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7 PRODUÇÃO DE ÁGUA DE COCO EM

7.1 ESTRUTURA DA PRODUÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO

A produção do município de Petrolândia é comercializada em diversas cidades do Nordeste e Sudeste do Brasil, como em Maceió, Salvador, Petrolina, São Paulo, Rio de Janeiro, entre outras. Somente o Perímetro Irrigado de Apolônio Sales produz, aproximadamente, 400 caminhões de coco por mês, o que representa cerca de 3.200.000 cocos comercializados com outras cidades.

A maioria dos produtores comercializa por meio de atravessadores, porém uma pequena parcela escoa via algumas empresas que se instalaram na região, como a Paraipaba, a Dicoco, a Pepsico, Amacoco33, Serra Coco, entre outras, empresas que não estão instaladas no município, mas compram a produção local, como a Frisk,

33A Pepsico comprou, em 2009, a Amacoco, uma das principais compradoras da água de coco de

Petrolândia. A empresa era responsável pelas marcas Kero Coco e Trop Coco e uma das maiores produtoras do Brasil, com fábricas em Petrolina (PE) e São Mateus (ES).

Ducoco, Sococo, entre outras pequenas empresas que comercializam a água de coco no próprio município.

A água de coco de Petrolândia tem um alcance internacional (Mapa 4). A Paraipaba Agroindustrial é uma indústria exportadora com sede na cidade de Paraipaba, no Ceará, com uma filial localizada em Apolônio Sales. Desde 2012, a empresa passou a extrair e pasteurizar a água de coco em Petrolândia. Depois desse processo, a água segue para Paraipaba, embalada em bags (Fotografia 13) e (Figura 7).

No Ceará, a água de coco passa pelo processo de beneficiamento com a aromatização, são inseridos sabores de açaí com romã, abacaxi, laranja, limão, manga com pêssego e a água de coco natural (Figura 7) e (Figura 8). Cerca de 90% da produção é direcionada para o mercado estrangeiro (Mapa 4) por meio da Vitacoco, uma das maiores revendedoras do mundo, dentre outras, como a empresa austríaca Dr. Antônio Martins, que atua no ramo de orgânicos. Os 10% restante são comercializados nos supermercados do Brasil, principalmente nos Estados do Sudeste. A água aromatizada segue para o mercado externo, a não aromatizada permanece no mercado nacional.

Mapa 4 - Destino internacional da água de coco industrializada de Petrolândia

Fotografia 13 - Bag de 1000 litros para armazenar água de coco pasteurizada

Fonte: O autor.

A água de coco de Petrolândia é reconhecida como um produto de alta qualidade. Geralmente, é comercializada para apreciação da classe média alta e elite. Nos países desenvolvidos, ela é encontrada em supermercados com alto nível de especialização. Na Alemanha, por exemplo, o produto é encontrado nas galerias Kaufhof, nas lojas Käfer, Galeries Lafayette etc (Fotografia 14).

A Paraipaba compra somente dos produtores de Apolônio Sales, devido à qualidade do produto, que é melhor que em outros reassentamentos em função das condições do solo, irrigação e manejo da cultura. Normalmente a empresa compra o litro do coco e não a unidade. Então envia um caminhão gratuitamente para o lote, que será abastecido sob responsabilidade do agricultor (Figura 7) e (Figura 8).

O processo de negociação ocorre diretamente entre a Paraipaba e o agricultor. O produtor envia sua colheita para a empresa e lá é analisado quantos litros tem a quantidade enviada para, então, ser efetuado o pagamento ao produtor. Em um determinado caso, a colheita de 9.300 cocos resultou em 3.250 litros, o que foi questionado pelo produtor, porém os agricultores não têm condições técnicas de averiguar a análise da empresa. Por esta razão, há produtores que preferem vender o coco para outras empresas ou com os atravessadores, nesse caso, não

comercializam por litro, mas sim por unidade. O valor normalmente oscila em torno de R$0,40, podendo cair, no inverno, até R$0,25.

Figura 7 - Cadeia de produção da água de coco de Petrolândia para exportação

Fonte: O autor.

O valor da água de coco no país importador deve incluir todos os custos do processo produtivo; no entanto, nem todos os gastos são considerados no valor da comercialização, o que torna o produto mais barato, com ônus para o produtor. Por exemplo, o valor da terra e da água não são apontados no processo de produção. Dessa forma, toda a água utilizada para produzir o coco não é contabilizada em termos

Processo na sede da agroindústria

Produção Transp. no trator Transp no caminhão Análise do fruto Quant. dos litros Pasteuri- zação Embalag. em bags Transp. para sede Higieniza- ção Aromati- zação Embalag. tetra pak Comer- cialização Extração Processo no lote

de produção e comercialização. A terra, que foi doada como forma de compensação pelos danos do reassentamento, também não é considerada, somente os insumos químicos e maquinários são considerados pelos produtores, o restante é acrescentado pela agroindústria e pelos retalhistas e varejistas.

Fotografia 14 - Água de coco em embalagens tetra pak

Fonte: O autor.

O processo produtivo de água de coco no lote deve considerar alguns elementos que não são abordados pelos produtores na hora da comercialização da água de coco em litros e também da unidade do coco, como aponta o esquema na Figura 8.

De acordo com a Figura 8 são necessários alguns processos para que a água de coco conservada na embalagem tetra pak chegue às mãos dos consumidores. Os processos foram divididos em espaços diferentes. O primeiro ocorre ainda no lote, sob responsabilidade do produtor. O segundo ocorre com a agroindústria, sob responsabilidade da própria organização.

No lote, os custos para produção são com os adubos, com os fertilizantes e com a extração. A água é gratuita e a terra foi doada para compensar os danos da construção do Reservatório de Itaparica; com isso, os produtores não somam os valores do uso da terra e nem do uso da água na hora de comercializar a água de

coco ou o fruto. Porém, sem a terra e a água seria impossível manter a cultura. Inclusive a quantidade de água é responsável pela qualidade do fruto; mesmo assim, esse recurso natural não é incluído nas contas para sugestão de preços. Além da água e da terra, há ainda alguns os custos ambientais devido à supressão da vegetação nativa e dos impactos sobre a biodiversidade local. O que torna a água de coco mais cara que seu valor comercializado.

Figura 8 - Relação produção e compensação do custo para produção da água de coco industrializada de Petrolândia

Fonte: O autor.

Nesta perspectiva, surge a dúvida sobre quem assume esses gastos. Uma parte é conferida aos próprios produtores e outra ao Estado, porque os reassentamentos ainda são gerenciados pela Codevasf. Os custos com a manutenção do abastecimento de água ficam a cargo do Estado e os da fertilidade do solo com os produtores; no entanto, esses gastos não são observados.

US$ 0,21 0,20 € R$ 0,70 Participação na produção Compensação do custo Terra Extração Adubo Fertilizante Água R$7,70 2,20 € US$ 2,47 Supressão da veg. nativa

Perda da biodiversidade Beneficiamento Comercialização Transporte Processos com o produtor Processos com a agroindústria

Caso fosse exigido um valor a considerar as questões tratadas anteriormente, os produtores disponibilizariam de reservas financeiras suficiente para realizar a manutenção do sistema de irrigação e para resolver diversos problemas, por exemplo: correção do solo. Visto que o sistema local ainda é o mesmo utilizado quando o reassentamento foi instalado, inclusive há diversos pontos com infraestrutura defasada, alguns lugares com vazamento, outros com entupimentos etc.

Deve-se ressaltar o valor imensurável da água para o semiárido brasileiro. A região sofre periodicamente com conflitos ambientais, milhões de pessoas são vítimas de secas. Para a maioria, o racionamento de água em épocas de estiagem é um privilégio. Neste cenário, famílias inteiras precisam se mudar para outras cidades por causa da falta de água.

Os perímetros irrigados de Petrolândia se destacam nesse contexto. Estes são abastecidos pelo Reservatório de Itaparica e, durante o racionamento, têm acesso diário a água para uso residencial e agrícola.

Outros reassentamentos públicos não são contemplados pelas águas do reservatório, como é o caso dos assentamentos do Movimento Sem Terra (MST). Nesses lugares, os agricultores precisam sair de suas terras para trabalhar nas áreas irrigadas como forma de subsistência. Por exemplo, o Assentamento Antônio Conselheiro, localizado a 1 km do reservatório, não tem nenhum sistema de captação, nem mesmo para abastecimento residencial. Os produtores precisam armazenar a água em cisternas particulares para poderem irrigar e consumir.

Este cenário revela, de modo mais claro, como a água é um bem de alto valor para a região e principalmente para produção agropecuária. Mesmo sendo geograficamente acessível, por razões políticas e sociais tornou-se um bem completamente inacessível, principalmente para os pequenos produtores, que não se enquadram diretamente nas determinações do acordo entre a Chesf e o Polo Sindical.

Com relação ao solo, deve-se considerar primeiramente que os produtores reassentados dos perímetros irrigados não pagam aluguel e não precisaram comprar a propriedade, mas este custo está implícito desde o período da transferência. Há também o problema da salinização do solo e da erosão. Os produtores investem em medidas para evitar o processo ou corrigir o solo já salinizado. Estes valores também deveriam ser contabilizados no valor do produto.

Nesta perspectiva, entende-se que a água de coco é comercializada por um valor muito aquém do merecido, visto que os elementos básicos que contribuíram para sua produção, não são contabilizados durante a decisão de preços e comercialização. Dessa forma, os consumidores adquirem um produto de qualidade excelente, sob o ponto de vista do sabor, onde os principais recursos utilizados na sua produção não estão incluídos no valor de compra, isto significa que o uso da água e do solo é gratuito para os consumidores; além disto, estes recursos estão diante de um contexto de segregação ambiental, uma vez que milhares de agricultores também necessitam da água, mas têm seu acesso negado.

Diante deste fato, pode-se concluir que o coco e a água de coco de Petrolândia são bem mais valiosos do que o seu preço de mercado, visto que, para seu consumo, não se considera o valor da água, da terra e o contexto de vulnerabilidade que a região enfrenta, como os conflitos ambientais, materializados no estabelecimento de uma situação de inacessibilidade à água e à terra.

Conforme este raciocínio, observa-se que alguns processos podem ter continuidade porque têm o retorno financeiro suficiente para ser mantido; porém outros processos não o têm, precisam de investimentos originários de outras fontes para permitirem que a cadeia produtiva funcione normalmente.

Como o adubo, o fertilizante e a mão de obra são contabilizados no preço do produto, então estes sempre terão recursos para serem mantidos no ciclo da produção. Portanto, as multinacionais produtoras destes produtos podem reproduzir sua acumulação de capital e de mais valia neste ambiente. A mão de obra de local tem seu retorno financeiro; dessa forma, pode ser mantida, mas os recursos extraídos do ambiente local, como: terra, água e os impactos ambientais como supressão da vegetação nativa, redução da biodiversidade, não tem nenhum incentivo a partir da comercialização para se manterem ou reproduzirem, porque seus valores não são contabilizados no preço.

Dessa forma, cabe questionar como os reassentados se mantêm atualmente? Com os investimentos do Governo Federal ou dos próprios produtores, quando retiram este valor do seu apurado, ou quando contraem dívidas? Esta parcela do lucro poderia servir para sobrevivência do próprio produtor. Muitos precisam vender seus lotes porque o valor da comercialização não tem sido suficiente para se manter no campo.

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