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Aluno 4: Pensava que era um caroço de pêssego (Anexo 11 Reflexão da 9.ª e 10.ª

2.2 R EVISÃO DE L ITERATURA

Nesta secção é apresentada a revisão da literatura que sustenta a investigação, estando dividida em quatro subsecções. Na primeira subsecção apresenta-se a definição de género e a importância da igualdade de género na sociedade. Na segunda subsecção abordam-se os estereótipos e os papéis de género, sob diversos pontos de vista. A terceira subsecção está relacionada com as questões da identidade de género e, por fim, a quarta subsecção faz uma breve alusão à Educação Sexual em Portugal.

2.2.1GÉNERO

Para definir o termo género é importante perceber qual a diferença entre esse termo e o termo sexo. Assim, Oakley (1972) afirma que o termo sexo está relacionado com as características anatómicas e fisiológicas que validam a diferenciação, biológica, entre masculino e feminino e o termo género está relacionado com os atributos psicológicos e as aquisições culturais que os indivíduos dos dois sexos vão incorporando, ao longo do processo de formação da identidade (Cardona et al., 2011).

O sexo de uma criança é definido biologicamente, quando nasce. O género vai sendo desenvolvido ao longo do tempo, de acordo com a cultura onde estamos inseridos. Logo, o fator social e o fator cultural desempenham um papel muito importante no desenvolvimento do género de um indivíduo, “uma vez que as pessoas tendem a reagir de maneira diferente perante uma criança do sexo masculino ou do sexo feminino” (Cardona et. al, 2011, p. 10). Estas reações diferentes podem estar simplesmente relacionadas com o aspeto da criança, com os brinquedos que lhe oferecem, ou acima de tudo com a “formação de expetativas de desempenho, da expressão de elogios e encorajamentos, do estabelecimento de interações verbais e não-verbais e da linguagem utilizada” (ibidem).

De acordo com a Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica (2011),género “designa os papéis, os comportamentos, as actividades e as atribuições socialmente construídos que uma sociedade considera apropriados para as mulheres e os homens” (p. 4).

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[g]énero refere-se aos atributos sociais e oportunidades associadas com o facto de se ser do sexo masculino ou feminino e as relações entre mulheres e homens (…). Esses atributos, oportunidades e relações são construídas socialmente e aprendidas através de processos de socialização. (…) O género determina o que é esperado, permitido e valorizado numa mulher ou num homem, num determinado contexto. Na maioria das sociedades existem diferenças e desigualdades, entre mulheres e homens, nas responsabilidades entregues a cada um, nas atividades desempenhadas por cada um, no acesso e controlo de recursos, assim como nas oportunidades de tomada de decisões.

Cardona et. al (2011), definem género como sendo um conceito relacional, sendo que por isso não se refere apenas a mulheres ou homens, mas sim às relações que ocorrem entre ambos e à forma como essas relações são socialmente construídas, ou seja,

(…) remete para as diferenças sociais (por oposição às biológicas) entre homens e mulheres, tradicionalmente inculcadas pela socialização, mutáveis ao longo do tempo e que apresentam grandes variações entre e intra culturas. Inclui as características culturais específicas que servem para identificar o comportamento de mulheres e de homens (Cardona et. al, 2011, p. 159).

Deste modo podemos perceber que o género é a definição da relação entre mulheres e homens, construída socialmente, e que vamos aprendendo desde jovens. Assim, as crianças em idade escolar são suscetíveis ao que a sociedade/cultura, onde estão inseridos, lhes transmite. Se os/as professores/as estiverem despertos para a importância da igualdade de género, conseguirão transmitir aos seus alunos os valores essenciais, de forma a modificar a perspetiva da sociedade em relação a este tema.

O Conselho da Europa (2004, p. 8) afirma que a

igualdade de género significa uma visão, poder e participação igual dos dois sexos em todas as esferas da vida pública e privada. É o oposto a desigualdade de género, e não a diferenças entre géneros, e tem como objetivo promover uma participação plena das mulheres e dos homens na sociedade.

Até certo ponto, as condições de vida dos homens e das mulheres é diferente, tendo em conta a função reprodutora das mulheres. Contudo, estas diferenças não devem ter um impacto negativo na vida dos dois sexos, sendo que não devem ser discriminados devido a essas diferenças. Para além disso as diferenças entre homens e mulheres deveriam contribuir para uma partilha igualitária do poder na economia, na sociedade e nos processos políticos (ibidem).

A igualdade de género também pode ser definida, de acordo com Canço (2007, p. 182), como um

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[c]onceito que significa, por um lado, que todos os seres humanos são livres de desenvolver as suas capacidades pessoais e de fazer opções, independentes dos papéis atribuídos a homens e mulheres, e, por outro, que os diversos comportamentos, aspirações e necessidades de mulheres e homens são igualmente considerados e valorizados.

A Constituição da República Portuguesa de 2 de abril de 1976, revista pela última vez a 12 de agosto de 2005, refere a igualdade como um princípio fundamental. Aqui se estabelece que todos os cidadãos são iguais perante a lei e têm a mesma dignidade social, sendo que ninguém pode ser beneficiado ou prejudicado de qualquer dever devido ao sexo, orientação sexual, entre outros (artigo 13.º). Ainda é referido que todos os cidadãos têm o direito de participar na vida política e na direção dos assuntos públicos do país (artigo 48.º), sendo que todos os cidadãos maiores de dezoito anos têm direito de sufrágio (com algumas exceções devido a incapacidades previstas na lei geral) (artigo 49.º). Todos os cidadãos têm direito ao trabalho e à igualdade de oportunidades na escolha da profissão e nas condições de acesso a quaisquer cargos (artigo 58.º). Da mesma forma, todos os cidadãos têm direito ao ensino e à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar (artigo 74.º). O artigo 109.º expressa ainda que a

participação directa e activa de homens e mulheres na vida política constitui condição e instrumento fundamental de consolidação do sistema democrático, devendo a lei promover a igualdade no exercício dos direitos cívicos e políticos e a não discriminação em função do sexo no acesso a cargos políticos (Constituição da República Portuguesa, Lei Constitucional n.º 1, 2005).

A Lei de Bases do Sistema Educativo (1986) refere a “(…) formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários (…)” e o “(…) desenvolvimento do espírito democrático e pluralista, respeitador dos outros e das suas ideias (…)” (artigo 2.º). Globalmente, a Declaração dos Direitos Humanos (1948), defende que “[t]odos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os ourtos em espírito de fraternidade” (artigo 1.º). No entanto, a igualdade de género tem tido uma evolução muito lenta no nosso país. Antes de se pensar em género, a diferença entre sexos era vista a partir do sexo “diferente” (sexo feminino), em comparação com a evidente referência do sexo masculino (Houel, 1999). Em 1557, pela primeira vez, foi publicado um livro feminista português que tinha como objetivo defender os direitos das mulheres. As primeiras escolas para meninas foram criadas em 1790, todavia só em 1835 é que foi estabelecida a obrigatoriedade da frequência escolar, no ensino primário. Depois da proclamação da República, em 1910, foram implementadas novas leis do casamento e da filiação, sendo que a mulher deixou

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de dever obediência ao marido. Em 1911 as mulheres passam a poder trabalhar na Função Pública. Em 1931 reconhece-se o direito de voto às mulheres diplomadas com cursos superiores ou secundários, sendo que os homens só precisavam de saber ler e escrever. Mas só em 1975 é que foram abolidas todas as restrições baseadas no sexo quanto à capacidade eleitoral dos cidadãos e nesse mesmo ano foram realizadas as primeiras eleições livres e democráticas para a Assembleia Constituinte. Em 1976 entrou em vigor a nova Constituição que estabelece a igualdade entre os dois sexos, em todos os domínios. Em 1978 entrou em vigor a revisão do Código Civil que, segundo o Direito de Família, decretava que a mulher passava a ter um estatuto de igualdade perante o homem, desaparecendo a figura do “chefe de família” e deixando de haver poder marital (Canço, 2007).

Em 2014, o Conselho da Europa definiu cinco metas/objetivos, de forma a promover a igualdade de género: