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1.3 Métodos na detecção de hibridação

1.3.2 Estudos moleculares na identificação de híbridos

A partir do final da década de 1960, deu-se início ao uso de marcadores moleculares na detecção e descrição da diversidade biológica e os anos subseqüentes assistiram a uma revolução na biologia molecular. Passaram a ser desenvolvidos métodos mais acurados para a observação e o estudo da estrutura molecular de proteínas e de ácidos nucléicos, proporcionando grandes avanços no que diz respeito às metodologias de pesquisa, biotecnologia molecular e bioinformática (Moritz e Hillis, 1996).

O desenvolvimento dos marcadores genético-moleculares tem impactado a pesquisa em quase toda área biológica, incluindo a aqüicultura, onde tais

marcadores têm se tornado importantes ferramentas para fornecer informações a respeito da variabilidade genética e endogamia, relacionamentos de parentesco, identificação de híbridos e linhagens em programas de cultivo (García de Leon et al., 1998; Spidle et al., 2004; Vandeputte et al., 2004; Liu e Cordes, 2004). Atualmente, uma ampla variedade de marcadores tem sido desenvolvida para diferentes espécies utilizadas na aqüicultura mundial (Liu e Cordes, 2004). O interesse na caracterização e identificação de híbridos em pisciculturas e também estudos envolvendo hibridações naturais tem disponibilizado uma gama considerável de marcadores moleculares na literatura. Entre os mais utilizados estão marcadores do tipo RFLP (Restriction Fragment Lenght Polymorphism) (Calcagnotto, 1998; Perez et al., 1999), RAPD (Random Amplified Polymorphic DNA) (Elo et al., 1997; Liu et al., 1999), SPAR (Single Primer Amplification Reaction) (Fonteles et al., 2005) e AFLP (Amplified Fragment Length Polymorphism) (Congiu et al., 2001; Young et al., 2001). Os procedimentos para obtenção de marcadores do tipo RAPD foram desenvolvidos primeiramente em 1990 (Welsh e McClelland, 1990; Williams et al., 1990) usando a PCR (Polymerase Chain Reaction) para amplificar aleatoriamente segmentos anônimos do DNA nuclear com um par idêntico de primers de 8-10 pb de comprimento. Como os primers são curtos e são usadas temperaturas relativamente baixas de anelamento (frequentemente 36-40ºC), a probabilidade de amplificar produtos múltiplos é grande, com cada produto possivelmente representando um locus diferente. No estudo de híbridos realizado por Elo et al. (1997), através desta metodologia estes autores conseguiram obter fragmentos que permitiram a separação dos parentais e híbridos entre espécies de salmonídeos. Liu et al. (1999), analisando híbridos de bagres e seus parentais também encontraram bandas de ambos os parentais nos híbridos, conseguindo diferenciá-los.

Já a metodologia de SPAR, da mesma forma que o RAPD, também se baseia na amplificação por PCR de fragmentos aleatórios do DNA. No entanto, consiste da utilização de regiões genômicas flanqueadas por microssatélites, de tal forma que para a reação de amplificação são usados primers únicos de seqüências repetitivas simples (Gupta et al., 1994). No Brasil, Fonteles (2002) utilizou-se desta técnica para identificação de híbridos artificiais entre espécies parentais do gênero Piaractus. Fonteles et al. (2005) também conseguiram estabelecer relações de parentesco entre diferentes espécies de carpas e seus híbridos interespecíficos.

A técnica RFLP baseia-se na produção de fragmentos moleculares através da digestão do DNA por enzimas de restrição, o que resulta em fragmentos cujos números e o tamanho podem variar entre indivíduos, populações e espécie. Tradicionalmente, fragmentos genômicos foram separados usando a análise de “Southern blot” (Southern, 1976), em que o DNA genômico é digerido, sujeitado a eletroforese através de um gel de agarose, transferido a uma membrana e visualizado pela hibridização por sondas específicas. Este método já foi utilizada na identificação de híbridos artificiais por Calcagnotto (1998) e Perez et al. (1999).

Primeiramente empregada por Vos et al. (1995), AFLP é uma técnica baseada na PCR que combina as forças e supera as fraquezas dos métodos de RFLP e RAPD. A característica exclusiva da técnica é a adição de adaptadores aos fragmentos de DNA gerados por digestão enzimática do DNA genômico total. Como os adaptadores têm seqüências conhecidas e são ligadas às extremidades dos fragmentos, estes podem ser usados como sítios de primers para a amplificação por PCR. O principal alvo da variação genética é o mesmo que RFLP, mas em vez de analisar um locus de cada vez, permite a análise de muitos loci simultaneamente. Como exemplo, Young et al. (2001) usaram a técnica de AFLP para gerar 133

marcadores polimórficos, das quais 23 foram diagnósticos na distinção de híbridos e suas espécies parentais de truta Oncorhynchus mykiss irideus e O. clarki clarki.

Mais recentemente, ainda em relação ao método de RFLP, a maioria das análises substitui o método “Southern blot” com as técnicas baseadas na reação de PCR (PCR-RFLP). Assim, após a amplificação de uma região conhecida, os produtos de PCR podem ser digeridos com enzimas de restrição e serem visualizados por simples eletroforese devido à grande quantidade de DNA produzida por esta técnica. A técnica PCR-RFLP apresenta uma considerável redução do tempo de execução, no custo e complexidade (Ferreira e Grattapaglia, 1998). Desta maneira, tem sido utilizada com sucesso na diferenciação e identificação forense de espécies de peixes (Cocolin et al., 2000; Wolf et al., 2000; Hold et al., 2001; Hsieh et al., 2005 e 2007), sendo bastante promissora para análises aplicadas à piscicultura, principalmente na identificação de híbridos e diferenciação das espécies parentais.

Outro método muito eficaz e rápido, porém não utilizado na caracterização de híbridos, é a técnica PCR Multiplex com “primers” espécie-específicos. Este método consiste em utilizar “primers” espécie-específicos para um determinado locus, o qual difere de uma a poucas substituições nucleotídicas para as espécies a serem analisadas, de tal forma que testes podem ser multiplexados, isto é, duas ou mais reações de PCR podem ser aplicadas simultaneamente no mesmo tubo (Henegariu et al., 1997; Markoulatos et al., 2002). Esta técnica tem se demonstrado importante na diferenciação e identificação de espécies, o que também a torna promissora para a identificação de híbridos. Atualmente suas finalidades variam desde o monitoramento da qualidade de água (Abd-El-Haleem et al., 2003), determinação sexual (Seddon, 2005) e aplicações em programas de conservação (Chapman et al., 2003; Magnussen et al., 2007; Apostolides et al., 2007) até o uso em identificação

O valor do DNA mitocondrial e nuclear na identificação de híbridos

Estudos moleculares têm usado o DNA mitocondrial (DNAmt) por serem muito menor que o DNA nuclear (aproximadamente 5 vezes menor); por existirem várias cópias do DNAmt dentro da célula (versus somente 1 ou 2 cópias de DNA nuclear); e finalmente pelo fato dos íntrons estarem ausentes (Sotelo et al., 1993). Conseqüentemente, o DNAmt é uma ferramenta útil para estudos filogenéticos e de evolução em animais, por seu modo de herança uniparental, taxa relativa rápida de substituição de base, falta de recombinação e fácil isolamento (Moritz et al., 1987; Saccone, 1994). Por isso, a maioria das análises filogenéticas e de identificação de espécies tem se baseado em regiões conservadas do genoma mitocondrial (DNAmt), em especial o DNA ribossomal 16S (Meyer, 1993; Orrell e Carpenter, 2004; Calcagnotto et al., 2005; Pardo et al., 2005; Gagnaire et al., 2007).

Em relação às regiões do genoma nuclear, os íntrons (seqüências não- traduzidas que medeiam seqüências codificadoras polipeptídicas no genoma nuclear) são fontes potencialmente ricas de marcadores espécie-específicos para estudos de hibridação. Enquanto isso, por serem não-funcionais, os íntrons acumulam mutações com uma taxa mais rápida do que as seqüências codificadoras nucleares e desta forma, têm sido usados com freqüência em diferenciação de espécies, estudos filogenéticos e populacionais (Palumbi e Baker, 1994; Friesen et al., 1999; Friesen, 2000; Calcagnotto et al., 2005; Avelino, 2007).

Segundo Toledo-Filho et al. (1994), os marcadores mitocondriais e nucleares têm fornecido valiosas informações na identificação de híbridos recíprocos e na detecção de eventos históricos de hibridação em peixes, nos quais, a médio e longo

prazos, os genes de uma das espécies são lentamente incorporados ao patrimônio genético de outras espécies por meio da introgressão. Como o DNA mitocondrial em animais apresenta característica peculiar de herança materna (Moritz et al., 1987), este tipo de marcador é extremamente útil para detectar a direção do evento de hibridização, uma vez que identifica os parentais maternos, no entanto, não tem a capacidade de ser utilizado para estimar taxas de introgressão e hibridação. Por outro lado, visto que híbridos e seus descendentes herdam DNA nuclear de ambas as espécies parentais, somente através dos marcadores nucleares eventos de hibridação e introgressão podem ser detectados, entretanto, é fundamental utilizar o DNAmt em conjunto com os marcadores genéticos nucleares, pois os resultados de ambos se complementam (Scribner e Avise, 1993 e 1994a, b; Rosenfield et al., 2000; Scribner et al., 2001).

1.4 Objetivos

Como a produção de híbridos interespecíficos é uma prática comum nas pisciculturas e considerando que os estudos genéticos em híbridos ainda são escassos e, em sua maioria, não estão relacionados a projetos de cultivo, este estudo teve como principais objetivos: