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6 O AGRONEGÓCIO DO LEITE NO BRASIL E NO RIO GRANDE DO SUL

6.6 ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA E RELAÇÕES SISTÊMICAS

A Figura 38 elaborada por Jank e Galalan (1998) mostra a configuração do SAG do leite no Brasil, destacando em cor mais escura os segmentos que, segundo eles, apresentam as transações consideradas mais importantes na dinâmica atual e potencial do sistema leite.

Observado segundo uma lógica de cadeia, o SAG do leite organiza-se de maneira similar aos demais, envolvendo transações típicas entre fornecedores de insumos e equipamentos, produtores primários, indústria processadora, distribuidores e consumidores (SOUZA, TONON e PEREIRA, 2005; CARVALHO et al, 2005b).

Produtos Veterinários Forrageiras Pastagens Grãos Sais e Vitaminas Rações (Volumosos e Concentrados) Equipamentos de Ordenha e Refrigeração Instalações, Máquinas e Equipamentos Prestadores de Serviços

Fornecedores de Sêmen, Embriões e Animais Produtores Não Especializados • Corte •Rebanho Misto Produtores Especializados Empresas Multinacionais Cooperativas Singulares Cooperativas Centrais Grupos Nacionais Pequenos Laticínios Mini Usinas Comerciais Importadores Lácteos Importados Padarias Pequeno Varejo Supermercados

Venda Direta ao Consumidor (formal e informal)

Mercado Institucional

Outros: Atacados, Bares, Restaurantes, etc. Forne cedores de Insumos, Máquinas e

Equipamentos

Produção Primária de Leite

Processamento Distribuição

Figura 38 - Delimitação do Sistema Agroindustrial do Leite no Brasil Fonte: Jank e Galan (1998, p. 189).

Produtores de Insumos – De acordo com Carvalho et al (2005b), este segmento é bem

organizado, concentrando e com forte poder de barganha, representado por um conjunto pequeno de empresas detentoras de capital e conhecimentos específicos. Este segmento é responsável pelo fornecimento de insumos tanto à produção primária como para a indústria de processamento (SOUZA, TONON e PEREIRA, 2005; CARVALHO et al, 2005b) e pode ser considerado essencial para a promoção da qualidade (PAULA, CASTRO e MOTA, 2005).

Produtores de Leite – Dividem-se em dois tipos: os especializados e os não-

especializados (JANK e GALAN, 1998). Jank, Farina e Galan (1999) caracterizam os produtores especializados como aqueles que desenvolvem a atividade de forma intensiva, empregam rebanhos de raças específicas e investem em tecnologia. Já os produtores não- especializados produzem de forma extensiva e empregam tecnologias rudimentares, sendo os principais responsáveis pela oferta de leite e derivados de baixa qualidade e de forma irregular, principalmente por meio do mercado informal. Além disso, os produtores de leite, em sua maioria, estão localizados de forma pulverizada e apresentam pouca organização, o que implica em um menor poder de barganha frente aos demais componentes do SAG (CARVALHO et al, 2005b).

Indústria Processadora – Este é o segmento que adquire a matéria-prima dos

produtores e processa o leite, obtendo uma grande variedade de produtos (SOUZA, TONON e PEREIRA, 2005). A indústria de lácteos, conforme Jank e Galan (1998), é composta por diferentes tipos de organizações, entre as quais encontram-se empresas multinacionais, grupos nacionais, cooperativas de produtores de leite e pequenos laticínios. A característica marcante deste segmento é a sua estrutura oligopolizada (CARVALHO et al, 2005b).

Distribuição e Varejo – Quanto ao segmento responsável pela distribuição, Gomes

(1999) caracteriza esse em dois tipos, o formal e o informal. Sobre o primeiro incide a fiscalização da qualidade e de tributos. Já no segmento informal, praticamente não há influência decorrente da ação fiscalizadora. Os principais sujeitos que formam este segmento são os super e hipermercados, as padarias e os vários tipos de pequeno varejo (JANK, FARINA e GALAN, 1999; CARVALHO et al, 2005b). Atualmente, a grande concentração do varejo nos formatos maiores (super e hipermercados) está revertendo a estes pontos de venda um grande poder de barganha frente à indústria processadora, influenciando fortemente os preços (CARVALHO et al, 2005b) e impondo condições de compra (PAULA, CASTRO e MOTA, 2005).

Consumidor Final – De acordo com Carvalho et al (2005b), é o alvo estratégico de

todos os componentes do SAG do leite, que buscam atender às suas exigências.

Paula, Castro e Mota (2005) informam que do total do valor agregado pelo SAG do leite, o setor de insumos participa com 5%, a produção primária com 20%, a indústria com 25% e o setor varejista (distribuição) com 50%. No setor lácteo, conforme Gomes (2001), as margens de ganho têm crescido entre os agentes mais próximos dos consumidores finais e diminuído naqueles que estão mais próximos do produtor primário, resultando na concentração do poder de mercado em alguns segmentos do SAG do leite. Carvalho et al (2005b), ainda acrescentam que as relações comerciais no SAG do leite são caracterizadas pela informalidade entre produtor e indústria e por algum grau de formalidade entre a indústria e a distribuição.

Jank e Galan (1998) resumem as principais transações que caracterizam a coordenação do sistema agroindustrial do leite brasileiro, apresentando as estruturas de governança observada e esperada, lista os principais problemas observados em cada uma das transações. Resumidamente, estas observações de Jank e Galan (1998) podem ser vistas na Quadro 09.

Transação Estrutura de Governança Esperada Estrutura de Governança Observada Problemas Observados T1 Vendedores de Insumos –

Pecuaristas Mercado Mercado

ƒ Forte heterogeneidade de sistemas produtivos: nível tecnológico, gestão, capacidade de investimento, etc.

ƒ Diferenças de interesses dos produtores (leite/corte).

ƒ Dificuldades de adaptação de tecnologias às condições tropicais (umidade e calor).

T2

Pecuaristas –

Laticínios (mensal, sistema de Mercado cotas e anual) e Formas Híbridas (contratos de médio prazo, com base no volume, qualidade, e regularidade da matéria-prima). Mercado (mensal, sistema de cotas e raramente anual)

ƒ Diferenças de interesses: produtores (leite/corte); laticínios (formal/ informal).

ƒ Forte heterogeneidade da matéria-prima: falta de normas, padrões de qualidade e sanidade e inspeção.

ƒ Erros freqüentes na sinalização de expectativas e nos incentivos dados pela indústria.

ƒ Baixo incentivo à especialização do produtor.

ƒ Concorrência desleal dos importados afeta a estrutura de formação de preços ao produtor.

ƒ Falta de estatísticas confiáveis sobre produção e mercado de leite no Brasil.

T3

Laticínios –

Distribuidores Mercado Mercado

ƒ Concorrência desleal do mercado informal em todos os níveis.

ƒ Concentração: poder crescente dos

supermercados em relação a laticínios, padarias e pequeno varejo.

ƒ Baixa eficiência da cadeia do frio. Quadro 09 - Coordenação do Sistema Agroindustrial do Leite Brasileiro

Fonte: elaborado com base em Jank e Galan (1998).

Em complemento, Martins (2000) informa que as relações entre grandes empresas laticinistas e grandes redes de varejo são puramente de mercado e caracterizam-se por um alto nível de oportunismo, sendo que as transações ocorrem em um ambiente de incerteza. Martins (2000) também fala que o fluxo de informação ao longo da cadeia é praticamente inexistente, sendo que o elo da comercialização está descomprometido com o restante da cadeia. Este desajustamento da comercialização com o restante da cadeia produtiva do leite leva a crer na existência de duas formas de governança na cadeia. Na primeira, a coordenação é exercida pela indústria processadora, que organiza e qualifica os produtores. Na segunda, a coordenação é exercida pelo segmento da comercialização, que impõe suas próprias regras abastecimento (MARTINS, 2000).

Para Martins et al (2005), o custo de produção é peça fundamental no processo de negociação entre indústria e produtores. Com relação à adoção de práticas contratuais entre indústria e produtores, Paula, Castro e Mota (2005) consideram que persistem dificuldades de relacionamento derivados do baixo nível de padronização da matéria-prima, irregularidades na quantidade entregue de leite e pouca fidelidade por parte dos produtores. Em virtude destas características gerais, Souza Filho e Paulillo (2005) argumentam que existem baixos custos de

transação no mercado do leite. De acordo com Souza Filho e Paulillo (2005), a maioria dos produtores de leite que participam do mercado formal são tomadores passivos de preços. Já os produtores que participam do mercado informal enfrentam, segundo Souza Filho e Paulillo (2005), altos custos de transação, principalmente relacionados ao transporte do leite.

Qualquer que seja o mercado considerado (formal ou informal), a escolha do canal de comercialização pode determinar a viabilidade ou inviabilidade do empreendimento agropecuário. No SAG do leite, a escolha do canal de comercialização, segundo Bankuti, Schiavi e Souza Filho (2005), é feita levando em conta três fatores principais: o preço, a confiança no relacionamento, a existência de outras opções e outros fatores como proximidade e conveniência. Em geral, o leite pode ser vendido através de três canais: plantas de processamento privadas, cooperativas locais e mercado informal (SOUZA FILHO e PAULILLO, 2005). Também é necessário destacar que para os produtores de leite, o crescimento da demanda por leite do tipo UHT tem representado um incremento na dependência em relação a grandes plantas de processamento, as quais ganharam importância ao tornaram-se os principais compradores no mercado de leite cru (SOUZA FILHO e PAULILLO, 2005).

Por fim, é importante destacar o papel das cooperativas de produtores no SAG do leite. Este tipo de organização permite o desenvolvimento de uma maior confiança entre as partes, promove a redução das incertezas e assimetrias de informação, dando maior segurança às transações e reduzindo a chance de ocorrência de comportamento oportunista. Maraschin e Waquil (2004) destacam que o SAG do leite no Rio Grande do Sul tem seu maior diferencial em relação aos demais estados brasileiros justamente em função de que a produção primária está fortemente vinculada ao sistema cooperativo.

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