto)) 3. quando tá lendo e não entende alguma coisa (+) é isso que você

4. faz”

5. A2: na maioria das vezes sim (+) continuo lendo pra ver se eu 6. entendo

(entrevista – fase de diagnóstico)

Apesar do apego à forma, em especial ao vocabulário, e de sua preocupação em decorar palavras desconhecidas para se preparar para leituras futuras, como constatamos anteriormente no discurso de A2, nesses últimos excertos de sua entrevista podemos identificar que ela se utiliza do processamento descendente para construir significado durante uma leitura em LE. Ela deixa claro que faz uso dessa estratégia cognitiva de inferência pelo contexto para solucionar problemas de compreensão, fato que viria a se confirmar na análise dos protocolos da segunda etapa da pesquisa.

O gráfico 6 traz os dados referentes às estratégias mais utilizadas pelos alunos que não gostam de ler e cujas respostas assemelham-se às do outro grupo. Aqui, as categorias do uso do dicionário e do uso das ilustrações também foram bastante apontadas, representando 26% e 21% das opiniões, respectivamente.

Gráfico 6: Recursos mais utilizados pelos alunos durante uma leitura em LE (grupo que não gosta de ler)

Há, no entanto, um dado muito interessante – 27% dos alunos declararam que continuam a leitura mesmo quando não entendem, compondo assim, o recurso mais recorrente. A partir de tal informação, senti que essa era uma questão que deveria ser aprofundada, pois havia a necessidade de descobrir o propósito desses alunos ao dar continuidade à leitura mesmo diante de dificuldades. A partir de tal informação, aventei uma possibilidade de explicação para esse fato. Os 9 alunos desse grupo, no questionário de diagnóstico, justificaram a falta de gosto pela leitura usando os seguintes argumentos: não gosto de ler porque nunca tem assunto que me interessa; porque não sou chegado em livros; porque não tenho incentivo próprio, tenho preguiça; por falta de interesse próprio; porque nunca fui de ficar lendo, não sou acostumado a ler.

O que podemos observar, no discurso desses alunos, é um aspecto comum que diz respeito à própria motivação. Assim, é possível que, numa atividade de leitura para fins escolares (em sua maioria de caráter avaliativo), eles leiam o texto sem interrupções, sem se

RECURSOS UTILIZADOS DURANTE A LEITURA EM LE

11% 5% 27% 5% 21% 5% 26%

ignoro as palavras desconhecidas tento “adivinhar” o assunto através do título e/ou sub-títulos

continuo a leitura mesmo quando não entendo

utilizo meu conhecimento de mundo

faço uso de ilustrações para construir significado

faço uma primeira leitura para entender a idéia geral

preocupar com os problemas de compreensão justamente pela falta de interesse em depreender o real sentido do texto e, também, pela falta de interesse em aprimorar sua própria habilidade como leitores.

É interessante notar que a estratégia cognitiva de inferência de sentido pela análise de ilustrações e/ou marcas tipográficas tenha sido a terceira mais indicada, com 21% das opiniões. Em se tratando de alunos que afirmam sua preguiça e desinteresse pela leitura, é esperado que eles, diante de dificuldades de compreensão, lancem mão de recursos que não exijam deles o árduo trabalho de ler o texto na íntegra para, ao menos, se inteirarem do assunto ali tratado. Nesse caso, inferir significados a partir de ilustrações pode trazer resultados satisfatórios. Todavia, esse tipo de leitura que privilegia o processamento descendente de informações, sem confirmação posterior nas formas do texto, pode promover construções inadequadas de sentido (CARRELL, 1995). Arriscaria ir além nessa análise e buscar, nas palavras de Eskey (1995), a causa mais comum da dependência excessiva do processamento descendente para se chegar à compreensão de um texto a qual seria a falta de conhecimento específico das estruturas e do léxico da LE para se utilizar no momento do processamento de informações.