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3. A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DE SANTANA

3.6. Estrutura e funcionamento da educação atual

A estrutura física, em 2009, é a mesma que foi construída em 1988, sem que tenham ocorrido reformas ou ampliações. Há alguns anos os moradores de Santana vêm reivindicando junto ao poder público municipal a construção de um prédio escolar que tenha estrutura física para comportar todas as modalidades de ensino que já são desenvolvidas no assentamento. É um desejo dos moradores que essa escola se vincule aos princípios e metodologias de uma educação do campo32, já existindo um projeto político-pedagógico elaborado pelas

professoras da escola, aprovado pela Secretaria de Educação do Estado do Ceará - SEDUC e

32 Uma das políticas públicas voltadas para a educação do campo é o PRONERA, vinculado ao Ministérios de Desenvolvimento Agrário - MDA. Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) através do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra),. Tem a missão de ampliar os níveis de escolarização formal dos trabalhadores rurais assentados. Atua como instrumento de democratização do conhecimento no campo, ao propor e apoiar projetos de educação que utilizam metodologias voltadas para o desenvolvimento das áreas de reforma agrária. Os jovens e adultos de assentamentos participam de cursos de educação básica (alfabetização, ensino fundamental e médio), técnicos profissionalizantes de nível médio e diferentes cursos superiores e de especialização. O Pronera capacita educadores, para atuar nas escolas dos assentamentos, e coordenadores locais, que agem como multiplicadores e organizadores de atividades educativas

comunitárias. (Disponível em:

http://www.incra.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=category&layout=blog&id=49&Itemid=7 5) Acesso em: 31/12/2009

pelo Conselho Estadual de Educação, cujo texto não tive acesso. A direção da escola me informou que um novo texto estaria sendo escrito no segundo semestre de 2009 e ainda não estava pronto. A organização das modalidades de ensino da Educação Infantil até o Ensino Médio Profissionalizante é complexa e requer mais informações. O único prédio escolar existente, em cujo muro consta “Escola São Francisco”, dispõe de duas salas de aula, dois banheiros, uma cantina e um pátio externo que serve como quadra esportiva e local para a realização de eventos.

As atividades do corpo docente de Santana prestam atendimento aos próprios moradores e a mais cinco comunidades, contando com cerca de 300 alunos. O atendimento se dá nos três turnos, garantindo escolarização para todos os moradores. O corpo docente é composto por professores não graduados em ensino superior, graduados e pós-graduados e já existe um novo contingente de educadores em formação dentro da própria comunidade.

A escola de Ensino Fundamental tem a categoria de escola sede ou escola patrimonial, é municipal com a denominação de Escola de Ensino Fundamental São Francisco, possuindo cinco anexos distribuídos nas comunidades circunvizinhas. São Sebastião (Comunidade Olho d’Água Velho); Antonio Marculino Bezerra (Comunidade Piedade); Nossa Conquista (Comunidade Tira Teima); Nova Conquista (Assentamento Orange); Domingos Luciano da Silva (Assentamento Alegre) e Santa Célia (Comunidade Bargado).

A Escola São Francisco33, na categoria de escola sede, está diretamente vinculada ao

PDDE34, o que permite que os recursos sejam administrados pelo Conselho de Educação do

33 A comunidade possui registros de todo esse processo de ensino a partir de 2002. Outros dados anteriores são encontrados na Secretaria de Educação de Monsenhor Tabosa. A secretária da escola lembra que foram feitos os registros da Escola São Francisco a partir de 1996, mas estes foram extraviados. A documentação da doação do terreno está em poder da comunidade.

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Criado em 1995, o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) tem por finalidade prestar assistência financeira, em caráter suplementar, às escolas públicas da educação básica das redes estaduais, municipais e do Distrito Federal e às escolas privadas de educação especial mantidas por entidades sem fins lucrativos, registradas no Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) como beneficentes de assistência social, ou outras similares de atendimento direto e gratuito ao público. O programa engloba várias ações e objetiva a melhora da infra-estrutura física e pedagógica das escolas e o reforço da autogestão escolar nos planos financeiro, administrativo e didático, contribuindo para elevar os índices de desempenho da educação básica. Os recursos são transferidos independentemente da celebração de convênio ou instrumento congênere, de acordo com o número de alunos extraído do Censo Escolar do ano anterior ao do repasse. Até 2008, o programa contemplava apenas as escolas públicas de ensino fundamental. Em 2009, com a edição da Medida Provisória nº 455, de 28 de janeiro (transformada posteriormente na Lei nº 11.947, de 16 de junho de 2009), foi ampliado para toda a educação básica, passando a abranger as escolas de ensino médio e da educação infantil. Em 2008, o PDDE investiu R$ 692,7 milhões, beneficiando 26,9 milhões de alunos, matriculados em 117,4 mil escolas. Com a ampliação do programa, o universo de alunos beneficiados em 2009 passou para 45,6 milhões, em 164,1 mil escolas. O orçamento previsto para este ano é de R$ 930,8 milhões.

assentamento e pelo núcleo gestor da escola. No caso de Santana, pelo coletivo de educadores. O Ensino Fundamental I permanece como um anexo da Secretaria de Educação do Município de Monsenhor Tabosa. A secretária da escola explica como funciona a sistemática de registros oficiais de dados escolares entre o assentamento e o município.

Temos dados de 2002/2004 porque os de 2003 foram extraviados pela Secretaria. Os Livros de Atas são feitos aqui mesmo. Como não é totalmente desmembrada do município, os livros de atas vão pra lá e fazemos os registros dos resultados finais... ai eles mandam pra gente pra assinar. Nós não ficamos com cópia aqui. Só assinamos e eles ficam com ela. Nós ficamos com os livros aqui. Às vezes não dá tempo tirar cópia porque eles chegam numa moto de noite e a gente fica até 10 horas da noite assinando e devolvemos pra lá. Mas nós temos as informações em livros. A diferença é que nas atas tem a assinatura do diretor e do secretário. Lá eles fazem no computador e eu assino meu nome em cima. Mas os dados são iguais ao que temos aqui nos livros. O mesmo cabeçalho. (entrevistada 10)

A expedição da documentação é feita de acordo com as modalidades de ensino. Até o ano de 1988, os documentos como transferências, declarações e certificados, eram elaborados pela secretaria da escola São Francisco, mas necessitava da assinatura da secretária da Escola Luis Leitão, cuja sede é em Monsenhor Tabosa. Cabia ao diretor dessa escola ir até a secretaria pedir o material escolar para destinar ao anexo do assentamento.

Em 2002, a Escola São Francisco passou a ser sede para o Ensino Fundamental I e Anexo da Escola Luís Leitão para o Ensino Fundamental II. Nesse caso, a secretaria passou a expedir sua documentação até o 9º Ano.

Os moradores acreditam, conforme depoimentos, que os recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola – PDDE não são repassados da maneira justa ou adequada. A comunidade não tem meios legais de reivindicação porque não sedia todos os níveis de ensino próprios do assentamento. É um ensino legalizado, mas vinculado às escolas da zona urbana de Monsenhor Tabosa. Daí resulta a luta por um prédio escolar mais amplo que possa justificar a legalização de todos os níveis de ensino dentro da estrutura do assentamento, reduzindo a presença de mediação de outras escolas.

A diretora atual da escola explica que o governo providencia projetos e benfeitorias para contribuir com o desenvolvimento da comunidade em geral, por meio da cooperativa. No que se refere à escola, entretanto, todas as conquistas são resultado de lutas incessantes, junto à prefeitura. Um comentário que vem ao encontro da idéia defendida neste trabalho de que o Estado brasileiro não enxerga no campo a necessidade do ensino ser tão desenvolvido como as outras áreas.

A diretora exemplifica que o próprio recurso do PDDE foi descoberto pelas professoras por meio de consultas à internet. A escola local tinha direito, mas como não tinha conhecimento disso, esse direito não era garantido. Após essa descoberta, foi feita a reivindicação junto à prefeitura, que passou a dividir parte dos recursos. No entanto, o único recurso direto que recebem é destinado à merenda escolar. Os recursos para a merenda, até maio de 2009, ainda não havia sido repassado.

A comunidade pode receber recursos na própria escola referente ao Ensino Fundamental I, uma vez que os documentos são produzidos e assinados na secretaria da escola do assentamento. Essa foi uma conquista do ano de 2004. Segundo depoimentos, a comunidade conquista todas as suas demandas por meio de lutas e reivindicações, indicando que a prefeitura municipal não garante seus direitos de outra forma.

A gente se junta, discute e elabora documentos, pega assinatura da comunidade, faz ofícios, manda pro órgão correto, vai comissão de três ou quatro pessoas. Se não der certo a gente envia de novo. Quando a gente quer uma coisa, faz uma vez, faz duas. As coisas para Santana eles liberam logo pra gente não ficar insistindo. Procuramos acordos. (entrevistada 12)

Neste ano de 2009, o assentamento já recebeu a visita de engenheiros de empreiteiras que estão destinadas a construir um prédio que seja capaz de concentrar todos os alunos e todas as modalidades de ensino ofertadas atualmente pela escola. O objetivo da comunidade é sediar, no assentamento, tanto o Ensino Fundamental quanto o Ensino Médio, tendo a possibilidade de gerenciar todos os recursos destinados à escola, reduzindo a presença de intermediadores como é a realidade atual.

A estruturação social da escola, entendida aqui como a instância de convivência e tomada de decisão foi organizada, segundo Santos (2009, p. 37), em sete instâncias. 1) Coletivo de Educação; 2) Assembléia Geral; 3) Direção Coletiva da Escola; 4) Coordenação da escola; 5) Equipe de disciplina; 6)Coletivo de Educadores e Educadoras; 7) Núcleos de Base.35 A organização descrita pressupõe um modelo diferenciado da conhecida hierarquia das escolas urbanas.

35 Assim se definem tais instâncias:

1) Coletivo de Educação: É formado por educadores/as, representantes dos educandos e educandas, pais, e representantes dos Núcleos de base do Assentamento O mesmo tem a função de realizar negociações com o poder público, planejar algumas atividades e realizar estudos da Pedagogia do Movimento, da Educação do Campo e outros temas.

2) Assembléia Geral: É a instância máxima da comunidade escolar. Após debates nos núcleos e na coordenação, as propostas e encaminhamentos serão aprovados em assembléia geral com a participação de todos e todas envolvidos no processo educativo e encaminhados para a realização nos núcleos e nas demais instâncias da escola.

A implantação de metodologia de nucleação na escola São Francisco foi registrada por Santos (2009, p. 39) em que a autora explica que o processo foi iniciado no ano de 2005 por meio da participação dela e de mais cinco estudantes do curso de Pedagogia da Terra (seis filhas de assentados de Santana) e de uma educadora do Assentamento. Essa educadora tinha vivências fora do assentamento por ocasião de sua especialização em educação do Campo na UNB. Esse grupo estava vivenciando novas metodologias aplicáveis ao ambiente escolar, engajadas em cursos de formação acadêmica e pedagógica com a interferência do MST. “Estes cursos apresentam uma nova forma organização que possibilita a participação efetiva dos educandos e educadores no encaminhamento dos trabalhos e organização do curso como um todo”. (2009, p. 39)

Em seu estudo, a autora aponta as dificuldades de fazer a adaptação desse tipo de vivência ao modo de vida dos assentados de Santana, sobretudo nos dois primeiros anos. “(...) alguns educadores não compreenderam a complexidade e importância da proposta para a escola nos seus diversos aspectos. E por não ter essa compreensão ficou um pouco difícil conduzir o processo. Em alguns momentos faltou o planejamento e outras vezes as pessoas deixavam de encaminhar atividades importantes para funcionamento deste processo de organicidade. (2009, p. 41)

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A mesma observou que essa organização proposta no regime de nucleação não ocorria em todos os núcleos, nem as discussões eram devidamente aprofundadas, segundo ela, pela “falta do entendimento das questões levantadas, porque na maioria das vezes faltava entendimento da importância e do funcionamento desta forma de organicidade.” (p. 42) Isso 3) Direção Coletiva da Escola: A Direção Coletiva da Escola é formada por representantes dos educadores/as; por representantes da coordenação dos Núcleos de Base dos educandos/as e pelo Núcleo Gestor, tendo como objetivo mobilizar o desenvolvimento educativo, cultural e organizativo dos educandos/as no envolvimento com a escola, assumindo, ainda, as funções correspondentes ao Conselho Escolar.

4) Coordenação da escola: É formada pelos coordenadores de cada núcleo. Dentre os coordenadores escolhem-se representantes para compor a direção coletiva da escola

5) Equipe de disciplina: Cada turma tem uma Equipe de Disciplina, formada por uma pessoa de cada Núcleo de Base. A turma escolherá um representante da Equipe de Disciplina da Turma para compor a Equipe de Disciplina da Escola, juntamente com um educador.

6)Coletivo de Educadores e Educadoras: O coletivo de Educadores e Educadoras é formado por todos educadores/as da escola. É função do Coletivo de Educadores e Educadoras debater, aprofundar, trocar experiência, avaliar e planejar a implantação da escola do campo, visando o processo de ensino-aprendizagem e o cotidiano escolar, num trabalho de pesquisa articulando teoria e prática, na ação educativa. Ter compromisso com a luta pela Reforma Agrária com o Assentamento e com a Educação do Campo e está inserido na organização da comunidade e da escolar visando uma sociedade mais justa mais humana e mais livre.

7)Núcleos de Base: As turmas são organizadas em Núcleos de Base de sete (7) educandos/as cada um. O objetivo dos Núcleos de Base da escola é a auto-organização dos educandos/as para realização de atividades, tarefas práticas, estudo, análise de problemas e propostas de encaminhamentos práticos. 37

levou à dispersão algumas turmas e nem todos os membros do núcleo participavam. Ela sentia falta de compromisso inclusive por parte de quem coordenava o núcleo e o processo como todo. Nesse fragmento, Santos reconhece que a metodologia aplicada tem falhas e o processo democrático também é falho em alguns aspectos.

Embora esse novo jeito de organização da gestão da escola possibilite a participação de todos nas decisões, percebemos que muitas vezes as decisões são tomadas por um pequeno grupo, derespeitando o coletivo e a estrutura orgânica da escola. Observamos que o coletivo de educadores às vezes decide sem a participação dos educandos. (2009, p. 47)