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DOS ESTUDANTES DO ENSINO SUPERIOR Apesar do alargamento social verificado entre os que acedem e

frequentam o ensino superior, é ainda muito relevante a sobrerre-

1 Trata-se de um projeto europeu que reporta, de três em três anos, os resultados de um inquérito levado a cabo por países da Área Europeia de Ensino Superior sobre as condições socioeconómicas dos estudantes (http://www.eurostudent.eu/). Tendo-se concluído no ano de 2018 a sua 6ª edição, estiveram envolvidos 28 países (para as análises produzidas para o texto deste capítulo não foram incluídos países como a Albânia, a Geórgia, a Sérvia e a Turquia).

presentação de estudantes mais favorecidos ou com origens sociais mais escolarizadas. Tal não se verifica apenas no acesso ao ensino superior, mas também na frequência de determinadas áreas ou tipos de ensino (como universidades e politécnicos), marcados por importantes hierarquias sociais, mesmo que com expressões e intensidades diferenciadas nos vários países europeus (ASPLUND et

al., 2008; DURU-BELLAT; KIEFFER; REIMER, 2008; MAURITTI;

MARTINS, 2007; MARTINS, 2015; HAUSCHILDT, GWOSĆ, E VÖGTLE, 2018).

Deste modo, identificar os principais traços de caracterização das origens sociais destes estudantes, afigura-se como crucial para compreender as transformações que foram ocorrendo na popula- ção inscrita no ensino superior. Muitas destas resultaram de novas exigências sociais e políticas, no quadro de um sistema mais aberto e democratizado.

O nível de escolaridade dos pais dos estudantes tem-se eviden- ciado como uma das variáveis mais determinantes para este tipo de análise. No conjunto dos países europeus pertencentes ao Projeto Europeu Eurostudent, os contextos de origem dos estudantes apre- sentam níveis de qualificação muito diferenciados. Tal leitura é muito subsidiária das dinâmicas de qualificação das próprias popu- lações nacionais em idade ativa.

Figura 1 Pais e mães dos estudantes com o ensino superior, em países da

UE (+ Islândia, Noruega, Suíça), 2017 e 2007 (anos de referência) (%)

Fonte: construído a partir de HIS (2008; 2018). Orr, Schnitzer, & Frackmann (2008) e Hauschildt, Gwosć e Vögtle (2018)

Legenda: AT Áustria; CZ Rep. Checa; DE Alemanha; DK Dinamarca; EE Estónia; FI Finlândia; FR França; HR Croácia; HU Hungria; IE Irlanda; IS Islândia; IT Itália; LT Lituânia; LV Letónia; MT Malta; NL Holanda; NO Noruega; PL

Polónia; PT Portugal; RO Roménia; SE Suécia; SI Eslovénia; SK Eslováquia.

Interessa por isso fazer algumas ilustrações das dinâmicas e dos contextos mais reveladores. Itália e Portugal são os países em que os pais dos estudantes apresentam menores níveis de escolaridade (Figura 1). Apenas cerca de um terço destes tem origens familiares em que pelo menos um dos pais concretizou uma formação de nível supe- rior. Muito contrastante com a realidade de países como a Noruega, em que quase 80% dos estudantes tem pelo menos um dos pais com o ensino superior, mas também a Estónia, a Finlândia, a Alemanha ou a Dinamarca onde mais de 2 terços tem essa qualificação.

Uma das primeiras verificações da análise dos indicadores sobre os níveis de escolaridade é que as mães dos estudantes portugueses têm já qualificações superiores às dos pais. O contingente destas representa mais de 5% do que o verificado no segmento dos pais. Deste ponto de vista existe já uma homologia aproximada à distribuição verificada na estrutura socioeducacional de homens e mulheres em Portugal.

Um outro aspeto que vale a pena evidenciar é que Portugal é ainda um contexto nacional onde se verifica uma sobrerrepre- sentação das altas qualificações dos pais dos estudantes no ensino superior face à população portuguesa (figura 2).

A leitura comparada de caracterização da escolaridade dos pais no contexto europeu (Figura 1) dá conta de uma taxa reduzida de origens com graduações no ensino superior português. Se asso- ciarmos a esta posição europeia a já referida sobre representação desse tipo de qualificação no segmento etário da população onde se encontram, com grande probabilidade, os pais dos estudantes, ficamos com um reconhecimento de uma estrutura socioeducativa muito menos qualificada do que a dos congéneres europeus. Alguns estudos têm vindo a sublinhar a importância histórica, nos países europeus, da escolarização das famílias no acesso e desenvolvimento de uma formação no ensino superior, ficando muito realçado o papel da mulher e as suas dinâmicas de maior prolongamento dos estudos nestes processos (KOUCKÝ; BARTUŠEK, 2013).

Figura 2 Nível de escolaridade de pais e mães dos estudantes

portugueses, 2017, e níveis de escolaridade da população portuguesa no segmento etário correspondente (45-65 anos), 2016 (%)

Fonte: construído a partir de Martins et al. (2018) e Eurostat, 2016 (recolhidos em fevereiro de 2018).

A escolaridade dos pais dos estudantes é um indicador que se relaciona de forma muito direta com as condições de vida e de estudo desta população. Tal fica ainda mais reforçado tendo em conta, como veremos, que os estudantes portugueses são dos que mais dependem financeiramente dos seus pais (família de origem) e permanecem a viver com eles até mais tarde.

Se considerarmos a figura 3, identificamos padrões de inserção institucional, com correspondência a vários tipos de ensino, muito desiguais no quadro europeu. Com exceção de França, uma boa parte do alargamento social da educação terciária fez-se através das instituições não universitárias, reconhecidas em muitos países (como Portugal) pelo desenvolvimento do ensino politécnico.

Figura 3 Pais sem certificação de ensino superior segundo

o tipo de instituição de ensino superior (IES), em países da UE (+ Islândia, Noruega, Suíça), 2016-2018 (%)

Fonte: construído a partir de HIS (EVI: 2018). Hauschildt, Gwosć eVögtle (2018) Legenda: AT Áustria; CZ Rep. Checa; CH Suíça, DE Alemanha; DK Dinamarca; EE Estónia; FI Finlândia; FR França; HR Croácia;

HU Hungria; IE Irlanda; IS Islândia; IT Itália; LT Lituânia; LV Letónia; MT Malta; NL Holanda; NO Noruega; PL Polónia; PT Portugal; RO Roménia; SE Suécia; SI Eslovénia; SK Eslováquia.

Sublinhar ainda que, onde se verifica uma maior equidade na rede e tipo ensino, é na Letónia, Dinamarca, Noruega e em França (o único país onde esta diferença tem um sentido contrário). Por outro lado, os países onde esta diferença nas qualificações dos pais é mais pronun- ciada é na Holanda, Malta, Portugal, Eslovénia e Lituânia. Destes, Malta e Portugal são dos países onde a proporção de pais com o ensino secundário (ou equivalente) como escolaridade máxima é maior.

Um outro parâmetro é o da avaliação da situação financeira dos pais por parte dos estudantes (Figura 4). A este respeito, um terço dos estudantes portugueses considera-a boa ou muito boa. Os países em que esta percentagem é mais reduzida é na Eslováquia, na Roménia, na Lituânia, na Croácia e na Eslovénia – onde nem um quarto dos estudantes dá uma avaliação positiva (como boa ou muito boa). Na Croácia e na Eslovénia mais de um quinto declara mesmo que a situação financeira dos seus pais não está bem ou nada bem.

Figura 4 Avaliação dos estudantes do ensino superior

sobre a situação financeira dos pais, em países da UE (+ Islândia, Noruega, Suíça), 2016-2018 (%)

Fonte: construído a partir de HIS (2018), EUROSTUDENT VI (2016-2018) Legenda: AT Áustria; CH Suíça; CZ Rep. Checa; DE Alemanha; DK

Dinamarca; EE Estónia; FI Finlândia; FR França; HR Croácia; HU Hungria; IE Irlanda; IS Islândia; IT Itália; LT Lituânia; LV Letónia; MT Malta; NL Holanda; NO Noruega; PL Polónia; PT Portugal; RO

A situação financeira da família de origem dos estudantes holandeses (52%), suecos (49%) e finlandeses (45%) é declarada como estando bem ou muito bem, sendo consistente com aquilo que os estudantes reportaram em relação às suas condições de vida em cada um destes países.

COMO VIVEM OS ESTUDANTES