O estudo de caso múltiplo

O estudo de caso múltiplo foi realizado em quatro empresas que se colocaram à disposição para este tipo de pesquisa entre as dezenove pré-selecionadas. A pré-seleção usou por base as cinqüenta e quatro empresas que responderam ao questionário do estudo exploratório. Uma vez que, somente com os dados obtidos no questionário, não foi possível a formação de grupos homogêneos quanto às características analisadas,

foram realizadas entrevistas com gerentes de vinte e quatro organizações, tendo como objetivo:

a) confirmar algumas respostas apresentadas pela empresa ao questionário;

b) caracterizar de forma mais detalhada os recursos humanos das empresas quanto ao número, qualificação e atividades desenvolvidas;

c) registrar de forma mais minuciosa os recursos computacionais disponíveis quanto ao seu efetivo uso (pessoas / tarefas) e aos software aplicados.

Foram, então, selecionadas dezenove empresas que apresentavam as seguintes características:

a) possuir sistemas computacionais que auxiliam na elaboração do orçamento discriminado e programação das obras;

b) realizar efetivamente o orçamento discriminado e programação das obras por funcionário registrado na empresa;

c) contar com um número total de funcionários inferior a vinte; d) desenvolver atividade de construção de edifícios e não só a

sua incorporação.

No contato direto com essas empresas, quatro delas apresentaram outra condição considerada essencial: dispor de tempo e motivação para participar da pesquisa. Deve-se observar que, sendo muito baixo o índice de concordância em participar do estudo de caso, entre as quatro empresas encontra-se a empresa “A” que atualmente não desenvolve os documentos complementares na própria empresa.

Neste estudo de caso múltiplo, para caracterização do processo de documentação de projetos, foram definidas três modalidades de

variáveis: fluxo de informações, uso de sistemas computadorizados e qualidade do projeto executivo7. A cada uma das variáveis analisadas, foram relacionadas perguntas que revelavam o detalhamento desejado (quadros 5 a 7).

Quadro 5 - Variáveis sobre fluxo de informações

Variável Perguntas

Informações para

documentação de projetos

1. Que documentos se originam das plantas dos projetos ? 2. Que informações são buscadas nessas plantas para a elaboração desses documentos complementares ?

3. Quais as informações geradas neste momento para a criação de documentos abrangentes e completos ? Qual a sua origem ? 4. A quem são enviados estes documentos?

5. Quem utiliza efetivamente estas informações ? 6. Como e onde são arquivados esses documentos ? Reavaliação de

banco de dados

7. Quando os projetos são revisados e como é controlado o registro das alterações ? Nas plantas, nos documentos técnicos ?

Reavaliação dos

documentos gerados

8. Os banco de dados que alimentam a execução de

documentos técnicos complementares são atualizados com dados obtidos durante o controle da execução da obra ? 9. A empresa arquiva um projeto as built? Plantas e documentos técnicos?

Informações técnicas x administrativa s

10. Ocorre algum tipo de relacionamento direto entre os bancos de dados dos documentos técnicos e o dos documentos administrativos (ex.: orçamento da obra e prestação de contas para clientes) ?

7 _{Considera-se projeto executivo aquele que dispõe de plantas, memorial descritivo, discriminações}

técnicas, orçamento discriminado e programação da obra que incluem todas as especialidades, ou seja, projeto arquitetônico, estrutural, fundações, instalações elétricas, hidráulicas e todas as demais

A forma como foram apresentados os resultados obtidos em cada uma das empresas por meio de entrevistas e observações das atividades, assim como as sugestões formuladas, estão no anexo 4. Aqui serão apresentadas, de forma resumida, algumas informações obtidas nesta etapa do trabalho:

a) informações para documentação de projetos: ao serem questionados sobre os documentos que se originam dos desenhos dos projetos, não foram citadas, espontaneamente, as discriminações técnicas, mas somente memoriais descritivos;

Quadro 6 - Variáveis sobre o uso de sistemas computadorizados

Variável Perguntas

Recursos computa- cionais

11. Quantos micros a empresa possui ? Qual sua especificação?

12. Quais os programas que possuem e para qual atividade? Uso efetivo de

recursos computa- cionais

13. Quais destes programas são efetivamente utilizados ? Caso não sejam utilizados, qual a causa?

Usuários dos recursos computa- cionais

14. Quais os usuários diretos desses sistemas? (função - formação)

15. Quem utiliza as informações geradas por esses sistemas?

Nível de integração de sistemas

16. Os programas utilizados para atividades técnicas estão integrados entre si?

Tarefas desenvolvidas sem o apoio computacional

17.Quais são as tarefas realizadas sem o uso de recursos computacionais?

18. Qual a justificativa para o fato de essas tarefas serem desenvolvidas sem a utilização desses recursos?

Quadro 7 - Variáveis sobre a qualidade do projeto executivo Variável Pergunta Documentos componentes do projeto executivo

19. Quais são os documentos considerados essenciais para o desenvolvimento da fase de execução da obra?

Plantas do Projeto Arquitetônico ( ) Plantas do Projeto Estrutural ( ) Plantas do Projeto de Fundação ( )

Plantas do Projeto de Instalações Elétricas ( ) Plantas do Projeto de Instalações Hidráulicas ( ) Plantas do Projeto (outros)______________( ) Memorial Descritivo ( ) Discriminações Técnicas ( ) Orçamento Discriminado ( ) Programação da Obra ( ) Coerência entre documentos

20. Como ocorre a análise da compatibilidade (coerência) das informações disponíveis nos documentos do projeto

executivo? Nível de

detalhamento

21. São executados detalhamentos gráficos de partes especiais da obra ? Para esta finalidade, são utilizadas escalas que permitam uma perfeita interpretação dos elementos ? Utilidade da

forma de apresentação das

informações

22. Por quem e onde são utilizados os documentos que compõem o projeto executivo (plantas, memorial descritivo, discriminações técnicas, orçamento discriminado,

programação da obra) ?

23.O Sr. poderia realizar uma avaliação da utilidade da informação apresentada no projeto executivo ? (para os profissionais que utilizam o projeto executivo)

Documento péssima ruim regular boa muito

boa Arquitetônico Estrutural Fundação Instal. Elétrica Instal. Hidráulica Outro: Memorial Descritivo Discriminações Técnicas Programação da Obra Orçamento Discriminado

24. O Sr. poderia dar sugestões para melhorar a forma como a informação é apresentada no projeto executivo ?

b) reavaliação de bancos de dados: não há registro de dados coletados no canteiro de obras para a reavaliação dos bancos de dados;

c) reavaliação dos documentos gerados e criação e arquivamento de projeto as built: existe a preocupação de registrar as alterações que possam comprometer o fornecimento do “habite-se” da obra, ou seja, a sua ocupação. Portanto, não existe a visão de registro para dar apoio à fase de manutenção da edificação;

d) integração entre informações técnicas e administrativas: as empresas não possuem, de forma integrada, informações técnicas e administrativas;

e) recursos computacionais: três das quatro empresas possuem 1 a 2 computadores e poucos programas computacionais. A quarta empresa, por sua vez, possui 7 computadores e uma maior gama de programas;

f) uso efetivo dos recursos computacionais: duas das quatro empresas utilizam recursos computacionais somente para atividades administrativas; uma terceira desenvolve

orçamentos discriminados; a quarta utiliza o CAD, desenvolve orçamentos discriminados e programação da obra;

g) usuários dos recursos computacionais: com exceção de uma das empresas, o responsável pela área financeira das organizações é o principal usuário dos recursos computacionais; na empresa com melhores recursos computacionais, o arquiteto é o grande usuário;

h) nível de integração dos sistemas: os sistemas disponíveis não trabalham de forma integrada;

i) documentos componentes do projeto executivo: ao ser apresentada uma lista de documentos para que fossem identificados aqueles que são considerados essenciais na composição do projeto executivo, as empresas indicaram, com exceção de uma, todos os documentos citados, inclusive as discriminações técnicas (este documento foi esquecido na citação espontânea de documentos considerados);

j) coerência entre documentos: as declarações demonstram que não são utilizados métodos padronizados para compatibilização de projetos. Isto é justificado pelo fato de ocorrerem revisões do conjunto de documentos por um

engenheiro ou arquiteto e, em alguns casos, em reuniões com todos os projetistas envolvidos. Alguns indicaram, ainda, que, pelo fato de o grupo de projetistas ser mantido o mesmo ao longo do tempo, não mais ocorreram esses problemas (com exceção dos projetos de instalações que exigem sempre adaptações ao longo da obra);

k) nível de detalhamento: uma das empresas, sem indicar o que deveria ser entendido como mínimo, diz fazer somente o necessário para aprovação dos projetos com o objetivo de reduzir os custos; as outras empresas admitem fazer detalhamentos gráficos de partes consideradas mais complicadas das obras, como escadas, cortes de terreno, esquadrias e lareiras, por exemplo;

l) utilidade das informações apresentadas nos documentos componentes do projeto executivo: obteve-se, numa escala que compreendia as medidas péssima, ruim, regular, boa e muito boa, a seguinte distribuição: 8% dos documentos apresentam informações de muito boa utilidade; 64% são boa utilidade e 28% classificam a utilidade das informações como regulares.

Desta forma, pode-se verificar que, fazendo-se um estudo mais detalhado de micro e pequenas empresas do subsetor de edificações, as constatações confirmam a precariedade do uso de recursos computacionais e do tratamento das informações em geral. Isto é ainda mais grave por trata-se de setor cujas empresas têm por característica a dependência entre a qualidade da transmissão das inúmeras informações e o sucesso de seus empreendimentos. Estas constatações foram confirmadas nos resultados de Bernardes & Carvalho (1997), que estudaram outras nove empresas gaúchas do subsetor de edificações.