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3.5 ÔNUS DA PROVA

3.5.1 Exame laboratorial

Este tipo de exame é conhecido, também, através da denominação “exame químico”, para o qual se coleta o sangue da pessoa pretensamente embriagada, levando-o a laboratório para exame. O laudo, então, aponta a quantia de álcool existente por litro de sangue no indivíduo.”37

Assim, por meio deste exame, “deverá ficar estabelecido qual o tipo de substância encontrada com a pessoa”38

, e, por conseguinte, sendo positivo o resultado, restará comprovada a materialidade do tipo penal.

Neste exame, para que haja a configuração da embriaguez, deverá ser o índice aferido igual ou superior à concentração de 6 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue.39

Enfatiza-se, outrossim, que, neste tipo de análise, pode o pretenso examinado recusar-se a ceder seu sangue.

3.5.2 Exame clínico

O exame clínico será aquele realizado “por médico, que atesta ou não o estado de embriaguez, verificando o comportamento do sujeito através de sua fala, seu equilíbrio, seus reflexos etc.”40

Entretanto, deverá ser este exame realizado somente por médico examinador da Polícia Judiciária, conforme estabelece o artigo 1º, III, da resolução nº 206, de 20 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Trânsito. Isto porque assim prescreve o citado artigo:

Art. 1º. A confirmação de que o condutor se encontra dirigindo sob a influência de álcool ou de qualquer substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, se dará por, pelo menos, um dos seguintes procedimentos:

[...]

III – exame clínico com laudo conclusivo e firmado pelo médico examinador da Polícia Judiciária.41 37 CAPEZ; GONÇALVES, 1999, p. 45. 38 MOSSIN, 2005, p. 376. 39 PORTÃO, 2009, p. 825. 40 CAPEZ; GONÇALVES, 1999, p. 45. 41 PORTÃO, loc. cit.

Todavia, como é de conhecimento popular, ninguém está obrigado a produzir prova contra si mesmo, ou seja, o cidadão pode não querer tanto soprar no etilômetro quanto ceder uma amostra de sangue para os exames. Mas, poderá ele se negar ao exame clínico realizado por médico examinador da Polícia Judiciária, uma vez que não haverá evasão alguma por parte deste?

Gomes discorre acerca desta indagação, no sentido de que “o motorista surpreendido, como se vê, pode recusar duas coisas: exame de sangue e bafômetro. Mas não pode recusar o exame clínico.”42

Isto porque a Lei nº 9.503/9743, em seu artigo 277, § 3º, estabelece sanções administrativas no caso da recusa à submissão do pretenso examinado à análise clínica. Por consequência, restaria a impunidade na esfera penal, ou seja, seria punido somente administrativamente. Sequer poderá aquele que se negou a ser avaliado pelo médico examinador da Polícia Judiciária ser preso em flagrante pela prática do crime de desobediência, uma vez que, repita-se, o § 3º, do art. 277, do CTB44, prevê a possibilidade da recusa, com a consequente penalidade administrativa. Esta tipificada no artigo 16545, do mesmo diploma.46

E finaliza, concluindo que:

o § 3º que estamos estudando só tem pertinência em relação ao exame clínico. A recusa ao exame de sangue e ao bafômetro não está sujeita a nenhuma sanção. Quem exercita um direito (direito de não-autoincriminação) não pode sofrer qualquer tipo de sanção. O que está autorizado por uma norma não pode estar proibido por outra.47

Este entendimento, entretanto, deve ser analisado com ressalvas, haja vista que o artigo 277, da Lei de Trânsito, em seu § 2º, estabelece que:

§ 2º A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.48

Interpretação esta que se harmoniza com o que muito bem escreveu Brutti, uma vez que, para ele:

42

GOMES; CUNHA; PINTO, 2008, p. 363. 43 ABREU FILHO, 2010, p. 887.

44 ABREU FILHO, loc. cit. 45 ABREU FILHO, loc. cit. 46

GOMES; CUNHA; PINTO, op. cit., p. 363-364. 47 Ibid., p. 364.

[...] está disciplinado no art. 277 do CTB que o condutor suspeito de embriaguez alcoólica será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado. Desta forma, apenas para reforçar a presente fundamentação, vislumbra-se que o termo „perícia‟ está empregado no sentido geral da palavra, nos exatos moldes impressos no Capítulo II do CPP, podendo, pois, desaparecendo os vestígios, não por culpa ou desídia do agente de trânsito ou da polícia, avocar-se a prova testemunhal.49

E continua afirmando que:

Por outro lado, não se pode conceber, outrossim, que tais metodologias de constatação do estado etílico do condutor insertas no mencionado art. 277 do CTB devem restringir-se à esfera de sua responsabilização administrativa cuja sanção correspondente é aquela inserta no preceito secundário do art. 165 do Códex de Trânsito Brasileiro. Com efeito, a „embriaguez‟ é uma só, podendo gerar seus efeitos tanto na esfera administrativa como também na penal.50

Observa-se, assim, perfeitamente possível, como se verá oportunamente, a aferição via prova testemunhal de que alguém se encontra em estado de embriaguez, podendo, igualmente, ser denunciado pela prática do crime capitulado no artigo 306, do Código de Trânsito Brasileiro.51

3.5.3 Exame realizado através do etilômetro/bafômetro

Neste exame, afere-se o nível de concentração de álcool expelido pelos pulmões, quando o examinado “sopra” o bocal de referido etilômetro.

Entretanto, este aparelho deve estar em conformidade com o que dispõe a resolução nº 206, de 20 de outubro de 2006, do Conselho Nacional de Trânsito, em seu artigo 6º, mais precisamente:

Art. 6º. O medidor de alcoolemia – etilômetro – deve observar os seguintes requisitos:

I – ter seu modelo aprovado pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – INMETRO, atendendo a legislação metrológica em vigor e os requisitos estabelecidos nesta Resolução;

II – ser aprovado na verificação metrológica inicial realizada pelo INMETRO ou órgão da Rede Brasileira de Metrologia Legal e Qualidade – RBMLQ;

III – ser aprovado na verificação periódica anual realizada pelo INMETRO ou RBMLQ;

49

BRUTTI, loc. cit. 50 BRUTTI, loc. cit.

IV – ser aprovado em inspeção em serviço ou eventual, conforme determina a legislação metrológica vigente. 52

Neste tipo de avaliação, foi estabelecido que, se o examinado apresentar-se com até duas decigramas por litro de sangue, restará impune. É o que se depreende do Decreto nº 6.488, de 19 de junho de 2008:

Art. 1o Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidades administrativas do art. 165 da Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, por dirigir sob a influência de álcool.

§ 1o As margens de tolerância de álcool no sangue para casos específicos serão definidas em resolução do Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, nos termos de proposta formulada pelo Ministro de Estado da Saúde.

§ 2o Enquanto não editado o ato de que trata o § 1o, a margem de tolerância será de duas decigramas por litro de sangue para todos os casos.

§ 3o Na hipótese do § 2o, caso a aferição da quantidade de álcool no sangue seja feito por meio de teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), a margem de tolerância será de um décimo de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões. Art. 2o Para os fins criminais de que trata o art. 306 da Lei no 9.503, de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia é a seguinte:

I - exame de sangue: concentração igual ou superior a seis decigramas de álcool por litro de sangue; ou

II - teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro): concentração de álcool igual ou superior a três décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões.53 (grifo nosso).

É interessante enfatizar que, repita-se, o suspeito que estiver embriagado pode recusar-se à submissão, eis que está acobertado pelo manto do princípio da não autoincriminação.

3.5.4 Prova testemunhal

Este meio probatório nada mais é do que “uma pessoa natural que, não sendo parte diretamente interessada no objeto de direito, é convocada para atestar, judicial ou extrajudicialmente, a existência ou o esclarecimento de ato ou fato de que tem conhecimento.”54

Entretanto, existe relutância em aceitar-se este tipo de prova para comprovar o estado de embriaguez alcoólica do examinado para a caracterização do crime tipificado no

52

PORTÃO, 2009, p. 825. 53 Ibid., p. 413.

artigo 306, do CTB, haja vista a impossibilidade da(s) testemunha(s) aferir se a concentração de álcool é igual ou superior a 6 (seis) decigramas.

Fato este que poderá ser esclarecido mediante algumas considerações acerca da hermenêutica jurídica, uma vez que, repita-se, a intenção do legislador, quando da edição da Lei 11.705/2008, foi única e exclusivamente tornar a legislação mais rígida, tanto é que assim dispõe no artigo 1º:

Art. 1º Esta lei altera dispositivos da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro, com a finalidade de estabelecer

alcoolemia 0 (zero) e de impor penalidades mais severas para o condutor que dirigir sob a influência do álcool[...]55 (grifo nosso).

Deste artigo, vislumbra-se que não há impedimento em admitir-se a prova testemunhal para que se constate o estado embriagante do examinado.

Reforça este entendimento o que preceitua o artigo 277, do Código de Trânsito Brasileiro, pois assim apregoa:

Art. 277. Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de dirigir sob influência de álcool será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado.56 (grifo nosso).

Por seu turno, a mesma legislação de trânsito, no Capítulo XIX, em seu artigo 291, caput, estabelece que:

Art. 291. Aos crimes cometidos na direção de veículos automotores, previstos neste Código, aplicam-se as normas do Código Penal e do Código de processo Penal, se este Capítulo não dispuser de modo diverso, bem como a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995 [...].57

Assim perfeitamente aplicável, no caso do condutor embriagado recusar-se aos exames estabelecidos para aferição da quantidade de etanol no organismo ou da impossibilidade de realizar o exame clínico. Ante ao desaparecimento iminente dos vestígios da embriaguez, aplicar-se-á a prova testemunhal para a caracterização do crime previsto no artigo 306, do CTB.58 55 PORTÃO, 2009, p. 363-364. 56 ABREU FILHO, 2010, p. 887. 57 Ibid., p. 888.

Isto porque disciplina o Código de processo Penal, em seu Capítulo II, artigo 167, que “não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta”.59 Desta forma, perfeitamente possível a constatação do estado ébrio do examinado via prova testemunhal.

Far-se-á, no capítulo subsequente, uma explanação sobre a hermenêutica jurídica e também uma digressão acerca dos direitos fundamentais que todo cidadão tem jus, suas funções, características e afins, com o escopo de demonstrar que a caracterização, via prova testemunhal, poderá servir como meio de prova para que se faça a denúncia pela prática do crime de embriaguez ao volante, e que nenhum princípio constitucional vem a infringir.

59 ABREU FILHO, 2010, p. 601.

4 CRIME DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE

No que se refere ao artigo 306, da Lei 9.503/971, quando da edição da Lei nº 11.705/2008, houve a supressão da expressão “sob influência de álcool” e, em seu lugar, está a locução “com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas.”2

Desta forma, latente ficou que o crime em tela, para restar configurado, deverá ser a sua materialidade comprovada através de exame de sangue ou por meio do instrumento denominado “etilômetro”, admitindo-se, em virtude do Decreto nº 6.488, de 19 de junho de 2008, a tolerância de 2 (duas) decigramas, eis que assim propuseram o referido Decreto:

Art. 1o Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidades administrativas do art. 165 da Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, por dirigir sob a influência de álcool.

§ 1o As margens de tolerância de álcool no sangue para casos específicos serão definidas em resolução do Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, nos termos de proposta formulada pelo Ministro de Estado da Saúde.

§ 2o Enquanto não editado o ato de que trata o § 1o, a margem de tolerância será de duas decigramas por litro de sangue para todos os casos.

§ 3o Na hipótese do § 2o, caso a aferição da quantidade de álcool no sangue seja feito por meio de teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), a margem de tolerância será de um décimo de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões. Art. 2o Para os fins criminais de que trata o art. 306 da Lei no 9.503, de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia é a seguinte:

I - exame de sangue: concentração igual ou superior a seis decigramas de álcool por litro de sangue; ou

II - teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro): concentração de álcool igual ou superior a três décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões.3 (grifo nosso).

Entretanto, emerge a problemática quando um motorista, visualmente embriagado, nega-se a se submeter tanto ao exame realizado via etilômetro quanto aquele feito através da coleta de sangue ou o clínico.

Problemática esta que poderá deixar impune um(a) motorista que, flagrantemente sob efeito de bebidas alcoólicas, vem a ocasionar um acidente, e, por conseguinte, infligir lesões corporais em outrem ou até mesmo a provocar mortes, o que não foi a intenção do legislador quando da edição da referida lei, muito ao contrário, pretendeu sim impor mais

1ABREU FILHO, 2010, p. 889. 2

ABREU FILHO, loc. cit. 3PORTÃO, 2009, p. 412.

rigor na fiscalização e punição neste tipo de conduta, como também estabelecer alcoolemia zero.4

Percebe-se que, para a aplicação da medida administrativa, podem-se usar todos os meios de provas admitidas em direito para verificar o estado de ebriez do(a) motorista.5

Já para a configuração do crime de trânsito, tipificado no artigo 306, do CTB6, não se poderá usar tais meios de prova ante o direito de que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”7

Ou seja, num caso vale-se o indigitado do princípio da não autoincriminação, noutro não. Ora, seria como aceitar que, em estando embriagado, será punido administrativamente, mesmo sem prova técnica, e, para a configuração do crime, aquelas provas em nada valem se a embriaguez é uma só.8

Desta forma, é evidente que o legislador redigiu mal o texto da Lei, mesmo que sua intenção tenha sido no viés de estabelecer índice zero de bebidas alcoólicas quando na direção de veículos automotores, e, por conseguinte, uma diminuição no número de acidentes.

Cabe, então, aos operadores do Direito, valerem-se da hermenêutica jurídica, haja vista que “quando a lei não ordena com certeza imperativa, que o juiz possa marchar com seu tempo, que ele possa tomar em consideração os usos e costumes que se criam, as ideias que evoluem, as necessidades que reclamam uma solução de justiça.”9 (grifo nosso).

Se assim não for, é o artigo 306, do CTB, um artigo natimorto, uma vez que não haverá quem se submeta aos referidos exames sabendo que ingeriu bebidas etílicas, dando azo a números ainda maiores de motoristas envolvidos em acidentes que, com base no principio da não autoincriminação, saem impunes, o que não foi, obviamente, a intenção do criador da lei.

Tudo isto acontece em razão da falta de atenção do legislador que, repita-se, em alguns detalhes primordiais, ou seja, quando houve a reedição do artigo em tela, principalmente pelo fato de que ninguém está obrigado a fazer prova contra si mesmo.

O princípio da não autoincriminação é para Gomes:

O privilégio ou princípio (a garantia) da não auto-incriminação (Nemo tenetur se detegere ou Nemo tenetur se ipsum accusare ou Nemo tenetur se ipsum prodere) significa que ninguém é obrigado a se auto-incriminar ou a produzir prova contra si

4 GOMES; CUNHA; PINTO, 2008, p. 357. 5 BRUTTI, loc. cit.

6 ABREU FILHO, 2010, p. 889. 7

Ibid., p. 27. 8 BRUTTI, loc. cit.

mesmo (nem o suspeito ou indiciado, nem o acusado, nem a testemunha etc.). Nenhum indivíduo pode ser obrigado, por qualquer autoridade ou mesmo por um particular, a fornecer involuntariamente qualquer tipo de informação ou declaração ou dado ou objeto ou prova que o incrimine direta ou indiretamente [...].10

Desta feita e levando em consideração os fatos acima mencionados, é de extrema importância a aceitação para a materialização do crime previsto no artigo 306, da Lei nº 9.503/9711, da prova testemunhal ou o exame clínico, uma vez que, em se negando estes meios probatórios admitidos em direito, corre-se o risco de ver-se um aumento significativo de condutores embriagados nas vias públicas brasileiras, ante a certeza da impunidade, que influi diretamente no desrespeito ao princípio importantíssimo à vida.

Assim, passa-se agora a explanar acerca da hermenêutica jurídica, seus tipos e funções, com a intenção de se ver efetivamente a aplicabilidade do artigo 306, do CTB, tendo- se como meio de comprovação do crime a prova testemunhal.

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