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Evolução, profissionalização e formação da carreira docent

I. Enquadramento teórico

4.1. Evolução, profissionalização e formação da carreira docent

Os sistemas de ensino em Portugal têm sido alvo de uma evolução gradual, com alterações importantes na forma como o mesmo sistema é perspectivado e olhado numa dinâmica de progresso (mais ou menos conseguido, dependendo do tempo e das situações).

No século XVIII, previa-se que a definição de uma rede escolar, distribuída por todo o país, facilitasse um avanço que permitia acompanhar o progresso. Reconhece-se que os professores representavam a voz dos novos organismos de educação. Aliás,

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nessa altura, o Estado desenvolvia esforços no sentido de facilitar as condições essenciais à sua profissionalização (Nóvoa, 1992).

Segundo informa Cró (1998), no início do século XIX, para admissão na carreira docente era feita uma selecção cuidadosa, por parte do Estado. O seu objectivo seria o de controlar a prática educacional, de acordo com as suas próprias práticas. A partir de meados do século XIX, deu-se particular importância à formação de professores, sobretudo ao nível de um aperfeiçoamento pedagógico, por meio da utilização de novas estratégias e técnicas pedagógicas, assim como da melhoria nas relações com colegas, alunos, famílias, entidades culturais, sociais, recreativas ou desportivas.

De acordo com o mesmo autor, o professor no século XIX era definido e assumia uma diversidade de atributos. A responsabilidade docente envolvia diversas missões como responsabilidade, dedicação, profissionalismo, humildade, dedicação, próprias aliás de qualquer funcionário público e remetendo para a ideia de apostolado. Por outro lado, assentava numa visão, valorizando o modelo e as qualidades de relação e de respeitos humanos. Os professores assumem até hoje aliás, uma posição mediana entre o povo e a burguesia, entre os funcionários públicos e os profissionais liberais.

No período de transição entre o século XIX e o século XX, procura-se legitimar a influência do ensino e a determinação de princípios reguladores sobre os professores, ou seja, o profissionalismo serviu o projecto dos que estavam no topo e possuíam uma formação especializada. Os administradores e professores das escolas puderam regular e desenvolver novas áreas disciplinares, embora sempre sob a tutela do estado (Cró, M., 1998).

O alargamento da escolaridade obrigatória em Portugal verifica-se, sobretudo, ao longo das décadas 60, 70 e 80, a partir das quais se destaca uma falta de professores no sistema regular de ensino. O desenvolvimento de programas de formação destinados à profissionalização ou complementaridade da carreira docente (por meio do desenvolvimento de cursos de pós-graduação), a rápida e intensa colocação de professores, a diminuição do índice de natalidade, verificou-se sobretudo ao longo dos últimos anos. Mas outro problema surgiu no seu lugar, o da qualidade da formação, tanto dos novos docentes (que, embora em menor número, continuariam a ser necessários) como dos docentes já em serviço (que, em muitos casos, não puderam ter a formação inicial) (Cró, 1998).

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Os investigadores neoweberianos, como Parkins (1979) defendem princípios em que o estatuto de grupo profissional se associa a um conjunto de pessoas que pela via das suas trocas e da sua formação constroem uma concepção comum da sua identidade e finalidades:

O credencialismo, segundo a perspectiva de Loureiro (2001), surge como uma forma de institucionalização de diferentes modalidades de especialização de conhecimentos que permitem o seu reconhecimento como correspondendo a actividades estáveis e credíveis, produzidas quer pelo Estado, quer palas associações profissionais, quer pelos agentes que beneficiam de bens e serviços prestados por profissionais credenciados.

Na realidade, o desenvolvimento do trabalho assalariado dos profissionais mais orientado pata a prestação de serviços do que para a consecução de lucros, alterou os mecanismos organizacionais das profissões, passando a existir uma preocupação maior com os seus procedimentos burocráticos que com a qualidade dos serviços prestados aos clientes.

A designação de profissão associa-se a uma carga de grande ambiguidade e alguns autores, como Abbot, (1988) fazem referência de que a mesma não pode ser claramente definída, dado o poder e importância que lhe estão associados na nossa cultura.

Em 1989, através de Lemosse e os teóricos da corrente funcionalista, defendem- se perspectivas que valorizam, por um lado as profissões como comunidades orientadas como os mesmos valores e baseadas em princípios éticos semelhantes de serviços e por outro lado, o seu estatuto profissional reside num saber predominantemente científico. Em suma, estes princípios defendem como pressupostos gerais de uma profissionalização a comunidade ética e o saber científico (Loureiro, 2001).

Os princípios protagonizados pela corrente funcionalista associam-se ao desenvolvimento de uma actividade intelectual, que compromete e responsabiliza individualmente quem a exerce, apresentando um conjunto de características, que, segundo a concepção de Loureiro (2001), representam práticas de raciocínio determinadas e não de natureza rotineira, mecânica ou repetitiva. A metodologia de trabalho utilizados, vão-se adquirindo no decurso de um determinado período de formação, em que o grupo assume um conjunto de responsabilidades estruturadas

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através de um nível elevado de organização e coesão interna, tendo por base um bom desempenho, espírito de trabalho e dedicação altruísta.

O exercício da carreira docente pode ser percepcionado como um saber formalizado e um ideal de serviço, incluindo-se então num leque alargado de grupos profissionais que incluem especialistas altamente qualificados, que se preocupam em serem reconhecidos como tal. Esta profissionalização pode ainda ser encarada segundo uma perspectiva que inclua categorias profissionais com estudos superiores e estruturados de forma a manter e a consolidar o monopólio sobre um público determinado. Na primeira perspectiva enunciada o ênfase recai sobre um saber legitimado, enquanto na segunda a carreira docente corresponde a um grupo social específico, organizado e reconhecido que ocupa uma posição social bem qualificada baseada num período longo e permanente de formação (Loureiro, 2001).

As diferentes concepções de profissão docente, segundo o mesmo autor, fazem alusão a dois tipos de conhecimento:

- o saber especializado, referente a um domínio de conhecimentos que proporciona uma fonte de autonomia das profissões em relação a qualquer forma de tutela, mesmo a do Estado;

- o ideal de serviço, com significado altruísta aliado a uma sua intervenção social directa.

Loureiro (2001) sintetiza a problemática da definição do conceito de profissão docente a duas dimensões: a dimensão estática que enuncia os princípios que permitem identificar as profissões e a segunda que corresponde a uma conceptualização que procura precisar as estratégias definidas através de diferentes grupos ocupacionais, no sentido a poder aceder a esse estatuto profissional.

Já na actualidade, as escolas, enquanto instituições criadas pelo estado, representam um poder controlador, embora se constituam também como forma de afirmação pessoal e profissional, representadas, muitas vezes, por meio de um corpo solidário e competente, no âmbito das suas funções e competências profissionais (sempre em actualização), junto da camada populacional, perante a qual exercem a sua influência. Importa sobretudo destacar que a profissão docente deve possuir atitudes e

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comportamentos sinónimos de integridade física e moral, que se possam reflectir pela utilização de um saber-ser, reflectido num saber e num saber-fazer (Dominicé, 1990).

A melhoria dos sistemas de ensino é feita de uma forma progressiva pela implementação de um conjunto de procedimentos baseados, muitas vezes, no desenvolvimento de projectos de formação e aperfeiçoamento pedagógico dos professores. Os professores, segundo o mesmo autor, devem exercer diversas competências em vários níveis, segundo Roldão (1999):

• Desenvolvimento das aprendizagens de uma forma autónoma, isto é, com conteúdos previamente definidos, mas adaptados por professores, de acordo com os sujeitos a que se destinam;

• Trabalho com alunos e turmas num esforço permanente de análise, confronto de situações e a consequente resolução de determinado tipo de problemáticas, sempre tendo por suporte a responsabilidade profissional de cada professor;

• Favorecimento de uma relação profissional íntegra, baseada em princípios de respeito, cumprimento de normas e desenvolvimento de um comportamento profissional íntegro, o qual vá ao encontro dos objectivos da escola, das turmas e, consequentemente, das próprias crianças ou jovens. Assim, de acordo com a mesma autora, torna-se importante que os professores sejam capazes de desenvolver competências relativas à implementação e desenvolvimento curricular. As sociedades actuais exigem estratégias de ensino que sejam capazes de favorecer o pensamento crítico, a flexibilidade e a capacidade de interrogar determinados princípios culturais, os quais exercem influência na autonomia e responsabilidade dos professores.