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2 SISTEMA PREDIAL DE ÁGUA NÃO POTÁVEL

2.4 EXPERIÊNCIAS COM O USO DE ÁGUA NÃO POTÁVEL

No cenário global, os Estados Unidos e a Austrália abriram o caminho para a prática do uso de água não potável. De acordo com Domènech e Saurí (2010), moradores australianos e do oeste americano começaram a utilizar água não potável para irrigação de jardins em resposta à seca das regiões. As autoridades dos países se viram forçadas a legalizar esta prática e desenvolver diretrizes, visando garantir o reúso adequado das águas cinzas para minimizar os riscos à saúde dos usuários e ao meio ambiente.

Com o aumento populacional e a preocupação com a conservação dos recursos hídricos, a Austrália permitiu a ampliação do reúso de águas cinzas para descarga de bacias sanitárias, por acreditarem na redução do potencial de água potável para esta atividade aliada à rega de jardins e gramados (JEPPESEN, 1996). No entanto, Domènech e Saurí (2010) explicam que somente a partir de janeiro de 2009 o governo australiano passou a promover o reúso em larga escala, anunciando descontos de até 500 dólares australianos a todos os domicílios que implantassem o sistema predial de água não potável recuperada.

O Japão também possui ampla tradição no uso de água não potável devido à pequena área territorial em comparação com a elevada densidade populacional (AL-

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JAYYOUSI, 2003). Segundo o autor, o uso de água recuperada em descargas sanitárias é incentivado pelas autoridades japonesas, sendo aplicado um volume anual de aproximadamente 970 mil m³ para esse fim. Além disso, Hanson (1997)4

apud CSBE (2003) ressaltam que, em Tóquio, os sistemas prediais de água não

potável são obrigatórios para edificações com área superior a 30.000 m² ou com potencial de reúso de 100 m³ por dia.

Na Alemanha e no Reino Unido, onde a escassez de água é menos crítica, mas a conservação ambiental é uma preocupação, as instituições têm o objetivo de pesquisar novas tecnologias a serem instaladas em edifícios que usam água não potável; verificar as implicações à saúde e ao ambiente decorrente de sua utilização, bem como ampliar a aceitação dos usuários para os sistemas de reúso nas residências (DOMÈNECH e SAURÍ, 2010). Conforme Hildebrand (1999)5 apud Al- Jayyousi (2003), os principais destinos para as águas cinzas na Alemanha referem- se às descargas em bacias sanitárias e à irrigação de jardins.

A Holanda, no início da década de 2000, iniciou um projeto financiado pelo governo para o suprimento de água a um conjunto habitacional de 30.000 casas. Apesar de terem sido tomadas diversas precauções durante a etapa de projeto, alguns erros foram cometidos durante a execução ocasionando a contaminação da água potável distribuída para 1.000 residências devido a uma conexão cruzada entre os sistemas prediais de água potável e não potável (SCHEE, 2004). Do mesmo modo, de acordo com SoPHE News (2012)6 apud CEM (2013), em 2010, famílias residentes no leste da Inglaterra passaram a ingerir água contaminada também em virtude de uma conexão cruzada nas tubulações de abastecimento de água potável e do sistema de captação de água pluvial.

Na Espanha, segundo Domènech e Saurí (2010), o uso de água recuperada ocorre, mas ainda tem muito para evoluir. Ao contrário de países onde as práticas de reúso tiveram que ser legalizadas para atender à demanda, os regulamentos espanhóis

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Hanson, L. Environmentally Friendly Systems and Products. Water Saving Devices. Bracknell: BSRIA, Department of Environment, Transport and the Regions. 1997.

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HILDEBRAND, R. Sedimentationsanlage Hildebrand. Grauwasser Recycling, Schriftenreline fbr, 5, p. 51-60, 1999.

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SoPHE News (2012). Available at:

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foram estabelecidos antes da conscientização pública. Desta forma, a partir de 2002, diversas regiões promulgaram políticas e diretrizes para promover a instalação de sistemas prediais de água não potável em edifícios em fase de projeto ou execução. De acordo com os autores, o primeiro município a aprovar essa lei foi Sant Cugat del

Vallès, situado na área metropolitana de Barcelona, seguido pelas regiões da

Catalunha, Galiza e Andaluzia.

Na Itália, os sistemas de água não potável são implementados, não somente, nas regiões áridas e semiáridas do sul do país, como também no norte, onde os recursos hídricos disponíveis geralmente atendem à demanda. Assim, a utilização de água recuperada é voltada para irrigação agrícola, de jardins, proteção contra incêndio e para finalidades industriais (BARBAGALLO et al., 2001). Kellis et al. (2013) destacam ainda que um novo conjunto de regulamentos referentes ao reúso tem sido adotado desde 2003 e as águas residuárias são reguladas por um decreto legislativo de 2006.

Em Portugal, segundo Matos et al. (2014), foram publicadas diretrizes para o uso de água não potável na irrigação (NP 4434:2005), fornecendo informações sobre a aplicação de água residuária urbana tratada para irrigação agrícola e irrigação paisagística. De acordo com os autores, é o primeiro documento no país que apresenta não somente os critérios de qualidade para águas servidas, mas que fornece orientações sobre como garantir a segurança na escolha dos equipamentos e métodos de irrigação. Além disso, fornece diretrizes para a proteção do meio ambiente e inclui procedimentos de monitoramento do impacto ambiental em áreas irrigadas com água residuária urbana tratada.

No Canadá, segundo Schaefer et al. (2004) o reúso de água é praticado em uma escala relativamente pequena e varia regionalmente, dependendo da disponibilidade de abastecimento e da flexibilidade das legislações existentes. Exemplos incluem o uso de água não potável para irrigação de culturas agrícolas não alimentares, parques urbanos, paisagismo e campos de golfe. Os autores acrescentam que as águas claras são empregadas em alguns setores industriais enquanto as águas cinzas têm sido testadas experimentalmente em residências unifamiliares para irrigação de jardins e de descargas em bacias sanitárias.

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Os países em situação de escassez hídrica constante, a exemplo da Arábia Saudita, Chipre, Jordânia, Turquia, Síria, Líbano, Marrocos e Líbia encontraram na água recuperada uma fonte para otimizar o uso da água, especialmente em atividades de irrigação (AL-JAYYOUSI, 2003; KELLIS, 2013). Entretanto, normas e diretrizes relacionadas ao emprego adequado de água não potável ainda estão sendo estudadas pelas autoridades dessas regiões.

2.4.2 Experiências nacionais

No Brasil a utilização de água residuária para fins não potáveis é recente e ainda não se aplica em larga escala. Apesar de não haver regulamentações específicas voltadas ao uso de águas recuperadas em sistemas prediais e ambientes urbanos, algumas prefeituras as empregam para a limpeza de vias públicas, pátios e veículos, irrigação de áreas verdes e desobstrução da rede de esgotos.

Além disso, desde 2012, o país possui o maior empreendimento da América do Sul para a produção de água não potável para fins industriais, o Aquapolo, que está apto a tratar 1.000 litros/segundo de esgoto, gerando uma economia aproximada de 2,58 bilhões de litros por mês de água potável (AQUAPOLO, 2015).

Em relação aos sistemas prediais de água não potável, com base nas literaturas brasileiras, percebe-se que sua implantação se concentra em edifícios recentes de alto padrão e englobam especialmente o uso de águas subterrâneas, pluviais e recuperadas (ALVES et al., 2009; BOZAN, 2011; CASTILHO, 2015). No entanto, conforme apresentado por Castilho (2015), também são verificadas irregularidades tanto nas etapas de projeto e de execução, relatando-se problemas com conexões cruzadas, quanto no processo de operação, de manutenção e de gerenciamento. Deste modo, constata-se que cada país tem um nível de desenvolvimento no que se refere ao uso de água não potável em sistemas prediais. Em alguns locais, como nos Estados Unidos, Austrália e Japão, esta prática está consolidada e amparada por legislações bem definidas. Enquanto que em outras regiões, a exemplo do Brasil, ainda existe um caminho considerável a se percorrer até que a utilização de água não potável, estabelecida em normas técnicas, se torne prática recorrente em edificações multifamiliares.

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