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2.7. Variáveis Justificativas da Influência das Crianças no Processo de Decisão de

2.7.4. Estrutura Familiar

A sociedade actual caracteriza-se pela pluralidade das formas de conjugalidade. Para além dos casais com vínculo matrimonial legal, surgem modelos como solteiros que vivem em casal e lares com um único chefe de família que educa sozinho ou com um companheiro os filhos.

As famílias monoparentais são lares que têm à sua cabeça não duas pessoas do sexo oposto, mas uma só, com filhos a seu cargo. As famílias monoparentais podem ser constituídas por pessoas viúvas, solteiras, separadas ou divorciadas. Segundo Segalen (1999), na maioria dos casos de famílias monoparentais são as mulheres que são chefes de família (é a mãe, enquanto progenitora, que fica com os filhos). Também Aboim et

al. (2005) apuraram que na esmagadora maioria dos casos a guarda legal da criança é

atribuída à mãe (90% dos casos).

No âmbito das novas estruturas familiares surgem ainda as famílias recompostas. Após o divórcio, cada um dos membros do antigo casal forma um lar. Os filhos passam assim a ter dois lares de referência. Depois do divórcio, os cônjuges poderão voltar a casar-se ou a coabitar sem matrimónio legal com um novo companheiro. Assistimos deste modo a uma abundância de pais, os biológicos e os sociais. Nestas novas famílias surge o

60 problema da divisão de papéis entre os progenitores (com a guarda e sem a guarda das crianças) e os cônjuges ou companheiros dos progenitores. Quem exerce o controlo quotidiano? Quem escolhe as grandes opções para o filho quando este é ainda muito pequeno? (Segalen, 1999).

A grande maioria das crianças que hoje nasce é desejada, inscrevendo-se o seu nascimento nas novas finalidades do casal. A chegada de um filho é objecto de um investimento afectivo considerável e, posteriormente, da vigilância dos projectos escolares. Com o divórcio, o casal conjugal e o casal parental encontram-se dissociados. O casal parental tem de continuar a funcionar para gerir a guarda dos filhos. A manutenção das solidariedades financeiras, de serviços, a divisão do tempo passado por cada um com os filhos, o atendimento dos desejos expressos por estes, o acesso ou a estadia no domicílio do outro, a partilha das responsabilidades relativas às instituições escolares, a conservação pela mulher do património do marido, as refeições tomadas em família são, entre outras, características que ilustram, no caso de certos “novos divorciados”, a preservação de solidariedades conjugais, tudo para benefício psicológico da criança. A preservação deste laço pós-conjugal parece ser difícil, dado que a maioria dos filhos de casais separados nunca vêem o pai ou só têm com este contactos episódicos (ibidem, 1999).

As Estatísticas Demográficas de 2007 do INE revelam as alterações ao nível das estruturas familiares em Portugal. O número de nados vivos registados fora do casamento tem vindo a aumentar reflectindo a adopção de outras formas de conjugalidade para além do casamento legal. Em 2007, a percentagem de nados vivos nascidos fora do casamento aumentou para 33,6%, sendo de 25,5% em 2002. Este aumento deve-se ao acréscimo da proporção de nados vivos ocorridos fora do casamento cujos progenitores viviam em coabitação, percentagem que atingiu os 27,0% em 2007 (20,4% em 2002). A de nados vivos ocorridos fora do casamento e sem coabitação dos pais, variou entre 5,1% em 2002 e 6,6% em 2007.

É cada vez menor o número de casamentos em Portugal. Entre 2002 e 2007, a taxa de nupcialidade diminuiu de 5,4 para 4,4 casamentos por mil habitantes. A idade média ao primeiro casamento tem vindo a aumentar, situando-se em 2007 em 29,4 anos para os

61 homens e 27,8 anos para as mulheres. Comparativamente, os valores registados em 2002 foram de 28,0 anos e 26,4 anos, respectivamente para homens e mulheres.

A nupcialidade de segunda ordem ou superior tem vindo a aumentar. Em 2002, do total de casamentos celebrados, 14,2% referiam-se a casamentos de segunda ordem ou superior, proporção que ascendeu a 22,9% em 2007 (20,6% em 2006).

Em mais de um quarto dos casamentos realizados em 2007 (31,8%), os nubentes já possuíam residência anterior comum, situação que tem vindo a aumentar nos últimos anos (18,1% em 2002). Em 26,6% dos casamentos celebrados em 2007, existiam filhos anteriores ao casamento.

A proporção de casamentos católicos tem vindo a diminuir. Em 2002, 62,5% dos casamentos eram católicos, valor que desceu para 47,3% em 2007 (53,9% em 2006). Em sentido oposto, a proporção de casamentos só civis aumentou de 37,5% em 2002 para 52,5% em 2007 e foram 49,4% em 2006.

Em Portugal, em 2007, foram decretados 25 255 divórcios, mais 1 320 do que em 2006 (23 935), tendo a taxa bruta de divorcialidade apresentado um valor de 2,4 divórcios por mil habitantes.

As crianças que vivem em famílias monoparentais são percepcionadas como tendo mais influência nas decisões de compra do que as crianças que vivem em lares com dois pais (Darley e Lim, 1986; Mangleburg et al., 1999).

Ahuja e Stinson (1993) apuraram que a probabilidade das crianças fazerem compras com os pais ou mesmo fazerem compras sozinhas é três vezes superior nas famílias monoparentais. Estes resultados poderão ser justificados pelo facto de nas famílias monoparentais as crianças assumirem mais responsabilidades e serem mais independentes do que nos lares com dois pais. Nas famílias monoparentais as crianças participam mais nas decisões de ir comer fora (Labrecque e Ricard, 2001) e nas tarefas domésticas, como ir às compras, limpar e cozinhar (Ahuja e Stinson, 1993).

Esta diferença poderá estar relacionada com diferenças ao nível da socialização da criança. Nas famílias monoparentais as crianças não são socializadas para ter uma clara distinção entre os papéis dos pais e das crianças. Na ausência de um dos pais, o estatuto da criança é muitas vezes igual ao do pai/mãe sozinho (Mangleburg et al., 1999).

62 Segundo Flurry (2007), as crianças provenientes de famílias monoparentais resultantes de um divórcio são as que têm maior influência na compra de produtos para a própria criança, sendo as crianças oriundas de famílias monoparentais de pais solteiros, isto é, que nunca casaram, as que menos influenciam a selecção dos produtos para o seu uso/consumo. Esta situação pode ser explicada pelo facto de os pais divorciados que actualmente formam uma família monoparental tentarem ultrapassar o sentimento de culpa por passarem menos tempo com os filhos e, devido a isso, estarem dispostos a compensá-los, gastando mais dinheiro com eles. Por seu lado, as famílias monoparentais com pais solteiros poderão ser mais rigorosas devido às limitações dos recursos financeiros.

Quando Flurry (2007) analisa a selecção dos produtos a comprar para a família constata que são as crianças provindas de famílias monoparentais de pais solteiros (nunca casaram) que mais contribuem para a pesquisa e decisão. Nas famílias monoparentais de pais solteiros, na ausência de um dos pais, a criança pode ser “promovida”, alcançando um estatuto igualitário, estando apta a exercer maior influência na compra de produtos para o consumo do lar. As crianças provenientes de famílias tradicionais, isto é, de pais casados, são as que menos contribuem na compra de produtos para a família, provavelmente resultado de uma maior restrição à participação, devido à presença de ambos os pais.