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4. A PRESENÇA DO RÁDIO EM SANTANA

4.11. O inicio, o fim e o meio

A radioescola, vista como o veículo rádio, apresenta características que contribuem com o desenvolvimento do assentamento, conforme os dados de pesquisa. O Projeto que possibilitou essa experiência vem enfrentando dificuldades em garantir a continuidade dessas rádioescolas. Uma dificuldade enfrentada pelos projetos sociais, de uma maneira geral, que implantam iniciativas que precisam perdurar mesmo após a saída dessas organizações.

Há uma regularidade no desenvolvimento do Projeto Segura Essa Onda no que se refere à perenidade das rádios implantadas, seja em assentamentos, em associações ou escolas. Mesmo quando todas as ações de implantação das rádios, incluindo formação de educadores e estudantes, rodas de conversa, reuniões de gestão da rádio e visitas de acompanhamento, são levadas a termo e os grupos de estudantes e educadores são formados, as rádios vivem uma fase produtiva e aos poucos perecem. Um fenômeno que inquieta as pessoas que fazem esse trabalho e contraria os objetivos do projeto. O intuito seria o de que, concluídas todas as oficinas de formação, de gestão e acompanhamento, as rádios funcionassem regularmente dentro de seus espaços sob a gestão das pessoas que foram formadas para isso e, paulatinamente, houvesse a inclusão de outras pessoas, que seriam orientadas por estas primeiras.

Ocorrem falhas de naturezas diversas que enfraquecem a rotina das rádios e desmotivam os participantes. A primeira é de natureza técnica e de baixo domínio pelas pessoas da ONG. Os equipamentos de som utilizados são antigos, alguns vêm deixando de ser fabricados. É o caso do deck duplo que usa fitas cassete. Essas fitas tiveram seu custo aumentado na proporção de R1,00 para R5,00 por unidade por estarem se tornando obsoletas. As cornetas com estrutura em fibra de vidro apresentam baixa resistência e queimam com facilidade. Os técnicos que trabalham com esses equipamentos são difíceis de encontrar na cidade. Nesse sentido o projeto tem evoluído pouco, ainda convivendo com os mesmos problemas, sem soluções à vista.

No ano de 2009, nos novos espaços em que o projeto vem sendo desenvolvido, a mesa de som foi acoplada a uma estrutura de metal (anexo), em forma de um carrinho de picolé, com rodízios, com a denominação de Radiolo. O deck duplo foi descartado e, em seu lugar, houve a inserção de um notebook para a edição e gravação dos programas. O amplificador e as cornetas foram substituídos por caixas de som amplificadas. Os resultados ainda não foram examinados porque as mudanças estão em testes. A equipe espera que essas mudanças surtam bons resultados e esse não seja mais o principal elemento a impedir a continuidade das radioescolas.

A segunda se refere aos recursos humanos. Os estudantes formados nas oficinas abandonam o grupo da rádio por motivo de gravidez, saída precoce da escola para trabalhos ou mudança de bairro, saída espontânea ou conclusão dos estudos naquele ambiente. Uma parcela de aproximadamente oitenta por cento dos educadores que concluem a formação não se envolve ou não se compromete com a rotina de programação da rádio, deixando-a aos cuidados dos estudantes. Normalmente as intervenções feitas por esses grupos que se evadem, junto com os educadores que nunca participaram são de caráter de censura e críticas negativas que não incentivam os estudantes em continuar suas programações.

Em Santana, existiram condições concretas de continuidade da radioescola no que se refere ao grupo de produção de mensagens. Um número suficiente de educadores se envolveu para desenvolver o trabalho na radioescola, os estudantes continuam no local e houve um bom entrosamento entre educadores, estudantes e comunidade. O que tem causado a descontinuidade é o equipamento, mas precisamente as quatro cornetas espalhadas pelo território próximo ao estúdio. Embora a ONG já tenha enviados alguns técnicos para analisar as causas, mesmo depois na conclusão do projeto, não surgiu, ainda, uma solução concreta que possa resolver o problema.

A rádio funcionou em diversos intervalos, de acordo com os períodos em que tais equipamentos se mantinham em funcionamento, depois de sucessivos consertos realizados pela ONG.

Essa limitação técnica é algo que justifica a descontinuidade da rádio. A impotência da ONG em resolvê-lo também. No entanto, durante a fase das pesquisas, em que esse equipamento foi consertado por várias vezes, registrei que os esforços para solucionar esse problema técnico foi da equipe da ONG e não da comunidade. As equipes faziam visitas, removiam as peças devolvendo-as consertadas. Houve dificuldade em arregimentar moradores que se dispusessem a ajudar a retirar as cornetas dos postes, eletricistas que residem no local que não dispunham de tempo para realizar ligações. Nesses momentos,

poucas pessoas se aproximavam do local e, quando era solicitado que algumas peças fossem enviadas para a capital, não havia mobilização e era sempre necessário alguém para vir até o local fazer a remoção e voltar para reinstalar. Caso houvesse um envolvimento maior do grupo gestor da rádio em mobilizar ajuda, os gastos seriam menores, assim como o tempo de inatividade da rádio.

Isso também ocorre em outros espaços em que as rádios são instaladas. Em Santana, todavia, de acordo com os depoimentos, houve valorização do funcionamento da rádio pelas pessoas do assentamento. Além disso, trata-se de um povoamento reconhecido por sua força de resistência e luta. Por que a comunidade não se mobiliza em prol da reativação da Rádio Cultura, já que é tão valorizada? Estaria a rádio circunscrita ao verbo, não como ação, mas como palavra?

5.

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: AQUISIÇÃO E PRÁTICAS