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3.1.Sobre a Má-Oclusão Dentária

Seguindo a tendência mundial, são escassas as publicações científicas de âmbito nacional que apresentam dados relativos à prevalência da má-oclusão dentária na nossa população infantil.

No estudo epidemiológico que realizámos no concelho de Sines, em 1983(1), cingimo-nos a apresentar a taxa de anomalias dento-faciais graves na referida população infantil (6 a 12 anos) que atingiu o valor máximo de 8,43% aos 10 anos.

Nos anos seguintes, investigadores portugueses de renome como Pereira, em 1990(204), Calado(205,206), em 1996/97, Almeida e col., de 1984 até à presente data(207,208,209,210,211), entre outros, realizaram vários estudos epidemiológicos, alguns de âmbito nacional, que serviram de referência à tomada de medidas preventivas e de tratamento adoptadas pelo Ministério da Saúde. Estes estudos visaram no entanto essencialmente a cárie dentária.

Almeida(209), no 1.o Inquérito Nacional Explorador de Prevalência das Doenças e Necessidades de Tratamento na Cavidade Oral, faz referência a 16% de anomalias dento-faciais exigindo tratamento em crianças de idades compreendidas entre os 6 e os 12 anos. Neste trabalho não há outros dados sobre má-oclusão dentária nem qualquer indicação sobre a prevalência de disfunção têmporo- mandibular nas crianças observadas.

Em 1999, uma vez mais, Almeida(212) preconiza um programa de saúde oral para os jovens portugueses e efectua 10 propostas, entre as quais realça a necessidade de organização dum serviço essencialmente municipal destinado à prevenção, diagnóstico precoce e tratamento das doenças da boca para todos os jovens até aos 18 anos. Reservou um item especial destinado à proposta de tratamento das cáries diagnosticadas com a melhor relação custo-benefício, sendo omisso no que se refere ao tratamento das más-oclusões dentárias e disfunções têmporo-mandibulares em crianças portuguesas.

Marques e Jardim(213) debruçaram-se sobre a morfologia dentária, nomeadamente sobre a dimensão e simetria, concluindo haver uma diferença entre os nossos jovens e o de outros países e, também, das dimensões dentárias entre os sexos, sendo maiores nos rapazes do que nas raparigas. Em 2000, Costa(214) tece algumas considerações sobre a perda de espaço na dentição decídua e mista, concluindo que a perda precoce dum dente não é sempre sinónimo de perda de espaço e não requer sempre a colocação dum mantedor de espaço. Diz ainda que para tratar adequadamente há que conhecer claramente os padrões de erupção dentária, oclusão e manutenção de espaço. Segundo

Ivo da Piedade Álvares Furtado

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o autor, o potencial para perder espaço é diferente consoante o dente decíduo perdido, seja maxilar ou mandibular, um primeiro ou segundo molar, não sendo a perda homogénea no tempo.

Resende e Pedroso(20), em 1999, tendo efectuado um rastreio de cárie dentária numa população escolar da região de Coimbra, constataram que a mesma população apresentava uma prevalência de 30% de más-oclusões dentárias. É a primeira referência concreta que conhecemos sobre a prevalência da má-oclusão dentária em crianças portuguesas.

Em 2005, Ventura(215) fez um trabalho pioneiro sobre a prevalência de más-oclusões dentárias num grupo amplo de crianças em fase de dentição decídua (627 crianças) do distrito de Setúbal, tendo obtido um valor de 44% e um predomínio de Classe III de Baume.

As últimas publicações nacionais que conhecemos sobre a prevalência de má-oclusão dentária em crianças foram efectuadas por nós(216,217,218,219),em 2006, no âmbito de um estudo que incidiu sobre crianças em idades escolar e pré-escolar da área setentrional de Lisboa, contemplando as diferentes fases de dentição e pela aplicação do protocolo da OMS. Foram encontradas prevalências de 72,42% na dentição decídua, com predomínio de Classe I de Baume; 85,23% na dentição mista inicial e estável; 75,8% na dentição mista tardia e 70,83% na dentição permanente.

3.2.Sobre a Disfunção Têmporo-Mandibular

Os trabalhos de investigação publicados no âmbito nacional sobre disfunção têmporo-mandibular são recentes e essencialmente de natureza clínica.

São conhecidos os trabalhos de Pinho e col.(220,221), em 1999. Estes autores relacionaram as prematuridades em oclusão cêntrica e os ângulos das inclinações das trajectórias condilianas (ITC) em pacientes com disfunção têmporo-mandibular e afirmam haver uma forte probabilidade de correlação entre as prematuridades e a disfunção têmporo-mandibular. Num segundo trabalho correlacionaram o ângulo das inclinações das trajectórias condilianas com a sua decomposição vectorial em doentes portadores de disfunção têmporo-mandibular, tendo constatado que, para além da discre- pância de 43.o entre os valores máximos e mínimos dos ângulos das ITC, os ângulos da ITC esquerda são superiores aos da direita em 75%.

Barbosa e col.(222), também em 1999, descreveram um método de avaliação clínica diária da dor na disfunção têmporo-mandibular, apresentando um caso clínico em que utilizaram uma escala visual analógica. Propuseram a colocação dum aparelho estabilizador de recobrimento total e a fim de reabilitar a função proprioceptiva, favorecendo a acção muscular que resultaria na diminuição efectiva da dor e a acção complementar de fisioterapia, psicoterapia e correcção postural.

Na mesma linha de pensamento e de conduta terapêutica inscrevem-se os trabalhos de Felício e col.(223), em 2003, que afirmam que os pacientes são capazes de fazer um julgamento sobre a gravidade de vários sintomas e sinais de disfunção têmporo-mandibular, através do uso duma escala numérica indicando a presença ou a ausência dos mesmos. Referem ainda o efeito satisfatório obtido pela aplicação duma férula oclusal, que reconhecem no entanto não resolver todos os casos.

Hotta e col.(224), em 2003, confirmaram a eficácia da placa oclusal estabilizadora em relação aos parâmetros clínicos de sintomatologia dolorosa e medidas dos movimentos mandibulares no grupo de doentes que trataram.

Tese de Doutoramento – Medicina – Anatomia

Castel-Branco e col.(225), em 2003, concluíram que a prematuridade pode ser devida a deficiente posição dos dentes nas arcadas, mas pode também dever-se à diferente relação maxilo-mandibular por alteração postural da mandíbula, sendo possível causa de disfunção crânio-mandibular.

Camargo e col.(226),em 2004, procederam ao estudo da relação entre o grau de disfunção têmporo- -mandibular e a presença de stress em 40 doentes. Concluíram que 82,5% destes apresentava stress e que tinham maiores índices de disfunção clínica do que os restantes doentes.

Mazetto e col.(227), em 2004, relacionaram a disfunção têmporo-mandibular e a má-oclusão em 37 doentes encaminhados para tratamento da DTM. Os resultados mostraram maior número de má- oclusão de Classe II divisão 1, seguida de Classe II divisão 2, sendo 80% dos doentes atendidos do sexo feminino.

Pinho e col.(228), num outro artigo publicado em 2000, abordam a prevenção da disfunção têmporo- -mandibular e a importância de que seja feita logo desde o seu início na criança, através da adopção de medidas simples, que apontam:

•Vigiar a cronologia e a sequência da erupção dentária.

•Detectar precocemente anomalias que possam condicionar, não só a posição dentária, mas também o futuro desenvolvimento do sistema estomatognático.

•Evitar extracções de dentes temporários antes da data prevista. Caso seja necessária a extracção dentária, utilizar mantedores de espaço.

•Efectuar exames periódicos para despistar cáries, dando especial atenção ao molar dos seis anos.

•Restaurar as superfícies oclusais obedecendo às regras da oclusão. •Não permitir mordidas cruzadas unilaterais.

•Recorrer à ortodontia interceptiva.

•Suprimir hábitos parafuncionais, como por exemplo a sucção nos dedos e o trincar o lápis. •Evitar e corrigir posturas erradas na escola, no lazer e durante o sono.

•Corrigir a deglutição infantil, caso se mantenha para além dos dez anos.

A ausência de consenso na prevalência da disfunção têmporo-mandibular pode inferir-se da afirmação de Gouveia(229), que em 2004 aponta para “3 a 4%, sendo que 70 a 80% das pessoas poderão experimentar disfunção da ATM ao longo da vida”.

Em 2006 publicámos os resultados de prevalência de DTM em grupos de crianças em diferentes fases de dentição de três escolas públicas da área setentrional de Lisboa(230,231). Não encontrámos nenhuma criança com DTM na fase de dentição decídua. Obtivemos uma prevalência de 4,55% na fase de dentição mista inicial e estável; de 8,8% na fase de dentição mista tardia e de 16,44% na fase de dentição permanente. São os únicos resultados de prevalência publicados que conhecemos, recolhidos em crianças portuguesas, até hoje.