• Nenhum resultado encontrado

Evidências, ponderações e radicalização na sociedade da informação para todas/os

1. CAPITALISMO E ECONOMIA SOLIDÁRIA: desigualdades sociais e resistência de

1.1. A sociedade da informação e a sociedade da informação para todas/os: na contradição as

1.1.2 Evidências, ponderações e radicalização na sociedade da informação para todas/os

Segundo Flecha, Gómez & Puigvert (2001), a pressão dos movimentos sociais e dos países excluídos, somado ao expansionismo dos produtos das empresas de informática e microeletrônica pelo mundo, nesse século, geraram uma crescente defesa da sociedade da informação para todas e todos. Na perspectiva da autora e autores, se a sociedade da informação comporta desigualdades32, também propicia avanços em termos de comunicação e

31 Expressão cunhada por Luis Razeto.

32 Devemos destacar que a informação tem sido utilizada como fonte de manipulação e poder. Por exemplo,

quando compramos um produto no supermercado, as inscrição sobre seu conteúdo são ilegíveis ou demasiado técnicas, não esclarecendo o efeitos colaterais de seu consumo ou verdadeira procedência. Assim, ganham relevância os movimentos de comércio justo e solidário, que tem entre suas preocupações a explicitação das

47 reflexão, favorecedores de relações democráticas, o que precisa ser cada vez mais reconhecido e analisado pelas teorias sociológicas, como forma de contribuir com a transformação social humanizadora.

Os avanços a que se referem Flecha, Gómez & Puigvert (2001) se caracterizam como gradativos na superação da burocratização e do poder, nos âmbitos relacionais e também nas instituições. Hoje, por exemplo, muitas pessoas doentes se contrapõem aos saberes dos médicos, até então inquestionáveis, a partir não apenas de conhecimentos de seus antepassados ou da própria observação da saúda-doença, mas também de informações acessadas por meio das tecnologias (internet) e processadas em comunicação com outras pessoas, no âmbito da relação entre necessidades e possibilidades objetivas e reflexivas. O mesmo se passa, de modo cada vez mais crescente, na relação mães/pais-filhas/os e estudantes – professoras/es, fazendo mudar as relações familiares e escolares. Singer (1998) vai nesse mesmo sentido, reconhecendo, entre as contradições, os avanços que a sociedade da informação permite para a emancipação dos trabalhadores qualificados. As tecnologias, materializadas nos objetos com os quais lidam os sujeitos, exigem destes motivação e um conhecimento do todo maior do qual participam. “A chamada administração flexível reduz o número de degraus da hierarquia gerencial e confere mais autonomia e responsabilidade ao pessoal de linha. A nova classe operária, formada pela 3a. Revolução Industrial, dificilmente aceitará o papel que o “script” neoliberal lhe destina”. (Ibid, p. 177)

Vai ficando evidente que, na busca pelo bem-estar comum, o modelo de racionalidade instrumental (especialistas que sabem e público que não sabe; engenheiro que sabe e operário que não sabe) já não serve mais. É preciso “eliminá-lo e criar outras formas de produzir consenso, que desmonopolizem o conhecimento especializado e permitam aos não especialistas participarem das estruturas decisórias, por meio de um diálogo público, que torne possível as normas para esse processo” (ibid., p. 106-107).

Sem ignorarem que este giro dialógico é, ainda, restrito a algumas situações e ao verificarem que a dificuldade da transformação contrasta com sua viabilidade, Flecha, Gómez e Puigvert (2001) escrevem: “a opção pela sociedade, que não é outra senão a sociedade da informação para todas as pessoas, não supõe o alcance da igualdade, mas sim um contexto no qual seja possível superar ou diminuir algumas das piores desigualdades existentes na fase anterior”. (ibid., 2001, p.92) A partir dessa proposição e do exposto até aqui, compreendemos que sociedade da informação, modelo de desenvolvimento capitalista, mesmo que seja

48 tomada para todas/os, não pode ser vista como ponto de chegada, mas como ponto de partida para a formação de uma sociedade democrática e justa. Do contrário, seria incoerente com nossa argumentação sobre a superação radical das relações de opressão entre seres humanos e entre estes e a natureza, o que pressupõe a divisão da riqueza e dos meios de produção. A forma atual das relações humanas e da humanidade com a natureza tem nos apresentado seus limites, claramente, por meio de desastres bélicos e ambientais de diferentes proporções, endereçados a todas as partes do globo. A superação disso demanda que a informação seja produzida e não apenas acessada e processada pelas pessoas e pelos movimentos, de modo a permitir um posicionamento político alavancador, por exemplo, da recusa ao consumismo e não apenas sua amenização, da recusa à propriedade privada sem limites e não apenas a formas de emprego precárias, que garantam somente a vida imediata.

Tal mudança qualitativa, ética e política, que buscamos defender com relação a um projeto social, passa por radicalizar a promessa da modernidade de colocar o conhecimento a serviço da melhoria da vida de todas as pessoas. Nesse sentido, é que defendemos, à luz de Habermas (1987), a aplicação e reelaboração de avanços democráticos, como, por exemplo, os Direitos Humanos33, na edificação de uma sociedade justa e democrática, para todas/os. Em nosso entendimento, essa busca é coerente com a revolução social, como já apontamos, feita a partir da transformação humanizadora das relações sociais, pautadas pela liberdade.

A liberdade é a capacidade para darmos um sentido novo ao que parecia fatalidade, transformando a situação de fato numa realidade nova, criada por nossa ação. Essa força transformadora, que torna real o que era somente possível e que se achava apenas latente como possibilidade, é o que faz surgir uma obra de arte, uma obra de pensamento, uma ação heróica, um movimento anti-racista, uma luta contra a discriminação sexual ou de classe social, uma resistência à tirania e a vitória contra ela. (CHAUÍ, 2005, p. 339)

Nesse horizonte, cabe a valorização de uma organização descentralizada e interconectada dos movimentos sociais com o apoio de intelectuais orgânicos, de universidades e de ONG's, valendo-se das tecnologias da informação e nutrindo suas identidades da resistência, a partir de uma estrutura social em que o poder não desaparece, mas busca nos dominar de novas formas. (2001, ibid., p. 98). É nesse mesmo sentido que Haddad (2005) que entende a construção da economia solidária não pode prescindir de uma tomada de posição teórica, que faça uma clara distinção entre as práticas verdadeiras de

33 Entendemos que a declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) precisa garantir limites à propriedade

49 economia solidária e outras práticas que, por distorção ideológica, recebem este substantivo. Na argumentação que faz Singer (2005), também encontramos esta preocupação de conceituar, justificada não só para explicar o que existe, mas para projetar ações de transformação social humanizadora. Passemos, então, a pensar o conceito de economia solidária.