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5.3 POTENCIALIDADE PARA A GESTÃO DO CUIDADO À CRIANÇA COM

5.3.1 Estrutura de um hospital universitário

O hospital universitário compõe a Rede de Atenção à Saúde como componente fundamental de alta complexidade, estando integrado à rede de cuidados locais. Além da assistência, exerce importante função social de formar profissionais para o SUS, configurando-se num espaço de excelência para o ensino, a pesquisa e a extensão.

No Brasil, esses hospitais encontram-se regulados pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). No caso dos hospitais federais, os recursos humanos são parcialmente custeados pelo orçamento do MEC, bem como pela receita proveniente da produção de serviços assistenciais, gerada a partir de sua contratualização e pactuação com o SUS (LOBO et al., 2010).

Portanto, espera-se que sua estrutura possua condições tecnológicas para prestação do cuidado de alta complexidade e para a promoção do ensino e da pesquisa com qualidade, além de produzir ferramentas que propiciem sua integração à rede de cuidado local e à academia, visto que assume a dupla missão de ensino e assistência. Nessa direção, as falas dos participantes apontam ser a estrutura do hospital universitário potencializadora da gestão do cuidado integral.

[...] aqui a gente depois que veio para cá teve um grande avanço em relação a acesso aos exames de imagem, então, a gente tem uma criança que foi admitida ontem para investigar uma atresia biliar. Essa criança que já está aí com dois meses de vida, então essa criança já está há dois meses andando aí na rede. Chegou aqui ontem e já está encaminhando os exames, então, de certa forma, é rápido. A potencialidade do hospital é o acesso a exames de imagem que antes era muito difícil para essa criança. Então a gente percebe uma certa facilidade e tempo hábil. A diversidade de especialistas na pediatria, cardiologia, nefrologia, pneumo, dermato. A gente também tem essa potencialidade e com possibilidade até de crescer. Então a gente tem hematologista, a gente tem oncologista, né? Tem UTI pediátrica agora, para melhorar ainda mais a assistência a essa criança (en4).

[...] eu acredito que o fato de estarmos em um hospital universitário que [...] é um lugar ainda que a gente tem mais especialistas, pessoas realmente qualificadas para conseguir fechar diagnósticos, que não são tão comuns, a gente tem muito recurso terapêutico com relação a exames, né? a acessar exames de imagem, exames de maior complexidade. De certa forma, isso facilita o acesso desses pacientes a esses exames, a gente sabe que um paciente que vem, por exemplo, da unidade básica para realizar um exame de alta complexidade o tempo é muito maior que um paciente nosso que está internado (en8).

As falas demonstram acreditar no potencial do hospital universitário para a prática da gestão do cuidado em razão da alta densidade tecnológica que o caracteriza, constituída pela diversidade de especialista e pelo recurso terapêutico e diagnóstico, coerente com a sua função na Rede de Atenção à Saúde. Sobre esse aspecto, destaca que a integração da pediatria ao hospital universitário proporcionou avanços na atenção à saúde da criança à medida que possibilitou a criação da UTIP e facilitou o acesso da criança aos exames de imagem.

Acerca da gestão do cuidado, em sua dimensão sistêmica, durante a observação participante, a pesquisadora identificou, em algumas áreas como a atenção psicossocial, que o hospital universitário vem avançando nas discussões e nas capacitações sobre linhas de cuidado, articulação e compartilhamento do cuidado entre atenção hospitalar e ABS, tendo promovido, em dezembro passado, a oficina de compartilhamento do cuidado na rede de atenção, amplamente divulgada na mídia local.

Na oportunidade, foi apresentado o Sistema de Gerenciamento de Matriciamento Aplicado (GEMA), desenvolvido pelo Laboratório de Inovação Tecnológica do Hospital, sob a coordenação de um Professor e Pesquisador da universidade. O sistema GEMA tem como objetivo melhorar o processo de regulação entre a atenção básica e a especializada, facilitando a troca de informações entre os níveis de complexidade. Esse fato evidencia iniciativas voltadas para facilitar o matriciamento do hospital universitário à ABS e revela o potencial do hospital universitário para desenvolver tecnologias que promovam o cuidado em Rede, que, a exemplo da Atenção Psicossocial, poderão ser utilizadas em outras linhas de cuidado, como na Rede de Atenção à Saúde da Criança.

Para além da estrutura tecnológica, a missão histórica do hospital universitário na formação profissional também lhe confere uma visível credibilidade quanto ao seu potencial na gestão do cuidado:

[...] aqui, no hospital, tem pessoas capacitadas para realizar esse cuidado e é uma instituição formadora, acho que é um ponto positivo. Então, tem muita gente boa tentando fazer algo de bom. A formação, o interesse, também dos docentes (nu1).

[...] eu acho que a gente está no melhor local de todas as potencialidades que existem [...] por que se a universidade (hospital universitário) não tiver isso (gestão do cuidado) a oferecer, os outros não vão ter. A gente é a ponta do iceberg, somos o ápice da pirâmide. A gente pega a nata mesmo, a gente pega bons profissionais. A gente tem excelentes docentes na nossa área, pediatras antigos, pediatras já consolidados na prática. A gente tem enfermeiros com boa carga de formação. Não sei dizer em termos de percentual, mas a imensa maioria tem especialização. Grande percentual tem mestrado, alguns correndo atrás de doutorado, ou seja, temos uma boa formação, temos bons conhecimentos (en2).

Sem dúvida, os profissionais entrevistados atribuem um alto potencial de gestão do cuidado ao corpo técnico do hospital universitário, por ser constituído de profissionais qualificados, os quais incluem desde especialistas até doutores, além de contar com a presença de docentes nas atividades assistenciais, de ensino e de pesquisa. Reconhece-se, portanto, o destaque da qualificação e do envolvimento desses profissionais para a consolidação da gestão do cuidado.

Corroborando esses relatos, Fadel e Filho (2009), em seu estudo sobre qualidade nos serviços públicos de saúde, destacam que, na avaliação do cliente, a atuação profissional é o principal componente para a qualidade dos serviços. Porém, não somente sob os aspectos técnicos ou a qualificação profissional, mas principalmente quanto à forma de interação, acessibilidade, comunicação e compreensão das necessidades do usuário.

A qualificação profissional instrumentaliza o profissional a desenvolver a gestão do cuidado, mas não de forma suficiente. Para além da competência técnica, é necessário constituir equipes motivadas a fazer uma gestão do cuidado centrada nas necessidades do usuário a partir do uso das tecnologias relacionais de interação e comunicação com o usuário e com a Rede (MERHY, 2007). Dessa forma, a constituição de equipes que compartilham o cuidado com foco na criança revelou-se como uma potencialidade:

[...] acho que as potencialidades hoje é uma equipe, como um todo, unida com o objetivo maior: a criança que está aqui internada [...] (en4).

[...] o que tem de potencial, de bom é que a gente tem uma equipe com muita vontade de fazer uma gestão do cuidado [...] muito disposta a colocar isso aí em prática (en3).

As falas revelam o compromisso e a disposição da equipe para a prática da gestão do cuidado. Assim, no campo da organização do processo de trabalho, percebe-se a busca por constituir-se uma forma de gerir o cuidado de modo mais coletivo. Nessa direção, o hospital universitário, na condição de órgão formador, é unidade executora dos programas de residência multiprofissional que pode ser visto como potencial, conforme evidenciado nas falas seguintes:

[...] O fato de ter residentes multiprofissionais que se dedicam integralmente no seu segundo ano a parte clinica. Eu acho que isso é uma grande vantagem (fi5).

Aqui, a equipe é muito grande, temos várias especialidades e isso é muito bom. Então cada um vai estar contribuindo como proceder com aquela criança. Então isso já é um grande benefício. [...]. A residência multiprofissional também é uma coisa que contribui muito… (ps7).

Um dos depoimentos relaciona a presença do residente multiprofissional como uma vantagem a mais para o hospital universitário fazer a gestão do cuidado à criança com condição crônica. As residências multiprofissionais são consideradas estratégias importantes no cenário da formação de profissionais voltada para o SUS, considerando que seu arcabouço teórico e metodológico tem como base os princípios e as diretrizes do SUS, a associação da teoria à prática, do ensino ao serviço e da compreensão do princípio da integralidade no cotidiano dos serviços de saúde (ARAÚJO et al., 2017).

Tais programas se inseriram no contexto do antigo hospital de pediatria, bem como dos demais hospitais universitários do Rio Grande do Norte desde o ano de 2010, em face de um edital do MEC voltado para a construção e o desenvolvimento dessa modalidade de treinamento em serviço nos hospitais universitários de todo o país. Esses espaços de formação parecem contribuir para potencializar o ambiente dos hospitais universitários como terreno fértil para a reflexividade sobre o cuidado integral e as práticas interprofissionais.